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Reforma do Judiciário (VI):

Justiça Federal comum e especializada

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01/09/1998 às 00:00
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INTRODUÇÃO

         A linha empreendida no estudo dos Tribunais Superiores será também aplicada no exame da Justiça Federal, para envolver nela tanto a Justiça Federal strictu sensu quanto a Justiça Federal especializada, por seus diversos ramos. O estudo, pois, pretende revolver, no conjunto, as denominadas Justiças do Judiciário da União. Eventuais aspectos concernentes a cada ramo judiciário em especial, se necessários, serão indicados, ainda que a inaceitabilidade de tais argumentos possam prejudicar o raciocínio final que pretendemos desenvolver. Para tanto, diversamente dos demais e anteriores ensaios, iremos ao final estabelecer modelos adequados às situações comuns e às situações particulares que se podem desenvolver, se um ou outro aspecto for recusado num debate amplo, de modo a encontrar, como se pretende com estudos de tal natureza, pontos de consenso para discussão devida da problemática do Judiciário, notadamente agora no campo constitucional das pretendidas reformas institucionais, além de, diferentemente dos anteriores estudos, estabelecer propostas constitucionais segundo o raciocínio lógico empreendido e ainda segundo a viabilidade de aceitação, notadamente considerando o momento político-institucional.

         A Justiça Federal encontra suas origens no Decreto nº 848, de 11.10.1890, expedido em decorrência dos poderes revolucionários da Constituição Provisória da República, editada pelo Decreto nº 510, de 22.06.1890, logo após a proclamação da República, que instituiu, também, a Federação brasileira.

         Se o Estado brasileiro passava a contar com duas esferas de Governo (considerado lato sensu), o Governo Federal e os Governos Estaduais, cada um destes passou a exigir a respectiva instituição do ramo judiciário ao lado dos ramos legislativo e executivo de Governo, seguindo então a linha do modelo constitucional norte-americano em que inspirada a Carta da República.

         A conseqüência desta divisão de competências entre os planos federal e estaduais do Judiciário acarretou a distribuição de determinadas matérias consideradas de interesse da União no âmbito da Justiça Federal, ficando a Justiça Local com as competências residuais, como de regra se estabelecera no concernente à distribuição de competências legislativas e de competências executivas, notadamente considerando que apenas mais recentemente o Direito Constitucional brasileiro evoluiu para a ampliação da denominada competência concorrente. A Justiça Federal, que começou apenas com os Juízes Seccionais e substitutos, posicionando-se o Supremo Tribunal Federal, em determinados casos, inclusive conforme a alçada, como Tribunal de Apelação da Justiça Federal, evoluiu de modo a ter instituídos ramos especializados (que persistiram, em determinadas épocas, à própria extinção do ramo comum da Justiça Federal, ou à sua mais radical modificação, quando a jurisdição federal comum em primeiro grau era entregue aos Juízes de Direito das Capitais e apenas a jurisdição federal comum em grau recursal passava ao Tribunal Federal de Recursos então instituído para desafogar o STF da competência recursal ordinária de tais casos), para alcançar o modelo consagrado na Constituição de Outubro de 1988, onde a Justiça Federal encontra os ramos comum (a denominada Justiça Federal, considerada strictu sensu) e especializados (as denominadas Justiça Militar Federal, Justiça do Trabalho e Justiça Eleitoral). Embora pouco enunciada, a Justiça da União congrega, também, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios e os respectivos Juízes de Direito, que embora atuando com a competência residual própria dos Judiciários estaduais, doutro lado tem toda sua estrutura mantida pela União, sem qualquer ingerência do Governo do Distrito Federal (considerado strictu sensu) ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal (Constituição Federal, artigo 21, inciso XIII).

         A disparidade das questões atualmente envolvendo a Justiça da União enseja repensar o modelo.

