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A relação entre lei e convenção coletiva de trabalho no Direito do Trabalho português

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10/10/2012 às 10:36
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V.Conclusão

O estudo da relação entre lei e convenção coletiva no Direito do Trabalho português tem como pressuposto o concurso entre normas de hierarquia diferente, sua forma de solução e uma ligação com a prevalência do princípio da norma mais favorável ao trabalhador, independentemente do grau hierárquico das fontes em conflito.

Contudo, este paradigma se alterou a partir de 2003, com a mitigação do mencionado princípio. Em 2009, o Código do Trabalho apenas prevê que a lei necessariamente prevalece diante do instrumento de regulamentação coletiva caso haja disposição imperativa nesse sentido. Ainda, o instrumento de regulamentação coletiva apenas se sobressai diante da lei se dispor em sentido mais favorável aos trabalhadores sobre um determinado rol de matérias.

Diante de todo o estudo realizado, constata-se que há uma tendência, ao menos no que tange ao relacionamento entre lei e convenção coletiva no Direito do Trabalho, de se possibilitar que as partes determinem o conteúdo das relações pactuadas entre si, havendo a imperatividade da norma estatal apenas em poucos casos previstos expressamente na legislação.

Dessa forma, abre-se um espaço cada vez maior para que os conflitos suscitados em decorrência do concurso de fontes no direito laboral luso sejam solucionados pela aplicação de técnicas que não consideram a existência de uma desigualdade intrínseca em uma dada relação jurídica, como é o caso da técnica de normas de conflito e da chamada posição tradicional (interpretação e aplicação de normas).

Se o movimento de afastar o Direito do Trabalho de sua característica tutelar do empregado na relação de trabalho é positiva, com o objetivo de torná-lo menos rígido e facilitar a integração de trabalhadores no mercado de trabalho formal, apenas o tempo dirá. Contudo, uma breve análise recente sobre o nível de desemprego português recentemente demonstra que essa relação não é necessariamente interligada, dado que este vem crescendo desde 2002[37].


VI.Referências bibliográficas

ASCENSÃO, José de Oliveira. O Direito. Introdução e Teoria Geral. Coimbra: Almedina, 2003.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003.

MENEZES CORDEIRO, Antonio. Manual de Direito do Trabalho. Coimbra: Almedina, 1991.

MOURA, José Barros. A convenção colectiva entre as fontes de direito do trabalho. Coimbra: Almedina, 1984.

ORGANIZATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION. AND DEVELOPMENT. Sítio da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Apresenta dados relativos aos países-membros. Disponível em www.oecd.org. Disponível em 04 abr 2009.

PALMA RAMALHO, Maria Palma. Insegurança ou diminuição do emprego? A rigidez do sistema jurídico português em matéria de cessação do contrato de trabalho e de trabalho atípico. LTr: revista legislação do trabalho, São Paulo, v. 64, n. 08, p. 1017-1021 , agosto 2000.

PORTUGAL. Assembléia da República. Lei nº 7/2009. Código do Trabalho. Publicado em 12 fev. 2009. In: Diário da República, nº 30, p. 926-1029.

PORTUGAL. Assembléia da República. Lei Constitucional nº 1/ 2005. Constituição da República Portuguesa. 7ª revisão constitucional. Publicada em 12 ago. 2005. In: Diário da República, nº 155, I Série A, p. 4624-4686.

ROMANO MARTINEZ, Pedro et ali. Código do Trabalho Anotado (em co-autoria), 2.ª edição, reimpressão. Coimbra: Almedina,  2004

ROMANO MARTINEZ, Pedro. Direito do Trabalho. 3ª edição. Coimbra: Almedina, 2006.


Notas

[1] Artigo 1º

(Fontes imediatas)

2. Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes; são normas corporativas as regras ditadas pelos organismos representativos das diferentes categorias morais, culturais, económicas ou profissionais, no domínio das suas atribuições, bem como os respectivos estatutos e regulamentos internos.

[2] ASCENSÃO, 2003, p. 268

[3] ASCENSÃO, 2003, p. 269

[4] ASCENSÃO, 2003, p. 270

[5] CANOTILHO, 2003, p. 346-347.

[6]Artigo 165.º

(Reserva relativa de competência legislativa)

1. É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo:

b) Direitos, liberdades e garantias;

[7] Artigo 165.º

(Reserva relativa de competência legislativa)

2. As leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada.

[8] Artigo 54.º

(Comissões de trabalhadores)

5. Constituem direitos das comissões de trabalhadores:

d) Participar na elaboração da legislação do trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector;

[9] Artigo 56.º

(Direitos das associações sindicais e contratação colectiva)

2. Constituem direitos das associações sindicais:

a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;

[10] MOURA, 1984, p. 51.

