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A boa-fé objetiva na interpretação dos negócios jurídicos

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27/11/2012 às 10:09
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3 A Boa-Fé na Interpretação dos Negócios Jurídicos

Adentrando a questão final desse trabalho, há que se verificar, então, como se porta o intérprete diante da cláusula geral de boa-fé objetiva, incrustada como preceito normativo que tem a atividade hermenêutica por objeto (art. 113 do Código Civil).

Alves (2003, p. 12), um dos autores do projeto do Código Civil em vigor, de pronto identifica que, sendo da boa-fé objetiva que trata o referido art. 113, o complexo de “deveres secundários ou instrumentais” que ela impõe às partes que integram o negócio é de naturalmente externo à avença e faz com que a interpretação assuma função ora integradora, ora limitadora, conforme prescreva o cumprimento de certos deveres ou a abstenção de determinadas condutas às partes.

O caráter externo dos deveres instrumentais é de relevo, pois determina o ponto de vista em que se deve pôr o intérprete para observar a relação obrigacional e fixar os deveres a cada parte. Por isso, interessante é a exposição de Cordeiro (2005, p. 554) a respeito do assunto, segundo a qual, tendo como premissa que o contrato é a seara de interesses divergentes, quando não contrapostos, as normas disciplinadoras de deveres acessórios ou de lealdade não podem ter um referencial contratual, isto é, só podem vir de fora do contrato, pois são estranhos à contratação e às partes.[12]

Martins-Costa (1999, p. 429-430), ao utilizar a boa-fé objetiva como critério hermenêutico-integrativo, põe em dúvida até que ponto o resultado dessa interpretação é determinado pela boa-fé, uma vez que percebe haver resultados que decorrem unicamente da interpretação integradora.

Para resolver essa inquietação, Martins-Costa (1999, p. 429-430) propõe que a interpretação integradora deva manter seu foco na vontade manifestada pelas partes na conclusão do negócio, “não abrangendo, por consequência, as mesmas situações atingidas pelo princípio da boa-fé, o qual traça uma órbita bem mais ampla, assumindo, por vezes, função limitadora de direitos [...] e alcançando todos os momentos e fases do vínculo, desde o seu nascimento até o adimplemento de deveres e obrigações.”

Martins-Costa (1999, p. 429-430) entende que a boa-fé, em sua função hermenêutico-integrativa, acompanha o desenvolvimento da obrigação durante todo o seu percurso, orientando as partes acerca dos comportamentos que devem ter para que assegurem o cumprimento daquela, em atenção ao fim para que foi constituída, e da maneira menos gravosa para cada parte, dentro, obviamente, do âmbito normativo por elas estipulado. Em referência ao papel do juiz, sua tarefa é a de compreender a obrigação em sua totalidade, percebendo o “sentido total da regulação” negocial, expresso pelas normas contratuais e pelos demais “módulos valorativos do sistema” (princípios da auto-vinculação, auto-responsabilidade, função social, equilíbrio e boa-fé), e, por meio da aplicação dessa última, preencher o conteúdo do negócio deixado em branco pelas partes, no que se refere às mais variadas condutas possivelmente praticáveis no curso do contrato, de forma que esse preenchimento permita a consecução do fim econômico-social do negócio jurídico examinado (MARTINS-COSTA, 1999, 430-432).

Nesse sentido, portanto, arremata Martins-Costa (1999, p. 437) que a boa-fé objetiva “é noção técnico-operativa que se especifica, no campo de função ora examinado [função hermenêutico-integrativa], como o dever do juiz de tornar concreto o mandamento de respeito à recíproca confiança incumbente às partes contratantes, por forma a não permitir que o contrato atinja finalidade oposta ou divergente daquela para o qual foi criado.”

A posição de Rosenvald (2005, p. 93), embora mais singela em seu arcabouço dogmático, alinha-se com a defendida por Martins-Costa. Para ele, no campo da interpretação negocial, a boa-fé desempenharia as funções de “aclarar o sentido das estipulações contratuais” (“função interpretativa”) e de “explicitar os deveres de comportamento do credor e devedor, ainda que não previstos no contrato ou na norma” (“função integrativa”).

