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A conciliação no PROCON/PA: um meio alternativo para a resolução do conflito nas relações de consumo

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4 A CONCILIAÇÃO NO PROCON-PA

No Brasil era premente a necessidade da criação de uma representação dos consumidores, tais como o Ombdsman do Consumidor (Conselho Público de Reclamações), da Suécia e das Comissões de Conciliação para Queixas dos Consumidores, da França, órgãos governamentais representativos dos interesses da coletividade dos consumidores.

Refletindo sobre as exigências sociais deste direito público de massa, abordam Capelletti & Garth [63]:

Os novos direitos substantivos das pessoas comuns têm sido particularmente difíceis de fazer valer ao nível individual. As barreiras enfrentadas pelos indivíduos relativamente fracos com suas causas relativamente pequenas, contra litigantes organizacionais – especialmente corporações ou governos – têm prejudicado o respeito a esses novos direitos. Tais indivíduos, com tais demandas, frequentemente não têm conhecimento de seus direitos, não procuram auxílio ou aconselhamento jurídico e não propõem ações.

Neste tópico refletir-se-á sobre a atuação do PROCON-PA como instância administrativa de composição e solução de conflitos de consumo entre consumidores e fornecedores de produtos e serviços, bem como seus limites e obstáculos que inviabilizam ou dificultam a missão constitucional de defesa dos interesses e direitos dos consumidores.

Constituindo uma das Diretorias da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH) [64] do Estado do Pará, o PROCON-PA é órgão interno da Administração Pública Direta, destituído de personalidade jurídica.

Discorrendo sobre a estrutura da Administração Pública, ensina o administrativista José dos Santos Carvalho Filho [65] que se pode conceituar o órgão público como o compartimento na estrutura estatal a que são cometidas funções determinadas, sendo integrado por agentes que, quando as executam, manifestam a própria vontade do Estado.

Nesse sentir, o PROCON-PA é órgão administrativo interno componente da estrutura do Poder Executivo do Estado do Pará, por meio da SEJUDH e, embora destituído de personalidade jurídica, não perde sua autonomia para promover a defesa do consumidor no âmbito de sua circunscrição.

O fato de o DPDC ser órgão interno do Ministério da Justiça não significa que consequentemente todos os órgãos oficiais estatais ou municipais de defesa do consumidor devam compor semelhante estrutura. Os órgãos de defesa do consumidor no Brasil ocupam posições diversas na estrutura de cada Federação. Assim, o PROCON do Estado do Espírito Santo [66], por exemplo, compõe o quadro da Administração Pública Indireta da Federação, na qualidade de autarquia.

Abrigada no corpo de qualquer instituição estatal não-juridicional, o PROCON é órgão estatal de iniciativa direta dos governos componentes das Federações, constituindo um dos princípios da Política Nacional das Relações de Consumo, conforme preconizado no Artigo 4º, inciso I, alínea "a", do CDC.

Ao acolher o PROCON-PA em sua estrutura interna, a SEJUDH assumiu entre suas finalidades institucionais a formulação, coordenação e execução da Política Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, e em consonância com as diretrizes nacionais, capitaneadas pelo DPDC-MJ [67].

Dentro desta configuração, é de se perguntar quem teria legitimidade para titularizar a ação coletiva de consumo, se o Governo do Estado do Pará ou o PROCON-PA. Ambos concorrentemente são capazes para ocupar o polo ativo da ação. Conforme autorizado pelo Art. 82, incisos II e III, do CDC, tanto o Estado do Pará, por meio da SEJUDH, quanto o PROCON-PA, órgão interno de sua estrutura, pode demandar em juízo na defesa dos consumidores.

De fato, a norma em tela espanca qualquer dúvida. O Prof.º Rizzatto Nunes [68], ao versar sobre a legitimidade concorrente explica:

A norma protecionista estabeleceu que o exercício do "direito de ação" devia ser conferido a certos entes de maneira concorrente, isto para conferir maior garantia possível de proteção aos direitos por ela definidos. A pretensão legal é a de não privilegiar nenhuma entidade em especial, seja ela pública ou privada, na permissão para o ingresso das ações, visando dar a maior eficácia possível à proteção criada. (grifo nosso)

Reforça este entendimento a norma do Artigo 105, do CDC, ao informar que os órgãos federativos e as entidades privadas de defesa do consumidor integrarão o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC).

