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Algumas lucubrações sobre o princípio da legalidade no Direito Penal brasileiro

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O princípio da legalidade desdobra-se em quatro: 1º - Proibição do emprego de analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas; 2º - Proibição de incriminações vagas e indeterminadas; 3º - Proibição da criação de crimes e penas pelos costumes; 4º - Proibição da retroatividade da lei penal.

1. Prolegômenos

O presente trabalho tem basicamente dois objetivos. O primeiro é do oferecer uma conceituação, ainda que simplória, do Direito Penal, enquanto ramo do direito positivo, permitindo que os estudiosos e operadores do direito tenham maior consciência do importante objeto que manejam. O segundo objetivo, que é o principal, é analisar, com certo grau de profundidade, o Princípio da Legalidade à luz do Direito Penal.

Neste ponto, será levantada a questão de saber se entre o Princípio da Legalidade e o Princípio da Reserva Legal há diferença relevante e que possa ser sustentada. Também serão analisados: a relação entre Princípio da Legalidade e Estado Democrático de Direito; as considerações históricas, introdutórias, conceituais, bem como garantias, funções e consequências daquele princípio.

Por último, sem maiores delongas, é importante dizer que procuramos trazer para o trabalho a opinião de vários doutrinadores, uma vez que o progresso do conhecimento, e da própria ciência, dá-se através de opiniões divergentes e convergentes, em embate, em busca de um consenso. Temos, assim, plena convicção de que o trabalho não esgota o tema, sendo apenas uma contribuição.


2. Conceituação do direito penal

Falar de Direito penal é falar, de alguma forma, de violência. Todavia, hodiernamente, sustenta-se que a criminalidade é um fenômeno social normal. Assim, o delito não ocorre somente na maioria das sociedades, mas, sim, em todas as sociedades constituídas pelo ser humano. As relações humanas são contaminadas pela violência, necessitando de normas que as regulem. O fato social que contrariar o ordenamento jurídico constitui ilícito jurídico, cuja modalidade mais drástica é o ilícito penal, o qual fere os bens mais importantes dos membros da sociedade. Destarte, quando as infrações aos direitos e aos interesses do sujeito assumem certas proporções, e os demais meios de controle social mostram-se insuficientes ou ineficazes para harmonizar o convívio social, eis que surge o Direito Penal- com sua natureza singular de meio de controle social formalizado e sistematizado-, procurando dirimir conflitos e suturando eventuais rupturas ocasionadas pela desinteligência dos homens.[1]

O Direito Penal pode ser concebido como o conjunto de normas e regras que dizem respeito aos crimes e às penas correlatas. Regula, pois, a atividade repressiva do Estado, a fim de preservar a sociedade do delito. Ademais, o Direito Penal ocupa-se dos atos puníveis, ou seja, do crime e da contravenção (ilícito de menor poder ofensivo) no plano normativo, vislumbrando-os como entidades abstratas, isto é, como condutas que não devem ser praticadas, uma vez que são punidas por lei. Ao conceituar as condutas delituosas, relaciona-as a uma sanção- pena (de natureza repressiva) ou medida de segurança (com finalidade preventiva)-, por ele previamente prevista e que deve ser aplicada pelo juiz aos meliantes e recalcitrantes.

Aos criminosos aplicam-se: 1 penas privativas de liberdade – reclusão, detenção e prisão simples; 2  penas restritivas de direito – prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviço à comunidade ou à entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana; 3 pena de multa; 4 medidas de segurança, aplicadas aos inimputáveis e, em alguns casos, aos semi-imputáveis e pode ser: detentiva, como internação, ou restritiva, como tratamento ambulatorial. [2]

Nas palavras de Bitencourt:

O Direito Penal apresenta-se como um conjunto de normas jurídicas que tem por objeto a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes – penas e medidas de segurança. Esse conjunto de normas e princípios, devidamente sistematizados, tem a finalidade de tornar possível a convivência humana, ganhando aplicação prática nos casos ocorrentes, observando rigorosos princípios de justiça.[3]

Ademais, vem à baila interessante consideração de Zaffaroni, a saber:

Com a expressão Direito Penal se designam – conjunta ou separadamente- duas entidades diferentes: 1) o conjunto de leis penais, isto é, a legislação penal; e 2) o sistema de interpretação desta legislação, isto é, o saber penal.[4]

Faz-se mister um adendo, por que é comum o conceito de medidas de segurança na conceituação de direito penal? O Código Penal brasileiro, juntamente com a doutrina, entende que determinados indivíduos não podem cometer crimes, haja vista que não possuem discernimento e razoabilidade para entenderem as consequências de seus atos, a saber, os que padecem de patologia mental ou os menores de dezoito anos, ilícitos praticados por estes são chamados de atos infracionais, desse modo, não cumprem penas (como os imputáveis), mas, sim, medidas de segurança e medidas socioeducativas (caso dos menores).