Em essência, Rosenvald parece sugerir que as funções desempenhadas pela boa-fé, em suas acepções interpretativa e integrativa, têm lugar em momento subsequente à aferição da intenção comum consubstanciada na declaração de vontade das partes, como prescreve o art. 112 do Código Civil[13]. Dessa forma, após o intérprete chegar à conclusão de que lhe faltam elementos para definir, com clareza e isenção de dúvidas, qual ação deve adotar, deve ele recorrer à boa-fé como forma de preenchimento dessas lacunas de sentido ou de norma.

O elemento mais relevante dessa percepção de Rosenvald parece ser a tentativa de conciliar o princípio da boa-fé objetiva com a liberdade das partes para definir os termos em que se dará o negócio jurídico, assim prestigiando a autonomia privada, valor fundamental ao Direito Privado. Com isso, tem-se a vantagem de evitar os efeitos negativos que podem advir da invasão, pelo órgão jurisdicional, do âmbito dos negócios jurídicos reservado à autonomia das partes, conforme parece desejar parte da doutrina, que admite semelhante intervenção judicial para, em nome da boa-fé contratual, promover equidade ou distribuição de riquezas entre as partes por meio de expedientes de justiça distributiva.

No campo da problemática que envolve a aplicação do art. 113 do Código Civil, tem-se que a questão central da interpretação dos negócios jurídicos conforme a boa-fé está na possibilidade de intervenção judicial sobre o conteúdo desses negócios. Se o Direito de outrora não admitia a alteração dos pactos após sua celebração, devendo as partes cumpri-los fielmente até sua extinção, em prestígio à autonomia privada – “o contrato faz lei entre as partes” –, a admissão de controle judiciário do conteúdo dos contratos “pressupõe o abandono, também no Direito Privado, da autonomia, como mero dogma formal, e a sua substituição pela regra da autonomia efectiva.” (CORDEIRO, 2005, p. 654). Isso quer dizer que a boa-fé permite ao juiz intervir no conteúdo do contrato, “reequilibrando-o” sempre que identificar que uma das partes pode ter experimentado “aparência de autonomia” ao manifestar sua decisão ou vontade de celebrar o negócio jurídico. Isso se revela, característica e sintomaticamente, nos contratos de adesão ou, entre os portugueses, nas condições negociais gerais e nos contratos pré-formulados, casos em que apenas uma das partes formula todas as cláusulas contratuais e, não admitindo discussão de qualquer de seus termos, faculta à contraparte o direito de mera aceitação ou recusa do contrato. (CORDEIRO, 2005, p. 654 e 659).

Não obstante, no que tange à interpretação dos negócios jurídicos conforme a boa-fé na seara do direito empresarial, ganham relevo as pretensas relativizações da autonomia privada e do princípio do pacta sunt servanda, especialmente quando feitas em nome de uma justiça distributiva, pois tais procedimentos vão contra a lógica reinante no mundo empresarial e tendem a criar mais problemas do que soluções para seus participantes.

É o que se depreende de considerações feitas por Forgioni (2007, p. 111-148), ao revelar o temor de que muitas das inovações trazidas pelo Código Civil de 2002 (função social do contrato, boa-fé objetiva, revisão por onerosidade excessiva etc.) transformem-se em perigosa “consumerização” do direito mercantil, a contribuir para a redução da necessária previsibilidade das relações comerciais, por meio da abertura que se procedeu a que magistrados apliquem desmedida “justiça” às relações contratuais, sem que seja dada a devida importância aos princípios da autonomia da vontade e do pacta sunt servanda.

