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Pagamento direto ao litigante: um caso para os advogados

26/04/2012 às 16:41
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Os alvarás judiciais não devem ser expedidos diretamente em nome da parte, mas em nome de seus procuradores, único modo de se garantir o recebimento, oportuno e seguro, da merecida remuneração advocatícia.

Passada a procuração, firmado o contrato de honorários, recolhidos os dados, a ação foi proposta e, depois de idas e vindas judiciais, por quase uma década, o processo alcançou a liquidação, cujo valor foi liberado, diretamente à constituinte que, recebendo-o, até hoje, passados alguns anos, não cumpriu a obrigação assumida com os advogados - seus procuradores nos autos - ou seja, não lhes pagou um centavo, sequer...

Debalde reclamaram junto ao douto juízo, afirmando que a liberação do alvará para a autora importava em quebra do estabelecido pelo art. 36, do Código de Processo Civil, que assegura a representação judicial, do litigante, pelo advogado, de tal maneira que, como não lhe era lícito praticar atos conducentes da ação, muito menos lhe seria dado receber, em pessoa, o produto do trabalho desenvolvido pelos advogados, no correr de tantos anos, no processo judicial.

Diante destas circunstâncias, providenciaram eles uma representação, junto à ilustrada Corregedoria da Justiça Estadual, obtendo, como resposta, absolutamente, inverossímil e inacreditável, com as vênias costumeiras, a informação final de que a ilustre Juíza, dirigente do processo, informara que mandou tirar o alvará, em nome da autora, por recomendação de sua representação nos autos.

Ora, esta é uma atitude judicial inaceitável, renovando as vênias, porque o fato, atribuído aos procuradores da autora, é por eles, peremptoriamente, negado, e não demonstrado na informação judicial e, mais que isso, ainda que houvesse tão abstrusa “solicitação”, ela não encontraria apoio na lei, posto que o referido art. 36/CPC estabelece que a atuação do litigante se dê pela representação profissional especializada, a não ser com a hipótese, não aventada, inspirada no art. 22, da Lei 8.906/94 que, na realidade, visa PROTEGER o profissional.

A vigorar tal entendimento, o de que o pagamento dos valores apurados no processo judicial ou entrega respectiva, do “quantum” liquidado, deve ou pode ocorrer pessoalmente ao litigante, pela via do art. 708/CPC, cria-se uma distorção exegética insustentável, quebrando a harmonia das regras, carecendo de melhor apreciação, posto que ele regule o pagamento ao credor cujo parágrafo 1º., quando se refere a tal acerto, dizendo que será feito pela entrega do dinheiro não exclui a representação advocatícia, nem estabelece que seja diretamente à parte litigante.

 Os advogados, assim, estarão profundamente prejudicados na sua laboriosa e honrada atividade, agravando, de maneira quase insuportável, os transtornos que eles já enfrentam, na rotina diária dos escritórios e balcões da Justiça, como, ainda, e principalmente, nas suas relações com os clientes, porque perdem a garantia legal de que, havendo contrato de honorários, podem proceder à compensação pecuniária no saldo apurado pelo processo, inclusive, de outros gastos.

Com efeito, pelo art. 664, do Código Civil, “O mandatário tem o direito de reter, do objeto da operação que lhe foi cometida, quanto baste para pagamento de tudo que lhe for devido em conseqüência do mandato”, portanto, muito mais que os honorários, o que ficou totalmente inviabilizado pelo procedimento em questão, quando há crédito cobrável diretamente na importância levantada no processo, a que deram assistência e em que o adquiriram.

Sobre este inciso legal, consta o Enunciado 184 do CEJ: “Da interpretação conjunta destes dispositivos, extrai-se que o mandatário tem o direito de reter, do objeto da operação que lhe foi cometida, tudo o que lhe for devido em virtude do mandato, incluindo-se a remuneração ajustada e o reembolso de despesas”, valorizando os argumentos até aqui expendidos.