Retomando o “fio da meada”, as normas do direito penal regulam os atos que atentam, imediata ou mediatamente, contra a ordem social- pondo-a em perigo, lesando direitos dos indivíduos-, determinando as penas e as medidas de segurança respectivamente aplicáveis. Em resumo, é o ramo do direito público interno que define, tipifica e sanciona as contravenções (práticas de jogo de azar etc.) e os crimes (homicídios, furto, roubo, lesão corporal, bigamia, estelionato, assédio sexual, estupro etc.). É necessário lembrar que o Estado só pode punir crimes tipificados em lei e aplicar penas nela cominadas (Princípio da Reserva Legal, da Legalidade estrita ou da Tipicidade: Nullum crimen sine lege.Nulla poena sine lege, consagrado pelo Código Penal)[5], assunto que será aprofundado mais adiante. 

Vem à baila interessantes ilações de Francesco Carnelutti, para este, o Direito Penal reprime o ato contrário às suas normas, acordando o que existe com aquilo que deve existir. Todavia, o acordo não é e não pode ser perfeito por causa da irreversibilidade do tempo, ou seja, da impossibilidade que o fato não seja fato, não podendo a restituição do dano ser retroativa, logo, com o ressarcimento se busca o remédio para esta imperfeição. Então, o Direito Criminal tem função repressiva e preventiva da restituição, o temor do ressarcimento do dano opera, deveras, como estímulo ao adimplemento da obrigação. [6]

Por outra faceta, decerto, a matéria penal não consagra a sanção com o escopo de restabelecer o status quo ante, mas, sim, exerce função repressiva. Nesse sentido, vale a admoestação de Sêneca: nemo prudens punit quia peccatum est sed ne peccetur(o pecado quando foi cometido nãos se pode apagar do mundo)[7], assim também ocorre com o crime, quando passa do plano hipotético-abstrato(suporte fático hipotético ou abstrato), previsto pelo texto normativo, para o plano fático-concreto(suporte fático concreto ou materializado), permitindo a incidência da regra jurídica. [8] Doravante, resumindo o que dissemos acima, o Direito Penal, tem a função precípua de prevenir e dissuadir a prática do injusto, todavia, se este ocorrer, cabe ao Estado punir, através da sanção, a fim de evitar novas transgressões. Sob o ângulo linguístico, a sanção é uma ameaça, regulada pela norma jurídica ao nível do relato/cometimento, servindo de controle das expectativas possíveis para uma dada situação fática. Logo, a sanção tem um duplo viés, a saber, o relato (informação/comunicação) e o cometimento (metacomunicação/ como se deve entender a informação).[9]

Como síntese,

o Direito Penal é o conjunto de normas que ligam ao crime, como fato, a pena como consequência, e disciplinam também as relações jurídicas daí derivadas, para estabelecer a aplicabilidade de medidas de segurança e a tutela do direito de liberdade em face do poder de punir do Estado.[10]


3. Garantias gerais do direito moderno

Resumidamente, segundo Kelsen, A técnica jurídica moderna desenvolveu alguns institutos para resguardar o ordenamento jurídico. As garantias preventivas procuram evitar a produção de atos irregulares. Já as garantias repressivas reagem contra atos irregulares produzidos, impedindo sua renovação no futuro e reparando o dano que eles causaram.[11]

Como exemplos das garantias preventivas, nas searas constitucional e penal, há os tribunais, cujo papel é tutelar bens individuais garantidos pela Constituição Federal (v.g., direitos fundamentais individuais ou pessoais) de possíveis intromissões nefastas de terceiros.

A organização em tribunal do órgão de criação do direito é não apenas a garantia preventiva mais característica da regularidade dos atos a produzir, mas também a primeira do grupo de garantias que chamamos pessoais. As outras são a responsabilidade penal e disciplinar, assim como a responsabilidade civil do órgão que produz um ato irregular.[12]

Como exemplo de garantias repressivas, em certo sentido, há o aparato estatal, englobando polícia, Ministério Público, sistema prisional e o próprio ordenamento penal, o qual tipifica crimes e estabelece as sanções cabíveis. A responsabilidade penal e civil (responsabilidade pecuniária pelos danos causados por certos atos, por exemplo), assim, são garantias repressivas também.


4. Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal Penal

4.1. Diferença entre Princípio da Legalidade e Princípio da Reserva Legal

Alguns doutrinadores, como Flávio Augusto Monteiro de Barros[13], intentam em levar a efeito uma distinção entre o Princípio da Legalidade e o da Reserva Legal. Segundo parte dos autores, a diferença estaria no fato de que, ao se falar de Princípio da Legalidade, estar-se-ia a adotar quaisquer dos diplomas elencados pelo art. 59 da CF (leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções); já, quando se menciona o Princípio da Reserva Legal, estar-se-ia a limitar a criação legislativa, em matéria penal, somente às leis ordinárias e às leis complementares.[14]

Bem observa Rogério Greco:

