O IPI foi instituído em 1964 pela Lei 4.502 e foi recepcionado pela Constituição de 1967 no seu artigo 21 e pela Constituição de 1988 pelo seu artigo 153.
A Constituição de 1988 faculta ao poder executivo estabelecer a alíquota do IPI nos termos da Lei, sendo que a sua base de cálculo deve ser estabelecida por Lei Complementar, conforme prevê o artigo 146.
No caso dos cigarros, o Decreto-lei 1.593/77, recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como lei complementar, dando continuidade ao já disposto no Decreto-lei 34/66, se incumbiu de fixar a base de cálculo do IPI, qual seja, um percentual sobre o preço de venda a varejo acrescido de despesas acessórias, tais como frete, taxa de fiscalização sobre o selo de controle e etc. O percentual deveria ser fixado pelo Poder Executivo, delegação esta permitida no âmbito da Constituição Federal de 1967 mas que não foi admitida (recepcionada) pela Carta de 1988.
Posteriormente, a Lei n. 7.798/89, já sob a égide da Carta de 1988, introduziu nova sistemática de cobrança do IPI dispondo que determinados produtos (no caso bebidas), estariam sujeitos ao IPI incidente em preço fixo, variável segundo classes pré-estabelecidas, por unidade. E dispôs, ainda, que o Poder Executivo poderia incluir novos produtos neste regime tributário.
Assim, lei ordinária estabeleceu nova base de cálculo e alíquota ao IPI sobre bebidas, contrariando o artigo 146 da Constituição Federal que assevera que somente lei complementar pode dispor sobre a base de cálculo dos tributos lá previstos.
A Lei n. 7.798/89 foi mais longe ao delegar ao Poder Executivo a prerrogativa de incluir nesta nova sistemática de cobrança do IPI outros produtos. Portanto, uma lei que não poderia alterar a base de cálculo do IPI ainda ousou delegar esta competência ao Poder Executivo.
Foi nesta toada que em 1991 houve a publicação da Lei n. 8.218, que determinou a extensão da previsão contida na Lei n. 7.798/89 (acima mencionada) afirmando que o valor de IPI lá previsto poderia ser alterado pelo Poder Executivo até o limite que correspondesse à aplicação da alíquota prevista na TIPI sobre o preço de venda.
Portanto, a norma contida na Lei n. 7.798/89 – relativa à tributação do IPI em preço fixo – ficou limitada a um valor máximo previsto na Lei n. 8.218/91. Caso esta norma fosse estendida a outros produtos, o atributo legislativo deveria ser exercido considerando esta limitação.
Neste contexto veio o Decreto n. 3.070/99, que desprezou a base de cálculo dada pelo Decreto-lei n. 1.593/77 para determinar que o IPI seria devido pela aplicação de uma alíquota específica sobre a vintena de cigarro, ou seja, sobre o preço de venda de vinte cigarros, seja em maço ou em box, nos moldes do previsto na inconstitucional Lei n. 7.798/89.
Muitos contribuintes questionaram esta nova base de cálculo junto ao Poder Judiciário que logo se apressou em afirmar que o Decreto n. 3.070/99 estabeleceu nova alíquota e não nova base de cálculo, mas quedou-se a dizer, então, o que foi feito da base de cálculo anteriormente prevista com força de lei complementar – um percentual sobre o preço de venda a varejo acrescido de despesas acessórias.
Ainda, segundo o disposto no artigo 153, parágrafo 1º, da Constituição Federal, o Poder Executivo pode alterar a alíquota do IPI, nos termos e limites da Lei. A Lei, no caso, é a Lei n. 8.218/91, à qual o Decreto n. 3.070/99 fez tábua rasa.
Nesse cenário carente de normas que viessem imprimir legalidade e constitucionalidade à cobrança do IPI sobre cigarros, foi publicada a Medida Provisória nº 540, de 2 de agosto de 2011, que trouxe em seu cerne seis artigos sobre a tributação do IPI sobre cigarros e a fumaça de novos tempos.
Começa muito bem a MP 540 estabelecendo nos três primeiros artigos referentes ao tema que o IPI será calculado através da aplicação de um percentual não inferior a 15% sobre o preço de venda a varejo (base de cálculo) multiplicado por uma alíquota de 300%. Esta é a base de cálculo do IPI prevista no Decreto-lei 1.593/77 que tem força de lei complementar.
Mas, na sequência, a MP institui o regime especial de tributação do IPI, cuja opção deveria ser exercida até o dia 30/11/2011, através do qual o imposto devido será a soma de duas parcelas: a) a primeira parcela será a aplicação de um percentual não inferior a 15% sobre o preço de venda a varejo (base de cálculo) multiplicado por uma alíquota a ser fixada pelo Poder Público; e, b) a segunda parcela será calculada pela incidência de uma alíquota específica sobre a vintena de cigarro.
Portanto, a MP veio sanar o vício antes existente no Decreto n. 3.070/99 no regime geral, mas veio, também, perpetuá-lo no que diz respeito ao regime especial, demonstrando ser, novamente, fumaça tóxica.
Isto ocorre porque, no regime especial, a segunda parcela do IPI deve ser calculada sobre a base de cálculo – que é o preço da vintena do cigarro – base de cálculo esta inexistente, posto que jamais houve uma lei complementar que assim regrasse a matéria.
O interessante é que por determinação legal – da MP 540 e do seu decreto regulamentador -esta fumaça tóxica deve ser inalada sem esperneio. Sim, é o que dispõe a MP quando lança a regra do pegar ou largar: ou o contribuinte aceita o regime especial sem questioná-lo judicialmente ou a ele se submete automaticamente.
Esta norma impositiva deixa nossa fumaça irrecuperável, vez que solapa os princípios constitucionais do livre acesso ao Poder Judiciário e da liberdade de defesa por meio do devido processo legal e, por que não dizer, nos afasta do Estado Democrático de Direito.