Definido o escopo legal e estrutural do PROCON-PA, partir-se-á para discorrer sobre os mecanismos administrativos pelos quais o órgão concretiza a defesa do consumidor.

4.1 A Reclamação

Instituído pelo Decreto Federal nº2.181/97, que organiza o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) e estabelece as normas gerais de aplicação de sanções administrativas previstas no Capítulo VII do CDC, a reclamação constitui o instrumento de abertura do processo administrativo em desfavor do fornecedor, [69]e que poderá resultar em aplicação de sanção estatal, realizada a partir de um ato de vontade do consumidor.

Em matéria constitucional, a reclamação é o exercício do direito de petição, insculpida no Artigo 5º, inciso XXXIV, alínea "a", da Constituição Cidadã de 1988 para a defesa de direitos ou contra a ilegalidade ou abuso de poder. Em síntese, preleciona o constitucionalista Dirley da Cunha Jr. Que o direito de petição afigura-se mais propriamente como uma garantia constitucional de defesa de direitos, destinada a reivindicar dos poderes públicos a proteção de direitos. [70]

Também colaborando com esta definição, ensina Nelson Nery Costa [71]:

O direito de petição pode ser definido como aquele que tem por objetivo apresentar um pleito de interesse pessoal ou coletivo, visando com tal medida ao interesse público. Trata-se, então, do direito que pertence a uma pessoa de invocar a atenção dos Poderes Públicos sobre uma questão ou situação determinada, servindo tanto para denunciar uma lesão concreta, como para pedir que seja revisto certo ato. (grifo nosso)

Das lições apresentadas se depreende que a reclamação se ajusta com adequação como petição administrativa na defesa de direitos do consumidor.

A prática cotidiana dos atendimentos realizados pelo PROCON no Estado do Pará tem revelado que os consumidores, ao buscarem a tutela administrativa de suas pretensões consumeristas, não manifestam interesse de provocar a sanção estatal contra o fornecedor do produto ou serviço, traduzida na simples aplicação de multas e inscrição de seu nome no Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. O que se tem verificado é que a coletividade dos consumidores tem almejado do PROCON-PA atuação no sentido de intermediar a relação conflituosa de consumo com vistas a resgatar o bem violado ou sob ameaça de lesão.

Desta feita, o processo administrativo construído a partir do procedimento reclamatório, tem se prestado mais apto à resolução dos conflitos que propriamente à simples aplicação de medida sancionatória contra o fornecedor, que, raras vezes, tem de fato coibido condutas infrativas reiteradas dos fornecedores no mercado de consumo.

Atento a estes anseios dos consumidores, o legislador já previu a resolução administrativa de conflitos de consumo, ao dispor na definição da Política Nacional das Relações de Consumo o seguinte:

Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(...)

(...) III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, CF), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Dentro desta perspectiva, o processo administrativo reclamatório não terá caráter sancionatório se, antes, não se constituir em instrumento de pacificação social nas relações de consumo.

O nominado Decreto Federal nº2.181/97, no que pertine ao processo administrativo de consumo, também previu sua instrumentalidade pacificadora quando prescreve:

Art. 4º No âmbito de sua jurisdição e competência, caberá ao órgão estadual, do Distrito Federal e municipal de proteção e defesa do consumidor, criado, na forma da lei, especificamente para este fim, exercitar as atividades contidas nos incisos II a XII do art. 3º deste Decreto e, ainda:

II – dar atendimento aos consumidores, processando, regularmente, as reclamações fundamentais;

III – fiscalizar as relações de consumo;

IV – funcionar, no processo administrativo, como instância de instrução e julgamento, no âmbito de sua competência, dentro das regras fixadas pela Lei nº 8.078, de 1990, pela legislação complementar e por este Decreto;

Combinando-se as normas, denota-se que ao instituir o SNDC, o ato normativo pretende que o processo administrativo não criará óbices para que o consumidor dele se utilize para a reparação de seu direito. Ademais, é seu direito básico, prescrita no Artigo 6º, inciso VII, do CDC, o acesso aos órgãos administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos que venha a sofrer nas relações que travar com o fornecedor.