O melhor seria restringir ainda mais a possibilidade de edição de diplomas penais, ficando limitada tal possibilidade às leis complementares, tal como ocorre na Espanha, que adota as chamadas Leis Orgânicas, que lhe são equivalentes. Assim, com a exigência de um quorum qualificado para a sua aprovação (maioria absoluta, de acordo com o art. 69 da Constituição Federal), tentaríamos, de alguma forma, conter a “fúria do legislador”, evitando a tão repugnante inflação legislativa.[15] (grifos nossos)

Todavia, segundo Fernando Capez, dissentido do entendimento majoritário:

Pensamos que Princípio da Legalidade é gênero que compreende duas espécies: Reserva Legal e Anterioridade da Lei Penal. Com efeito, o Princípio da Legalidade corresponde aos enunciados dos arts. 5º, XXXIX, da Constituição Federal e 1º do Código Penal [...] e contém, nele embutidos, dois princípios diferentes: o da Reserva Legal, reservando para o estrito campo da leia existência do crime e sua correspondente pena [...], e o da Anterioridade, exigindo que a lei esteja em vigor no momento da prática da infração penal (lei anterior e prévia cominação). Assim, a regra do art. 1, denominado Princípio da Legalidade, compreende os princípios da Reserva Legal e da Anterioridade.[16]

De qualquer modo, ao se adotar a expressão Princípio da Legalidade, em sede de Direito Penal, deve-se ter em mente a criação legislativa somente por leis ordinárias e por leis complementares.[17] Por cabo, assim como Rogério Greco[18], Cláudio Brandão, Heleno Cláudio Fragoso[19] e Alberto Silva Franco[20], bem como a maior parte da doutrina, concordamos que, na prática, o Princípio da Legalidade e o Princípio da Reserva Legal são sinônimos.

4.2. O Estado de Direito e o Princípio da Legalidade

Estado de Direito e Princípio da Legalidade são dois conceitos quase inseparáveis, uma vez que num legítimo Estado de Direito, formulado com a função de retirar o poder absoluto das mãos do soberano, exige-se a subordinação de todos perante a lei.[21]

Para Lenio Streck, o Estado de Direito aparece desde logo como Estado que, nas suas relações com os sujeitos, submete-se a um regime de direito, quando, então, a atividade estatal somente pode desenvolver-se através de instrumentos regulados e autorizados pela ordem jurídica, bem como os indivíduos, cidadãos, têm acesso a mecanismos jurídicos aptos a salvaguardar-lhes de abusos do Estado.[22]

Paulo Bonavides preleciona que o Princípio da Legalidade nasceu do anseio de formular, na sociedade, normas válidas, as quais fossem criações da razão e pudessem abrigar os indivíduos de uma conduta arbitrária e imprevisível por parte dos governantes. Tinha-se por cerne alcançar um estado geral de confiança e certeza na ação dos titulares do poder, evitando-se, desse modo, a dúvida, a intranquilidade, a desconfiança e a suspeição, tão comuns onde o poder é absoluto, onde o governo possui uma vontade pessoal soberana e onde, portanto, as regras de convivência não foram previamente criadas nem reconhecidas.[23]

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Hodiernamente, os países que possuem uma Constituição rígida [...] adotam um verdadeiro Estado Constitucional de Direito, no qual a Constituição, como fonte de validade de todas as normas, não pode ser contrariada pela legislação que lhe é inferior. Como Instrumento de defesa da hierarquia constitucional existe o controle de constitucionalidade das leis.[24]

Ademais, além do controle de constitucionalidade, há outro instrumento com o objetivo da perfeita acomodação dos textos legais à norma constitucional, a saber, a interpretação conforme a Constituição. Decerto, não se faz mister aprofundar este último conceito, pois o vernáculo dá uma ideia clara do seu significado.

4.3. Considerações históricas e introdutórias

O Princípio da Legalidade tem sua origem remota na Magna Carta Inglesa (1215), editada ao tempo do rei João Sem Terra[25], a qual estabelecia que nenhum homem livre poderia ser punido senão pela lei da terra. Mesmo antes do surgimento do período humanitário do direito penal, Thomas Hobbes defendia o princípio da legalidade, assim, a sanção, deveria ser uma consequência lógica do antecedente, a saber, a violação de leis estabelecidas previamente pelo Estado. Sem lei anterior, a punição, deveras, seria arbitrária, destarte, engendra-se a necessidade de definir e classificar os delitos.[26]

Segundo esse Princípio da Reserva Lega, vem à baila a definição de Hobbes sobre a punição: “dano infligido pela autoridade pública, a quem fez ou omitiu o que pela mesma autoridade é considerado transgressão da lei, a fim de que assim a vontade dos homens fique mais disposta à observância”.[27] Todavia, o princípio da legalidade, exposto no Leviatã, só seria consagrado após a Revolução Francesa (1789).[28]

A causa próxima de tal princípio, está no ideário do Iluminismo ou Ilustração, em especial na obra Dos delitos e das penas (Cesare Beccaria, 1764) [29], bem como na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) [30], nos seguintes termos: “Ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada(art. 8º).”[31]

