5 – CRÍTICAS. Análise do posicionamento doutrinário e da Jurisprudência. INADEQUAÇÃO DO ATUAL POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
Neste capítulo será analisada a posição da doutrina e da jurisprudência, confrontando a o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça com as decisões das Cortes Regionais, do próprio STJ e a posição da grande parte da doutrina.
O ilustre jurista Hugo de Brito Machado, citado por João Claudio Franzoni Barbosa[11] muito bem diferenciou a compensação prevista nos artigos 170 e 170-A e a compensação prevista na Lei 8.383/91, vejamos:
“É importante esclarecer que a Lei nº 8.383/91 cuidou da compensação de forma diversa da prevista no art. 170 do Código Tributário Nacional, sendo importantes as diferenças entre duas prescrições normativas.
No art. 170 do Código cuida-se de compensação de créditos tributários, com créditos de qualquer natureza, desde que líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo com a Fazenda Pública. Objetos da compensação, neste caso, são, de um lado, um crédito tributário, que é por natureza líquido e certo, posto que constituído pelo regular procedimento administrativo do lançamento; e do outro, um crédito que o sujeito passivo daquela relação tributária tem junto a um devedor qualquer, que pode ser a própria Fazenda ou terceiro. O titular deste crédito está, em princípio, obrigado a comprovar essa titularidade, assim como a liquidez do crédito, contra devedor idôneo.
Na Lei nº 8.383/91, a compensação autorizada é apenas de créditos do contribuinte, ou responsável tributário, contra a Fazenda Pública, decorrente de pagamento indevido de tributos ou contribuições federais, com tributo da mesma espécie, relativo a períodos subseqüentes. Objeto da compensação, neste caso, são, de um lado, um futuro crédito tributário, e não um crédito tributário já constituído, posto que relativo a período futuro; e de outro, um crédito que o sujeito passivo da relação tributária tem perante a Fazenda Pública, em decorrência de pagamento indevido de tributo. Não se há de cogitar, portanto, de idoneidade do devedor que a própria Fazenda, nem de qualificação do crédito como líquido e certo. Basta o reconhecimento de que o pagamento do tributo se fez indevidamente. E tal reconhecimento pode ter havido em decisão anterior, ou efetivar-se em face de ação movida pelo interessado para ter reconhecido o seu direito a compensação”.
Tal distinção é de extrema importância, para que possa se distinguir as duas modalidades de compensação. Resta cristalino que os comandos contidos nos artigos 170, 170-A do CTN e o artigo 66 da Lei 8.383/91 são totalmente distintos. Corroborando este entendimento, Alexandre Macedo Tavares[12] pontua que:
...a compensação prevista no artigo 170 do Código Tributário Nacional retrata realidade jurídica inconfundível e diametralmente oposta àquela consagrada pelo art. 66 da Lei nº 8.383/91. Ao passo que a primeira é norma dirigida à autoridade administrativa e pressupõe a existência de créditos tributários líquidos e certos devidamente constituídos pela regular atividade administrativa de lançamento; a segunda prescrição normativa constitui norma dirigida ao contribuinte, viabilizadora da utilização do procedimento compensatório no âmbito do lançamento por homologação, em decorrência de um recolhimento indevido ou a maior de tributos.
O Superior Tribunal de Justiça acatava tal entendimento e corroborava esse posicionamento, conforme se observa no julgamento do Recurso Especial nº 83.946 de Minas Gerais, vejamos:
TRIBUTARIO. COMPENSAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PARA O FINSOCIAL E CONTRIBUIÇÃO PARA O COFINS. POSSIBILIDADE. LEI N. 8.383/91, ART. 66. APLICAÇÃO.
I - Os valores excedentes recolhidos a titulo de Finsocial podem ser compensados com os devidos títulos de contribuição para o Cofins.
II - Não ha confundir a compensação prevista no art. 170 do código tributário nacional com a compensação a que se refere o art. 66 da lei 8.383/91. a primeira e norma dirigida a autoridade fiscal e concerne a compensação de creditos tributários, enquanto a outra constitui norma dirigida ao contribuinte e e relativa a compensação no âmbito do lançamento por homologação.