No entanto, o respeitável entendimento objurgado prejudica, irremediavelmente, se não lesa, as garantias legais oferecidas, com legitimidade, aos profissionais da área, correspondendo a um grave prejuízo ao patrimônio de quantos vivam da atividade advocatícia porque, estabelecido, na lei, o direito de reter, ou seja, na dependência de que o produto da ação esteja nas mãos do procurador.

A perdurar esta situação, compromete-se, o futuro e a credibilidade de quanto propaga a própria ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, quando defende a legislação que, a duras penas, conseguiu implantar para um harmonioso relacionamento entre os que, prestando serviço público, a enobrecem, com sua efetiva participação no cenário jurídico-social da coletividade.

É caso, portanto, de interveniência da mais alta direção da Autarquia, no sentido de restabelecer a vigência do direito por ela proclamado, de que é privativa de advocacia: I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário, postulação que compreende, é claro - como no direito de acesso à Justiça, assegurado pelo art. 5º., XXXV, da Constituição Republicana, a correspondente obrigação dos órgãos que a compõem, de se manifestar, em tempo razoável, ou não haveria proveito no reconhecimento do direito mencionado - O DE RECOLHER O PRODUTO DA POSTULAÇÃO, já pelo art. 22, “caput”.

Ao examinar a Constituição Federal, no seu art. 5º. XXXV, que assegura a todo cidadão o acesso à Justiça, os conceituados autores, NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY, à fl. 131, de sua CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMENTADA, Editora Revista dos Tribunais, do ano de 2006, proferem preciosa lição, que merece relida:

“. XXXV: 21. Direito de ação. Todos têm acesso à justiça para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória de um direito individual, coletivo ou difuso. Ter direito constitucional de ação significa poder deduzir pretensão em juízo e também poder dela defender-se. O princípio constitucional do direito de ação garante ao jurisdicionado o direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada (Nery, Princípios, n 18). Por tutela adequada entende-se a que é provida da efetividade e eficácia que dela se espera. Caso o jurisdicionado necessite de atuação pronta do Poder Judiciário, como, por exemplo, a concessão de medida liminar, pelo princípio constitucional do direito de ação tem ele direito de obter essa liminar. Restrições impostas pela lei à concessão de liminares não podem obstar a incidência do preceito constitucional aqui examinado ... A facilitação do acesso do necessitado à justiça, com a assistência jurídica integral (5º LXXIV), é manifestação do princípio do direito de ação. Todo expediente destinado a impedir ou dificultar sobremodo a ação ou a defesa no processo civil, como por exemplo o elevado valor das custas judiciais, constitui ofensa ao princípio constitucional do direito de ação.”

Então, é claro, que o direito de postulação, que se garante, constitucionalmente, no art. 5º., XIII, ao assegurar como livre o exercício de qualquer trabalho, tem de encontrar correspondência no entendimento judicial de que o resultado dela, do pedido processado, tem, obrigatoriamente, de ser entregue à disposição do advogado, pois não é lógico que se lhe assegure o direito à prestação do serviço sem garantia de receber a retribuição equivalente.

Ele é o agente da própria ação, de tal modo que, como consta do art. 708/CPC, relativamente ao encerramento da demanda, o pagamento ao credor far-se-á: I – pela entrega do dinheiro, certamente, e por coerência, ao procurador da parte que a ele haja feito jus, segundo a visão judicial, porque esta é a representação que funciona, desde o art. 36.

Se o levantamento do resultado do trabalho do procurador pode ser efetuado pelo litigante, que ele representa, como aconteceu, hipoteticamente, no caso presente, em que os representantes nada receberam até esta data, o advogado perdeu suas garantias profissionais, com raízes no art. 5º., XIII, pelo qual, desde seu “caput”, se estabeleceu que:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.”

O entendimento que está sendo combatido atenta, frontalmente, contra esta norma constitucional, de clareza solar, se se perceber que a liberdade de exercício profissional está frustrada ou obstaculizada pelo impedimento de percepção da verba honorária, ou porque esta dependerá, como no caso, de profunda e incerta discussão com o constituinte, noutra demanda de longa duração.