A partir da Revolução Francesa, o Princípio da Legalidade – verdadeira pedra angular do estado de Direito – converte-se em uma exigência de segurança jurídica e de garantia individual. O seu fundamento político radica principalmente na função de garantia da liberdade do cidadão ante a intervenção estatal arbitrária, por meio da realização da certeza do direito. O significado científico ou jurídico aparece na teoria da pena como coação psicológica de Feuerbach e, ao depois, na teoria da tipicidade de Bilding.[32]

Todavia, hodiernamente, o grande mentor de tal princípio foi Anselm von Feuerbach[33], que, no início do século XIX, consagrou a máxima latina nullum crimen, nulla poena sine lege.[34] Sendo considerado o pai do Direito Penal moderno.[35]

  O Princípio da Legalidade constitui um dos princípios limitadores/reguladores do poder punitivo estatal. As ideias de igualdade e de liberdade, apanágios do Iluminismo, deram ao Direito Penal uma feição formal menos cruel do que aquela que predominou durante o Estado absolutista, impondo limites à intervenção estatal nas liberdades individuais. Alguns desses princípios limitadores passaram a integrar os Códigos Penais dos países democráticos e, afinal, constituíram-se em máximas constitucionais, como garantia de respeito aos direitos fundamentais do cidadão.[36]

Nossa Constituição (art. 5º) absorveu alguns desses princípios, os quais têm por escopo orientar o legislador ordinário para a adoção de um sistema de regulação penal voltado para os direitos humanos, erigidos em um Direito Penal mínimo e garantista.[37]

A gravidade dos instrumentos que o Estado utiliza na repressão do delito, a drástica intervenção nos direitos mais elementares e fundamentais da pessoa, o caráter de ultima ratio (último recurso a ser usado, quando todos os outros falharam) que esta intervenção deve ter, impõe inexoravelmente a busca de um princípio para controlar o poder punitivo estatal e que restrinja sua aplicação em limites que excluam toda arbitrariedade e excesso do jus puniendi. Tal princípio seria o da Legalidade, ora abordado.

4.4. Conceituação

O principio em tela é o estudo da lei penal em seu caráter intrínseco, uma vez que cuida da substância ou essência da lei. O Estado utiliza aquele princípio com o escopo de exercer sua potestade de repressão penal, por outro lado, o mesmo princípio limita o reino de arbítrio, haja vista que um indivíduo só pode ser considerado criminoso após prévia tipificação da conduta na lei como crime.

Pode-se dizer que, pelo Princípio da Legalidade, a elaboração de normas incriminadora é função exclusiva da lei, isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. A lei deve definir com precisão e de forma cristalina a conduta proibida.[38]

Pelo Princípio da Legalidade, alguém só pode ser punido se, anteriormente ao fato por ele praticado, existir uma lei que o considere como crime. Ainda que o fato seja recriminável moralmente, antissocial ou danoso, não há de se falar na possibilidade de se punir o autor.[39]

Cláudio Brandão acrescenta, com propriedade, que o sistema penal tem como partes o Estado e a pessoa humana, logo, o Princípio da Legalidade equilibra o sistema penal, possibilitando ao Estado, por um lado, uma fonte para a emissão de suas regras, por outro, possibilita à pessoa humana garantias. Assim, consoante a orientação hodierna, o legislador esculpiu- na Constituição brasileira de 1988, ao tutelar os direitos e garantias fundamentais-, o Princípio da Legalidade no art. 5º, XXXIX, ao dizer: “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal” (grifos nossos). Bem asseveram Rogério Greco[40] e Mirabete[41] que tal princípio também está presente no art.1º do Código Penal, quase com a mesma redação da Constituição Federal. Para Luis Regis Prado,

a dicção legal tem sentido amplo: não há crime (infração penal) nem pena ou medida de segurança (sanção penal) sem prévia lei (stricto sensu). Isso vale dizer: a criação dos tipos incriminadores e de suas respectivas consequências jurídicas está submetida à lei formal anterior (garantia formal). Compreende, ainda, a garantia substancial ou material que implica uma verdadeira predeterminação normativa (lex scripta lex praevia et lex certa).[42]

“É o Princípio da Legalidade, sem dúvida alguma, o mais importante do Direito Penal. [...] A lei é a única fonte quando se quer proibir ou impor condutas sob a ameaça de sanção. Tudo o que não for expressamente proibido é lícito em Direito Penal.” [43]

Portanto, segundo Capez, podemos resumir assim: o Princípio da Legalidade, na seara penal, corresponde a uma aspiração fundamental do homem, a saber, a de ter proteção contra formas tirânicas e arbitrárias dos detentores do exercício do poder, capaz de lhe salvaguardar a convivência social, sem o perigo de ter a sua liberdade limitada pelo Estado, salvo nas hipóteses previamente estabelecidas em regras gerais, abstratas e impessoais. Ademais, assim, a lei não pode se furtar de definir (tipificar o crime), propiciando ao sujeito prévio e integral conhecimento das consequências penais da prática delituosa, outrossim, evita invasão arbitrária em seu direito de liberdade.[44]

Do ponto de vista jurídico, o princípio ora abordado, alcança a hermenêutica da lei penal, como será abordado abaixo.