Em referência específica à adoção do princípio da boa-fé objetiva no direito brasileiro, pondera Forgioni (2007, p. 133):

“Nessa perspectiva, o comportamento honesto não implica gasto, mas sim economia, tanto para o agente (que atuará conforme as regras) quanto para o mercado como um todo, que tenderá a diminuir a incidência de custos de transação pelo aumento do grau de certeza e previsibilidade. E assim deve ser para o direito, porque a sanção prevista desestimula o comportamento infrator. Por fim, a boa reputação deve ser realmente adquirida pelo agente, mas também o impele ao cumprimento das regras do mercado (i. e., ao respeito, à confiança e à boa-fé) em um prudente e profícuo círculo vicioso.”

No entanto, nefastas seriam as conseqüências da má aplicação do mesmo princípio:

“Um ponto merece ser destacado, porque sua incorreta compreensão pode gerar distorções: no sistema de direito comercial, a boa-fé permite e estimula a eficiência do agente econômico ao mesmo tempo que exige (para o bem do tráfico mercantil) seja adotado o comportamento típico dos ‘comerciantes cordatos’, como dizia Cairu. No direito comercial, o respeito ao princípio da boa-fé não pode levar, em hipótese alguma, a uma excessiva proteção de uma das partes, sob pena de desestabilização do sistema. Afinal, como dissemos, o ‘erro de cálculo’ do agente é um instrumento que premia a eficiência de outro. No processo de interpretação dos contratos mercantis, a boa-fé não pode ser confundida com eqüidade ou com ‘consumerismo’, erro em que incidem vários autores não habituados à dinâmica de mercado.” (IDEM, p. 134).


Conclusão

Entendida a interpretação do direito como uma atividade que vivifica o texto posto legislativo ou o texto de negócios jurídicos, viu-se que a renovação conceitual promovida pelo novo Código Civil muito contribui para um melhor tratamento dos problemas jurídicos que, em uma sociedade tão culturalmente díspar e economicamente desigual, não podem sê-lo de maneira uniforme.

Aberto o sistema de direito civil, por meio de cláusulas gerais como a da boa-fé, verdadeiros lugares-comuns, segundo a tópica, ou modelos jurídicos, na terminologia de Miguel Reale, cabe à cultura jurídica sedimentar as bases sobre as quais cada tema será tratado, o que constitui tarefa cujo sucesso está a depender da interação dialética entre a sociedade e os sujeitos legitimados a decidir no Estado brasileiro (quer sejam decisões políticas, tomadas por agentes políticos, quer sejam decisões judiciais, proferidas pelos órgãos jurisdicionais).

O consenso da doutrina assinala que a boa-fé objetiva, ainda que referida a noções de preservação da confiança e de lealdade entre as partes que entram em relações jurídicas, não assume significado unívoco e o conteúdo dos deveres que dela decorrerão para cada parte somente se podem determinar à vista de elementos concretos, isto é da análise de situações específicas.

Por isso, é natural supor que, nos diferentes “ramos” do direito, terá a boa-fé objetiva formas também distintas de serem aplicadas à interpretação das relações jurídicas subordinadas a esses específicos conjuntos normativos. É o que se observou com a aplicação da boa-fé na interpretação de negócios empresariais, procedimento no qual a referência aos usos e costumes mercantis se mostrou essencial, para evitar sérios prejuízos ao funcionamento do mercado e, em decorrência, perdas para toda a sociedade.

Nesse derradeiro ponto, vale citar exemplo de bom tratamento de institutos criados a partir do princípio da boa-fé objetiva, quando aplicados a ramos do direito com lógicas distintas. Trata-se de passagem da obra de Cordeiro (2005, p. 655-658) em que o autor comenta a experiência alemã de disciplinar os contratos de adesão com uma lei elaborada a partir da sedimentação de soluções jurisprudenciais anteriores, assentes essencialmente na boa-fé, e que se provou muito adequada àquela sociedade. Menciona o autor que o AGBG,[14] de 1976, contém previsões, em seus §§ 10 e 11, de cláusulas reputadas nulas – as constantes do último dispositivo, absolutamente; enquanto as do primeiro, a depender do juízo do órgão jurisdicional ao apreciar o caso –, mas esses dispositivos não se aplicam aos contratos de adesão (“condições negociais gerais”) firmados com comerciantes, no exercício de sua atividade, ou a instituições de direito público. Segundo o autor, “entendeu-se que, nesse caso, a limitação à autonomia privada poderia ser excessiva; além de que, em tal eventualidade não se verifica, em igual grau, a ignorância e a inexperiência que justificam a protecção dispensada ao interveniente débil.” (CORDEIRO, 2005, p. 657).

