CONCLUSÃO
Com o advento da Constituição Federal de 1988, passou-se a discutir a celeridade processual, em paralelo aos muitos direitos inalienáveis e indisponíveis do indivíduo tratados no estudo do Processo Penal, buscando-se, assim, que o ordenamento jurídico acompanhe as mudanças ocorridas na sociedade, que justificam, ou não, a sua perenização em nossa sistemática jurídica.
Por este motivo é que foi editada a Lei 11.689/2008 que, dentre outras alterações, extinguiu o Protesto por Novo Júri, diante de sua natureza polêmica e incompatibilidade com a nova realidade social e jurídica contemporânea, vez que este recurso foi criado para reavaliar casos com penalidades muito gravosas, tais como a pena de morte ou perpétua, situações que já não são mais abarcadas pelo Sistema Judiciário Brasileiro, não se justificando a sua manutenção como meio recursal em nosso ordenamento.
Embora não restem dúvidas quanto à necessidade e propriedade da extinção do Protesto por Novo Júri, diante de todo o já explicitado, tal modificação trouxe também novas celeumas jurídicas situadas no campo do Direito Intertemporal, em razão daqueles processos que ainda estão em andamento ou que se iniciaram após o advento desta lei, mas cuja materialidade do fato criminoso se deu antes da mesma, surgindo várias correntes acerca da aplicabilidade ou não do recurso para tais casos.
Existe respeitável doutrina, composta por eminentes doutrinadores, que admitem o cabimento do Protesto por Novo Júri nestas situações, em virtude da sua suposta natureza jurídica híbrida – penal e processual – e conseqüente ultra-atividade da norma, por ser mais benéfica ao réu que a nova lei, pois esta norma decorreria do direito subjetivo do acusado ao duplo Grau de Jurisdição e Ampla Defesa.
Data venia, nos reservamos do direito de discordar dos doutos juristas, por entendermos que não se trata de norma híbrida, mas puramente processual, não havendo que se falar em ultra-atividade da lei, mas somente de aplicação imediata, sem que haja, de tal modo, ofensa ao Duplo Grau de Jurisdição ou Ampla Defesa, posto que o Protesto por Novo Júri era dirigido ao próprio juízo a quo, e não para uma instância superior, e que sua extinção de nosso ordenamento não retirou do acusado o direito aos demais recursos ainda vigentes em lei.
Insta esclarecer que esta norma possui caráter exclusivamente processual tendo-se em vista que não afeta, nem mesmo indiretamente, o poder punitivo do Estado, tratando-se aqui tão somente de realização de novo julgamento, o que faz cair por terra o entendimento de que seria norma mista, pois, se o fosse deveria ser apta a modificar a situação material do acusado perante o processo e a pretensão punitiva do Estado, o que obviamente não ocorre neste caso.
Ademais, a não aplicação do Protesto por Novo Júri a situações jurídicas de que aqui se trata não afeta de forma alguma o direito subjetivo do indivíduo à Ampla Defesa e ao Duplo Grau de Jurisdição, porque não retira dele o direito de utilizar-se de outros instrumentos recursais, tais como a apelação, conforme vem ocorrendo em situações hodiernas.
Cumpre ressaltar que este já é um entendimento que vem se assentando na jurisprudência dos nossos Tribunais, conforme se pode observar no recente julgamento do casal Nardoni, em que foi denegado o pedido de Protesto por Novo Júri, recebendo-se o recurso apenas como Apelação, em uma brilhante decisão do Douto Magistrado responsável.
Resta clara, portanto, a natureza processual da norma em estudo, e a patente plausibilidade de seu não cabimento nos crimes cometidos antes da promulgação da Lei 11.689/2008, mas que foram processados e/ou julgados somente após o advento da mesma, não se reconhecendo a ultra-atividade da lei antiga, posto que tal princípios não se aplica a norma de caráter processual, pois sua incidência e aplicação devem ser imediatas, atingindo todos os processos futuros e em andamento.
BILIOGRAFIA
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_____________ Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Anne Joyce Angher. Vade Mecum Acadêmico de Direito. 7ª Ed. São Paulo: Rideel, 2009.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal parte geral. Vol. 1. 12º ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
_____________ Código de Processo Penal Comentado. 8ª Ed. São Paulo: Editora RT, 2008.
_____________ Curso de Processo Penal. 16º ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.
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DOTTI, René Ariel. Anteprojeto do Júri. Revista dos Tribunais, v. 702, abr. 1994, p. 281. in MENDONÇA, Andrey Borges de. O Protesto por Novo Júri e o Casal Nardoni: um estudo sobre a aplicação da lei processual penal no tempo. Março de 2010. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/14604 Acesso em: 22 Mar 2010.
MENDONÇA, Andrey Borges de. O Protesto por Novo Júri e o Casal Nardoni: um estudo sobre a aplicação da lei processual penal no tempo. Março de 2010. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/14604 Acesso em: 22 Mar 2010.
STF. 5ª Turma. Recurso Especial 1094482 - RJ. Ementa: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO CONSUMADO E TENTADO. RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. JULGAMENTO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.689/2008. PROTESTO POR NOVO JÚRI. NOVO JULGAMENTO. Relator. Min. Laurita Vaz. Acórdão publicado no DJ 03.11.2009 PP.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 3ª Ed. Rev. Ampl. e Atual. Salvador: Editora Jus Podivm, 2009.
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ÚLTIMA INSTÂNCIA. Leia a íntegra da decisão que negou novo júri para o casal Nardoni. Disponível em: http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/LEIA+A+INTEGRA+DA+DECISAO+QUE+NEGOU+NOVO+JURI+PARA+O+CASAL+NARDONI_68724.shtml Acesso em: 07 Abr 2010.
Notas
[1] Artigo 8º - Garantias judiciais: (...) h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.
[2] Por questões de praticidade, o Protesto por Novo Júri passará a ser identificado neste texto através da sigla PNJ.
[3] Art. 5º, inc. XL, CR – A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
[4] Art. 2º - A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos, realizados sob a vigilância da lei anterior.
[5] Art. 5º, inc. LV da CR – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
[6] Alexandre Nardoni foi condenado à pena de 31 (trinta e um) anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime prisional fechado, e à pena de 08 (oito) meses de detenção, pela prática do crime de fraude processual qualificada, a ser cumprida inicialmente em regime semi-aberto. Anna Carolina foi condenada à pena de 26 (vinte e seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime fechado, e à pena de 08 (oito) meses de detenção, pela prática do crime de fraude processual qualificada, a ser cumprida inicialmente em regime semi-aberto.
[7] STF. 5ª T. Recurso Especial 1094482/RJ. Rel: Ministra Laurita Vaz. Julgado em 01 Setembro 2009. Publicado em DJe 03 Novembro 2009. [...] Vale observar que, para a aferição da possibilidade de utilização de recurso suprimido, a lei que deve ser aplicada é aquela vigente quando surge para a parte o direito subjetivo ao recurso, ou seja, a partir da publicação da decisão a ser impugnada. (grifo nosso). Nesta mesma linha, Nestor Távora e Rosmar Antonni (2009, p. 786): “A garantia da irretroatividade da lei penal mais gravosa não pode ser ampliada ao ponto de inviabilizar as reformas processuais penais. O direito ao recurso só surge para o acusado no momento em que este se torna sucumbente, com a data de definição do recurso interponível e seus consectários legais é, portanto, a sentença (não a prática do crime)”.