O benefício concedido pelo Estado Brasileiro ao militar qualificado como ex-combatente é regulado por diversas normas jurídicas que se sobrepõem no tempo. A análise da matéria se torna dificultosa por ter o legislador optado, no mais das vezes, pela revogação tácita, que exige a identificação precisa do que constitui instituto novo, criado a par das disposições anteriores, e do que representa norma revogadora, em cada uma das sucessivas edições. A presente explanação pretende fornecer um ponto de partida para exames em torno da matéria, apontando o fundamento legal do instituto e descrevendo o objeto dos principais diplomas legais atinentes à espécie.
Inicialmente, cumpre distinguir o benefício em questão, denominado de “pensão de ex-combatente”, da pensão do militar comum, que não tenha atuado em efetiva operação de guerra. A última tem natureza previdenciária, sendo semelhante à pensão por morte devida aos dependentes do trabalhador ou servidor civil, vinculado ao regime geral ou a regime próprio de previdência; a primeira, objeto desta consideração, é um benefício especial assegurado ao militar que, independentemente do tempo de serviço, tenha participado de efetiva operação de guerra externa promovida pelo Estado Brasileiro. É uma gratificação concedida pelo Estado em reconhecimento dos serviços prestados à Nação na crítica circunstância de uma tensão bélica com Estado estrangeiro. Tem natureza sui generis, aproximando-se de um favor político, de ordem especial, bastante frequente no direito comparado. Não obstante a maioria dos últimos ex-combatentes brasileiros (militantes da Segunda Guerra Mundial) não mais estejam entre nós, a discussão ainda encontra relevância prática por força da transmissibilidade do direito aos dependentes do militar, o que torna o tema, ainda hoje, objeto de controvérsias em sede judicial.
A origem do benefício remonta às guerras do Uruguai e do Paraguai. A Lei n.º 3.765/60, que dispõe sobre as pensões militares, estabeleceu, em seu art. 26, que os ex-combatentes da campanha do Uruguai e Paraguai, que percebessem pensão especial criada por decreto anterior, bem como suas viúvas e filhas, e os ex-combatentes da revolução acreana, também beneficiados com uma pensão vitalícia e intransferível definida por lei anterior, passariam a perceber a pensão correspondente à deixada por um 2º sargento.
Posteriormente, a Lei n.º 4.242/63, em seu art. 30, dispõe que seria concedida aos ex-combatentes da Segunda Guerra Mundial, da FEB, da FAB e da Marinha, que participaram ativamente das operações de guerra e se encontrassem incapacitados, sem poder prover os próprios meios de subsistência, e não percebessem qualquer importância dos cofres públicos, bem como a seus herdeiros, pensão igual à estipulada no art. 26 da Lei n.º 3.765, de 4 de maio de 1960, ou seja, a pensão em valor correspondente à deixada por um 2º sargento. Note-se, pois, que no caso específico dos combatentes da Segunda Grande Guerra, para fazer jus ao benefício especial de ex-combatente, ante o disposto na Lei n.º 4.242/63, era necessário que, além da participação efetiva na operação bélica, o militar se encontrasse inválido, e, ainda, não percebesse qualquer remuneração proveniente dos cofres públicos.
Quatro anos depois, valendo-se das disposições constantes do art. 178, da Constituição Federal de 1967, a Lei n.º 5.315/67 regulamentou o conceito de ex-combatente e estabeleceu direitos adicionais aos veteranos de guerra que pretendessem permanecer em atividade no serviço público civil ou militar.
Em 1978, a Lei n.º 6.592 criou uma nova pensão especial aos ex-combatentes da Segunda Guerra Mundial, inacumulável e intransferível, no valor de duas vezes e meia o salário-mínimo, devida àqueles incapacitados definitivamente para o trabalho.