O fornecedor de produtos e serviços, ao ser demandado no PROCON-PA pelo consumidor, poderá promover a resolução imediata da reclamação ou por meio do Processo de Reclamação. Terá então duas oportunidades para atender ao conflito de consumo, se fundamentada a pretensão do consumidor.

Para uma ideia mais real do impacto social da importância da atuação do PROCON no Brasil, o Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), divulgou que foram realizadas e atendidas 812.471 queixas dos consumidores no período de 01.09.2009 a 31.08.2010, como observa no gráfico abaixo:

Gráfico 2. Volume de Atendimento às Petições Administrativas e de Reclamações:

Fonte: CADASTRO NACIONAL DE RECLAMAÇÕES FUNDAMENTADAS 2010-DPDC/MJ

Esses dados demonstram que a tutela dos direitos difusos, preconizada por Capelletti & Garth, realizada pelo PROCON, tem de alguma forma, contribuído para a realização da justiça, numa acepção mais ampla do termo e condizente com a terceira onda renovatória de acesso à justiça.

O volume de atendimentos registrados por estes dados exprimem as demandas no plano individual apenas, posto que o DPDC ainda não avaliou e compilou em suas pesquisas estatísticas o volume das intermediações no plano coletivo.

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A dificuldade de se chegar a estes dados, que expressem a defesa em âmbito coletivo, se justifica pelo baixo índice de atividades administrativas e judiciais dos PROCONS nesta seara. Este fato será apreciado mais adiante, mas antecipe-se desde já que constitui uma das fragilidades do sistema protetivo consumerista no Brasil.

Valorizando a atuação dos órgãos governamentais como de extrema relevância social e mencionando a notoriedade dos Conselhos Públicos de Reclamações da Suécia e das Comissões de Conciliação para Queixas dos Consumidores da França, equivalentes do PROCON no Brasil, comentaram os renomados processualistas [72]:

O Conselho Público de Reclamações resolve com muita presteza e praticamente sem custos as reclamações. Ele se notabiliza por sua habilidade em usar sua experiência tanto para auxiliar os consumidores informalmente quanto para examinar imparcialmente as disputas dos consumidores, as quais podem ser muito complexas e altamente técnicas. Mesmo que suas decisões não sejam obrigatórias, tem havido plena aceitação delas em pelo menos 80% dos casos. A aceitação é estimulada pela publicação de uma "lista negra" dos empresários que deixam de atender às decisões dentro do prazo de seis meses.

É inconteste que se o processo administrativo se prestasse tão somente para a aplicação de sanções aos reclamados, pouco ou nenhum benefício imediato alcançaria o consumidor ao fazer uso do direito de petição ao PROCON-PA.

Embora não disciplinado em lei ou ensinamentos doutrinários, constituem atributos do processo administrativo de consumo a simplicidade, a celeridade, a informalidade, a confiabilidade e o empoderamento das partes. Este último atributo significa que a solução do conflito depende da livre manifestação da vontade dos contendores.

4.2 A Conciliação

A adoção do método da conciliação como alternativa de harmonização do conflito nas relações de consumo no curso do processo reclamatório do PROCON-PA vai além da simples busca de um acordo, estabelecido formalmente entre consumidor e fornecedor, na presença do poder público.

Nas audiências conciliatórias, consumidor e fornecedor têm a oportunidade de receber orientação e educação quanto aos limites de seus direitos e obrigações, pois o órgão tem se especializado em dirimir os conflitos de consumo e neste mister acumulou relevante capital de conhecimentos.

Porém, é prudente salientar que, no Brasil, não se confunde a conciliação com a mediação, posto que constituem técnicas procedimentais distintas. Tratando desta matéria, elucida Carlos Eduardo de Vasconcelos [73] que a conciliação é um modelo de mediação focada no acordo, estando apropriada para lidar com relações de consumo, equacionando interesses materiais.

Contribui com esta distinção a especialista em Psicologia Jurídica, Eliana Riberti Nazareth [74], ensinando que a conciliação é a mediação dirigida para o acordo:

É baseada no modelo desenvolvido pelo Programa de Negociação (PON, em inglês) da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Tende a focalizar as questões mais aparentes dos conflitos e buscar soluções práticas. Portanto, costuma privilegiar o que denominamos "posições" das partes. As questões de ordem subjetivas e emocionais não costumam ser abordadas. É o modelo que mais se assemelha ao nosso modelo de conciliação.