4.5. Garantias, Funções e Consequências

O Princípio da Reserva Legal dá lugar a uma miríade de garantias e consequências em que se manifesta o seu aspecto material, o que importa em restrições ao legislador e ao intérprete da lei penal. Destarte, ser traduzido no sintético apotegma nullum crimen, nulla poena sine lege praevia, scripta et stricta.

Esse postulado apodítico cumpre funções reciprocamente condicionadas: limitação das fontes formais do Direito penal e garantia da liberdade pessoal do cidadão. Faz-se, também, distinção entre mera legalidade, que tem na lei condição indispensável do delito e da pena [...], e o postulado da estrita legalidade, como modelo regulativo que exige as demais garantias como fundamento da legalidade penal.[45]

4.5.1. Exigência de lei estrita (lei taxativa) ou proibição do emprego de analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas (nullum crimen, nulla poena sine lege stricta)

É mister ressaltar que a lei penal deve ser interpretada- e isto também ocorre com o princípio da analogia-, de modo peculiar, diferindo das normas existentes em outras searas do direito.

Basicamente, a analogia é o processo cognitivo que integra uma lacuna existente na lei a partir de argumento de semelhança, logo, segundo o professor Brandão, a analogia permite a regulação de certo caso que “não se encontra tratado na perspectiva linguística-conceitual da norma, a partir de um processo de comparação.” A proibição da analogia decorre do Princípio da Legalidade. Caso uma conduta não se conforme perfeitamente ao modelo hipotético da ação ou omissão que a norma penal descreve, não é exequível ou executável (para utilizar a expressão de José Afonso da Silva) a aplicação da norma. Isto se configura, pois, o Direito Penal não tolera a aplicação das normas a fim de incriminar condutas análogas àquelas típicas. Destarte, o juiz não pode substituir o legislador para cria um novo tipo penal ou para onerar a punibilidade dos crimes já previstos.

Doravante, conclui-se que só a lei pode tipificar o conteúdo da ação digna de uma pena e suas consequências jurídicas, ou seja, só há de se falar em crime quando houver uma lei estrita taxativa, previamente fixando uma determinada conduta como delituosa.[46]

Logo,

não há crime nem pena sem lei em sentido estrito, elaborada na forma constitucionalmente prevista. O caráter absoluto de reserva legal impede a delegação por parte do poder legiferante de matéria de sua exclusiva competência, lastreado no Princípio da Divisão de Poderes.[47]

Assim, só o Poder Legislativo pode legislar, no que toca à determinado assunto, tal como tipificar e definir infração penal e imputar-lhe a respectiva consequência jurídica. O Princípio da Legalidade, como princípio de legitimação democrática, deve informar e presidir a atividade produtora normativa penal. Destarte, tem tal princípio, deveras, um papel negativo no sentido de que o objetivo imediato e essencial é o de impedir o acesso do Poder Executivo à normação penal. Daí a importância e o fundamento da lei, na seara penal, emergem de maneira clara quando se destaca o significado de máxima garantia que representa para o indivíduo: tutela sine qua non em face da incidência da sanção penal sobre o bem jurídico essencial, a saber, a liberdade pessoal. Portanto, o vetor que justifica a escolha do Legislativo como o único detentor do poder normativo, em sede penal, reside em sua legitimação democrática (representatividade popular – art. 1º, parágrafo único, CF), fazendo com que seu exercício não seja arbitrário.[48]

Bem ressalta Mirabete que, segundo o Princípio da Reserva Legal, é prerrogativa da

lei (emanada pelo Poder Legislativo, através de procedimento estabelecido em nível constitucional) para a definição dos crimes e cominação das sanções penais, o que afasta não só outras fontes do direito como as regras jurídicas que não são lei em sentido estrito, embora tenham o mesmo efeito, como ocorre, por exemplo, com a medida provisória, instrumento totalmente inadequado para tal finalidade.[49]

Para utilizar um exemplo bem simples, o art. 121 do Código Penal diz: “matar alguém: pena – reclusão de 6 (seis) a 20(vinte anos).” Ou seja, o homicídio está tipificado (matar alguém), não podendo o intérprete/aplicador usar esta tipificação para aplicá-la a uma situação não prevista como- por exemplo, usando um caso bem fácil-, alguém que mate um rato, claramente, não pode responder perante juízo por homicídio. Logo, ao juiz é vedado impor pena a condutas distintas da descrita pelo tipo penal.

Resumindo, “em razão do Princípio da Legalidade é vedado o uso da analogia para punir alguém por um fato não previsto em lei, por ser este semelhante a outro por ela definido”.[50]

Não obstante o que foi dito, a proibição do uso da analogia no Direito penal não é absoluta. O Princípio da Legalidade tem por escopo proteger a pessoa humana diante da possibilidade de ser imputada uma sanção, portanto, a analogia vedada é a in malam partem, ou seja, a que prejudique o sujeito, sendo a analogia in bonam partem (que beneficie o cidadão) permitida, haja vista que contribui para estender a liberdade.  