         No entanto, apenas pensar que problemas se podem resolver com a distribuição de competências à combalida Justiça Estadual é menosprezar alguns aspectos pouco visíveis do problema, e que esperamos evidenciar, tópico a tópico, para cada qual dos ramos do Judiciário da União (a Justiça Federal lato sensu), notadamente em relação aos órgãos de primeiro e segundo grau, ante o estabelecimento anterior de entendimento do ensaio relativo aos Tribunais Superiores (vide Reforma do Judiciário (V): Tribunais Superiores). Igualmente, federalizar toda a prestação jurisdicional, com a devida vênia das opiniões discordantes, é menosprezar as peculiaridades regionais e locais e notadamente a própria Federação brasileira que, embora permeada por vícios centralizadores, ainda consegue suportar, num e noutro aspecto, temas restritos ao âmbito dos respectivos Estados. Ademais, muitas das críticas ao Judiciário podem, numa análise mais isenta, ser inclusive creditada à federalização incipiente do Judiciário, tanto assim que a própria Constituição atualmente não enverga nos capítulos próprios de Estados e do Distrito Federal (embora certo que quanto a este a União avocou para si o Judiciário, que assim também é integrado por magistrados federais com competência local similar aos congêneres estaduais), regras pertinentes ao respectivo Poder Judiciário local, o qual é apenas disciplinado no capítulo do Poder Judiciário, dentro do título destinado à organização dos Poderes da União. A correção de tais regramentos, sem, logicamente, perder de vista garantias à magistratura local, ainda que por invocação de parâmetros federais, pode propiciar uma melhoria na estruturação judiciária, inclusive pelo devido posicionamento dos magistrados estaduais como órgãos de Poder do respectivo Estado-Membro.

         Que fique claro, contudo, desde logo, que se temos defendido a centralização das estruturas judiciárias, no sentido de apenas haver a Justiça Federal e as diversas Justiças Locais, doutro lado arduamente defendemos a especialização destas estruturas, sem que para tanto se faça necessária a criação de Justiças especializadas, mas quando muito se proceda à especialização de Juízos e Tribunais de determinado Judiciário. Com isto, diminui-se a burocracia forense necessária à administração de Cortes estratificadas em estruturas estanques, não comunicáveis umas com as outras, eis que toda a estrutura judiciária passa a ter um ponto de comando único, afastando-se assim, inclusive, algumas das críticas que hoje cercam o Judiciário. O modelo ao final proposto como resultado do estudo da Justiça Federal, se não é perfeito, como nada que aqui se escreve pretende a tanto ser alçado, ao menos, cremos, permite a demonstração de que a unificação das Justiças não significa a não especialização dos seus Juízes e Tribunais. Tal linha, inclusive já havia sido indicada quando do estudo do Conselho da Justiça Federal, ampliado em alcance (vide Reforma do Judiciário (II): Controle Externo — Alternativas), em que se vislumbra uma nova posição para tal órgão, ao lado do Supremo Tribunal Federal, como efetivo Conselho de administração de todo o Judiciário da União, inclusive para situar o Presidente de tal Conselho como efetivo representante e chefe do Poder Judiciário Federal — a tal modo, os enfoques de administração da Justiça, por já delineados em tal estudo, ficam baseados naqueles traçados preliminares, ao que invocamos reportagem, a fim de permitir maior fluidez no desenvolvimento das linhas específicas deste ensaio.

         Como se está a enunciar preceitos relativos à Justiça Federal, comum e especializada, de Primeiro e Segundo Graus, cabe igualmente invocar os estudos já realizados na série relativa à reforma judiciária, concernente à presença de advogados e de membros do Ministério Público nos Tribunais de segundo grau, eis que o critério vocacional há que ser considerado como elemento restritivo a tal participação, que, fora os méritos que muitos de tais representantes acabam por levar às Cortes, igualmente outros muitos problemas são gerados, inclusive nos seios de tais representações pela busca de indicações às listas, maculando a própria isenção que os Tribunais devem ter ao restringir as listas a tríplices, notadamente sendo tal desvio verificado nos âmbitos locais e regionais, pelo que apenas admitimos tal presença, por mais ilustre que possa ser, nos Tribunais Superiores, onde a própria característica enseja o reconhecimento nacional do brilhantismo do advogado ou do procurador indicado, e cuja própria experiência exigida para a indicação restrita a Corte de tal porte denota venha uma condução à posição de magistrado de Tribunal Superior como coroamento de uma carreira, seja na Advocacia, seja no Ministério Público (vide nosso Reforma do Judiciário (III) — Magistratura: Relações Internas e com a Sociedade).


JUSTIÇA FEDERAL (STRICTU SENSU)

         A denominada Justiça Federal (comum), em verdade Justiça Federal strictu sensu porque também integram a Justiça Federal os ramos especializados denominados por Justiça Eleitoral, Justiça do Trabalho e Justiça Militar (tanto mais porque federal vem de união, aliança, e é inadequado distinguirmos Justiça Federal de Justiça da União, porquanto sinônimos) vem definida constitucionalmente nos artigos 106 a 110 da Constituição Federal.

