2.Cessação do vínculo laboral.
Conforme a nova regra hispânica (artigo 49.1 do Estatuto dos Trabalhadores), a cessação do contrato seguirá as hipóteses de extinção do contrato prevista no Estatuto do Trabalhador, quais sejam: a) Por mútuo acordo das partes; b) Pelas causas consignadas validamente no contrato; c) Por expiração do tempo contrato; d) Por demissão do trabalhador; e) Por morte, invalidez permanente total ou absoluta do trabalhador; f) Por jubilação do trabalhador. g) Por morte, aposentadoria ou incapacidade do empregador-empresário; h) Por vontade do trabalhador, fundamentada na falta contratual do empregador-empresário; i) Por demissão do trabalhador; j) Por decisão da trabalhadora que se veja obrigada a abandonar definitivamente seu trabalho, por ser vítima de violência de gênero.
As motivações de rescisão contratual estabelecidas pelo Real Decreto (Artigo 11.2) ressaltam algumas modalidades previstas no Estatuto dos Trabalhadores, a saber:
a- Demissão disciplinar do doméstico[3]: Neste caso o trabalhador se deverá ser notificado por escrito, manifestando as razões previstas no Estatuto dos Trabalhadores. Não obstante esta notificação, se a justiça declara improcedente a demissão, o doméstico fará jus às indenizações que devem ser pagas integralmente em espécie. O valor da indenização calcula-se dividindo o salário mensal por vinte dias. Deste resultado, multiplica-se pelo número de anos de trabalho, limitado ao máximo de 12 anos.
b- Demissão por falta do empregador: Neste caso, aplica-se a indenização descrita no tópico anterior (a);
c- Demissão por abandono do empregador: Neste caso, o empregador deve notificar por escrito ao empregado de forma clara e inequívoca a sua vontade de rescindir o contrato emprego por justa causa.
d- Rescisão por desistimiento (equivalente à rescisão sem justa causa no Brasil). Por desistimiento entende-se a simples vontade do empregador em rescindir o contrato. Neste caso, o empregador deverá comunicar por escrito a rescisão do contrato. O empregador deverá em um ato notificar (aviso prévio) e indenizar o doméstico. A indenização “é equivalente à sete dias naturais de salário em espécie multiplicado pelo numero de anos ano naturais de duração do contrato, incluído o período de pré-aviso, com o limite de seis mensalidades”. GIRÓN, 2006, p. 83) Se o empregador preterir alguma formalidade desta modalidade, a indenização passa de sete para vinte dias de salários que será multiplicado pelo número de anos naturais do contrato, cujo limite passa de seis para doze mensalidades.
Na legislação brasileira, o doméstico poderá ter rescindido o contrato em três principais hipóteses:
a) A pedido do doméstico. Neste caso de rescisão, o empregado doméstico deverá notificar o empregador mediante o aviso prévio. Nesta hipótese, deverá trabalhar o mês após notificação ou acordar com o empregador o desconto de um salário de sua remuneração. Terá direito: ao saldo de salários dos dias que trabalhou e não recebeu; ao 13º proporcional dos meses que trabalhou; e às férias proporcionais relativa aos meses que efetivamente trabalhou.
b) Demissão arbitrária ou sem justa causa. Nesta hipótese, o empregado doméstico terá rescindido o contrato por simples decisão ou iniciativa do empregador. Decorrem os seguintes direitos: aviso prévio; saldo de salários dos dias trabalhados e não recebidos; 13º proporcional aos meses trabalhados; férias proporcionais aos meses trabalhados, acrescida do terço constitucional e saque do Fundo de Garantia, isto se o empregador tiver optado na relação laboral pelo depósito.
c) Demissão por justa causa. Neste tipo de demissão, as causas são as previstas na CLT que sintetizamos topicamente: a) ato de improbidade; incontinência de conduta ou mau procedimento; condenação criminal do empregado, transitada em julgado; desídia no desempenho das respectivas funções; embriaguez habitual ou em serviço; ato de indisciplina ou de insubordinação; abandono de emprego; ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; prática constante de jogos de azar. O doméstico, assim, terá o seguinte direito: saldo de salário dos dias que tiver trabalhado e não recebido. (MARTINS, 2002, p. 313 e 314)
Cabe ressaltar que a empregada doméstica gestante está protegida de despedida arbitrária ou sem justa causa[4], mas não da demissão por justa causa ou a pedido da própria empregada[5].
3. Aviso prévio
No direito espanhol, o empregado doméstico tem direito ao aviso prévio de vinte dias se somar mais de um ano de trabalho e de sete dias se for inferior a um ano, regulado no Artigo 11.3. Durante o período de aviso prévio, o empregado de jornada completa terá direito, sem prejuízo de sua remuneração, a uma licença de seis horas semanais para buscar novo emprego ou o empregador poderá substituir o tempo do aviso por uma indenização equivalente a essas horas, estando pois dispensado o empregado de cumprir o prazo.
O Aviso prévio proveniente de demissão ou rescisão do doméstico que pernoita na residência do empregador, não deve ser feito entre as dezessete e oito horas, a não ser que a rescisão do contrato seja motivada por uma violação muito grave dos deveres de lealdade e confiança.
Em qualquer caso, cabe destacar que simultaneamente à comunicação da rescisão, o empregador deverá por a disposição do trabalhador uma indenização, que se pagará integralmente em espécie, na quantia equivalente ao salário correspondente a doze dias naturais por ano de trabalho, não excedendo de seis mensalidades, conforme Artigo 11,3, §2º, do Real Decreto nº 1.620/2011.
