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Efeitos da inabilitação no impeachment

22/12/2012 às 12:58
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Em tese, quem sofreu impeachment pode ser candidato (pois este direito não lhe é podado pelo texto constitucional) não podendo, se for o caso, exercer a função caso venha a ser eleito. Isso porque os direitos políticos não estão suspensos, encontram-se apenas limitados pela impossibilidade de exercício de função pública.

 Inabilitação é a situação jurídica daquele que foi condenado em processo de apuração de crime de responsabilidade, também chamado de Impeachment.

 Trata-se de um fenômeno jurídico diverso da Inelegibilidade. Nesta o pré-candidato é considerado inapto para assumir uma função pública eletiva assim, o que se impede é que o indivíduo venha a ser eleito. Naquela, por expressa menção constitucional, artigo 52, caput, inciso I e parágrafo único[1], a intenção não é a de vedar o acesso ao cargo, como naquela, e sim não permitir o exercício de função pública por determinado período. Além de não poder exercer cargo eletivo haverá a impossibilidade de, por exemplo, ser jurado em Tribunal do Júri, exercer cargo em comissão (Secretário Municipal, Secretário Estadual, Ministro de Estado), etc.

 Desta maneira, não podemos confundir a impossibilidade de candidatura com a impossibilidade de exercício de função. Apesar de se aproximarem quanto a alguns efeitos, à medida em que quem não pode se candidatar não poderá exercer a função resultante do processo eleitoral, devemos reparar que o individuo que está inabilitado poderia sim, em tese, ser candidato, uma vez que o ordenamento jurídico não o proíbe de tal expressamente. O que o corre é que se ele, hipoteticamente, viesse a ser eleito para período no qual ainda existisse a restrição ao exercício, não o poderá assumir.

 À guisa de exemplo temos o famoso caso Collor, quando este ex-presidente, inabilitado em decorrência do processo de impeachment que sofrera em dezembro 1992 tentou candidatar-se à prefeitura de São Paulo para o exercício de 2001 a 2004. Ocorre que em janeiro de 2001 já haveria se findado a punição de oito anos ao ex-presidente (caso de inabilitação).

 A nosso ver, impossibilitá-lo de participar daquela eleição, como o foi, é ato inconstitucional. Ocorre que, como dito, não havia qualquer impedimento à candidatura daquele indivíduo, mas sim, até o término do prazo, ele estava impedido de exercer qualquer função pública. No caso concreto, a pretensa função seria assumida já quando este fosse apto para ela, razão pela qual não vemos qualquer impedimento.

 A constituição não preceitua a perda dos direito políticos a quem sofreu processo de impeachment. Apenas, impede que o indivíduo atue na administração pública por oito anos. Nem poderia ser diferente, uma vez que o art.15 da C.F. é taxativo e a condenação por responsabilidade do art. 52 não está defesa. Se não há a perda dos direitos políticos não há a impossibilidade de Registro de Candidatura, o que pode haver é a não aptidão para o exercício da função.

  Desta forma, e ainda com base no caso, o que se fez foi estender a punição àquele ex-presidente, não permitindo que ele viesse a exercer um cargo para o qual estaria, juridicamente, apto.

A dura sanção cominada a quem comete crime de responsabilidade não pode ser entendida de maneira a ser eternizada. Vale dizer, a impossibilidade de exercício de função pública por oito anos não deve ser estendida, sob nenhum argumento, sob pena de ferir-se direito constitucional do candidato.

 Assim, em tese, quem sofreu impeachment pode ser candidato (pois este direito não lhe é podado pelo texto constitucional) não podendo, se for o caso, exercer a função caso venha a ser eleito. Isto porque os direitos políticos não estão suspensos, encontram-se apenas limitados pela impossibilidade de exercício de função pública.

Ressalvamos por oportuno, que se o registro é pedido para um cargo ao qual o pré-candidato não poderá assumir pela sua inabilitação, ai sim deverá haver o indeferimento, mas não como sanção e sim a titulo de fazer valer um princípio básico do direito eleitoral, o da Soberania Popular. Deve-se evitar a escolha pelo povo de alguém como seu representante que efetivamente não poderá exercer o papel, em decorrência do impedimento, resguardando, assim, a vontade popular.

 Se o constituinte quisesse tornar inelegível quem passou pelo processo de impeachment não haveria utilizado o termo Inabilitação ou, ao menos, haveria determinado a sanção da inelegibilidade, explicitamente, também a este[2].

