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Ação direta de inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Legislação processual constitucional vigente e sugestões para sua reforma

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3.Reflexão crítica sobre limites e possibilidades da adin catarinense

Neste ponto do trabalho refletiremos sobre três questões, que prepararão a sua conclusão:

a) é válido, segundo a ordem constitucional vigente, a instituição do rito de adin por lei estadual ?

b) tendo em conta o modelo federal de adin, a estrutura da adin estadual ficou além ou aquém do paradigma central?

c) que inovações seriam possíveis em face da estrutura da adin estadual vigente em Santa Catarina?

3.1. Instituição do rito processual constitucional de adin por lei estadual

A Constituição de Santa Catarina, como já dissemos, regulou em seu artigo 84 e seguintes a propositura da ação direta de inconstitucionalidade. O Estado promulgou a lei 12.069, em dezembro 2001, que cuidou do rito processual dessa ação; anteriormente, a resolução tribunalícia 06/90 tratara da mesma matéria.

Tendo em conta o círculo constitucional de competências legislativas traçado na Constituição Federal, esses atos normativos catarinenses seriam válidos, legítimos, constitucionais?

Para darmos resposta a esta questão, precisamos sublinhar que em nosso sistema federativo a competência normativa do constituinte estadual se expressa através de poderes de elaboração da Constituição estadual, de emissão de normas constitucionais estaduais que serão paramétricas para os demais poderes estaduais e mesmo para os particulares. Neste poder de elaboração da constituição está ínsito, implícito, o poder de criar o sistema de proteção da Constituição elaborada pelo Estado-membro. E as regras, o rito e os instrumentos de proteção da Constituição elaborada pelo Estado-Membro podem vir nela traçadas por normas constitucionais estaduais, ou por normas legislativas ou regimentais produzidas pelos poderes constituídos estaduais.

Os institutos basilares do controle estadual de constitucionalidade e seus legitimados devem estar positivados no texto constitucional estadual, podendo o legislador ordinário estadual - o judiciário através de sua competência normante regimental -, criar normas ordinárias que especifiquem, modulem os efeitos das decisões liminares e de mérito, definam o rito e o processo constitucional respeitante ao sistema de controle de constitucionalidade estadual.

Podemos dizer que há uma reserva de constituição estadual quanto à previsão dos institutos, todavia quanto às regras do processo constitucional e suas características procedimentais secundárias podem ser delineadas ou aprofundadas pela atividade legislativa infraconstitucional, como demonstram, no plano federal, as leis federais 9.868/99 e 9.882/99, que definiram, respectivamente, o rito das ações direta de inconstitucionalidade federal e da ação declaratória de constitucionalidade, e o rito da argüição de descumprimento de preceito fundamental, assim como as disposições regimentais do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional que dispõem sobre ritos judiciais e parlamentares no que toca a decisões e seus efeitos proferidas no controle de constitucionalidade. Nesse caso o princípio da simetria deve funcionar como estimulante, como norte, como luz da liberdade de conformação do Estado-membro.

Afirmamos que o poder de proteção da Constituição estadual realiza-se em três momentos distintos:

i) elaboração constituinte das linhas mestras do sistema, com a definição dos institutos basilares, com a opção pelos instrumentos processuais constitucionais que figuraram no rol de normas da Constituição estadual, tanto no ato inicial constituinte estadual, quanto pela ação de reforma constitucional do texto local;

ii) os poderes constituídos estaduais, em atividade de normação infra-constitucional, através de leis ou atos regimentais, definirão com minúcia as características ordinárias do processo constitucional de controle da compatibilidade de atos e normas com a constituição estadual;

iii) o judiciário estadual, através da cúpula do Tribunal de Justiça, em via de controle direto, ou os demais juízes estaduais, no âmbito do controle difuso, farão valer esses instrumentos diante das normas constitucionais estaduais paramétricas ao controle de constitucionalidade.