III - A compensação feita no âmbito do lançamento por homologação, como no caso, fica a depender da homologação da autoridade fiscal, que tem para isso o prazo de cinco anos (CTN, art. 150, parágrafo 4º). durante esse prazo, pode e deve fiscalizar o contribuinte, examinar seus livros e documentos e lançar, de oficio, se entender indevida a compensação, no todo ou em parte.
IV - Recurso especial conhecido e provido, em parte.
(REsp 82.038/DF, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/06/1996, DJ 01/07/1996, p. 24035)(grifo nosso)
Conforme se infere, o próprio Superior Tribunal de Justiça já fazia a distinção entre a compensação prevista no Código Tributário Nacional e a prevista na Lei 8.383/91. A principal distinção é que a compensação do código é dirigida a Autoridade Fiscal e a compensação da lei ao Contribuinte.
Hugo de Brito Machado[13] já tecia críticas a jurisprudência e aos operadores do direito, pela confusão feita acerca do artigo 66 8.383/91 e a compensação prevista no artigo 170 e 170-A do Código Tributário Nacional, vejamos:
“Talvez por confundirem a compensação a que se reporta o Código Tributário Nacional, com aquela autorizada pelo art. 66 da Lei nº 8.383/91, e por desatenção à figura do lançamento tributário, muitos Juízes deixam de assegurar o direito à compensação de tributos pagos indevidamente, ao argumento de que a mesma pressupõe a liquidez e certeza dos créditos a serem compensados, sendo impossível ao Judiciário conceder liminar para que o contribuinte realize a compensação de foram unilateral”.
Observar-se que a crítica do eminente autor aplica-se de maneira total e completa ao atual posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, visto que este Tribunal não observou tal distinção no julgamento, contribuindo assim para um grande retrocesso jurisprudencial em desfavor do Contribuinte. A impropriedade da recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pode ser verificada, ao igualar a compensação prevista no artigo 170 e 170-A do Código Tributário Nacional e a compensação prevista do artigo 66 da Lei 8.383/91.
Outro importante ponto a ser frisado é a não observância, por parte do STJ, ao fato de que nas compensações no âmbito do lançamento por homologação (art. 66 da Lei 8.383/91) não se aplicam as regras do Código Tributário Nacional.
Como visto, a compensação no âmbito do lançamento por homologação, por si só, não tem o condão de extinguir o crédito tributário, pois para que isto se opere, é necessário a homologação da compensação, que somente por ser feita pelo Fisco. Sufragando tal entendimento, assim leciona Eduardo Marcial Ferreira Jardim[14]: “Como sabido e ressabido, o aludido regime jurídico é aquele aplicável aos tributos cuja apuração, declaração e recolhimento são de iniciativa do contribuinte, cabendo à Fazenda Pública tão-somente receber e promover a chamada homologação tácita, salvo hipótese de revisão e eventual lançamento complementar dentro do lapso decadencial”.
Como se não bastasse, a Lei nº 8.383/91, em seu art. 66, trata de uma modalidade de compensação passível de ser realizada pelo Contribuinte no âmbito do lançamento por homologação, sujeita a posterior fiscalização. O art. 170 do Código Tributário – e seu apêndice, o artigo 170-A - cuidam de outra modalidade de compensação, realizada diretamente pelos agentes fiscais a pedido do contribuinte, e que extingue o crédito tributário (já constituído, portanto), nos termos do art. 156, II, do CTN e da inestimável lição do eminente tributarista HUGO DE BRITO MACHADO[15].
Portanto, não se aplica o regime dos artigos 170 e 170-A do CTN as compensações no regime do lançamento por homologação (autolançamento), previsto no art. 66 da Lei nº. 8.383/91.
Neste enfoque, também se percebe que a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é imprópria, pois também não observou esta particular diferença entre os regimes de compensação e foi de encontro à jurisprudência já pacífica da corte e ao entendimento da doutrina.