O processualista Walsir Edson Rodrigues Jr. [75] Ensina que a conciliação distingue-se da mediação por conferir ao seu intermediador determinado poder decisório, ausente na composição pela mediação.

Em distinção às técnicas, leciona Cândido Rangel Dinamarco [76] que a mediação trabalha o conflito, constituindo o acordo mera decorrência, objetivo fundamental da conciliação.

Das lições prestadas pelos estudiosos conclui-se que suas percepções não são dissonantes, pois distinguem a mediação da conciliação, conferindo a esta última uma atuação mais pragmática e que mais se aproxima da atuação jurisdicional.

O PROCON-PA se utiliza da técnica da conciliação como meio autocompositivo de pacificação dos conflitos de consumo, cujas razões serão expostas em tópico oportuno.

Nos seus movimentos internos de conciliação, o PROCON-PA busca evidenciar as qualidades da resolução imediata do conflito para os contendores e de que a solução por eles construída é mais salutar que aquela decidida por um terceiro, com poder para dizer o direito.

Abordando este tema da conciliação, afirmaram Capelletti & Garth [77]:

Existem vantagens óbivas (sic) tanto para as partes quanto para o sistema jurídico, se o litígio é resolvido sem a necessidade de julgamento. A sobrecarga dos tribunais e as despesas excessivamente altas com os litígios podem tornar particularmente benéficas para as partes as soluções rápidas e mediadas, tais como o juízo arbitral. Ademais, parece que tais decisões são mais facilmente aceitas do que decretos judiciais unilaterais, uma vez que eles se fundam em acordo já estabelecido entre as partes. É significativo que um processo dirigido para a conciliação – ao contrário do processo judicial, que geralmente declarar uma parte "vencedora" e a outra "vencida" – ofereça a possibilidade de que as causas mais profundas de um litígio sejam examinadas e restaurado um relacionamento complexo e prolongado. (grifo nosso)

Na prática processual administrativo-consumerista, uma vez não obtida a resolução imediata pelo fornecedor, o consumidor pode peticionar ao PROCON que se utilize da técnica da conciliação para que torne a se manifestar quanto à sua pretensão e com a intermediação do conciliador.

Ao buscar a composição administrativa do conflito de consumo, o consumidor não deseja litigar em juízo, porque não pretende ver o conflito se arrastar por mais tempo e obter da melhor forma possível a satisfação de seu interesse violado.

Para o fornecedor reclamado, a conciliação consistirá numa porta de acesso, uma oportunidade para atender à demanda do consumidor evitando-se sua rediscussão em âmbito judicial, podendo obter ao fim do processo custos menores de resolutividade e ao mesmo tempo evitar a aplicação de multa administrativa.

Tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, a adoção do método alternativo de resolução de conflito, pela conciliação no PROCON-PA, previne a perpetuação da disputa e os desgastes que ela acarreta.

O conciliador deverá ser o instigador da extinção do conflito, podendo fazer proposições quanto às pretensões resistidas, orientando o consumidor sobre seus direitos e ponderando junto ao fornecedor as melhores formas de atendimento à demanda do consumidor e das desvantagens de um futuro lítigio judicial, além de se mostrar passível à imposição de sanções pelo órgão.

Sua postura jamais poderá resvalar para a intimidação do fornecedor, sob o argumento de que o PROCON é órgão de defesa do consumidor. Portando-se desta forma, a conciliação perde sua razão de ser e frustra a possibilidade da solução pela via administrativa, empurrando-se o consumidor para litigar em juízo.

Em Instrução Normativa nº01/1999, o renomado civilista paraense Zeno Veloso, então Secretário de Justiça, reforçava o escopo resolutório de conflitos de consumo do processo de reclamação, antecedente à sua função sancionatória. Esta sua percepção do alcance social do processo administrativo foi acompanhada pelo Decreto Estadual n°1.602/09, que preconiza em seu Artigo 30, inciso I, que caberá à Divisão de Conciliação do PROCON-PA receber e analisar processo buscando solução para os casos e realizar audiências de conciliação entre consumidores e fornecedores.

4.3 A Defesa Individual e Coletiva

A sociedade de consumo engrendra litígios de massa e a atual estrutura da administração judiciária brasileira, como demonstrado ao longo deste breve estudo, não tem condições suficientes para promovê-los com qualidade e celeridade esperadas.

