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Reforma do Judiciário (V):

Tribunais Superiores

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01/09/1998 às 00:00
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O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

No prosseguir dos estudos, cabe examinar a posição de relevo do atual Superior Tribunal de Justiça, cuja importância no contexto judiciário nacional enseja urgente adoção de medidas que permitam àquela Corte suportar o aumento do demandismo, pela inserção de obstáculos ao uso em demasia de recursos, mesmo quando de natureza extraordinária, tanto mais porque, como defendido por nós ao estudarmos o Supremo Tribunal Federal, o Excelso Pretório está a merecer transferir competências de índole não política nem constitucional a outros Tribunais, notadamente o STJ pela posição de proeminência como Tribunal nacional, de modo que o conjunto de medidas que possibilitem ao STF consolidar a posição necessária de Corte Constitucional do País igualmente venha ensejar que o repasse de algumas de suas competências ao STJ não sufoquem este Alto Pretório de Justiça de modo a impossibilitar o exercício de suas especiais competências.

Não se pode, pois, para solucionar os problemas do Supremo Tribunal Federal, criarem-se outros problemas na esfera do Superior Tribunal de Justiça. A tal modo, o delineamento das proposições que passamos a fazer em relação ao STJ decorrem do estudo sistemático e metódico que estamos tentando desenvolver com relação ao Judiciário e que, no particular, envolvem questões postas no estudo que fizemos acerca do STF (vide Reforma do Judiciário (IV): o Supremo Tribunal Federal), sempre, logicamente, submetidas à crítica geral e, em decorrência destas, a uma revisão.

O Superior Tribunal de Justiça, de certo modo inspirado no congênere português, e sem esquecer a experiência anterior do extinto Tribunal Federal de Recursos, que lhe cedeu seus primeiros Juízes, sabiamente configura-se numa Corte que incorpora outras quatro, numa mecânica que ao mesmo instante em que permite uma agilidade e especialização ímpar ao STJ, também lhe confere grande grau de uniformidade interna de julgados, conseguindo, assim, mais do que o pretendido pelo modelo alemão.

Explico: atualmente o Superior Tribunal de Justiça se encontra repartido, para funções jurisdicionais, na Corte Especial e em três Seções Especializadas, cada qual integrada por duas Turmas. Originalmente, a idéia fora de estabelecer a Primeira Seção como especializada em questões de Direito Público, a Segunda Seção como especializada em questões de Direito Privado e a Terceira Seção como especializada em questões de Direito Penal (também inserido o Direito Penal Militar oriundo das Cortes Estaduais ou do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, quanto aos policiais e bombeiros militares), inclusive os aspectos processuais concernentes a cada qual dos ramos de Direito Material indicado, com a Corte Especial, denominação do órgão especial admitido pelo artigo 93, IX, da Constituição Federal, com atribuições que seriam próprias do Tribunal Pleno ou que ultrapassassem a de determinada Seção Especializada, inclusive os embargos de divergência envolvendo Seções diversas, diretamente ou por suas respectivas Turmas, e conflitos entre as mesmas. Com a divisão interna estabelecida a tal modo, praticamente o Superior Tribunal de Justiça se transformou em quatro Cortes Superiores dentro do mesmo harmônico conjunto de Juízes, sem os gravames, assim, de divergências que pudessem ocorrer fosse cada uma das Seções Especializadas um Tribunal Superior, como poderia acontecer se seguíssemos o modelo alemão, porquanto, sendo órgãos fracionários do mesmo Tribunal, todas as divergências de interpretação se podem resolver rapidamente por órgão interno que se sobreponha aos mesmos. É certo que o modelo de repartição funcional interno de competências se tem alterado por sucessivas emendas regimentais, notadamente porque, embora estabelecido pela Constituição Federal apenas o número mínimo de seus Ministros em trinta e três, tal não se vislumbra para breve possível de ser aumentado, o que permitiria que as Primeira e Segunda Seções, mais factíveis a receberem demandas, pudessem ter implementadas novas Turmas, evitando, assim, o desvirtuamento da idéia original, como já se verifica pelo acolhimento pelos Ministros da Terceira Seção, inicialmente prevista para causas apenas de ordem penal, de competências antes entregues àquelas outras Seções. Nada, por ora, que invoque prejuízos à prestação jurisdicional, mas que está a merecer cuidados no sentido de logo serem permitidas novas Turmas para a Primeira e Segunda Seções, retornando à idéia anterior, que como antes dito, segue a linha do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, e nos tem parecido de melhor lógica orgânica por evitar o fracionamento jurisprudencial entre Cortes diversas. Mas aumentar-se indefinidamente a composição do Superior Tribunal de Justiça, como já dissemos, é remédio que se não mata o doente, também não o cura, enquanto a cada dia estabelece fadiga no corpo do doente. E Tribunal doente, sufocado pelas pletora de casos intermináveis, é Tribunal desrespeitado, agradando apenas aos que nele vêem a possibilidade de procrastinação dos litígios à eternidade, enquanto desanima os afoitos por Justiça.

