O Sistema de Registro de Preços – SRP consiste no procedimento destinado a atender a situações nas quais a Administração Pública revele necessidade contínua em relação a determinados bens ou serviços a serem adquiridos em contratação realizada a posteriori. Consoante a definição normativa prevista no Decreto nº 3.931/2001, o SRP consiste no conjunto de procedimentos, mediante licitação, para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, destinado a contratações futuras.
O mesmo decreto mencionado possibilitou a extensão da utilização da Ata de Registro de Preços de determinado órgão ou entidade por outro que não tenha participado do Sistema de Registro de Preços, criando, assim, a figura do “carona”. A adesão à Ata de Registro de Preços, por sua vez, é tida como um o ato, por meio do qual um órgão ou entidade da Administração Pública adere à ata elaborada mediante licitação promovida por outro órgão, valendo-se dela como sua fosse.
O Decreto nº 3.931/2001 prevê, em seu art. 8º, a possibilidade de qualquer órgão ou entidade aderir à Ata de Registro de Preços efetivada pela Administração, in verbis:
Art. 8º A Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou entidade da Administração que não tenha participado do certame licitatório, mediante prévia consulta ao órgão gerenciador, desde que devidamente comprovada a vantagem.
§ 1º Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação.
§ 2º Caberá ao fornecedor beneficiário da Ata de Registro de Preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento, independentemente dos quantitativos registrados em Ata, desde que este fornecimento não prejudique as obrigações anteriormente assumidas.
§ 3º As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços.(Incluído pelo Decreto nº 4.342, de 23.8.2002)
Não obstante sua previsão normativa, consoante as disposições acima transcritas, o Tribunal de Contas da União – TCU tem estado atento ao uso indiscriminado da adesão à ARP. De acordo com o TCU, a Administração perde na economia de escala, na medida em que, se a licitação fosse destinada inicialmente à contratação de serviços em montante bem superior ao demandado pelo órgão inicial, certamente os licitantes teriam condições de oferecer maiores vantagens de preço em suas propostas. Sendo assim, a Administração deve aproveitar o Sistema de Registro de Preços para obter preços por atacado, evitando os preços de retalho. Para tanto, tem de estabelecer lotes mínimos que permitam aos potenciais interessados formular a proposta mais vantajosa1.
Entendeu o TCU que a atual regulamentação do Sistema de Registro de Preços, por meio do Decreto n.º 3.931/01, ao permitir a adesão ilimitada de órgãos e entidades às Atas de Registro de Preços, afronta o princípio da competição, uma vez que, a partir de uma única licitação, múltiplos contratos são celebrados, estendendo-se a cada participante o limite de 100% do quantitativo inicialmente registrado. Diante de tal constatação, a Corte de Contas determinou ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, órgão central do sistema de serviços gerais do Governo Federal, que reavalie as regras atualmente estabelecidas para o registro de preços, de forma a estabelecer limites para a adesão, pelos órgãos e entidades, aos registros de preços realizados por outros, visando preservar os princípios que norteiam a Administração Pública.
A despeito da preocupação constante com o uso ilimitado da adesão pela Administração Pública, convém observar que certas demandas administrativas diferem dos pressupostos então analisados pelo TCU, quando da lavratura do referido acórdão.
Em muitas demandas da Administração, os materiais/equipamentos e serviços são solicitados pela área técnica responsável em quantidade inferior aos quantitativos máximos previstos na Ata de Registro de Preços à qual se adere. Por conseguinte, deduz-se que o órgão licitante, autor da ata, tendo em vista a superior quantidade licitada, tem condições de obter preços mais vantajosos.
Ademais, a utilização da adesão à ARP pode não se revelar indiscriminada, mas justificada por circunstâncias que revelem ser a adesão a opção mais econômica para a Administração, quando houver motivação expressa em tal sentido.
Posto isso, importa verificar, em cada caso concreto, a implementação das condicionantes estabelecidas na normativa aplicável à adesão à ARP, consoante a observância dos seguintes requisitos:
a) interesse do órgão não participante (carona) em utilizar Ata de Registro de Preço realizada por outra entidade;
b) avaliação interna do órgão não participante (carona) de que os preços e condições do SRP são efetivamente vantajosos, justificando sua conduta;
c) consulta prévia e concordância do órgão realizador da Ata de Registro de Preços;d) concordância do fornecedor da contratação pretendida pelo carona, desde que não prejudique os compromissos anteriormente assumidos;
e) devem ser mantidas as mesmas condições contratuais do registro, ressalvadas eventuais peculiaridades necessárias do órgão “carona”.
É mister observar que, para a adesão, a demanda administrativa não pode superar a quantidade prevista na Ata de Registro de Preço, sob pena de violação ao § 3º do já transcrito art. 8º do decreto em tela.
Ademais, cumpre verificar se a Ata de Registro de Preço selecionada está dentro do prazo de validade de 12 (doze) meses. Ressalte-se que, decorrido prazo de 12 meses, não será possível a adesão à referida ata.