O empregado doméstico brasileiro também tem o direito de receber e dar o aviso prévio, lembrando-se que o aviso prévio é uma obrigação da parte que pretende rescindir o contrato, de informar a outra, com no mínimo trinta dias de antecedência, quando do seu exercício, e a sua inobservância geram direitos e obrigações à parte que descumprir esta regra. O tempo relativo ao aviso prévio refletirá sobre as verbas das férias e 13º salário.
O empregador que não der o aviso prévio deverá indenizar o doméstico com o valor equivalente a um salário mensal e, por outro lado, quando o exercício deste direito couber ao doméstico, ele deverá comunicar ou deduzir de suas verbas rescisórias o valor reativo a um salário mensal.
4. Quadro comparativo sintético dos direitos dos empregados domésticos espanhóis e brasileiros:
DIREITOS |
Doméstico Espanhol |
Doméstico Brasileiro: |
Vinculo jurídico |
Contrato |
Carteira de Trabalho assinada (inclusive no contrato de experiência). |
Jornada trabalho |
Máximo: 40 horas |
Não há controle |
Contrato de experiência |
Sim, até quatro semanas |
Sim, até 90 dias |
Informação detalhada da prestação de serviço |
Obrigatória |
Não obrigatória |
Menor de idade |
Permitido (16 e 17 anos) |
Proibido |
Remuneração mínima |
Salário mínimo: R$ 1.460,04 Valor diário: R$ 48,67 Valor por hora: R$ 11,42 |
Salário mínimo: R$ 622,00 Valor diário: R$ 20,73 Valor por hora: R$ 2,83 |
Gratificações extraordinárias |
13º e 14º salário (pago a cada 6 meses) |
13º salário |
Horas extras |
Sim |
Não tem direito |
Limite de jornada de trabalho |
Sim |
Não tem direito |
Repouso semanal remunerado |
Sim |
Sim |
Feriados civis e religiosos |
Sim (máximo: 14 feriados) |
Sim |
Férias |
Sim, 30 dias |
Sim, 30 dias |
Licença-maternidade |
Sim |
Sim |
Vale-transporte. |
Sim |
Sim |
Verbas rescisórias |
Sim |
Sim |
Aviso Prévio |
Sim: 20 dias (mais de ano trabalho) 7 dias (menos de ano trabalho) |
Sim, 30 dias (não pacífica). |
FGTS |
Inexiste congênere |
Sim, se o empregador optar. |
Seguro-desemprego. |
Não |
Sim (se tiver mínimo de 15 depósitos de FGTS) |
Saúde pública |
Sim |
Sim |
Maternidade |
16 semanas +2 semanas por filho, se gêmeos. |
120 dias |
Salário-maternidade |
Não |
Sim |
Auxílio doença |
Sim |
Sim |
Aposentadoria |
Sim |
Sim |
Falecimento |
Sim |
Sim |
Auxílio-Acidente. |
Sim |
Sim |
Dignidade humana |
Protegida: Principio da não discriminação |
Protegida: Principio da não discriminação |
Conclusão:
A guisa de conclusão, se pode dizer que internamente a nova regra espanhola avançou positivamente nos direitos e garantias dos seus trabalhadores domésticos quando, pela atual regra, o trabalhador passou a ter o direito de exigir do empregador o contrato de trabalho, e ainda assim, que especifique as condições de trabalho, com possibilidade de controle do horário de trabalho para efeito de cômputo das horas extraordinárias.
Em junho do ano passado, os delegados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aprovaram normas internacionais para melhorar as condições de trabalho dos empregados domésticos de todas as nações. Assim, o Projeto de Lei 262/2011, de autoria do Dep. Marçal Filho - PMDB/MS busca regular a duração do trabalho do empregado doméstico em oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, bem como o estabelecimento da remuneração pelos serviços extraordinários e trabalho noturno.
Com a nova regulação espanhola, os momentos de descansos relativos à intrajornada, entre jornadas e descanso semanal remunerado ficaram devidamente estabelecidos. E, com a precisão da regra, foi assinalada a certeza das formas de compensação do trabalhador doméstico e dos instrumentos para reivindicar seus direitos para receber a justa retribuição pelas horas laboradas.
Salta aos olhos a brutal diferença entre o valor do salário mínimo que é pago a um trabalhador doméstico espanhol e o que é pago ao brasileiro. É certo que existem diferenças estruturais entre as duas realidades, porém o Brasil figura como a sexta economia mundial e como tal tem que reestruturar o tecido, os princípios e prioridades que organizam a sociedade econômica. As cidades brasileiras como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre, figuram nas pesquisas com custo de vida maiores que Madri, Nova York e Londres, porém não com a mesma qualidade de vida ao cidadão-trabalhador.
Cabe destacar que o Projeto de Lei 5140/09, aprovado da Câmara e que certamente será aprovado pelo Senado, permitirá o contrato de experiência de até 90 dias na relação laboral do empregado doméstico, sanando, assim, as controvérsias relativas a este direito.
Há muito a percorrer no reconhecimento dos direitos e nos ajustes das variantes econômicas e políticas que conjugarão forças e esforços com todos os atores sociais para o estabelecimento de melhores condições de trabalho aos empregados domésticos, instrumentalizando, assim, o principio da dignidade humana.