Para dar um exemplo, seguindo o do professor Brandão, o art. 128, II, do Código Penal permite o aborto em caso de estupro, logo, uma gravidez resultante de atentado violento ao pudor não poderia ser interrompida. Todavia, havia o entendimento majoritário que, por analogia in bonam partem, o aborto resultado de atentado violento ao pudor também é descriminalizado. É importantíssimo ressaltar que tal exemplo é meramente explicativo e elucidativo, uma vez que, desde 2009, o tipo atentado violento ao pudor (art. 214 do CP) foi revogado, sendo o tipo penal do estupro, art. 213 do CP, (nova redação do caput determinada pela Lei n. 12.015, de 7-8-2009) expandido, passando a englobar tanto a conjunção carnal quanto a prática de outros atos libidinosos.

Ademais, segundo Cláudio Brandão, deve-se distinguir a analogia da interpretação analógica. Na primeira, integra-se, através de um processo lógico de comparação, uma lacuna da norma, através do qual se regula um caso por uma norma semelhante. Já na interpretação analógica, o hermeneuta não se afasta do relato da norma, mas, sim, atém-se ao sentido literal possível da regra jurídica.

Por último, interessante notar que, no âmbito penal, a fim de resguardar ao máximo a liberdade dos cidadãos, a interpretação deve ser sempre restritiva da punibilidade e, in dúbio pro reo (em caso de dúvida na interpretação, esta deve favorecer o réu). Portanto, analogia, interpretação analógica, interpretação extensiva (extensão analógica), literal ou restritiva devem sempre, no Direito Penal, favorecer o cidadão do arbítrio do Estado.[51] É o que se pode notar no relatório do ministro Ayres Britto:

A orientação jurisprudencial desta nossa Casa de Justiça é firme em conferir interpretação extensiva e aplicação analógica à norma contida no art. 580 do CPP. (...) Isso para admitir a aplicação do efeito extensivo mesmo às hipóteses de decisão favorável proferida em sede não recursal (como, por exemplo, em revisão criminal ou em habeas corpus) ou, se resultante de recurso, mesmo à decisão proferida por instância diversa ou de superior hierarquia, ainda que o paciente, ele próprio, haja recorrido." (HC 107.731-Extn, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 13-9-2011, Segunda Turma, DJE de 2-3-2012.) [52]

4.5.2. Exigência de lei certa (lei taxativa) ou proibição de incriminações vagas e indeterminadas (nullum crimen, nulla poena sine lege certa)

A fim de evitar o esvaziamento do Princípio da Legalidade, o legislador deve ater-se ao preceito de conceituar com clareza e individualizar a conduta delituosa, cominando a pena. Assim, “exige-se que o legislador descreva da forma mais exata possível o fato punível” [53], ou seja, a definição do preceito e da sanção, contidos na lei penal, deve ser precisa, a fim de limitar o arbítrio do jus puniendi do Estado.

Exige o princípio ora em estudo que a lei defina abstratamente um fato, ou seja, uma conduta determinada de modo que se possa reconhecer qual o comportamento considerado como ilícito. Infringe, assim, o Princípio da Legalidade a descrição penal vaga e indeterminada que não possibilita determinar qual a abrangência do preceito primário da lei penal e possibilita com isso o arbítrio do julgador.

Também infringe o Princípio da Legalidade a cominação de penas relativamente indeterminadas em margens elásticas.[54]

Infelizmente, o legislador contemporâneo tem utilizado, na linguagem legal, signos ou significantes vagos, imprecisos e ambíguos, como “bem comum”, “utilidade pública”, “dignidade da pessoa humana”, “interesses da pátria”, “honra alheia”, “atos libidinosos”, “proporcionalidade”, “razoabilidade”, etc. Assim, as pessoas ficam sujeitas à instabilidade e à insegurança, pois esses termos, extremamente genéricos e vagos, permitem a mobilidade semântica, por parte do intérprete em quase qualquer direção, ou seja, em casos extremos, o intérprete legisla ao seu talante! Foi o que ocorreu com o Direito Penal da Alemanha nazista, da Itália fascista e da União soviética, logo após a Revolução bolchevique.[55]

O Princípio da Legalidade exige do legislador, quanto ao uso da linguagem, signos claros, os quais possibilitem a individualização do modelo abstrato da conduta tipificada como delituosa.[56] Isto possibilita a restrição da liberdade decisória do juiz (arbitrium judicis) a determinados parâmetros legais, os quais não podem ser ultrapassados no momento da aplicação da lei ao caso concreto.