Nisto, um posicionamento que tenho defendido é a diminuição na composição dos órgãos fracionários dos Tribunais, no caso dos Tribunais de Recursos por incongruência dos embargos infringentes que acarretaram que tais passassem a ter Turmas com quatro Juízes ou Desembargadores para permitir tal recurso a todos os litigantes (eis que a composição com três poderia não permitir o mesmo se o quorum estivesse prejudicado com a presença de apenas dois dos membros da Turma); igualmente nos Tribunais Superiores não se justifica a presença de cinco Ministros, quando estatisticamente se vislumbra que as decisões minoritárias não encontram remédio, eis que como Cortes de uniformização apenas as decisões divergentes no âmbito do próprio Tribunal podem ser reexaminadas por via dos embargos de divergência, não importando, pois, se as decisões são unânimes ou majoritárias, enquanto em regra aquelas prevalecem. Apenas com isto, haveria uma saudável multiplicação de órgãos fracionários no Tribunal Superior de Justiça, tanto mais porque sabiamente a LOMAN define que cada órgão fracionário de Tribunal, seja Órgão Especial, Seção, Câmara, Turma ou Grupo de Turmas, atua como tribunal distinto, pelo que cada Turma implementada no âmbito da Corte Superior desafogaria em muito o congestionamento das pautas de julgamento, tanto mais quando precipuamente julgam recursos, dado que a competência originária em regra tem sido reservada à Corte Especial ou às Seções especializadas em pleno. Isto, inclusive, merece maior consideração quando se percebe que as questões sumuladas em regra são decididas monocraticamente pelos Relatores, e que os casos que evidenciam possível divergência interna muitas vezes são pelos órgãos fracionários afetados ao órgão maior, de forma que as Turmas significativamente perdem funções de impor posicionamentos jurisprudenciais à sociedade, ficando-lhes reservada sobretudo a função de irradiar o posicionamento do Pleno, Corte Especial ou Seção especializada.

Outro ponto que cabe ser analisado é o retorno da relevância para o conhecimento de determinados recursos em tema infraconstitucional, eis que muito se tem verificado estar o congestionamento dos Tribunais Superiores na impossibilidade de julgarem apenas matéria de alta repercussão para a sociedade, notadamente nos casos vindos por recurso, em que pressuposto todo um exame em graus judiciários inferiores. Há que se notar, inclusive, que com a dimensão territorial e cultural do País, pretender-se que todo o tema possa ser unificado num Tribunal Superior sediado em Brasília é desconsiderar os temperamentos que o julgador de cada Região merece impor à letra legal inclusive para que ela continue sendo respeitada pela sociedade local — afinal, também um dos problemas dos Tribunais Superiores, hoje, é que a matéria federal é a predominante, relegando poucas competências legislativas ao âmbito local; neste sentido, as Cortes locais têm grande importância no adequar a norma federal ao contexto estadual ou regional, sem que tal acarrete a violação da Constituição ou da lei federal. E digo isto com a tranqüilidade de ter com muita honra nascido em Brasília e atuar como magistrado do Trabalho na Capital Federal, certo que a maravilha de nossa Nação reside exatamente na multiplicidade cultural decorrente das multiplicidades racial e regional.