O posicionamento anterior da Corte maior de Justiça era no sentido de garantir ao contribuinte, nos caso de compensação no âmbito do lançamento por homologação, um verdadeiro direito subjetivo a compensação, não se aplicando as regras contidas no Código Tributário, principalmente a prevista no artigo 170-A.
Note-se que a distinção entre os regimes de compensação em debate tem sido perfeitamente destacada pelo Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. PIS. RESTITUIÇÃO. PRESCRIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. ART. 170-A DO CTN. NÃO-INCIDÊNCIA. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. TAXA SELIC. APLICAÇÃO DO ART. 39, § 4.º, DA LEI N. 9.250/95. SÚMULA N. 83/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICES.
1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 435.835-SC (relator para o acórdão Ministro José Delgado), firmou o entendimento de que, na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo para a propositura da ação de repetição de indébito é de 10 (dez) anos a contar do fato gerador, se a homologação for tácita (tese dos "cinco mais cinco"), e, de 5 (cinco) anos a contar da homologação, se esta for expressa.
2. O art. 170-A do CTN não deve ser aplicado ao presente caso, uma vez que se trata de compensação de tributo sujeito a lançamento por homologação, em que a Fazenda Pública terá o prazo de 5 (cinco) anos para fiscalizar a compensação efetuada pelo contribuinte e, se for o caso, poderá proceder ao lançamento de ofício das diferenças indevidamente compensadas.
(...)
(REsp 612324/AL, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2004, DJ 13/09/2004, p. 217)(grifo nosso)
Neste mesmo sentido:
TRIBUTÁRIO. PIS. DECRETOS-LEIS 2.445/88 E 2.449/88. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. COMPENSAÇÃO COM OUTROS TRIBUTOS. ART. 74, DA LEI N.º 9.430/96, COM REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI N.º 10.637/02. JUROS DE MORA. SELIC. COMPENSAÇÃO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA. ART. 170 - A. NÃO INCIDÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. EXPURGOS. CRÉDITO LÍQUIDO E CERTO. DESNECESSIDADE.
(...)
8. "A compensação no âmbito do lançamento por homologação não necessita de prévio reconhecimento da autoridade fazendária ou de decisão judicial transitada em julgado, para a configuração da certeza e liquidez dos créditos" REsp 129.627/PR, Rel. Min.
Francisco Peçanha Martins, DJU 25.10.99.
9. A averiguação da liquidez e certeza dos créditos e débitos compensáveis é da competência da Administração Pública que fiscalizará o encontro de contas efetuado pelo contribuinte, providenciando a cobrança de eventual saldo devedor.
10. Não se aplica à hipótese dos autos a regra do art. 170 - A, do CTN, já que não pretende o particular a compensação de valores exatos, mas a compensação no âmbito do lançamento por homologação, em que terá a Fazenda Pública o prazo de cinco anos para fiscalizar o procedimento compensatório levado a cabo pelo contribuinte e, se for o caso, lançar de ofício diferenças compensadas a maior.
11. Recurso Especial da Fazenda Nacional improvido. Recurso Especial do contribuinte parcialmente provido.
(REsp 555058/PE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/10/2003, DJ 25/02/2004, p. 162)
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUTÔNOMOS. ADMINISTRADORES.
AVULSOS. COMPENSAÇÃO. LEIS Nº 9.032/95 E 9.129/95. LIMITES DE 25% E 30%. ARTIGO 170-A. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. VIOLAÇÃO A PRECEITOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE.
I (...)
II- Não se aplica o artigo 170-A à hipótese dos autos, uma vez que a contribuinte não pretende a compensação de valores exatos, mas a compensação no âmbito do lançamento por homologação. "É possível o reconhecimento da possibilidade de realizar a auto-compensação antes do trânsito em julgado da sentença, no âmbito do lançamento por homologação. Assim, o contribuinte declarará o quê e quanto vai compensar, cabendo à Fazenda Pública, no prazo facultado pela lei, fiscalizar o procedimento, e, se preciso, lançar de ofício diferenças compensadas a maior. Recurso especial conhecido em parte e provido" (REsp nº 413.668/RS, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 01/02/2005, p. 473).
III - É vedado a esta Corte analisar suposta violação a preceitos constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento.