Maiores dispêndios orçamentários para robustecer sua burocracia e a contratação de maior número de julgadores e serventuários em muito colaboram para contornar este estado de coisas. Também, o emprego de modernas tecnologias no tratamento e tráfego da informação judicial, pode contribuir para promover maior celeridade à prestação jurisdicional. Até que se atinja este patamar ideal, alternativas devem ser experimentadas.

Conforme abordado no transcorrer deste estudo, a Administração Pública, no exercício de sua função executiva, abre suas portas para prevenir conflitos e solucioná-los por meio da utilização das técnicas procedimentais alternativas no bojo de seu processo.

Os PROCONS do Brasil têm feito uso de seus processos administrativos para orientar consumidores e fornecedores quanto aos seus direitos e deveres nas relações que firmam no mercado de consumo.

Ainda que o Decreto nº2.181/97 estabeleça que o processo administrativo do PROCON consista em veículo para apurar práticas infrativas [78] dos fornecedores, não há impedimento legal para que possa também oportunizar ao fornecedor abertura para a apresentação de resposta satisfativa de interesse do consumidor.

Da mesma forma que o processo judicial deve cumprir a função social de tutelar o direito aos que dele se socorrem, assim o processo administrativo consumerista não tem o condão de se transformar num labirinto kafkaniano, demonizando o fornecedor e frustrando o consumidor, conduzindo-o às portas do judiciário, reduzindo o processo administrativo a um mero instrumento para aplicação de multas.

Em outras palavras, o processo administrativo consumerista deve ter como premissa básica intermediar os conflitos de consumo com vistas à pacificação social. Portanto, o procedimento sancionatório em seu curso será decorrência da resistência injustificada do fornecedor de reparar o defeito ou o vício do produto ou do serviço posto à disposição do consumidor.

Delimitando o conceito do processo para a Administração Pública, leciona o Prof.º José dos Santos Carvalho Filho que o processo é indicativo das relações jurídicas entre seus participantes, assumindo natureza teleológica e valendo como instrumento para alcançar os fins visados pela Administração. [79]

Em sintonia com este entendimento, o processo administrativo de consumo sob os cuidados do PROCON-PA deve cumprir seu objetivo de conferir proteção e defesa dos consumidores que dele buscam resposta para a satisfação de seus interesses. Em petição, o consumidor requer do PROCON-PA a representação coletiva na defesa de seu direito no plano individual.

Em toda a sucessão dos procedimentos administrativos que lhe dão feição, o consumidor descreve o prejuízo a que fora lançado pela conduta do fornecedor, que entende indevida, e, por sua vez, o fornecedor apresenta defesa pela qual informa os elementos fáticos e jurídicos que o levaram a conduzir-se de tal ou qual modo.

Da apreciação dos fatos narrados e das provas demonstradas pelos contendentes, o PROCON-PA classificará a reclamação como fundamentada ou não-fundamentada, equivalente ao juízo de admissibilidade realizado no âmbito judicial.

Ao receber do consumidor a informação de que sua reclamação é pertinente, orientado quanto aos seus direitos e o modo como deve proceder diante do fornecedor, o PROCON-PA poderá instaurar procedimento sancionatório, após apreciação da resposta do fornecedor, conferido seu direito à ampla defesa e contraditório, ou perquirir do consumidor se este tem interesse na tentativa de resolução do conflito, através do procedimento da conciliação, com a intermediação do PROCON-PA junto ao fornecedor em audiência ou sessão oportunamente agendada.

Se o consumidor decidir pôr fim ao conflito em juízo, o processo inaugurará fase punitiva em desfavor do fornecedor. Caso tenha interesse em compor o conflito pela conciliação administrativa, o processo seguirá seus atos com vistas à obtenção de acordo que encerre e restaure a harmonia na relação jurídica de consumo.

É senso comum entre os consumidores que um conflito de consumo que se instala com o fornecedor em razão de certo vício de um produto, como seu inadequado funcionamento, e não reconhecida sua responsabilidade, não deve ser apresentado ao judiciário, porque entende que este deve se ocupar de litígios caros e de maior valor jurídico, a exemplo de um defeito do mesmo produto que venha a causar prejuízos mais relevantes. Esta equivocada percepção até soaria verídica sob a batuta do Estado Liberal, mas o fato é que no curso das audiências de conciliação conduzidas por este acadêmico, os relatos dos consumidores reforçam resquícios de sua permanência no inconsciente coletivo dos consumidores, notadamente, aqueles maiores de 30 anos.