Neste ponto, todavia, Capez faz uma ressalva genial, há que se atentar para certas exceções. A vedação de cláusulas gerais não alcança, claramente, os crimes culposos, pois nestes, por maior esmero e acuidade que o legislador tenha, não terá condições de prever e pormenorizar todas as condutas humanas ensejadoras da composição típica. Toda tentativa de aprofundar uma conduta culposa será sempre insuficiente para abarcar a infinidade de possibilidades do mundo fático. Isso porque o mundo fático é infinitamente contingente (há infinitas possibilidades). Por este motivo, nos crimes culposos, as previsões típicas serem todas genéricas, limitando-se o legislador a dizer: “se o crime é culposo, pena de tanto a tanto”. São os alcunhados “tipos abertos”. ”Com efeito, como poderia a lei antever todas as formas de cometer um homicídio por imprudência, negligência ou imperícia”?[57] Portanto, os tipos culposos são denominados abertos.

Repetindo o que dissemos anteriormente, as fórmulas excessivamente genéricas, criam efeitos nefastos, deletérios e funestos, a saber, acarretam a insegurança no meio social, deixando ao juiz larga e perigosa margem de discricionariedade.[58]

4.5.3. Exigência de lei escrita ou proibição da criação de crimes e penas pelos costumes (nullum crimen, nulla poena sine lege scripta)

Segundo Capez,

nenhuma outra fonte subalterna pode gerar a norma penal, uma vez que a reserva de lei proposta pela Constituição é absoluta, e não meramente relativa. Assim, somente a lei, na sua concepção formal e estrita, emanada e aprovada pelo Poder Legislativo, por meio de procedimento adequado, pode criar tipos e impor penas.[59]

Porém, faz-se mister fazer algumas considerações. Primeiramente, o que vem a ser costume?          

O costume é uma norma jurídica que aflui de maneira espontânea, como resultado da sucessão reiterada de atos, sempre tendo um aspecto subjetivo essencial: a convicção de sua obrigatoriedade. Nas palavras de Maria Helena Diniz: “o costume decorre da prática reiterada de certo ato com a convicção de sua necessidade jurídica.” [60]

A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, art.4º, caput, assevera que em caso de lacuna, o interprete pode recorrer ao costume. Todavia, neste ponto, o Direito Penal é peculiar. O costume não pode ser usado para incriminação de condutas nem para imputar penas, pois, destarte, a segurança jurídica estaria em perigo; o Ordenamento Punitivo exige, para tipificação do ilícito ou da sanção, a formalização legal (lei) da conduta.

Todavia, o Direito Penal tem o condão de sempre beneficiar o sujeito, portanto, a norma costumeira só pode ser aplicada para beneficiar o réu (in bonam partem). Assim, a norma consuetudinária, que é tida como lícita (socialmente adequada), pode ensejar a tipicidade de uma conduta pelo consenso social. 

Como exemplo de costume derrogatório (contra legem), vem à baila o art. 129 que tipifica a lesão corporal. Porém, o tatuador, em princípio, ao exercer seu ofício, estaria a praticar um crime. Todavia, a tatuagem (costume) é uma conduta aceita e tida como lícita pelo consenso social, logo, não há de se falar em crime neste caso.

Outro exemplo bastante interessante, citado pelo professor Brandão, vem à lume pelo que é dito no art. 229 do Código Penal:

Manter, por conta própria ou de terceiro, casa de prostituição ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso, haja, ou não, o intuito de lucro ou mediação direta de proprietário ou gerente: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Logo, em conformidade com o artigo, os motéis, enquadrar-se-iam no conceito de recintos que estimulam a prostituição e encontros para fim libidinoso, ademais, é fato público e notório que, outrossim, há o intuito de lucrar. Destarte, em princípio, tais recintos configuram o tipo penal de casa de prostituição. Todavia, hodiernamente o costume derrogatório da manutenção de motéis é visto como consensual e aceito pela sociedade, sendo assim, o costume exclui a reprovação social da conduta em tela. Desta feita, refletindo a sociedade, há várias jurisprudências excluindo o motel da tipificação do art. 229, como exemplo, citar-se-á um trecho do conteúdo da decisão absolutória do Tribunal de Justiça de São Paulo (AC n. 98.873, rel. des. Luiz Betanho):

Quando se trata não de um erro, mas de ilícito repetido, numeroso e comum, é necessário reavaliar até que ponto a moralidade média da sociedade (enfoque fundamental nos crimes contra o costume) realmente considera criminosa a conduta, a fim de se alargar ou reprimir o âmbito de interpretação. Não se pode, em outras palavras, desconhecer a dramática alteração de costumes por que tem passado nosso país, desde que entrou em vigor o Código Penal, há cinqüenta anos.[61]

Como visto, portanto, a norma consuetudinária derroga a imputação/incidência do art. 229. Nesse diapasão, o costume in bonam partem - porquanto ser uma conduta que brota da seara social, sendo aceita e socialmente adequada-, também é aceito pelo Direito Penal. Com efeito, o Direito Penal, segundo o Princípio Minimalista de intervenção, tem como um de seus cernes a defesa da liberdade.