 Parece-nos se tratar o tema de Direito Administrativo e não de Direito Eleitoral, uma vez que a sanção não é só para cargos eletivos, e conforme estudado, não gera efeitos diretos na eleição (uma vez que não impede ninguém de ser candidato, proibindo apenas o exercício do cargo).

 As Leis 1.079 de 1950 e o Decreto-lei nº 201 de 1967 que definem os crimes de responsabilidade e que foram recepcionadas pela constituição, definem que o julgamento de crime de responsabilidade “não exclui o processo e julgamento do acusado por crime comum”. Este sim capaz de tornar o candidato inelegível.

 Não podemos, portanto, coadunar com Adriano Soares da Costa [3]que assevera:

Assim, a inabilitação para concorrer a mandato eletivo é uma espécie de inelegibilidade cominada potenciada, consistindo no impedimento de registrar a candidatura enquanto durar a sanção, ainda que o nacional possua todas as condições de elegibilidade presentes.

 Ocorre que não se pode confundir dois institutos jurídicos diversos. Não podemos tachar de inelegibilidade uma sanção puramente administrativa que não está mencionada pelo art. 15 da Constituição e que não foi criada por lei complementar, como determina a constituição.

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 Não pode ser aceito também o raciocínio errôneo que se poderia formar de que os citados textos legais tenham sido recepcionados pela atual Constituição com o status de lei complementar, e explicamos o motivo.

 Ocorre que a constituição de 1946 que regia o ordenamento jurídico pátrio ao tempo da lei 1.079 previa expressamente em seu artigo 62 § 3º que não era possível “impor outra pena que não seja a da perda do cargo com a inabilitação (...) sem prejuízo da ação da justiça ordinária”. Vale dizer, desde aqueles tempos, demonstrava o constituinte a intenção de não tornar inelegível a ninguém através da condenação por responsabilidade.

 Esta posição fica ainda mais clara com a analise da situação do Decreto-lei nº 201, que foi editado sob a égide da constituição de 1967. Nesta carta o constituinte determinou a necessidade do uso de Lei complementar para a criação de inelegibilidades. Ao surgir em nosso ordenamento na figura de Decreto-lei e, cotejando-a com a norma constitucional, fica claro que a intenção da norma não é tornar nenhum indivíduo inelegível, como sustenta DA COSTA, mas sim o tornar inapto para o exercício de função pública, tão somente.

 Por tudo que vimos, não pode ser tida a inabilitação como uma inelegibilidade, só servindo aquela para obstar a candidatura se, efetivamente, o pré-candidato estiver inabilitado quando da posse, ou seja, quando do real exercício da função pública, e não quando da candidatura.


BIBLIOGRAFIA

CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro. 10. ed. rev., ampl. e atual., 2. Tiragem. Bauru : Edipro, 2003.

CASTRO, Edson de Resende. Teoria e Prática do Direito Eleitoral. 3. rev. e atual. Belo horizonte : Mandamentos, 2006.

CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. Direito Eleitoral Brasileiro. 2. ed. rev., ampl. e atual. Belo Horizonte : Del Rey, 2002.

CUNHA, André Luiz Nogueira da. Direitos Políticos, representatividade, capacidade eleitoral e inelegibilidades. São Paulo : Editora Juarez de Oliveira, 2004.

DA COSTA, Adriano Soares. Inelegibilidade e inabilitação no Direito Eleitoral . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 37, dez. 1999. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/1518>. Acesso em: 26 fev. 2007.

_____. Instituições de direito Eleitoral. 5. ed. rev., atual e ampl. Belo Horizonte : Del Rey, 2002

_____. Teoria da Inelegibilidade e Direito Processual Eleitoral. 1. ed. – Belo Horizonte : Del Rey, 1998.

DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 23. ed. rev. e atual. São Paulo : Malheiros, 2004.

DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidade. 2. ed. São Paulo : Dialética, 2004.


Notas

[1]“Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis".

[2]  Frisamos que mesmo o legislador infra-constitucional, por lei complementar, poderia instituir a inelegibilidade a quem sofreu Impeachment.

[3]COSTA, Adriano Soares da. Inelegibilidade e inabilitação no Direito Eleitoral . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 37, dez. 1999. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/1518>. Acesso em: 26 fev. 2007.

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Sobre o autor
Rogerio Braz Mehanna Khamis

Advogado com atuação em direito eleitoral. Graduado pela Universidade Católica de Santos. Pós-Graduado pela Escola paulista de Direito. Mestrando na PUC-SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KHAMIS, Rogerio Braz Mehanna. Efeitos da inabilitação no impeachment. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3461, 22 dez. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23274. Acesso em: 23 dez. 2024.

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