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BETTI, Emilio. A interpretação da lei e dos atos jurídicos: teoria geral e dogmática. Trad. por Karina Jannini, São Paulo: Martins Fontes, 2007.

CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2007.

FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 5ª ed., São Paulo: Atlas, 2007.

FORGIONI, Paula A. “Interpretação dos negócios empresariais”. In: Fernandes, Wanderley (coord.) Fundamentos e princípios dos contratos empresariais. São Paulo: Saraiva, 2007.

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. São Paulo: Malheiros Editores, 2002.

MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 15.ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001.

MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 17.ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998.

ALVES, José Carlos Moreira. “O novo código civil brasileiro: principais inovações na disciplina do negócio jurídico e suas bases romanísticas”. In: Revista Jurídica, n.º 305, Porto Alegre: Notadez, 2003, p. 7-23.

NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas. 2.ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. V. 1, 25.ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no código civil. São Paulo: Saraiva, 2005.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. V. 1, 3.ª ed., São Paulo: Atlas, 2003.


Notas

[1] E continua Grau (2002, p. 112), ponderando ser impossível pretender enclausurar os textos jurídicos no contexto social em que surgiram – e de cujos valores e outras particularidades se nutriram para serem redigidos como o foram – negando-lhes a utilidade de se adaptarem continuamente a novas realidades, novas necessidades e novos anseios. Segundo ele, ainda, isso ocorreria mais caracteristica e emblematicamente com a interpretação do texto constitucional.

[2] Sirvo-me, aqui, das noções de semântica e pragmática trazidas da semiótica para o estudo sobre as normas por FERRAZ JR (2007, p. 123-132). Segundo essa concepção, a semântica, representando as “normas em relação ao objeto normado”, revelaria a matéria ou facti species da norma, bem como o limite espacial de sua incidência e o tempo ou vigência da norma (FERRAZ JR, p. 126-128). Já a pragmática refere-se às “normas em relação à sua função”, o que se identifica pelo efeito que as normas provocam ou visam provocar sobre os sujeitos (FERRAZ JR, p. 129-132).

[3] “Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.”

[4] Grau (2002, p. 53-70) argumenta que a interpretação de textos jurídicos não se faz a esmo, mas em vista de um caso (hipotético ou concreto); então, a interpretação desses textos é também a interpretação dos fatos desse caso, do relato desses fatos; cf. também Betti (2007, passim).

[5] Cf. nota de rodapé nº 1, acima, sobre o entendimento de Grau.

[6] Nas palavras de Grau (2002, p. 172): “Ora, quando o juiz forma o próprio convencimento, livre de qualquer vínculo com a própria iniciativa, ele deduz da ordem ou do sistema de normas, extraído da experiência, um critério de julgamento apto a atribuir ao sujeito do seu exame o predicado mais conveniente. Quando, ao contrário, é vinculado por uma regra legal, não é livre para formar, segundo as máximas comuns de experiência ou de hermenêutica, o próprio convencimento sobre a existência do fato a ser provado ou sobre o sentido do preceito a se aplicado, mas deve observar o limite ou a diretiva que ela lhe impõe.”  E, mais adiante: “A vantagem da disciplina legal da interpretação está em circunscrever à margem mais estreita possível a incerteza e a incompletude da tarefa hermenêutica e, com elas, o perigo de uma pluralidade indefinida de interpretações diferentes, divergentes umas das outras.” (Grau, 2002, p. 174).

[7] Nesse sentido, cf. Martins-Costa (1999, p. 412), Cordeiro (2007, p. 415-425), Rosenvald (2005, p. 79-81) e Negreiros (2006, p. 119-122).