Com relação à regra de competência legislativa processual da União (art. 22, I da CRFB), que poderia impedir o legislador estadual de tratar sobre tal matéria, asseveramos que o processo constitucional estadual de controle é instituto que está na esfera de competência constituinte e legislativa do Estado-Membro e não se verá obstado por tal preceito, por três razões básicas:

i) o processo judicial que se cuida naquele texto é o processo civil e o processo penal, não o processo constitucional;

ii) é inerente a capacidade de auto-legislação e auto-organização dos Estados-Membros definirem o seu sistema processual de defesa da constituição estadual, podendo fazê-lo por normas constitucionais estaduais, normas legais e normas regimentais;

iii) seria incoerente que se imaginasse poder o constituinte decorrente elaborar uma constituição estadual, todavia o sistema de defesa dessa constituição fosse regulado por norma processual federal, sem que para isso houvesse disposição expressa posta pelo constituinte originário federal: aqui também a matéria, além de ser de competência implícita, também é remanescente.

É da essência da autonomia do constituinte estadual criar o sistema de defesa da Constituição que dele emanar. Cabe a ele e só a ele criar mecanismos de controle que assegurem a supremacia da Constituição Estadual no plano territorial dos Estados. Seria ilógico e inaceitável que o sistema de controle de constitucionalidade estadual fosse ou devesse estar previsto e exaurido na Constituição Federal – isso, para Anna Cunha Ferraz, anularia o significado da autonomia federativa.

Além disso, ressaltamos que o constituinte estadual não está obrigado a acompanhar os modelos de defesa criados e estruturados pela Constituição Federal, já que a criação de seu mecanismo de defesa é direito autônomo:

Para o Estado-Membro, em nossa federação, a criação de seu sistema de defesa seria "direito autônomo", não estando adstrito a acompanhar os eventuais modelos de defesa da Constituição Federal, por esta criados e estruturados.

Assim, não haveria uma correspondência estrutural necessária entre controle federal e controle estadual de constitucionalidade. Óbvio que o sistema de defesa estadual está limitado pelas regras e princípios de observância obrigatória pelo poder constituinte decorrente, como são, a exemplo, a separação de poderes, o sistema de direitos e garantias fundamentais, a organização mínima do poder judiciário e sua articulação com os demais poderes.

Anna Cunha Ferraz, ao tratar do assunto afirma:

"[...]o controle de constitucionalidade frente à Constituição Estadual há de ser exercido por poderes constituídos pelo Constituinte Decorrente e, em regra, deve ser previsto na própria Constituição Estadual para que possa atuar eficazmente.

O Constituinte Estadual ao criar o sistema de controle de defesa da Constituição há de indicar-lhe a natureza, estruturar-lhe os meios de funcionamento, inclusive os de natureza processual.

Esse controle alcança, necessariamente, todos os atos jurídicos que tenham fundamento na Constituição Estadual, de modo direto ou indireto. Vale dizer que alcança a ação dos poderes locais, legislativo e executivo. Assim, à Constituição Estadual hão de ajustar-se, no plano legislativo, as leis estaduais e as leis municipais; no plano executivo, os atos do governador e das autoridades estaduais, dos prefeitos e autoridades municipais, e, no plano judiciário, os atos do Poder Judiciário Estadual, quer enquanto aplica normas (função jurisdicional), quer quando atua competências decorrentes da Constituição Estadual e das leis estaduais (função administrativa)." [34]

Do exposto, conclui-se que o controle de constitucionalidade estadual (para defesa da constituição estadual no modo concentrado) é matéria dos Estados-Membros e deve ser regulado no plano local como manifestação de autonomia federativa. Nesse sentido, o Estado de Santa Catarina, ao promulgar a Lei 12.069/01, e, anteriormente, a resolução tribunalícia nº 06/90, agiu de acordo com sua autonomia normativa, cingindo-se ao círculo constitucional de competências que lhe é assegurado na Constituição da República (arts. 1º, caput, 18, caput, 25, § 1º, 125, § 2º, da CRFB).

3.2. Comparação entre o modelo federal de adin e o estadual catarinense: diferenças e semelhanças constatadas

O primeiro ponto a destacar é a semelhança, inclusive redacional, entre os artigos da Lei estadual 12.069/01 relativamente aos dispositivos da Lei federal 9.868/99, que regulou o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade federais. O legislador catarinense não apenas inspirou-se, antes copiou, em certa medida, o modelo federal.