Neste respeito, observe-se o gráfico que segue, elaborado pelo SINDEC-MJ, traçando o perfil dos consumidores que reclamam e peticionam ao PROCON sua representação coletiva em defesa de direitos.

Gráfico 2. Perfil do Consumidor Individual sob a relação Área x Faixa Etária entre 2005 e 2010:

Fonte:

www.mj.dpdc/sindec.2010.

O gráfico também revela que os consumidores maiores de 50 anos de idade são os que mais reclamam contra os fornecedores prestadores de serviços de saúde e de assuntos financeiros no País. São consumidores que almejam do PROCON orientação, defesa e resolução de seus conflitos de consumo.

Traduzem os dados ainda que os consumidores com faixa etária entre 30 e 50 anos são os que mais buscam a tutela do PROCON no Brasil. São indivíduos que vivenciaram as mínimas políticas públicas adotadas pelo Estado fundado nas ideias de não-intervencionismo.

Muito embora o PROCON-PA tenha por missão institucional promover a representação coletiva dos consumidores no mercado de consumo, sua atuação tem sido restrita à proteção ao nível individual.

Todos os dias centenas de consumidores batem à porta do órgão estadual para reclamar da conduta de fornecedores que lhe tenham causado alguma espécie de dano ou então para realizar simples consulta quanto aos seus direitos.

É óbvio que esta demanda individual será processada e atendida, porém urge a necessidade da adoção de ferramentas de maior amplitude para abarcar o maior número de situações e evitar o aparecimento de conflitos ou a repetição dos já existentes.

Os dados abaixo expressam o volume de ações de defesa dos consumidores no âmbito do DPDC nos anos de 2009 e 2010:

Gráfico 3. Volume de Demandas Individuais:

Fonte: Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. 2009.DPDC/MJ.

Chama a atenção que, se no plano individual o índice de sucesso na pacificação de conflitos realizados pelos PROCONS do Brasil tem evitado a formação de litígios judiciais, constituindo uma porta de acesso à Justiça, no sentido aqui adotado, é certo que a atuação coletiva trará resultados mais satisfatórios.

Os dados são reveladores quando se observa que mais de 85% das reclamações apresentadas pelos consumidores no PROCONS são prontamente respondidas de forma satisfatória pelos fornecedores reclamados, através do instrumento da Carta de Investigação Preliminar (CIP).

A inexistência deste procedimento prévio poderia impulsionar a deflagração de um grande volume de ações judiciais nos Juizados Especiais contribuindo para amontoar e retardar ainda mais a prestação de serviços da Administração Judiciária no Brasil.

Indo mais a fundo quanto à importância social dos atos administrativos que consubstanciam a defesa do consumidor pelos PROCONS, observe-se a Tabela abaixo, que exprime o elevado grau de resolutividade de conflitos de consumo.

Tabela 4. Demandas Individuais por procedimento:

Fonte: Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. 2010.DPDC/MJ.

Dos dados acima, colhidos no ano de 2010, denota-se que mais de meio milhão de ações deixaram se ingressar no sistema judiciário na matéria de consumo.

No âmbito estadual, o cenário nacional se repete e até com maior efetividade. De acordo com os dados do exercício administrativo de 2010, o sistema de proteção do consumidor no Pará, registrou mais de 11.000 demandas de consumidores. O gráfico abaixo revela o reduzido número de conflitos não solucionados:

Gráfico 4. Volume de Atendimentos por Solução Imediata e Reclamação em 2010:

Fonte:Fonte:PROCON-PA/Coordenação de Atendimento e Orientação ao Consumidor.2010

A solução imediata constituiu o maior número de satisfações alcançadas pelos consumidores que buscaram a intermediação do PROCON-PA para a resolução de suas queixas dos fornecedores.

Do volume de Reclamações formuladas, no importe inferior a 30% das queixas dos consumidores, apenas 76 dos mais de 3.000 Acordos foram descumpridos pelos fornecedores, um índice de eficácia superior a 95%.