Somente com a Lei n.º 7.424/85, regulamentou-se a transferência da pensão a que se refere a Lei n.º 6.592/78 para os dependentes do militar.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, o art. 53, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, assegurou que o ex-combatente, conforme definido na Lei n.º 5.315/67, teria direito a uma pensão correspondente à deixada por um 2º tenente. Ou seja, a norma constitucional, expressamente, assegurou o reconhecimento do direito previsto no art. 30, da Lei n.º 4.242/63, na nova ordem jurídica, efetuando, contudo, as seguintes alterações: a) generalizou-se a prerrogativa para todo ex-combatente, independentemente de ter-se tornado incapaz ou sem condições de custear a si próprio; b) o benefício seria devido no valor correspondente à pensão deixada por um 2º tenente, e não por um 2º sargento. Eis o teor integral do dispositivo:
“Art. 53. Ao ex-combatente que tenha efetivamente participado de operações bélicas durante a Segunda Guerra Mundial, nos termos da Lei nº 5.315, de 12 de setembro de 1967, serão assegurados os seguintes direitos:
I - aproveitamento no serviço público, sem a exigência de concurso, com estabilidade;
II - pensão especial correspondente à deixada por segundo-tenente das Forças Armadas, que poderá ser requerida a qualquer tempo, sendo inacumulável com quaisquer rendimentos recebidos dos cofres públicos, exceto os benefícios previdenciários, ressalvado o direito de opção;
III - em caso de morte, pensão à viúva ou companheira ou dependente, de forma proporcional, de valor igual à do inciso anterior;
IV - assistência médica, hospitalar e educacional gratuita, extensiva aos dependentes;
V - aposentadoria com proventos integrais aos vinte e cinco anos de serviço efetivo, em qualquer regime jurídico;
VI - prioridade na aquisição da casa própria, para os que não a possuam ou para suas viúvas ou companheiras.
Parágrafo único. A concessão da pensão especial do inciso II substitui, para todos os efeitos legais, qualquer outra pensão já concedida ao ex-combatente."
Dois anos depois, a Lei n.º 8.059/90 regulamentou o art. 53, do ADCT, estabelecendo novo regramento sobre a pensão devida ao ex-combatente e aos seus dependentes. Tal norma, por exemplo, exclui as filhas maiores de 21 anos de idade do direito de receber a pensão, sendo aplicável às dependentes que tenham feito jus ao benefício no curso de sua vigência.
Verifica-se, pois, que são diversos os benefícios qualificados como “pensão de ex-combatente”. As normas instituidoras variam tanto nos requisitos para a percepção quanto no valor do benefício, sendo necessário fixar um critério para a aplicabilidade das diferentes disposições.
Apreciando a questão, o Supremo Tribunal Federal fixou o entendimento de que o direito dos dependentes à pensão do ex-combatente é regido pelas normas legais em vigor na data do óbito do militar. Ou seja, aos ex-combatentes em vida por ocasião da promulgação da CF/88, é devido o benefício previsto no art. 53, do ADCT, na forma da Lei n.º 8.059/90. Entretanto, caso o militar tenha falecido sem requerer o benefício, os dependentes do ex-combatente farão jus à pensão prevista na lei vigente à época do evento morte. Tendo o óbito ocorrido na vigência da CF/88, a pensão será devida, incondicionalmente, no valor dos proventos percebidos por um 2º tenente; caso o falecimento se tenha dado na vigência da Lei n.º 4.242/63, contudo, a pensão terá apenas o valor dos proventos de um 2º sargento, e isso desde que seja comprovado que o militar, à época do óbito, satisfazia o requisito de incapacidade para o trabalho. Tal é o consignado no seguinte Aresto:
"STF. PRIMEIRA TURMA.Publicação DJe-034 DIVULG 18-02-2011 PUBLIC 21-02-2011 EMENT VOL-02467-02 PP-00413Parte(s) RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. EX-COMBATENTE. PENSÃO ESPECIAL. REGÊNCIA PELA LEGISLAÇÃO VIGENTE NA ÉPOCA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO."
Assim, uma vez que diversas são as espécies de benefícios de ex-combatente e distintos são os valores das pensões respectivas, a concessão da pensão aos dependentes do militar deve obedecer aos requisitos estabelecidos na legislação vigente na época do óbito do instituidor, sendo o valor devido para o benefício, igualmente, o disposto na Lei vigente no momento do evento morte. Sendo o caso de requerimento de ex-combatente atualmente em vida, o benefício é devido na forma do art. 53, do ADCT/88, obedecidas as disposições da Lei n.º 8.059/90.