Segundo: o legislador catarinense manteve o mesmo silêncio do legislador federal no que toca à ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Ou seja, a lei federal apenas regulou a adin e adc, nada dizendo sobre a adio. Apesar de a Constituição estadual ter instituído a adio (CESC, art. 85, §3º), a lei estadual sobre ela nada dispôs.

Terceiro: a lei catarinense disciplinou apenas uma única ação, enquanto o legislador disciplinou duas, conferindo-lhes tratamento uniforme e sistematizado. Ora, poderia o legislador catarinense, como dissemos, ter aproveitado a oportunidade normante e ter disciplinado o rito da adio estadual.

Quarto: a lei estadual (art. 2º, VII), reproduzindo preceito da Constituição estadual (art. 85, VII, da CESC), limitou a propositura de adin, a Prefeito, Mesa da Câmara e um quarto dos Vereadores, somente quando se tratar de lei ou ato normativo municipal, ou seja, quando houver inconstitucionalidade de lei estadual em face da Constituição estadual não poderão essas autoridades proporem a via concentrada. Tendo em conta os dispositivos similares da lei federal (art. 2º, IV e V) e da Constituição Federal (art. 103, IV e V), que regularam a adin federal para a Mesa da Assembléia Legislativa e Governador, não notamos semelhante restrição, pois essas autoridades tanto podem impugnar leis estaduais e leis federais perante o STF, na via direta.

Ou melhor, o Prefeito, como segundo chefe do executivo, em Santa Catarina, tendo em conta o Governador no plano federal (que também é o segundo chefe de executivo, todavia em nível nacional), pode menos do que esse, pois não lhe foi atribuído a via processual de impugnação da lei estadual frente à Constituição estadual (e assim, na mesma proporção, a Mesa da Câmara, relativamente a Mesa da Assembléia Legislativa).

Nesse ponto, a lei estadual e a constituição catarinense representam retrocesso relativamente ao modelo federal, que se baseou na ampliação democrática do pólo ativo para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade.

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Quinto: a lei estadual, na parte final do dispositivo antes analisado (art. 2º, VII), consagrou norma atribuidora de legitimidade ad causam para adin, que representa, relativamente ao modelo federal, significativo avanço, pois legitimou a Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público de primeiro grau e as associações comunitárias (e. g., comunidades de bairro etc.) a proporem a ação direta quanto se tratar de lei municipal contestável em face da Constituição estadual. Houve assim ampliação do número de sujeitos proponentes, todavia com redução do objeto da impugnação, como criticado no item quatro desta exposição. E o avanço é evidente, pois no modelo federal não foi atribuído legitimidade ativa às Procuradorias Gerais de Justiça dos Estados, nem aos seus Conselhos Seccionais da OAB, que seriam as instituições, em plano federal, similares às elencadas no plano estadual catarinense.

Além disso, sequer há no plano federal a menor menção a "associações representativas da comunidade", o que, na esfera catarinense, amplia, e muito, a possibilidade de acesso à jurisdição constitucional estadual. O que no plano federal mais se aproxima de tal disposição é a alusão, no inciso IX, do artigo 2º, da Lei 9.868/99 (103, IX, CRFB): a "confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional", todavia, a ordem jurídica catarinense também legitimou "as federações sindicais e as entidades de classe de âmbito estadual" (art. 2º, VI da Lei 12.069; 85, VI, CESC).

Sexto: o artigo 8º da lei estadual inovou relativamente ao seu correspondente normativo, o artigo 8º da lei federal. A disciplina estadual diz que, decorrido o prazo para as informações, serão ouvidos o Procurador-Geral do Município, se municipal o ato impugnado, o Procurador-Geral do Estado, se estadual, e, caso esse se abstenha de defendê-lo, será chamado a fazê-lo o Procurador-Geral da Assembléia Legislativa; após, se ouvirá o Procurador-Geral de Justiça (como integrante máximo do Ministério Público estadual).

No plano federal, o Advogado-Geral da União se pronunciará tanto no caso de lei federal quanto no de lei estadual, para defender a presunção de constitucionalidade de ambas. Sequer se cogitou de outro agente que possa substituí-lo em tal tarefa, melhor, sequer admitiu-se que possa ele abster-se de tal responsabilidade processual. Após a manifestação da advocacia máxima da União, manifestar-se-á o Chefe Máximo do Ministério Público Federal, o Procurador Geral da República.