[11] Lei nº 16 de 12 de setembro de 1979 – Lei das Comissões de trabalhadores.

[12] CANOTILHO, 2003, p. 420

[13] MOURA, 1984, p. 53.

[14] PINTO apud ROMANO MARTINEZ, 2006, p. 174

[15] Neste sentido, ver os acórdãos 218/89 (relator Conselheiro Martins da Fonseca) e 64/91 (relator Conselheiro Ribeiro Mendes) do Tribunal Constitucional de Portugal.

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[16] MOURA, 1984, p. 62.

[17] MOURA, 1984, p. 73-79.

[18] MOURA, 1984, p. 81.

[19] MOURA, 1984, p. 83.

[20] MOURA, 1984, p.83-91.

[21] Artigo 2.º

Instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho

1 — Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho podem ser negociais ou não negociais.

2 — Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho negociais são a convenção colectiva, o acordo de adesão e a decisão arbitral em processo de arbitragem voluntária.

3 — As convenções colectivas podem ser:

a) Contrato colectivo, a convenção celebrada entre associação sindical e associação de empregadores;

b) Acordo colectivo, a convenção celebrada entre associação sindical e uma pluralidade de empregadores para diferentes empresas;

c) Acordo de empresa, a convenção celebrada entre associação sindical e um empregador para uma empresa ou estabelecimento.”

[22] Artigo 482.º

Concorrência entre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho negociais

1 — Sempre que exista concorrência entre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho negociais, são observados os seguintes critérios de preferência:

a) O acordo de empresa afasta a aplicação do acordo colectivo ou do contrato colectivo;

b) O acordo colectivo afasta a aplicação do contrato colectivo.

[23] Artigo 482.º

5 — Os critérios de preferência previstos no n.º 1 podem ser afastados por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho negocial, designadamente através de cláusula de articulação entre convenções colectivas de diferente nível, nomeadamente interconfederal, sectorial ou de empresa.

[24] Artigo 482.º

2 — Nos outros casos, os trabalhadores da empresa em relação aos quais se verifica a concorrência escolhem o instrumento aplicável, por maioria, no prazo de 30 dias a contar da entrada em vigor do instrumento de publicação mais recente, comunicando a escolha ao empregador

interessado e ao serviço com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral.

[25] Artigo 482º

3 — Na ausência de escolha pelos trabalhadores, é aplicável:

a) O instrumento de publicação mais recente;

b) Sendo os instrumentos em concorrência publicados na mesma data, o que regular a principal actividade da empresa.

[26] Artigo 514.º

Extensão de convenção colectiva ou decisão arbitral

1 — A convenção colectiva ou decisão arbitral em vigor pode ser aplicada, no todo ou em parte, por portaria de extensão a empregadores e a trabalhadores integrados no âmbito do sector de actividade e profissional definido naquele instrumento.

2 — A extensão é possível mediante ponderação de circunstâncias sociais e económicas que a justifiquem, nomeadamente a identidade ou semelhança económica e social das situações no âmbito da extensão e no do instrumento a que se refere.

[27] Artigo 517.º

Admissibilidade de portaria de condições de trabalho

1 — Quando circunstâncias sociais e económicas o justifiquem, não exista associação sindical ou de empregadores nem seja possível a portaria de extensão, pode ser emitida portaria de condições de trabalho.

2 — A portaria de condições de trabalho só pode ser emitida na falta de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho negocial.

[28] MENEZES CORDEIRO, 1991, p. 204

[29] MOURA, 1984, p. 148

[30] ROMANO MARTINEZ, 2006, p. 260

[31] PALMA RAMALHO, 2000, p. 1021

[32] MENEZES CORDEIRO, 1991, p. 218

[33] ASCENSÃO, 2003, p. 523

[34] MOURA, 1984, p.154

[35] MOURA, 1984, p. 149

[36] MOURA, 1984, p. 154

[37] De acordo com dados da OCDE, a taxa de desemprego em Portugal em 2002 era de 5,08%. Em 2008, a taxa foi de 7,75%.

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Sobre o autor
Renan Bernardi Kalil

Advogado. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Mestre em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KALIL, Renan Bernardi. A relação entre lei e convenção coletiva de trabalho no Direito do Trabalho português. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3388, 10 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22776. Acesso em: 25 abr. 2024.

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