Certo, assim, que a relevância não pode envolver os recursos cuja problemática envolva tema constitucional, porque senão estaria o Tribunal Superior a indiretamente vedar o acesso da questão ao Supremo Tribunal Federal, mas possível de estabelecer-se segundo regras que permitam o reexame de decisões de relevo, e depois, se o entendimento merecer uniformização por âmbito sumular, assim permitir-se que outras lhe cheguem quando tais verbetes hajam sido contrariados. Tudo numa regra de obstáculos recursais que desestimulam o recurso procrastinatório, alçam o recurso especial ao debate de questões de relevância para a sociedade nacional, e permitem que os entendimentos adotados pela Corte sejam respeitados pela permissibilidade de recursos que invoquem a contrariedade da decisão recorrida a verbete da súmula editada.

Ao lado da relevância, entendo que deve ser corrigido o anômalo sistema recursal instituído pela Constituição de 1988, que ensejou recursos concomitantes em matéria constitucional para o STF e em matéria infraconstitucional para o STJ, num debate que prolonga o processo muitas vezes ao exame de qual tema é prejudicial a outro, e mesmo criando uma figura que não encontra paralelo na Teoria Geral do Processo: a coisa julgada por tema. Por conseqüência, melhor a instituição do sistema recursal adotada pelo Processo do Trabalho, em que o recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho pode e deve também invocar matéria constitucional como via de acesso ao Supremo Tribunal Federal, servindo a Alta Corte de Justiça do Trabalho como filtro de admissibilidade de recursos extraordinários, eis que muitos apelos se mostram desprovidos de efetiva indicação de contrariedade a preceitos constitucionais, desafogando assim a Suprema Corte de recursos extraordinários que, fossem interpostos diretamente dos Tribunais Regionais (como ocorre com o recurso extraordinário contraposto ao recurso especial), aumentaria ainda mais o congestionamento hoje verificado no STF. Para tal confronto, basta verificarmos quantos são os recursos extraordinários admitidos na origem ao Supremo Tribunal Federal oriundos da Justiça do Trabalho (ou seja, oriundos em regra do TST) e quantos são os oriundos da Justiça Comum (ou seja, não apenas os oriundos do STJ quando a matéria constitucional haja nele sido desenvolvida, como ainda os oriundos de cada um dos Tribunais Regionais Federais, de cada um dos Tribunais de Justiça, Tribunais de Justiça Militar e Tribunais de Alçada dos Estados e ainda do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios), e verificar, depois, quantos seriam diminuídos se concentrado antes o exame da matéria constitucional ao prévio crivo do STJ, no caso, sem, inclusive, que tal possa corresponder a implemento no serviço do Superior Tribunal de Justiça, porquanto para cada recurso extraordinário em regra há um correspondente recurso especial interposto, tanto mais porque o detalhismo da nossa Constituição Federal permite que muitas violações possam ser invocadas ao mesmo tempo no campo constitucional e no campo infraconstitucional.

No concernente ao sempre preocupante tema da divergência no âmbito do mesmo Tribunal, não por conta de suplantação jurisprudencial interna, mas notadamente pela sábia disposição contida na LOMAN que atribui a cada órgão fracionário a condição de Tribunal distinto (parágrafo 4º do artigo 101 da Lei Complementar nº 35/79), muito se tem criticado acerca da inadmissão de recursos que invocam divergência jurisprudencial com distinto órgão fracionário do mesmo Tribunal, sob o argumento de suplantação de entendimento da Corte, quando em verdade um não se reveste da condição de revisor do outro, e atuam como Cortes diversas. A multiplicação dos órgãos fracionários dos Tribunais de segundo grau afeta, inequivocamente, a capacidade de julgamento em sede recursal dos Tribunais Superiores, e, assim, ou se permite que os recursos ainda que baseados no pronunciamento de órgão inferior diverso do mesmo Tribunal sejam admitidos (sob pena de diminuir a regra da uniformização jurisprudencial), ou se indica caminho seguro para a uniformização interna, o que certamente não tem sido plenamente alcançado pelo incidente de uniformização de jurisprudência. Neste sentido, pode ser pensada a via de embargos de divergência no âmbito dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais, inclusive quanto àqueles para suplantar a divergência entre os Tribunais de Alçada, que são, como veremos em oportunidade própria, detentores também de parcela da competência originária das Cortes de Justiça locais. A tal modo, tais Tribunais igualmente serviriam de filtros na interpretação do direito, enquanto recursos diretos de tais Cortes poderiam seguir se a invocação de divergência fosse em relação a Tribunais plenamente distintos.