[8] “Art. 131 - Sendo necessário interpretar as cláusulas do contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre as seguintes bases:

1 - a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa fé, e ao verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras;”

[9] Porém, essa indeterminação não afasta a força normativa do princípio da boa-fé objetiva, embora ele demande referência a situações práticas para se ver condensado (MARTINS-COSTA, 1999, p. 412-413). Considerando todos esses caracteres (impossibilidade de fixar, a priori, qual o significado da valoração a ser procedida com a utilização da boa-fé objetiva e o fato de tratar-se ela de norma cujo conteúdo é preenchido levando-se em conta as circunstâncias concretas do caso), aponta Martins-Costa (1999, p. 412-413): “é, incontroversamente, regra de caráter marcadamente técnico-jurídico, porque enseja a solução dos casos particulares no quadro dos demais modelos jurídicos postos em cada ordenamento, à vista das suas particulares circunstâncias.”

[10] Essa lógica é devida, primordialmente, à reiterada e natural recorrência dos comerciantes aos usos e costumes de determinada praça (e, em alguns casos, também de determinado ramo comercial, ao lado dos usos e costumes específicos de outros ramos do comércio), isto é, a regras informais que os contratantes esperam não serem frustradas (FORGIONI, 2007, p. 97-107).

[11] Assim é que, para Forgioni (2007, p. 127-128), “a boa-fé no direito comercial não desempenha apenas uma função moral, desconectada da realidade dos negócios e fundada em valores outros que não a busca do melhor funcionamento do mercado. Ao contrário, reforça as possibilidades de confiança dos agentes econômicos no sistema, diminuindo o risco. A boa-fé – agora, em todo o direito privado – é um catalisador da fluência das relações no mercado.” No mesmo sentido, propõe que “a boa-fé vem relacionada ao uso e ao costume da praça, ou seja, ela é objetiva e não pinçada no íntimo dos partícipes da avença” (FORGIONI, 2007, p. 129), ligando-se “umbilicalmente aos usos e costumes comerciais, dando-lhes força.” (FORGIONI, 2007, p. 130).

[12] Cordeiro (2005, p. 649-650) demonstra que sua compreensão sobre o papel da boa-fé no cumprimento de obrigações contratuais é de que as partes devem cumpri-las tendo em vista o fim que possuem as prestações realizadas dentro do escopo maior do contrato. “A boa fé não contemporiza, pois, com cumprimentos formais; exige, numa atitude metodológica particular perante a realidade jurídica, a concretização material dos escopos visados.” (CORDEIRO, 2005, p. 649) Busca-se, em essência, com a aplicação da boa-fé à realização das prestações devidas, evitar, por meio da imposição de deveres acessórios, que o devedor cause prejuízo ao credor ou, ainda, seja onerado excessivamente, sem que tal onerosidade seja proveitosa ao alcance do fim buscado pelas partes no contrato. (CORDEIRO, 2005, p. 650)

[13] “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.”

[14] Sigla da expressão alemã Gezets zur Regelung des Rechts der Allgemeinen Geschäftsbedingungen. Em tradução livre: lei aplicável ao direito das condições negociais gerais.


Abstract: This paper aims to investigate the role of the principle of good faith in the construction of agreements. By analyzing the arguments presented in the literature dedicated to the study of the meanings of good faith in Brazilian and Portuguese Private Laws, this explores the possibilities facing the interpreter when she tries to apply the principle of good faith to concrete situations.

Keywords: Good faith. Bona fide. Construction. Agreements. Contracts. Private Law.

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Sobre o autor
Danilo Takasaki Carvalho

Mestre em Direito (LSE, Reino Unido, 2011). Especialista em Contratos e Responsabilidade Civil (IDP, Brasil, 2009). Bacharel em Direito (USP, Brasil, 2004). Procurador do Banco Central do Brasil desde 2006.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Danilo Takasaki. A boa-fé objetiva na interpretação dos negócios jurídicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3436, 27 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23111. Acesso em: 27 dez. 2024.

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