A doutrina entende necessário, também, que se produza ato administrativo que formalize a adesão à Ata de Registro de Preços, o que é atribuição da autoridade competente, de acordo com a organização interna de cada órgão ou entidade. Esse ato administrativo de adesão à Ata de Registro de Preços deve ser publicado na imprensa oficial, dando-se publicidade a ela, em respeito ao artigo 10 do Decreto Federal n. 3.931/01 e ao princípio da publicidade.2
Importa, por fim, verificar que a Advocacia-Geral da União – AGU tem consignado a proibição de os órgãos públicos federais aderirem à Ata de Registro de Preços decorrente de licitação realizada pela Administração Pública Estadual, Municipal ou Distrital, bem como por entidades paraestatais. Tal entendimento está registrado na Orientação Normativa AGU nº 21, publicada no D.O.U. de 07 de abril de 20093:
ORIENTAÇÃO NORMATIVA Nº 21:
Ementa: "É VEDADA AOS ÓRGÃOS PÚBLICOS FEDERAIS A ADESÃO À ATA DE REGISTRO DE PREÇOS QUANDO A LICITAÇÃO TIVER SIDO REALIZADA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL, MUNICIPAL OU DO DISTRITO FEDERAL, BEM COMO POR ENTIDADES PARAESTATAIS.".
(REFERÊNCIA: Art. 37, caput, Constituição Federal, de 1988; arts. 1º e 15, §3º, Lei nº 8.666, de 1993, art. 1º, Decreto nº 3.931, de 2001, PARECER PGFN/CJU/COJLC/N° 991; Decisão TCU 907/1997- Plenário e 461/1998- Plenário; Acórdão TCU 1.487/2007-Plenário.)4
De acordo com a AGU, tal entendimento fundamenta-se no Princípio da Legalidade, combinado com o disposto nos artigos 1º e 15, §3º, da Lei nº 8.666, de 1993, e no artigo 1º, do Decreto nº 3.931, de 2001. A partir de tais dispositivos, chega-se às seguintes conclusões:
a) as contratações de serviços e a aquisição de bens, quando efetuadas pela Administração Pública Federal pelo Sistema de Registro de Preços, devem obedecer ao
disposto no Decreto n° 3.931, de 2001; e
b) o Decreto n° 3.931, de 2001, aplica-se somente à Administração Pública Federal.
Entendeu-se que a utilização do Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 1993, demandaria que as Administrações Estaduais, Municipais e do Distrito Federal expedissem seus respectivos decretos. O Decreto n° 3.931, de 2001, se aplicaria somente à Administração Pública Federal e a utilização de tal sistema pelos Estados, Municípios e Distrito Federal não seria regida pelo Decreto n° 3.931/2001, que seria o único diploma apto a disciplinar o Sistema de Registro de Preços da Administração Pública Federal.
Ressaltou, ainda, a AGU, que o referido Decreto não contém dispositivo prevendo a adesão às Atas dos demais entes federativos. Dessa forma, salientou-se que a adesão a Atas de Registro de Preços por órgãos e entidades da Administração Pública Federal somente poderia ser permitida quando o referido processo licitatório fosse realizado no âmbito de outros órgãos ou entidades federais.
Posteriormente, a referida orientação normativa foi alterada para destacar que o raciocínio que justifica a vedação ao uso de atas dos demais entes federativos se aplica, integralmente, às atas dos entes paraestatais, assim entendidos como as pessoas jurídicas de direito privado que, sem integrar a estrutura da Administração Pública, desenvolvem atividades de interesse da coletividade, em colaboração com o Estado, integrando o chamado Terceiro Setor.
Reconhece-se, de fato, que o procedimento seguido por tais entidades, quando da elaboração da Ata de Registro de Preços, não atende aos parâmetros normativos estabelecidos para a Administração Pública direta e indireta, conforme entendimento jurisprudencial5.
REFERÊNCIAS:
[1] Acórdão nº 1.487/2007 – Plenário. Tal entendimento foi repetido em outras oportunidades: Acórdão n.º 3625/2011-2ª Câmara, TC-029.535/2010-7, rel. Min. Aroldo Cedraz, 1º.06.2011; Acórdão n.º 1793/2011-Plenário, TC-011.643/2010-2, rel. Min. Valmir Campelo, 06.07.2011.
[2] NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo. Curitiba: Zênite, 2008, p. 390.
[3] Disponível em http://www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=189182&ID_SITE=. Acesso em 24 de maio de 2012.
[4] Orientação com alterações promovidas pela Portaria AGU nº 572, de 13 de dezembro de 2011 - DOU I de 14.12.2011
[5] A jurisprudência entende que os entes paraestatais possuem regulamento licitatório próprio, não estando sujeitos a todos os ditames da Lei 8.666/93, mas a princípios gerais da licitação pública. Esse é o entendimento do STF, disposto na ADI nº 1864/PR, e do TCU, consoante a Decisão nº 907/1997- Plenário e Decisão nº 461/1998- Plenário.