As competências de caráter originário, como expus no ensaio referente ao Supremo Tribunal Federal, não ensejam maiores problemas, eis que não se colocam nestas as causas do volume não mensurado de trabalho que o STF e o STJ têm recebido, e é plenamente possível que aquelas de cunho não constitucional nem político possam ser deslocadas do âmbito do Excelso Pretório para o Alto Tribunal de Justiça sem que esta se veja impossibilidade de prosseguir com a devida celeridade e grandeza da prestação jurisdicional dada.

Com relação ao modo de composição do Tribunal Superior de Justiça, tal se fará mais adiante, num fechamento do estudo geral das Cortes Superiores.


O TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Muitos dos aspectos delineados em relação ao Superior Tribunal de Justiça são plenamente válidos quando se discute a competência recursal do Tribunal Superior do Trabalho. Hoje, o Tribunal tem agido inequivocamente como instância revisora dos Tribunais Regionais do Trabalho, desviando-se de sua missão constitucional como uniformizadora da jurisprudência laboral, que não pode, a par dos esforços de seus integrantes, levar a contento.

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Com efeito, o TST poderia ter maior influência no direcionamento da interpretação do direito federal social se também os recursos interpostos contra as decisões regionais tivessem, em regra, que merecer reconhecimento de relevância do tema enfocado, eis que também suas decisões devem ultrapassar os limites da lide para alcançar o geral das relações capital-trabalho com igual delineamento, sem afetar, doutro lado, as peculiaridades regionais que devem ser também preservadas.

Neste sentido, embora o recurso de revista trabalhista não contenha alguns dos defeitos do recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, eis que também permite o debate de matéria constitucional, evitando-se assim o bifurcamento das vias recursais, doutro lado a inexigibilidade de relevância do tema debatido tem acarretado sua interposição com fins meramente procrastinatórios em muitas das vezes, o que vai contra a própria exigência do processo do trabalho de celeridade pela natureza alimentar dos créditos perseguidos em regra.

Não por menos muitos têm defendido a própria extinção da Corte Superior da Justiça do Trabalho, eis que com a avalanche de causas que lhe são submetidas, notadamente em grau de revista, fica impedida de prestar celeremente a tutela jurisdicional devida, havendo assim vozes que entendem que a jurisdição trabalhista deve encerrar-se nos Tribunais de Recursos, inclusive por ampliada a instância única do Primeiro Grau de Jurisdição, excetuada sempre a competência recursal constitucional do Excelso Pretório.

Não chego a tanto porque há inequivocamente matérias que ensejam a existência do Tribunal de cúpula, inclusive no aspecto da uniformização da jurisprudência acerca de questões de relevante interesse público, observados os delineamentos traçados acerca da regionalização do direito federal segundo os costumes e cultura envolvidos, que não pode ser desprezados pelos Juízes integrantes de Tribunal Superior sediado na Capital Federal, sob pena do direito federal passar a traduzir-se apenas pelo que ocorrido no cotidiano de Brasília, quando particularidades locais distintas muitas vezes são consideradas pelos Tribunais Regionais na aplicação do direito federal, desde que sempre preservada a letra da lei federal, ou seja, enquanto permitida pela norma federal a interpretação aplicável ao fato local, é tecnicamente imprópria a uniformização por Tribunal central, sob pena de deturpar o próprio sentimento federalista inserido no artigo 1º da Constituição vigente.

Ademais, a existência isolada do TST tem causado problemas como a interpretação divergente de normas de aplicação comum aos diversos Tribunais Superiores e ao Supremo Tribunal, sem que tenha o constituinte elaborado meio de consolidação de tal entendimento, tanto mais porque também o Tribunal Superior do Trabalho conhece outras questões que não apenas de Direito do Trabalho.