Sétimo: tendo em conta o modelo federal, a lei estadual deixou de estabelecer uma disciplina procedimental que, na visão da sociedade aberta dos intérpretes constitucionais de Häberle, poderia ser útil à exegese de questões constitucionais estaduais. Referimo-nos ao parágrafo 2º, do artigo 9º, da Lei 9.868/99: "O Relator poderá, ainda, solicitar informações aos Tribunais Superiores, aos Tribunais federais e aos Tribunais estaduais acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição."

Ora, esse dispositivo, no plano federal concentrado de constitucionalidade, quis oportunizar à Corte Constitucional Máxima Federal ouvir as cortes inferiores quanto à aplicação da norma impugnada no controle difuso de constitucionalidade. Esse dispositivo promove promissora interação entre o controle concentrado e difuso de constitucionalidade. Em nosso entendimento, no plano estadual catarinense poderia a Lei 12.069 tê-lo adotado, mutatis mutandis, para oportunizar ao Relator ouvir os juízos monocráticos das Comarcas e as Turmas Recursais dos juizados especiais.

Oitavo: o artigo 16 da lei estadual consagrou dispositivo completamente estranho ao modelo federal de adin: "Julgada a ação, far-se-á a comunicação à autoridade ou ao órgão responsável pela expedição do ato, inclusive para efeitos do § 2º, do art. 85 da Constituição Estadual.". Diz o dispositivo do § 2º, do artigo 85, da CESC: "Declarada a inconstitucionalidade, a decisão será comunicada ao Poder ou órgão competente para a adoção das providências necessárias."

No modelo federal concentrado, apenas quando a Constituição Federal tratou da ação direita de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º) é que exigiu "ciência ao poder competente para adoção das providências necessárias [...]", se declarada a inconstitucionalidade por omissão. Lembremos que a Lei federal 9.868/99 não tratou da adio, e nem especificou dispositivo semelhante.

Além disso, o constituinte estadual catarinense, ao adotar a adio estadual, especificou: "Reconhecida a inconstitucionalidade, por omissão de medida para tornar efetiva norma desta Constituição, a decisão será comunicada ao Poder competente, para adoção das providências necessárias a prática do ato ou início do processo legislativo, e, em se tratando de órgão administrativo, para cumprimento em trinta dias." (art. 85, § 3º, da CESC).

Nono: a Lei 12.069/01 não positivou na ordem jurídica catarinense o teor do artigo 26 da Lei federal 9.868/99: "A decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ação direta ou em ação declaratória é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória."

Não poderia ter adotado na íntegra este enunciado a lei estadual, por duas razões:

a) não foi positivado, na Constituição catarinense, a ação declaratória de constitucionalidade [35];

b) a jurisprudência do STF admite recurso extraordinário em adin estadual, desde que a norma-parâmetro adotada nesta ação seja reprodução de norma-parâmetro da Constituição Federal (apenas norma de reprodução, e não as normas de imitação), conforme fixado na Reclamação 383/93, Relatoria do Ministro José Carlos Moreira Alves [36].

Ainda que não tenha adotado tal enunciado, é possível a interposição de embargos declaratórios contra acórdãos proferidos em adins estaduais (art. 535, do CPC), recurso que serve para o aclaramento de qualquer decisão judicial, tanto as proferidas em processos de jurisdição ordinária como em processos de jurisdição constitucional concentrada [37].

Décimo: a lei estadual também não positivou o parágrafo único, do artigo 28, da Lei 9.868/99: "A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal."

Em outros termos, deixou de prever, expressamente, as técnicas de decisão encontráveis no sistema de controle de constitucionalidade concentrado federal, como são a "interpretação conforme a constituição" [38] e a "declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto" [39]. Ademais, não previu, explicitamente, o efeito vinculante [40] de suas decisões para o Poder Judiciário estadual e para os órgãos da administração pública estadual e municipal localizadas em território catarinense.