         Inicialmente o que pode parecer um absurdo se consagra como regra das mais adequadas possíveis: a Justiça Federal comum se firma, ao contrário dos ramos especializados do Judiciário da União, apenas em dois graus de jurisdição — os Juízes Federais (titulares e substitutos) e os Tribunais Regionais Federais. Isto porque se tem verificado em vários estudos que a implementação de inúmeras instâncias e graus recursais acarreta apenas e sobretudo a desacreditação do Judiciário pelo assoberbamento de feitos para a mesma controvérsia e o dispêndio de tempo desnecessário à esperada solução das controvérsias submetidas à tutela jurisdicional. Tal aspecto inclusive já também delineei ao proceder ao estudo das posições especiais do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores (vide Reforma do Judiciário (IV): o Supremo Tribunal Federal e Reforma do Judiciário (V): os Tribunais Superiores), a que nos reportamos.

         Alguns podem se apressar a indicar o Superior Tribunal de Justiça como órgão de terceira instância da Justiça Federal, mas a leitura mais atenta da Constituição denota que tal Corte Superior foi instituída pela Constituição de 1988 como Tribunal da Federação, assumindo as funções em tal nível antes atribuídas ao Supremo Tribunal Federal, além de outras, sem denotar, contudo, que a existência de competência recursal sobre decisões emanadas dos Tribunais Regionais Federais acarrete tal aspecto, porquanto se não também haveria que se compreender que o STJ figura igualmente como Tribunal integrante dos Judiciários locais, eis que igualmente ao mesmo se submetem decisões emanadas dos Tribunais de Justiça, dos Tribunais de Alçada e dos Tribunais de Justiça Militar. Se é certo que o Conselho da Justiça Federal atua na coordenação e supervisão administrativo-financeira da Justiça Federal (comum) de Primeiro e Segundo Graus e tem funcionamento junto ao Superior Tribunal de Justiça, que lhe empresta cinco de seus Ministros para compor o Colegiado junto com os cinco Presidentes de Tribunais Regionais Federais, tal não altera a definição do STJ como órgão integrante do Judiciário da União ao lado do Supremo Tribunal Federal, distinguidos como Cortes especiais de alcance nacional. A compreensão do fenômeno retrocede à criação do STJ e dos TRFs, aquele com parte de seus primeiros Ministros oriundos do extinto Tribunal Federal de Recursos, enquanto estes a receber a competência própria de Corte de Apelação do extinto TFR — tal situação ensejou que o STJ anomalamente tivesse ingerências no CJF, como o pai que não aceita a independência dos filhos, eis que muito mais adequado teria sido a instituição de tal Conselho da Justiça Federal, na acepção firmada pela Constituição, apenas junto aos respectivos Tribunais Regionais Federais. Na verdade, se a concepção inicial do Conselho da Justiça Federal era a de criar disciplinamentos pertinentes à Justiça da União, melhor seria que, então, o Conselho funcionasse junto ao Supremo Tribunal Federal e pudesse, assim, gerenciar as questões administrativo-financeiras envolvendo o próprio STF, os Tribunais Superiores e as diversas Justiças Federais — a crítica perdura, inclusive porque se há que verificar que tal similar estrutura não restou também constitucionalmente prevista para a Justiça do Trabalho e para a Justiça Eleitoral, assumindo os respectivos Tribunais Superiores funções próprias do CJF, embora quando ainda restrita a Justiça Federal comum aos Juízes Federais e ao Tribunal Federal de Recursos, único, também existia o Conselho, a demonstrar, pois, que não foi o fato da instituição do STJ que justificou que apenas a Justiça Federal comum fosse provida de tal órgão coordenador e supervisionador.

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         A Justiça Federal (comum) teve por competência definida genericamente as causas que envolvem o interesse federal direto, através da participação processual da União e de suas autarquias, fundações e empresas públicas, ou do Ministério Público Federal, inclusive assim para os crimes definidos como federais por transpostas suas conseqüências abstratamente consideradas dos limites do território nacional ou dos limites dos territórios estaduais, ou indireto, como nos casos que envolvem discussão de tratados e contratos internacionais firmados pela União e as causas em que partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, fiando ressalvadas do espectro competencial definido nos artigos 108 e 109 da Constituição apenas as causas que encontram tema próprio de discussão na Justiça Eleitoral, Justiça do Trabalho, Justiça Militar ou Justiça Local (esta nos especialíssimos casos de falências e de acidentes de trabalho).