Nesta linha de raciocínio, a fusão do Tribunal Superior do Trabalho ao Superior Tribunal de Justiça, passando aquele a integrar uma Câmara especializada em Direito Social, não é de difícil aceitação, notadamente porque, hoje, matérias com conteúdo social estão inseridas na competência de uma e outra Corte, valendo citar as questões que envolvem sindicatos, acidentes do trabalho e a matéria previdenciária, cuja origem na relação de trabalho por vezes acarreta que um Tribunal se manifeste sobre a questão, embora não necessariamente na linha do que a outra Corte Superior haja enunciado, porque entre elas nenhuma vinculação existe. Doutro lado, inserida no contexto de um grande Tribunal Superior de Justiça, as questões de uniformização interna poderiam, como hoje ocorre no âmbito do STJ, serem facilmente supridas, sem traumas para o jurisdicionado, que dos Tribunais Superiores espera o norte na conduta aplicável face às diversas relações jurídico-materiais do cotidiano social.

Logicamente, este pensamento passa também pela necessidade do TST adequar-se como Tribunal Superior extirpando de sua composição a representação classista, que, se de resto já é criticável, tanto mais criticável se mostra quando a regra é a discussão meramente jurídica das teses expostas pelos Tribunais Regionais, vedado que é ao TST conhecer, pela via recursal extraordinária da revista, dos fatos delineados nas Cortes Recursais de origem. A tal modo, demonstra-se mais ainda absurdo um Ministro Classista envolvido de debate da inteligência da norma federal, seja a lei, seja a própria Constituição Federal, porquanto justificativa alguma de conhecimento de fatos relacionados ao ambiente laboral se faz presente (argumento classista inclusive inconsistente, frise-se, porque nem sempre os envolvidos são das mesmas categorias dos representantes classistas envolvidos no julgamento, o que faz com os mesmos detenham igual ou menor conhecimento acerca das relações típicas da categoria do que Juiz Togado, que corriqueiramente, por uma vida, lida com causas trabalhistas diversas), assim restando indevidamente alçado à condição de revisor da interpretação que lhe haja dado Tribunal Regional, pelo que, sem de logo manifestar minha repulsa à representação classista na Justiça do Trabalho, maior ainda se encontra a justificativa para que a Corte Superior do Trabalho se componha apenas de Ministros Togados, que então deveriam integrar-se ao Tribunal Superior decorrente de igual integração dos Ministros do atual Superior Tribunal de Justiça.

Registro que a colocação da composição inicial a formar Câmara especializada, com Turmas ao mesmo modo integradas por três Ministros, dinamizaria a prestação laboral, tanto mais porque, com igual número de órgãos fracionários aos que hoje existem no TST haveria condições de melhor pronunciamento juslaboral, dada a defendida necessidade da argüição de relevância social da questão federal invocada.

E como se verifica com o STJ, a especialização numa Câmara própria em verdade em muito contribuiria para um melhor relacionamento dos Juízes encarregados da interpretação do direito federal, tanto mais porque a existência da Corte Especial permitiria sempre que o debate dos diversos enfoques do Direito se fizesse permeado no sentido de evolução da Ciência Jurídica nacional, tudo no âmbito de um único Tribunal Superior.

Com relação ao denominado poder normativo, muito já se tem debatido quanto ao caráter excrescente dele na atualidade, quando as categorias profissionais e econômicas devem desenvolver os próprios meios de solução de conflitos coletivos de caráter meramente econômico, enquanto muito se pode desenvolver no âmbito dos denominados dissídios coletivos jurídicos, onde em discussão o alcance das normas adotadas pelas diversas categorias, ou mesmo das decisões de cunho coletivos proferidas pelo Judiciário, sem que tal importe em deferir-se ao magistrado a criação da norma para a categoria envolvida. Cabe salientar que tal poder legiferante atualmente deferido aos Tribunais do Trabalho se tem distanciado daquele que chegou a ser cogitado para o mandado de injunção, e que defendo, no sentido de permitir ao magistrado o pronunciamento constitutivo ou declaratório acerca do modo de efetivar-se determinada norma superior por omissão do legislador ou normatizador inferior, pela via do juízo de eqüidade, atuando no vazio infraconstitucional a par da regra constitucional, enquanto o poder normativo há muito suplantara tal intento, para caracterizar-se como poder paralegislativo, de alcance restrito às categorias envolvidas, criando normas de sobreposição por especialidade.