Este silêncio sobre o efeito vinculante impossibilitou um olhar sobre o valor e uso da reclamação constitucional no plano estadual catarinense, para se fazer respeitar as decisões vinculantes tomadas em adin estadual. A Constituição barriga-verde, em seu artigo 83, XI, letra "i" [41], prevê o instituto da reclamação para preservar a autoridade das decisões do TJ.

A regulação de tal instituto, no plano da Constituição local, tem sido aceita como legítima pelo STF [42]. Assim, poderia e pode haver o uso da reclamação [43], como instrumento de proteção da ordem constitucional objetiva, no controle concentrado estadual, como tem sido feito no plano federal. A ordem jurídica catarinense já está aparelhada da para tal. Basta a jurisprudência estadual começar a registrar seu uso.

Os pontos expostos resultaram da comparação realizada entre a adin federal e a adin estadual catarinense. No tópico seguinte trataremos das possíveis inovações (inclusões e supressões) a serem realizadas pelo legislador catarinense no modelo concentrado de constitucionalidade estadual por via de ação direta de inconstitucionalidade.

3.3. Inovações possíveis ao modelo estadual catarinense de adin

Neste último tópico do trabalho, tendo em conta a análise feita no segundo capítulo e a comparação exposta no item anterior, apontaremos algumas sugestões para alteração do modelo catarinense de adin. Sugestões de lege ferenda, que poderão implicar alteração da Constituição estadual ou da Lei estadual 12.069 nas normas que disciplinaram o rito, o julgamento e os efeitos da ação direta de inconstitucionalidade positivada na ordem jurídica catarinense.

A primeira sugestão implica alteração do inciso VII, do artigo 85, da CESC e do inciso VII, do artigo 2º, da Lei estadual catarinense. Nesses dispositivos ficou assentado que o Prefeito, a Mesa da Câmara, a Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, o representante do Ministério Público e as associações representativas de classe ou da comunidade poderão propor adin, desde que o ato impugnado seja lei municipal, não lhes facultando ação para impugnar lei estadual. Sugerimos a supressão derrogatória, nos dispositivos apontados, de sua última parte, "[...] quando se tratar de lei ou ato normativo municipal", assim restando legítima e democraticamente franqueada, aos agentes referidos, a possibilidade de impugnar leis estaduais lesivas aos interesses das comunidades municipais em face da Constituição estadual.

A segunda sugestão é para excluir o critério da pertinência temática adotado na jurisprudência do STF para adin federal, e admitida pelo TJ catarinense, para garantir maior democraticidade e abertura no controle concentrado barriga-verde. Assim, talvez se pudesse acrescentar um parágrafo único ao artigo 2º, da Lei 12.069/01, com o seguinte enunciado: "Para o exercício do direito de ação pelos agentes e entes descritos nos incisos anteriores, não se exige a comprovação de pertinência temática, salvo demonstração de interesse para ente ou agente municipal impugnar lei vigente de município onde não exercem suas funções."

A terceira sugestão é adotar, no texto da Lei 12.069/01, parágrafo único ao seu artigo 18, mutatis mutandis, com o mesmo teor do parágrafo único do artigo 28 da Lei federal 9.868/99, que teria a seguinte redação: "A declaração de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário estadual e à Administração Pública estadual e municipal."

A quarta seria a supressão derrogatória do artigo 16 da Lei 12.069/01 e do § 2º do 85, da Constituição estadual catarinense, com os seguintes teores, respectivamente: "Julgada a ação, far-se-á a comunicação à autoridade ou ao órgão responsável pela expedição do ato, inclusive para efeitos do § 2º, do art. 85 da Constituição Estadual. Declarada a inconstitucionalidade, a decisão será comunicada ao Poder ou órgão competente para a adoção das providências necessárias."

Esses dispositivos, em nosso entendimento, se não ajudam a melhorar a eficácia do controle de constitucionalidade em Santa Catarina, podem atrapalhar-lhe a boa efetividade. Ocorre que a simples publicação do acórdão no órgão oficial de imprensa, no modo disciplinado no artigo 18 da Lei estadual (que corresponde ao artigo 28, da Lei 9.868/99), já opera efeitos de excluir da ordem estadual ou municipal a norma reconhecida como inconstitucional, já lhe empresta efeito erga omnes, vinculante, devendo o próprio acórdão dizer se haverá modulação dos efeitos temporais (ex nun, ex tunc), na forma do artigo 17 da lei estadual.