IV - Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 714443/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 06/06/2005, p. 220)
Resta cristalino que a distinção entre as regras do Código e da Lei eram extremamente clara, não se confundindo, mas coexistindo como direitos autônomos.
Impende destacar destes julgados que a Corte de Justiça inclusive estabeleceu a regra de como deve ser feita a compensação por parte do Contribuinte e como deve o Fisco proceder na efetivação desta compensação. O contribuinte, por sua conta e risco, efetua a compensação e o fisco verifica a sua regularidade. Os referidos decisum corroboram a tese aqui sustentada e se mostram adequados ao tratar de maneira isonômica o Fisco e o Contribuinte.
Assim, fica evidente a impropriedade do recente julgado do STJ, pois em um primeiro momento percebia-se por porte da Corte uma clara diferenciação e distinção das regras sobre compensação. Contudo no seu atual posicionamento a Corte pôs fim a tal diferenciação sem sequer fazer qualquer debate ou menção a esta diferenciação.
Outra crítica que deve ser adicionada ao Superior Tribunal de Justiça é acerca da possibilidade de compensação de créditos decorrentes de tributos que já foram declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal – STF. Nestes casos, o STJ recentemente afirmou que, mesmo havendo declaração de inconstitucionalidade do tributo, o Contribuinte terá que aguardar o prévio trânsito em julgado do seu processo para só assim poder ter seu patrimônio reconstituído. Com respeito, parece absurdo tal entendimento, justo por que os Tribunais Regionais vinham afastando as restrições do Código Tributário.
Neste sentido, o Tribunal Regional Federal da Primeira Região – TRF-1, já se manifestava de maneira favorável ao Contribuinte, afastando as regras do Código Tributário, vejamos:
TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO. COFINS. LEI 9.718/98. RECEITA BRUTA. FATURAMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO. ATUALIZAÇÃO.
(...)
5. A vedação disposta no artigo 170-A do Código Tributário Nacional funda-se em tributo contestado, todavia, se o STF já declarou a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei 9.718/98, não há que se falar em contestação judicial da norma e, por conseguinte, tal restrição à compensação não se aplica aos autos.
6. Apelação da impetrante parcialmente provida, para afastar dos autos a restrição disposta no art. 170-A do CTN.
7. Apelação da Fazenda Nacional e remessa improvidas.
(AMS 2006.37.00.003671-2/MA, Rel. Desembargador Federal Leomar Barros Amorim De Sousa, Conv. Juiz Federal Roberto Carvalho Veloso (conv.), Oitava Turma,DJ p.99 de 14/11/2007)(grifos nossos).
Neste mesmo sentido, o TRF-1, em recente julgado, afirma que o Fisco não pode alegar sequer a ausência do trânsito em julgado para negar a compensação, nos casos de declaração de inconstitucionalidade do tributo que originou o crédito, vejamos:
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS. DECRETOS-LEIS NS. 2.445/88 E 2.449/88. FINSOCIAL. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. DECISÃO JUDICIAL NÃO TRANSITADA EM JULGADO. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. Reconhecido o direito do contribuinte à compensação de valores indevidamente recolhidos, em sede mandamental, não pode o Fisco alegar ausência do trânsito em julgado da respectiva decisão para negar-lhes a homologação da compensação realizada. Não se aplica, in casu, o art. 170-A do CTN, em face da declaração de inconstitucionalidade dos Decretos-leis 2.445 e 2.449/88 pelo STF.
(...).
4. Apelação da Fazenda e remessa oficial improvidas.
(AMS 2006.36.00.016648-6/MT, Rel. Desembargador Federal Leomar Barros Amorim De Sousa, Oitava Turma,e-DJF1 p.311 de 24/07/2009)(grifo nosso)
Conforme se infere, a Corte Regional embasa todo seu entendimento no sentido de afastar a incidência do art. 170-A do CTN quando há declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal – STF. Entendimento que, ao que leciona a melhor doutrina, é o mais acertado e caminha em sentido oposto a jurisprudência recente do STJ.