Em resumo, A lei formal, e tão somente ela, é fonte criadora de crimes e de penas, de causas agravantes ou de medidas de segurança, sendo inconstitucional a utilização em seu lugar de qualquer outro ato normativo (v.g., medida provisória), do costume ou do argumento analógico in malam partem – exigência de lei escrita (nulla poena sine lege scripta).[62]

4.5.4. Exigência de lei prévia ou proibição da retroatividade da lei penal (nullum crimen, nulla poena sine lege praevia)

Como última consequência do Princípio da Legalidade, há a irretroatividade da lei penal que prejudique o réu de alguma forma. Se as normas penais pudessem retroagir indistintamente (inclusive para prejudicar o sujeito), a segurança jurídica- e, mais especificamente, o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (elencados no art. 6º,§1º,§2º e §3º, da LINDB, respectivamente) -, um dos valores cardeais do direito ficaria em perigo. Neste sentido, por exemplo, (usar-se-á um exemplo proferido pelo professor Elias Dubard de Moura Rocha, em aula de Introdução ao Estudo do Direito 1, ano de 2009, UNICAP), uma lei penal a posteriori, que tipificasse o ato de consumir cannabis sativa como crime, geraria o caos, imagine-se o problema que seria investigar denúncias, processar e condenar todas as pessoas que um dia consumiram a  dita erva!

Assim, perfaz-se o postulado da anterioridade da lei penal no que toca ao crime e à pena. Somente poderá ser imputada, ao criminoso, pena que esteja prevista anteriormente na lei como aplicável ao autor do crime tipificado.[63] Logo, Segundo Rogério Greco, com essa vertente do Princípio da Legalidade, aflora a certeza de que ninguém será punido por um fato que, ao tempo da ação ou da omissão, era tido como indiferente penal, haja vista a inexistência de qualquer lei penal incriminando-o.[64]

Porém, faz-se necessário um adendo, o Princípio da Legalidade permite a retroatividade da lei penal se, e somente se, de alguma forma, esta puder beneficiar o réu. Inclusive, o Código Penal, expressamente, em seu art. 2º:

Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que a lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela todos os efeitos penais da sentença condenatória.

Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Consagra-se, desse modo, o princípio constitucional da irretroatividade da lei penal, ressalvada a retroatividade favorável ao acusado – “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (art. 5º, XL , CF).Trata-se, pois, de restringir o arbítrio legislativo e judicial na feitura ou na aplicação retroativa de lei prejudicial.[65]

Ao cabo, bem assevera Paulo Souza de Queiroz:

Excepcionalmente, porém, a norma operará retroativamente, alcançando, por conseguinte, situações anteriores à sua entrada em vigor, sempre que for mais benéfica para o infrator, ou porque lhe é mais branda (Lex mitior) ou porque descriminaliza a conduta (abolitio criminis).[66]

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Sobre o autor
Eduardo Almeida Pellerin da Silva

1. Formação acadêmica: graduação em Direito pela Faculdade de Direito do Recife (FDR)/Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) (2016) e especialização em Processo Civil pela Faculdade Damásio (2018); 2. Atuação profissional: advogado proprietário do escritório Eduardo Pellerin Advocacia e Consultoria, o qual atuou com advocacia estratégica e consultiva, em Direito Civil, Consumidor e Administrativo (2020-2021), advocacia estratégica e consultiva, em Direito Civil, Administrativo e Processo Civil para Pequeno e Beltrão Advogados (2020-2021), assistente de Desembargador e servidor público federal do TRT6 (2021), assistente de Juíza e analista judiciário do TRT2 (2022-atual); 3. Concursos: aprovado em vários, com destaque para o TRF5, TRT6, TRT1, TRT2 e TRT15; 4. Pesquisa e produção: autor do livro "O ativismo judicial entre a ética da convicção e a ética da responsabilidade: a racionalidade da melhor decisão judicial de controle de políticas públicas diante da ineficiência estatal na concretização de direitos fundamentais", pesquisador bolsista do PIBIC UFPE/CNPq - no Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), linha de pesquisa: "A metafísica da doutrina do Direito em Kant: moral, ética e Direito" (2015-2016), publicou capítulo de livro, doze artigos científicos, em revistas jurídicas especializadas, jornais, anais de eventos e apresentou artigos, em congressos científicos; 5. Ensino: foi monitor das cadeiras de Introdução ao Estudo do Direito I, Direito das Coisas e Processo de Execução; 6. Extensão: Serviço de Apoio Jurídico-Universitário (SAJU) e Pesquisa-Ação em Direito (PAD): As relações entre a ficção jurídica e a ficção literária; 7. Formação complementar: fez vários cursos em Direito, Ciência Política, Português e Oratória; 8. Congressos: participou de mais de uma dezena. Currículo: http://lattes.cnpq.br/9336960491802994

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Eduardo Almeida Pellerin. Algumas lucubrações sobre o princípio da legalidade no Direito Penal brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3520, 19 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23745. Acesso em: 22 dez. 2024.

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