A Emenda Constitucional 66 de 13 de julho de 2010, que alterou o §6º do artigo 226 da Constituição Federal, ainda gera discussão e divergências quanto a sua interpretação, pois, se de um lado há uma corrente que defende o fim do instituto da separação judicial, de outro, há a que afirma convicta que isto não ocorreu.
O texto legal não fala expressamente na extinção da separação, ao contrário, somente na justificativa da emenda constitucional há uma referência a eliminação do requisito da prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos para o divórcio. Assim, em uma primeira análise, podemos verificar que houve uma eliminação do requisito temporal, afinal, agora o casamento poderá ser dissolvido diretamente pelo divórcio, sem que se tenha que aguardar o lapso temporal anteriormente previsto para a conversão da separação judicial em divórcio ou, para o pedido do divórcio direto.
Aos que defendem a manutenção da separação judicial, argumento forte consiste em que o instituto é regulado pelo Código Civil e, mais, que as espécies dissolutórias do casamento são reguladas na legislação infraconstitucional. Diante destas considerações, não há que se falar em “extinção” da separação, pois, ainda há vigência dos textos legais que tratam e regulam a matéria.
Em Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho da Justiça Federal através de seu Centro de Estudos Judiciários – CEJ houve a produção de enunciados relativos ao assunto, que corroboram o pensamento de que a separação não foi extinta de nosso ordenamento, tais como o enunciado 515 que diz: “Art. 1.574, caput: Pela interpretação teleologia da Emenda Constitucional n. 66/2010, não há prazo mínimo de casamento para a separação consensual” e o enunciado 517 que reza: “Art. 1.580: A Emenda Constitucional n. 66/2010 extinguiu os prazos previstos no art. 1.580 do Código Civil, mantido o divórcio por conversão”.
Outro ponto discutido por esta corrente é a eliminação da culpa. Com o decreto direto do divórcio não há discussão quanto à culpa pela dissolução do casamento, posto que a imputação de culpa a um dos cônjuges somente tem previsão no instituto da separação, que visa aplicar uma sanção ao descumprimento dos deveres legais do casamento, que são a vida em comum no domicílio conjugal, a fidelidade recíproca, a mútua assistência, sustento, guarda e educação dos filhos e o respeito e consideração mútuos.
Desta forma, extinguindo-se a separação judicial de nosso ordenamento, também se está extinguindo a possibilidade de aplicação de uma sanção ao cônjuge transgressor, ou seja, não se poderá alegar a culpa do outro para seu benefício quando da dissolução da sociedade conjugal. Na prática, o que pode ocorrer é que, mesmo não sendo fiel, o cônjuge “culpado” poderá, por exemplo, pleitear pensão alimentícia do cônjuge “inocente”, pois, não haverá mais a “sanção legal” por seu ato de descumprimento dos deveres do casamento.
Ainda, nesta linha de raciocínio, e atingindo o extremo da situação, sem a possibilidade de discutir a culpa quando do divórcio, o cônjuge que viveu todo o tempo mantendo e sustentando o outro, que é alcoólatra, violento e adultero, quando decide por fim a sociedade conjugal, ainda pode ser obrigado ao pagamento de pensão ao outro, afinal, é ele que detém os recursos e, o outro não pode mais ser “punido”.
Outros pontos também são discutidos em defesa da manutenção da separação, tais como questões religiosas, pois, com a extinção da separação fere-se o princípio da liberdade religiosa consagrado em nossa Constituição Federal, haja vista que em algumas religiões praticadas em nossa Federação, o divórcio não é aceito e, mais, elimina-se a possibilidade de utilização do instituto como remédio para a proteção dos doentes mentais.
Assim, simplesmente considerar “extirpado” de nosso ordenamento jurídico o instituto da separação é atitude precipitada, pois, deve se analisar todos os lados da questão para que, a posteriori, os problemas não restem sem solução.