Confirmando a tese da inaplicabilidade do artigo 170-A do CTN no caso de compensação de tributos que já foram declarados inconstitucionais, o Tribunal Regional Federal da Terceira Região – TRF-3, também se manifesta de maneira favorável ao Contribuinte, vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR AFASTADA. APELAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL PARCIALMENTE PREJUDICADA. ERRO MATERIAL. TRIBUTÁRIO - FINSOCIAL - INCONSTITUCIONALIDADE DAS MAJORAÇÕES DE ALÍQUOTA. COMPENSAÇÃO APENAS COM A CSSL E A COFINS.
1- A ação que visa à compensação tributária tem natureza de obrigação de não fazer, pois objetivam impedir que a Fazenda Pública pratique atos que impeçam a realização do procedimento compensatório nos moldes requeridos pelo autor, na medida em que, nos termos art. 66 da Lei 8.383/91, este ato deve ser realizado por conta e risco do mesmo.
(...)
8. No que tange ao artigo 170-A do CTN, seguindo orientação firmada recentemente por esta Turma, cumpre ressaltar que tratando-se de exação cuja inconstitucionalidade já foi amplamente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, não há que se aguardar o trânsito em julgado para efetuar a compensação, pois não se vislumbra mais a possibilidade de reforma neste aspecto.
9. Observar-se-á, a teor do artigo 195 do CTN, o direito da autoridade administrativa em proceder a plena fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem compensados, exatidão de números e documentos comprobatórios, "quantum" a compensar e conformidade do procedimento adotado com os termos da lei nº 8.383/91.
(...).
(AC 1999.61.00.024793-2/SP, Rel. Desembargador Federal Lazarano Neto, Sexta Turma,DJU p.337 de 21/05/2007)(grifo nosso).
Recentemente, a mesma Corte Regional manteve tal entendimento. Vejamos:
TRIBUTÁRIO - PRESCRIÇÃO - TRIBUTOS SUJEITOS À HOMOLOGAÇÃO - PIS E COFINS - LEI 9.718/98 - BASE DE CÁLCULO - PRECEDENTE DO E. STF - COMPENSAÇÃO - POSSIBILIDADE - ART. 170-A - INAPLICÁVEL - CORREÇÃO MONETÁRIA - SELIC.
(...)
2. O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, conheceu do recurso extraordinário nº 357.950/RS e, por maioria, deu-lhe provimento, em parte, para declarar a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, entendimento assentado, que adoto nos estritos limites da decisão proferida.
(...)
5. Inaplicável a disposição contida no art. 170-A do CTN, porquanto a discussão judicial sobre o tema encontra-se superada ante a decisão da Corte Suprema, conforme entendimento firmado nesta Sexta Turma.
(...)
7. Ressalvado o direito da autoridade administrativa em proceder a plena fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem compensados, exatidão dos números e documentos comprobatórios, "quantum" a compensar e conformidade do procedimento adotado com a legislação de regência.
(AMS 2006.61.20.000835-6, Rel. Desembargador Federal Mairan Maia, Sexta Turma,DJF3 CJ1 p.479 de 31/08/2009)(grifo nosso)
Fica claro que a Jurisprudência Pátria dominante caminha em sentido oposto do atual posicionamento do STJ.
De outra forma não poderia ser, pois não há razão para aplicação da aplicação dos arts. 170 e 170-A do CTN, eis que, conforme dito anteriormente, não se trata da compensação disciplinada por estes artigos do Código Tributário Nacional e sim de compensação de tributos sujeito ao lançamento por homologação, ficando, pois, condicionada à homologação pelo Fisco.
Some-se a isso o fato de tratar-se de compensação de exação tributária sem fundamento de validade, maculada pela inconstitucionalidade. Se o Supremo Tribunal Federal – STF se manifesta no sentido de declarar a inconstitucionalidade da norma, não há razão para postergar o direito da Contribuinte em, por sua conta e risco, efetuar o encontro de contas, ficando ressalvado o direito do Fisco em proceder a plena fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem compensados.