         Nesta repartição de competências próprias dos Estados federados, à Justiça Local remanesceram as questões não indicadas como de competência da Justiça Federal strictu sensu e igualmente das denominadas Justiças Federais Especializadas.

         Ao longo do tempo, diversas questões têm migrado da competência residual dos Judiciários locais para fixar-se na Justiça Federal, num reconhecimento seja do interesse direto ou indireto da União em tais controvérsias, seja na capacidade ímpar desta de gerir tais Juízos envolvidos de especiais causas.

         Com isto, verifica-se que a unificação das competências da Justiça Federal num único elenco constitucional, e a possibilidade de instalação de Juízos e Tribunais especializados, mas não de estruturas próprias de Justiças Especializadas, essencialmente burocratizadas e caras ao contribuinte, podem permitir um avanço na prestação jurisdicional, inclusive pelo desafogo de determinadas questões hoje submetidas à Justiça Local, que, ao contrário do que outros têm defendido, em muitos Estados não detém condições de ampliação para absorver outras questões tuteláveis, embora, em assim sendo, possa absorver a competência excepcional nas comarcas desprovidas de Juízos Federais, de modo a preservar o interesse maior do jurisdicionado na célere solução das controvérsias. Notamos que a própria Justiça Federal strictu sensu já se reparte, hoje, em Varas Cíveis, Varas Criminais, Varas Previdenciárias e Varas de Execuções Fiscais, e não seria, pois, difícil também defender que tais também se constituíssem como ramos judiciários organizados em separado — contudo, a multiplicação da burocracia necessária a tanto, se de logo não recomenda tal desiderato, igualmente indica a necessidade de centralização da estrutura administrativa necessária ao Judiciário, onde Juízos e Tribunais especializados não necessariamente conduzam a Judiciários Especializados.

         Por tais envolvimentos, várias questões devem ser discutidas sem maiores emoções.

         O primeiro debate envolve o tema das exceções competenciais registradas no atual inciso I do artigo 109 da Constituição Federal, quando afasta da Justiça Federal as causas de falência, de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

         De início cabe notar que o constituinte apenas excepcionou as causas cíveis de falência, sem fazer o mesmo com as questões criminais concernentes à falência, eis que o inciso IV do referido artigo 109 constitucional não insere igual ressalva; a tal modo, o crime relacionado à falência de uma empresa pública federal, por exemplo, estará inserida na competência da Justiça Federal, por conta do inciso IV do artigo 109, enquanto a própria falência, no âmbito cível, se perfaz deslocada, aliás indevidamente, para a Justiça Local. Notamos isto porque a falência, num conceito simples, mas aceitável, envolve a execução conjunta de credores contra determinada pessoa jurídica empresarial devedora e insolvente, numa efetiva reunião de tais execuções numa única relação processual e perante um único Juízo, embora tal critério de universalidade decorra mais da legislação processual pertinente do que de qualquer regra constitucional, que não empresta tal amplitude ao Juízo Falencial. Ocorre que eventuais execuções contra empresas públicas federais tramitam regularmente pela Justiça Federal, não havendo razões de lógica processual que eventualmente passem ao âmbito da Justiça Local, apenas pelo fato de reunião motivada por pedido de falência, o que inclusive já se tem admitido na doutrina quanto às mesmas. Assim, melhor seria que a Justiça Federal resolvesse todos os incidentes relacionados às falências de empresas públicas, por equivocada a ressalva do inciso I do artigo 109 da Constituição, inclusive porque no âmbito criminal relativo à falência tal ressalva não se fez inserida, e não se pode estender ressalva própria do âmbito cível para o campo de dispositivo inserido no inciso IV do artigo 109 da Carta Federal, de âmbito criminal.