Noto que de modo algum haveria prejuízo aos demais temas de competência originária do atual TST, eis que ou seriam atribuíveis à Corte Especial, ou às Câmara e Turmas especializadas em matéria social, que inclusive, num debate que merece ser efetivamente exposto em artigo próprio, mas que desde já se adianta, poderia também incorporar as demais questões indiretamente decorrentes da relação laboral, como as matérias sindicais, acidentárias e previdenciárias em geral.

Cabe notar que atualmente os diversos Tribunais caminham para a especialização, seja integralmente, seja por divisão interna, que passam a conduzir o pensamento jurídico próprio segundo as regras do cotidiano social que aplicam, razão pela qual os denominados Juízes do Trabalho, envolvidos diuturnamente com as relações decorrentes do capital-trabalho, em regra, no julgar captam todas as conseqüências sociais da interpretação do direito e do fato, para preservar, tanto quanto possível, a harmonia de tais relações e permitir o desenvolvimento da livre iniciativa sem atentado aos valores sociais do trabalho, conforme Constituição, artigos 1º, IV, 170 e 193.

Por hipótese, contudo, de perdurar o Tribunal Superior do Trabalho, logicamente há que ser reestudada a participação classista, eis que totalmente inaceitável a existência de leigos que pressupõe interesse em determinado sentido da causa, como são os representantes classistas, que longe estão de deterem a condição própria de magistrado, cujo pressuposto de isenção não podem de modo algum invocar (sob pena, então, de não mais serem representantes patronais ou obreiros), notadamente quando tal participação ocorre numa Corte de Justiça Superior envolvida essencialmente no debate de teses jurídicas, no debate da interpretação do direito federal especializado do trabalho, inclusive o respectivo ramo adjetivo, sem que fatos relacionados ao ambiente de trabalho possam sequer na via extraordinária do recurso de revista ser invocados. Mesmo que se invocasse a existência da competência originária ou a recursal ordinária em sede de dissídio coletivos, ainda assim haveria que ser questionada a participação de representantes com interesses das partes na própria mesa de julgamento; doutro lado, ainda que tal argumento também fosse recusado, de todo modo não poderiam os classistas no TST subsistir além da respectiva Seção de Dissídios Coletivos; mas então, repita-se, serão então partes travestidas de julgadores, figurantes da condição de magistrados, vestindo indevidamente a toga para representarem uma isenção que não podem efetivamente declarar.

Recomposto o Tribunal Superior do Trabalho, se não acolhida a fusão proposta com o STJ e TSE, ideal também seria a readequação da participação da Advocacia e do Ministério Público na composição da Corte, seguindo-se, por paridade com a Corte Superior de Justiça Comum, a indicação de 1/3 dentre Advogados ou Procuradores do Trabalho, e os restantes Ministros dentre Juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, ou, se alterada tal proporção no STJ seja igualmente a mesma adotada em relação ao TST.

Melhor, portanto, que sejam os classistas excluídos do Tribunal Superior do Trabalho, porque injustificável a participação dos mesmos numa Corte de índole uniformizadora da jurisprudência, julgadora de teses enunciadas por Cortes inferiores, neste caso ensejando a própria readequação da distribuição interna das vagas para similaridade com o Superior Tribunal de Justiça. E melhor ainda que tudo ocorra com a transformação do TST em Câmara Especializada do novo Tribunal Superior de Justiça que se fizesse criado, enaltecendo, assim, sobremodo, a função uniformizadora do Direito que incumbe às Cortes Superiores.

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Sobre o autor
Alexandre Nery de Oliveira

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO). Pós-Graduado em Teoria da Constituição. Professor de Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Alexandre Nery. Reforma do Judiciário (V):: Tribunais Superiores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 26, 1 set. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/218. Acesso em: 16 abr. 2024.

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