Corroborando tal entendimento, assim de posiciona Guilherme Cezaroti[16]:
A vedação à compensação antes do trânsito em julgado tem como objetivo dar segurança a real existência do direito creditório do contribuinte, o que, sob a ótica da Administração Pública, só ocorreria após o trânsito em julgado da decisão final. Após a declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, os pagamentos efetuados pelos contribuintes já passam a ter atributo de indevidos(...).
Ainda que se argumente que a inconstitucionalidade declarada em controle difuso não se prestaria a afastar a incidência da norma para todos indistintamente, esta não é a melhor solução. Compulsando as lições de Rodrigo César Rebello Pinho[17], ao discorrer sobre o controle abstrato das normas pelo Supremo Tribunal Federal, menciona que: “Qualquer que seja a decisão, pela procedência ou não da ação, produzirá eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Uma lei em desacordo com a Constituição quer em sentido formal, quer material, considerando o princípio da supremacia da norma constitucional, é nula, sem qualquer efeito jurídico válido.”
Importante também registrar a lição do Ministro Teori Albino Zavascki[18], segundo a qual "outro efeito importante do reconhecimento incidental da inconstitucionalidade da norma pelo STF é a vinculatividade da decisão para os demais tribunais, superiores e de apelação. "
Nesse sentido, já se posicionou o STJ:
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO CONFIGURADA. PIS. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELAS LEIS 9.715/98 E 9.718/98. CONCEITO DE FATURAMENTO. PRECEDENTES DO STF.
1. Não podem ser desconsideradas as decisões do Plenário do STF que reconhecem constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de diploma normativo. Mesmo quando tomadas em controle difuso, são decisões de incontestável e natural vocação expansiva, com eficácia imediatamente vinculante para os demais tribunais, inclusive o STJ (CPC, art. 481, § único: "Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão"), e, no caso das decisões que reconhecem a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, com força de inibir a execução de sentenças judiciais contrárias, que se tornam inexigíveis (CPC, art. 741, § único; art. 475-L, § 1º, redação da Lei 11.232/05).
(...)
(EDCL no RESP 752136/SP, Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10.04.2007, DJ 26.04.2007)(grifo nosso)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. COFINS E PIS. BASE DE CÁLCULO. CONCEITO DE FATURAMENTO. LEI 9.718/98. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PELO STF.
(...).
3. É devida a aplicação dos precedentes da Corte Suprema, considerando que o recurso extraordinário deve ser visto não só como meio para a defesa de interesses das partes, mas notadamente como forma de tutela da ordem constitucional objetiva, nos termos da lição do eminente Ministro Gilmar Mendes.
(...)
(REsp 648.565/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22.08.2006, DJ 18.09.2006 p. 266)
É fato inconteste, e reconhecido pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, que o julgamento que reconhece a inconstitucionalidade de uma norma, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, ainda que em caso concreto e incidental, tem efeito erga omnes e vinculante.
Depreende-se, destarte, que a declaração de inconstitucionalidade, ainda que em controle difuso, pelo Supremo Tribunal Federal é requisito suficiente para afastar a regra do art. 170-A do CTN, porquanto não mais subsiste discussão acerca da matéria. Ou seja, não há litígio quanto ao reconhecimento dos tributos recolhidos de forma contrária a Constituição Federal.
Com isso percebemos que o Superior Tribunal de Justiça vai de encontro a princípios basilares como o da celeridade e da economia processual e sua própria jurisprudência.
Outro importante ponto que foi omitido no recente julgado do STJ é nos casos no qual a Procuradoria da Fazenda Nacional admite aos seus procuradores que não interponha recursos sobre matérias já pacíficas contra a União. Nem mesmo nesses casos os Contribuintes poderão compensar antes do trânsito em julgado, pois a imprópria decisão do STJ sequer debateu sobre esta possibilidade, contudo proibiu implicitamente tal prática.
A possibilidade de a Procuradoria da Fazenda Nacional dispensar seus procuradores da interposição de recurso é prevista na Lei nº 10.522 de 19 de julho de 2002. O art. 19 da referida Lei autoriza os procuradores da Fazenda Nacional a não interpor recurso ou desistir do que tenha sido interposto em matérias cuja jurisprudência esteja pacífica no âmbito dos Tribunais Superiores, eis o teor:
Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a não contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto, desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão versar sobre: (Redação dada pela Lei nº 11.033, de 2004)
(...)