O advogado terá que, para receber a retribuição avençada, pelo trabalho prestado, de acionar o cliente que não o pagou – sim o seu cliente - e haverá de cuidar, de precaver-se quanto à sua subsistência, bem como à de seus dependentes, porque estará sujeito ao risco de não dispor de alimentos para todos, em face dos riscos conhecidos que circundam tais diligências.

Há, portanto, e com vênias devidas ao Poder Judiciário, na sua inteireza, uma indesejável violação da garantia constitucional, contida no direito à segurança e à propriedade, veste o desvio funcional, com correspondente abuso de direito da ilustrada autoridade condutora do processo, ao determinar, conforme consta da apuração da douta Corregedoria Geral da Justiça do Estado, o levantamento, a disponibilidade do valor liquidado na ação, pela própria parte, sem o acerto indispensável dos honorários.

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Se a ação movida pelos advogados, no exercício regular do direito constitucional, garantido pela Carta Federal, no seu art. 5º. XIII puder terminar com a exclusão dos procuradores no ato final, atingido pelo penoso e exaustivo processo judicial, de quase um decênio, com o pagamento direto ao constituinte, vigendo seu mandato, então, os profissionais estarão deixados em desamparo, injustificadamente, com gravíssima repercussão de descrédito da categoria, para as causas em andamento, porque violada a segurança jurídica da relação e a propriedade do trabalhador.

Nem se argumente, desprevenidamente, como pode acontecer, com a disposição do art. 22, no seu § 4º, da Lei 8.906/94, porque não é o caso presente, ou seja, não houve juntada de contrato, nem pedido de expedição de precatório, constituindo-se, portanto, em hipótese diversa a ser analisada, se e quando ocorrer, aliás, como opção do advogado que, não exercida, não desfigura a representação pelo art. 36/CPC.

Advirta-se, ademais, embora, aparentemente, não seja necessário, que o inciso legal examinado, inserido no Estatuto da advocacia, tem por objetivo proteger o trabalho do profissional, que se empenha em nome do cliente e merecer, portanto, a tutela legal que lhe é dada, porque, numa leitura superficial, pode parecer, a incautos, que se estivesse abrindo uma oportunidade para o litigante receber, pessoal e diretamente, o produto do esforço alheio.

Isto é, naquela hipótese, que não é a do caso presente, se o profissional quiser, a seu critério e escolha, pode, ele, procurador, resguardado o seu direito preferencial de destacar do resultado da ação os seus honorários, na forma do que contratou, pode providenciar, processualmente, e autorizar que, garantido o pagamento, da sua verba honorária, a parte do cliente lhe seja passada, em pessoa.

Por isso, que cabe à ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, por sua honrosa Presidência, a teor do disposto no art. 44, da Lei 8.906/94, nos seus incisos “I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito ... e II - a defesa ... dos advogados”, sugere-se adotar as providências judiciais e extrajudiciais cabíveis para prevenir ou restaurar o império do Estatuto, em sua plenitude, inclusive mediante representação administrativa, na forma da legislação em vigor, no legítimo interesse da laboriosa classe dos advogados que, inscritos, se encontram sob sua tutela e proteção legais.

Defende-se, na forma do art. 15, do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, sejam tomadas providências para o restabelecimento do império das regras do Estatuto, da Lei 8.906/94 e das disposições legais, atinentes ao contrato de mandato previstas no Código Civil, de forma a se assegurar, aos profissionais que laboram o recebimento do numerário a que fazem jus, de natureza jurídica, consabidamente, alimentar.

Não raro isto acontece após anos de árdua batalha judicial, sendo, portanto, justo, impedir que os alvarás judiciais sejam expedidos diretamente em nome da parte, mas, sim, como de direito, em nome de seus procuradores, único modo de se garantir o recebimento, oportuno e seguro, da merecida remuneração advocatícia, a não ser que ocorra a exceção mencionada, do art. 22/§ 4º. da Lei 8.906/94. 

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Sobre o autor
Abelardo Flôres

Desembargador do TRT da 3ª Região aposentado. Advogado em Belo Horizonte (MG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FLORES, Abelardo Flôres. Pagamento direto ao litigante: um caso para os advogados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3221, 26 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21630. Acesso em: 2 nov. 2024.

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