No entanto, apesar do sucesso alcançado até aqui, os acordos firmados e as otificas multas aplicadas sob a atuação processual em âmbito individual pelo PROCON-PA não têm sido capazes de causar uma mudança comportamental dos fornecedores de produtos e serviços no mercado com o escopo de diminuir as reiteradas práticas infrativas e lesivas aos interesses dos consumidores.

A realidade tem demonstrado que decisões judiciais e administrativas sancionatórias atualmente compõem o custo da política de riscos da atividade econômica dos fornecedores, de modo que o sentido pedagógico da sanção fora esvaziado em sua eficácia.

Outra questão que tem exigido do PROCON-PA maior efetividade no cumprimento da prestação constitucional de promover a defesa do consumidor é a limitação à defesa individual sem adoção da defesa coletiva em suas rotinas administrativas.

Embora reconhecida eficácia constitua um ganho social relevante para o sistema protetivo nacional, a adoção de procedimentos de defesa coletiva, tais como a Reclamação por Ato de Ofício e o Termo de Ajustamento de Conduta de Consumo, visa prevenir conflitos, na medida em que coíbem as práticas reiteradas dos fornecedores nas relações de consumo. Sua prática cotidiana traria como resultado a diminuição do número de demandas da sociedade.

A Reclamação por Ato de Ofício está prevista no Decreto nº2.181/97, que assim diz:

Art. 33. As práticas infrativas às normas de proteção e defesa do consumidor serão apuradas em processo administrativo, que terá início mediante:

I – ato, por escrito, da autoridade competente;

Ao constatar que certo fornecedor ou conjunto de fornecedores vem adotando certa prática comercial abusiva prejudicando os consumidores, a autoridade competente baixará ato de ofício notificando o fornecedor para prestar esclarecimentos sobre determinada prática.

Se os esclarecimentos prestados reforçarem a convicção de que o fornecedor não reconhece a abusividade de sua conduta no mercado de consumo, a autoridade poderá cientificá-lo de que o PROCON entende pela ilicitude de sua prática, apresentando-lhe o volume de queixas individuais dos consumidores lesados e cientificá-lo de que a continuidade de sua conduta estará passível de sanções administrativas.

Este procedimento administrativo constitui um ato de defesa coletiva, posto que o PROCON não se reporta ao consumidor individual, mas a todos os consumidores homogeneamente considerados que foram lesados quanto àquela situação fática, de origem comum. Eventual multa a ser aplicada, terá outros parâmetros de aferição em relação àquela relacionada à reclamação individual.

Por outro lado, se o fornecedor revê sua conduta e muda sua prática, a resolutividade alcançada terá atingido seu fim de prevenir os conflitos de consumo, resultando na diminuição de demandas no órgão.

Previsto no Decreto Federal nº2.181/97, o Termo de Ajustamento de Conduta de Consumo, permite também ao PROCON-PA promover a prevenção dos conflitos de consumo, ao firmar com o fornecedor compromisso para modificação de sua conduta infrativa reiterada.

Políticas dessa natureza, voltadas para o desenvolvimento de políticas ampliativas, com foco mais abrangente e com caráter preventivo, em detrimento do simples registro e encaminhamento de reclamações no plano individual, fará com que o PROCON-PA e os demais órgãos de defesa na circunscrição do Estado, bem como aos demais órgãos do sistema ofereçam ao consumidor uma resposta mais rápida e eficiente às suas demandas, evitando ainda que outros conflitos de igual natureza venham a replicar nas relações de consumo.

Este cenário permitirá ao órgão estadual otimizar e direcionar suas políticas de defesa em campanhas preventivas e orientativas para consumidores e fornecedores do Estado do Pará, o que reforçará a queda nas demandas individuais.

Esta perspectiva de atuação poderá refletir também na redução da pressão social de conflitos de consumo junto aos órgãos jurisdicionais do Estado, contribuindo para a pacificação social, que é o fim último dos poderes públicos e da sociedade.

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Sobre o autor
Celso de Jesus Pereira Saldanha

Bacharelando em Direito pela Faculdade Ideal (FACI), em Belém (PA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SALDANHA, Celso Jesus Pereira. A conciliação no PROCON/PA: um meio alternativo para a resolução do conflito nas relações de consumo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3118, 14 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20863. Acesso em: 25 nov. 2024.

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