II - matérias que, em virtude de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, ou do Superior Tribunal de Justiça, sejam objeto de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda.
Infere-se, com isso, que fica autorizado aos procuradores a não contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto em matérias cujo deslinde já tenha se pacificado no âmbito do Supremo Tribunal Federal, ou do Superior Tribunal de Justiça.
A ressalva contida no final do inciso suso mencionado é de que há a necessidade de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda para os procuradores agirem na forma mencionada. Contudo isto é apenas uma orientação, podendo os procuradores interpor os recursos.
Exatamente nesse sentido há uma lista[19] de temas julgados pelo STF sob a forma do art. 543-B do CPC, em que a própria Procuradoria Geral da Fazenda dispõe que não mais será objeto de contestação e recurso, dentre os quais o tema da inconstitucionalidade de tributos é um dos principais.
Diante disto, mais uma vez fica clara a inadequação da recente jurisprudência do STJ, ao sequer analisar no julgado, todas as particularidades inerentes ao instituto da compensação.
Caminhando mais a frente, algumas Cortes Regionais já se posicionavam no sentido de admitir a compensação, mesmo antes do trânsito em julgado, nos casos de a tese defendida pelo Contribuinte estar em consonância com a jurisprudência dominante do Tribunal Superior competente para analisar a matéria e que a vedação a compensação prevista no Código Tributário também não se aplicava ao Mandado de Segurança.
Resta claro e evidente avanço para garantir maior celeridade e isonomia na relação entre o Fisco e o Contribuinte. Nestes decisum não mais seria necessário que o tributo fosse sequer declarado inconstitucional, mas tão somente, que a tese defendida, fosse aquela predominante no Tribunal Superior competente para analisar a matéria em última instância. Percebe-se grande acertamento e respeito aos princípios da isonomia e celeridade.
Neste sentido, o Tribunal Regional da Primeira Região – TRF-1, assim se manifesta, vejamos:
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REMUNERAÇÃO PAGA PELO EMPREGADOR NOS PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AFASTAMENTO DO EMPREGADO POR MOTIVO DE DOENÇA. UM TERÇO DE FÉRIAS. VERBAS DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. EXAÇÃO INDEVIDA. COMPENSAÇÃO. SALÁRIO-MATERNIDADE E FÉRIAS. NATUREZA SALARIAL. INCIDÊNCIA DEVIDA. COMPENSAÇÃO.
(...)
5. A restrição à compensação, prevista no art. 170-A do CTN, não se aplica aos autos, por ter o mandado de segurança, como garantia constitucional, caráter mandamental, que impõe à Administração uma prestação específica, material e in natura, a ser satisfeita de plano, aliado à circunstância de o direito vindicado, no plano infraconstitucional, estar reconhecido por jurisprudência dominante do STJ. Portanto, a rigor, não se pode afirmar que há tributo contestado se o tribunal superior competente já reconheceu a tese do contribuinte.
6. Apelação da impetrante parcialmente provida.
7. Apelação da Fazenda Nacional e remessa oficial improvidas.
(Apelação/Reexame Necessário 2008.33.00.010682/BA, Rel. Desembargador Federal Leomar Barros Amorim De Sousa, Oitava Turma, DJ 11/09/2009))(grifo nosso)
PREVIDENCIÁRIO. FÉRIAS. 1/3 CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. SALÁRIO-MATERNIDADE. PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AFASTAMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
1. Os primeiros quinze dias de afastamento do empregado, por motivo de doença, constituem causa interruptiva do contrato de trabalho, portanto, os valores pagos pelo empregador, nesse período, não têm natureza salarial, mas sim indenizatória, não se sujeitando, à incidência de contribuição previdenciária, que tem por base de cálculo a remuneração percebida habitualmente (arts. 59 e 60, § 3º, da Lei n. 8.213/91).
2. O adicional de 1/3 de férias não integra o conceito de remuneração, razão pela qual não há de se falar em incidência de contribuição previdenciária.