         Outra ressalva que merece discussão é a relativa a causas de acidentes de trabalho. Cabe notar que, neste particular, pretendeu a Constituição ressalvar as causas de seguridade fundadas em acidente de trabalho e que têm num lado da relação processual a autarquia previdenciária envolvida com tais seguros, retirando-a do campo normal das questões previdenciárias federais. Muitas das justificativas para tal exceção vêm do fato de que assim se poderia ter maior amplitude da prestação jurisdicional por maior proximidade do Juízo ao jurisdicionado. Ocorre que tal maior proximidade vem acompanhada, também, de maiores dificuldades para o Juiz de Direito, envolvido com questões de diversos temas processuais e materiais, enquanto o Juiz Federal corriqueiramente já se perfaz, diuturnamente, envolvido com as questões previdenciárias em geral, não sendo justificável que um tema em particular lhe seja excluído. A própria proximidade, aliás, já se vê suplantada como justificativa eis que os foros descentralizados da Justiça Federal (as denominadas Varas Federais do interior) têm sido cada vez mais implantadas, e, ainda quando assim não é, notadamente pela dimensão continental do Brasil, há sempre a hipótese de invocação da regra do parágrafo 3º do artigo 109 da Constituição, que permite à Justiça Estadual, por competência federal investida em ampliação da competência estadual normal, julgar as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado ou beneficiário, no domicílio destes últimos, sempre que a comarca não seja sede de vara do Juízo Federal. Regras, portanto, plenamente aplicáveis às causas de acidente do trabalho que, em suma, são desdobramentos apenas das questões previdenciárias. Não se pode, igualmente, invocar que tal exceção faz permitida a instituição de Varas de Acidentes de Trabalho pelas Justiças Locais com competência também para o julgamento de causas envolvendo o fato acidente laboral quando envolvidos na relação processual empregador e trabalhador, por invocação de responsabilidade direta daquele, em pleito indenizatório, eis que para tanto a regra do artigo 114 da Constituição Federal não mereceu, ao contrário do artigo 109, qualquer ressalva, como antes ocorria no regime constitucional pretérito, havendo que se considerar, sempre, que a Justiça do Trabalho não tem competência delimitada pelo direito laboral, como pensam alguns, eis que nada alude a tanto a Carta Política vigente, tendo, sim, competência geral para as questões envolvendo os partícipes da relação empregatícia, nesta condição considerados, além de outras causas decorrentes da relação laboral, neste caso havendo lei federal autorizadora, ainda que as questões desloquem a discussão da Consolidação das Leis do Trabalho para o Código Civil ou legislação especial, aliás cotidianamente examinada pelos Juízes do Trabalho (vide nosso Dano Material, Dano Moral e Acidente de Trabalho na Justiça do Trabalho).

         As exceções concernentes à Justiça do Trabalho e à Justiça Eleitoral serão adiante tratadas.

         Por fim, quanto à Justiça Federal há que se implementar a possibilidade de instituição de Juizados Especiais Cíveis e Criminais também em seu âmbito, porquanto, como na Justiça Comum Local, há causas que merecem tratamento diferenciado pelo âmbito da controvérsia ou do valor da causa, ou ainda, no caso de infrações criminais, pelo potencial ofensivo oferecido. Neste sentido, logicamente, em se tratando de questões não-criminais a alteração passa, também, pela alteração do dispositivo relativo ao precatório, eis que ilógico admitir-se que causas pequenas tenham rápida solução na fase de conhecimento sem igual rapidez na fase executória, notadamente porque, em regra, em tais casos se discutem alimentos ou verbas essenciais ao cidadão, cuja procrastinação pelo Poder Público, ainda que involuntariamente pela sistemática exigida pelo precatório, conduz à injustiça das decisões adotadas, pelo tempo que passa a ser exigido para sua efetividade.

         No campo dos Tribunais Regionais Federais, sem deixar de fazer a crítica à infeliz denominação eleita pelo constituinte de 1987 (eis que regional se contrapõe ao conceito de federal, cujo sentido ultrapassa aquele), a permissibilidade de especialização interna denota forte argumento em prol do que se pretende defender neste ensaio, quanto à possibilidade de esgotamento das possibilidades de especialização no âmbito de um mesmo Tribunal, para apenas depois partir para eventuais Tribunais propriamente especializados, dado que em regra os atuais Tribunais Regionais Federais se mostram divididos em Seções e Turmas especializadas, seguindo, aliás, o modelo que se consagrara no extinto Tribunal Federal de Recursos e que mostrou adotado, também, com maior amplitude e sucesso, no atual Superior Tribunal de Justiça.

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Sobre o autor
Alexandre Nery de Oliveira

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO). Pós-Graduado em Teoria da Constituição. Professor de Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Alexandre Nery. Reforma do Judiciário (VI):: Justiça Federal comum e especializada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 26, 1 set. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/219. Acesso em: 24 abr. 2024.

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