Equivocada interpretação dos dispositivos que sugerimos derrogação pode levar ao entendimento de que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade dependam de atos de autoridades alheias à Corte Constitucional catarinense. Ou seja, pode-se querer que para a adin, para o controle concentrado, se tome o mesmo procedimento que se tem tomado para o controle difuso exercido pelo pleno do TJ: comunicação à Assembléia Legislativa, para expedição de decreto legislativo suspensivo de lei declarada inconstitucional em decisão definitiva do TJ/SC, por aplicação à espécie, do inciso XIII, do artigo 40, da CESC (que repete, mutatis mutandis, o artigo 52, X, da CRFB) [44].

A quinta seria a adoção, mudando o que deve ser mudado, do teor encontrável no parágrafo 2º, do artigo 9º, da Lei federal 9.868/99, criando-se o parágrafo 3º, no artigo 9º, da Lei 12.069, que teria a seguinte redação: "O relator poderá, ainda, solicitar informações às Turmas Recursais dos juizados especiais ou aos juízos monocráticos acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição."

A sexta sugestão seria substituir, no texto da lei catarinense, o teor do artigo 16 antes criticado, pelo seguinte teor: "A decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo em ação direta é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios ou recurso extraordinário na forma disciplinada na legislação processual federal, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória." [45]

Essa inclusão tem mais fins didáticos e pedagógicos aos operadores jurídicos envolvidos com a aplicação adequada do controle de constitucionalidade concentrado estadual, do que exigências pragmáticas, pois, como visto, a jurisprudência do STF e a legislação processual federal admitem tanto a interposição de recurso extraordinário quanto de embargos declaratórios, como afirmado acima. O legislador catarinense talvez tenha sido tímido ao positivar a lei estadual, por ter entendido que tal preceito não caberia em seus limites de regulação, alcançando competência legislativa do legislador federal (artigo 22, I, da CRFB). Como demonstramos no item 3.1 deste trabalho, esse entendimento não deve prevalecer em matéria de estruturação do sistema de defesa da Constituição estadual.

Acreditamos que o acatamento de tais sugestões pelo legislador catarinense poderá levar a um adequado aprimoramento do processo, julgamento e efeitos das decisões em ação direta de inconstitucionalidade aforável no Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

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Sobre os autores
Ruy Samuel Espíndola

Advogado publicista e sócio-gerente integrante da Espíndola e Valgas Advogados Associados, com sede em Florianópolis/SC, com militância nos Tribunais Superiores. Professor de Direito Constitucional desde 1994, sendo docente de pós-graduação lato sensu na Escola Superior de Magistratura do Estado de Santa Catarina e da Escola Superior de Advocacia da OAB/SC. Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Santa Catarina (1996). Atual Membro Consultor da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB/Federal e Membro da Comissão de Direito Constitucional da Seccional da OAB de SC. Membro efetivo da Academia Catarinense de Direito Eleitoral, do Instituto Catarinense de Direito Administrativo e do Octagenário Instituto dos Advogados de Santa Catarina. Acadêmico vitalício da Academia Catarinense de Letras Jurídicas na cadeira de número 14, que tem como patrono o Advogado criminalista Acácio Bernardes. Autor da obra Conceito de Princípios Constitucionais (RT, 2 ed., 2002) e de inúmeros artigos em Direito Constitucional publicados em revistas especializadas, nacionais e estrangeiras. Conferencista nacional e internacional sobre temas jurídico-públicos. [email protected], www.espindolaevalgas.com.br, www.facebook.com/ruysamuel. 55 48 3224-6739.

Andréia Maria Bocchi Cezar Espíndola

Advogada. Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí. Pós-Graduada pela Escola Superior de Magistratura do Estado de Santa Catarina. Pós-Graduanda em Processo Civil pela Universidade do Sul do Estado de Santa Catarina.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESPÍNDOLA, Ruy Samuel ; ESPÍNDOLA, Andréia Maria Bocchi Cezar. Ação direta de inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça de Santa Catarina.: Legislação processual constitucional vigente e sugestões para sua reforma. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3081, 8 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20597. Acesso em: 18 abr. 2024.

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