3. O salário-maternidade e as férias integram o salário-de-contribuição, compondo, assim, a base de cálculo da contribuição previdenciária.
4. Apelação do impetrante parcialmente provida para reconhecer a inexistência de relação jurídica que o obrigue ao recolhimento também de contribuição previdenciária sobre os valores pagos a seus empregados a título de 1/3 constitucional de férias, compensando-se, observada a prescrição decenal, com quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, corrigidos pela SELIC, afastada a aplicação do art. 89 da Lei n. 8.212/91 e sem a limitação do art. 170-A do CTN, inclusive quanto ao deferido na sentença (primeiros 15 dias). Apelação da Fazenda e remessa oficial não providas
(Apelação/Reexame Necessário 2008.34.00.004991-5/DF, Rel. Desembargador Federal Osmane Antônio dos Santos (Conv), Oitava Turma, DJ 30/06/2009) (grifo nosso).
Percebe que a posição de vanguarda adotada pelo Tribunal Federal Regional da Primeira Região vai além da declaração ou não de inconstitucionalidade do tributo. Como se verifica, a tese tratada nos dois acórdãos são matérias de cunha infraconstitucional, tendo como tribunal máximo na análise do caso concreto o Superior Tribunal de Justiça – STJ. A discussão de mérito dos Acórdãos é acerca da exigência da contribuição previdenciária patronal sobre verbas que são pagas quando não há contraprestação de trabalho. Como o STJ já se manifestou de maneira totalmente favorável ao contribuinte, o TRF-1 entendeu nesses julgados pela inaplicabilidade das restrições previstas no artigo 170-A do Código Tributário Nacional.
Assim, conclui-se que a atual Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ vai de encontro ao posicionamento dominante das Cortes Regionais bem como da melhor Doutrina. Fere princípios constitucionais, como exemplo o da isonomia, pois o Fisco fica em posição privilegiada para cobrar seus créditos do Contribuinte, via Execução Fiscal, podendo, desde logo valer-se da penhora de bens. Enquanto que do outro lado, o Contribuinte terá que aguardar um longo e demorado processo para ter sua quantia indevidamente paga restituída ou compensada.
Mais ainda, a aplicação do artigo 170-A do Código Tributário Nacional indistintamente a qualquer tipo de compensação, sem observar a particularidade do caso, como decidiu o STJ, é totalmente equivocada.
Nesse sentido explicita João Claudio Franzoni Barbosa:
O absurdo da aplicação do art.170-A a toda e qualquer compensação é tão grande que merece ser melhor detalhado. Imagine-se uma situação em que o Governo Federal edite lei tributária flagrantemente inconstitucional e que, por isso, venha declarada como tal pelo STF. Seria ilógico fazer com que o contribuinte tivesse que aguardar o trânsito em julgado do seu processo para que pudesse compensar aquilo que, durante certo tempo, pagou indevidamente. O contribuinte seria obrigado a esperar por longos e penosos anos para que pudesse utilizar-se do instituto da compensação. Ao revés, a Fazenda Pública encontraria facilidades para fazer “caixa” frente aos seus interesses secundários, contrários, quase sempre, aos interesses da coletividade – primários. Lançaria mão de tributo inconstitucional, arrecadaria por diversos meses até que o STF declarasse a inconstitucionalidade ou o Senado Federal suspendesse a eficácia da norma.
O Contribuinte, ao perceber isso teria que ajuizar uma ação e aguardar longamente por uma decisão judicial definitiva para que pudesse ser ressarcido. Ou seja, os efeitos de uma lei completamente inconstitucional perdurariam por longo lapso temporal, gerando, no mínimo, um enriquecimento indevido por parte do Fisco.
Por tudo que fora exposto, percebe-se a grande impropriedade do Superior Tribunal de Justiça, que privilegia o Fisco em detrimento do já castigado Contribuinte brasileiro, vedando a este a utilização de verdadeiro direito subjetivo a autocompensação de tributos sabidamente indevidos, postergando o exercício de um direito já reconhecido em nome de uma falsa segurança jurídica.