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A legalidade do cadastro de reserva nos concursos públicos e o direito à nomeação dos candidatos

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06/03/2013 às 18:19
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7 – O CADASTRO DE RESERVA E O DIREITO À NOMEAÇÃO

Diante da guinada jurisprudencial demonstrada no item anterior, qual seja, o reconhecimento a direito subjetivo de candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital do certame, ocorre no Brasil recentemente à possibilidade de formação de um cadastro de reserva, o que exige do gestor público maior cautela na análise das fases procedimentais internas da realização do certame público.  Isso porque, referida situação pode dar ensejo a demandas judiciais que visem à nomeação destes candidatos, ou até mesmo, de candidatos em número superior ao previsto pela Administração.

Insta salientar, que é comum nos concursos haver candidatos aprovados em número superior ao previsto no edital do certame, o que significa que esses candidatos, mesmo não classificados nas vagas oferecidas, possuem as mesmas aptidões e capacidades para exercerem as funções inerentes ao cargo ou emprego disputado. São esses aprovados excedentes que formam o chamado “cadastro de reserva”.

Trata-se aqui de instrumento utilizado pelo gestor público, para planejar a reposição rápida da força de trabalho da máquina estatal, sem que para isso a Administração tenha que se valer de novo concurso público para novas contratações. Referida situação ocorre com frequência naqueles cargos em que se nota uma maior rotatividade de agentes público, ocasionada, dentre outras, pela baixa remuneração paga aos servidores.

Ocorre que, nem todos os cargos ou empregos públicos de provimento efetivo ofertados pela Administração Pública, comporta a fixação de um cadastro de reserva no momento da realização do concurso público correspondente. Todavia, caso o gestor público opte pela sua formação, deve-se analisar dentro da fase procedimental interna do certame público, 3 (três) situações que norteiem a fixação, ou não, deste cadastro de reserva, a saber, o número de cargos existentes, o prazo de validade do concurso e limitação exata do número deste cadastro[16].

 Por lógica não será possível verificar a rotatividade dos aprovados para os cargos disputados com total precisão, uma vez que se trata de estatística empírica derivada da observação do comportamento dos aprovados de concursos anteriores com igualdade de cargos ofertados. Vale lembrar também, que deve o administrador público ficar atento à possibilidade de criação de novas vagas no decorrer da validade do concurso público, o que pode influenciar diretamente na fixação do quantitativo de vagas ofertadas para o cadastro de reserva.

Entretanto, com o nítido sentido de burlar a obrigatoriedade de nomeação dos candidatos aprovados dentro do número de vagas ofertadas no edital do certame, os gestores públicos têm publicado concursos com o fim exclusivo de formação de cadastro de reserva. Nessa modalidade não se especifica o número de vagas nos cargos ou empregos públicos em que os inscritos eram concorrer, o que se mostra desconforme com o real fundamento lógico do instituto do concurso público.

Segundo Fabrício Motta, “a existência de cargos constitui, em princípio, pressuposto lógico para a realização do procedimento de seleção”[17]. A frase se mostra apropriada, se interpretarmos a escrita da existência de cargos, como existência de vagas. Isso porque, conforme exposto no presente estudo, quando a Administração Pública deflagra certame público, ela manifesta real vontade no provimento daquele cargo ou emprego posto a disputa. Assim sendo, não se poderia valer de concurso público para cargo cuja vaga já esteja ocupada por outro servidor, se mostrando o procedimento seletivo como meio lógico inapropriado para esse fim, ou seja, seria “selecionar alguém para algo que não existe”[18].

Contudo, existem situações de cunho excepcional que podem dar ensejo à deflagração de concurso público exclusivo para formação de um cadastro de reserva, só que de forma temporário. Isso porque, não pode existir concurso com cadastro de reserva sem real necessidade de convocação dos aprovados, mesmo que o edital assim prescreva, sob pena ofensa ao fato gerador da necessidade do concurso público, qual seja, a necessidade real de provimento do referido cargo. Logo, podem-se ter como requisitos para publicação de concurso público com fim exclusivo de formação de cadastro de reserva, a urgência e a precariedade da causa impeditiva. O primeiro ocorre naqueles cargos em que a ausência de servidor possa acarretar a suspensão do serviço público derivado de sua função, ou seja, o não provimento imediato destes cargos, acarreta ofensa ao interesse público, por consubstanciar prestação inadiável da coletividade. O segundo requisito é comprovado quando existe real probabilidade da causa impeditiva de fixação de vagas deixe de existir, ou seja, a situação que impede que o edital preveja todas as vagas que os candidatos irão preencher, é precária tendo fim próximo ao da publicação do edital do certame.

Com efeito, estando ausentes qualquer destes requisitos, se mostra ilegal a publicação de edital com previsão exclusiva de formação de cadastro de reserva, uma vez que falta pressuposto lógico para existência do concurso público. Caso a Administração tenha interesse em contração por via escusa da seleção pública, deve adotar as medidas previstas na Constituição Federal, bem como preencher também seus requisitos, como no caso das contratações temporárias nos termos do artigo 37, IX.

Ocorre que não é essa a situação que se nota hoje em nosso país. Em muitos casos, a Administração publica edital de concurso público com cláusula exclusiva de formação de cadastro de reserva, sem preencher qualquer destes requisitos, deixando os candidatos inseguros quanto à nomeação, o que fulmina os princípios da segurança jurídica e da moralidade administrativa. Nesse sentido, atenta o doutrinador José dos Santos Carvalho Filho, in verbis:

A despeito de considerado legítimo, os candidatos ficam em situação de expectativa e instabilidade por desconhecerem quando haverá (ou mesmo se haverá) a convocação. Além disso, torna-se mais complexo o controle de legalidade da Administração em virtude de ampla liberdade que se lhe concede nesses casos, sendo difícil, inclusive, comprovar eventual arbitrariedade. Pode ser cômodo para a Administração, mas não nos parece seja ele o melhor método de garantir os direito dos candidatos; o melhor é aquele em que o edital já define previamente o número de vagas e o prazo de duração do certame, permitindo que todos possam aferir o comportamento da Administração na integralidade do processo competitivo.[19]

Nestes termos, a publicação de concurso público sem que haja ao menos um candidato aprovado e nomeado, mesmo que este tenha sido feito exclusivamente para preenchimento de cadastro de reserva, se mostra ilegal em razão da desídia do administrador público em observar as etapas de planejamento interno para deflagração do certame público, o que causa dispêndio de dinheiro, tempo, e de todo o aparato estatal, sem que ao fim se tenha conseguido cumprir a finalidade do instituto.

Em conclusão, pelo lado do candidato administrado, gera insegurança jurídica e desconfiança aos atos praticados pela Administração Pública, porquanto mesmo cumprindo todas as exigências contidas no edital do certame, os aprovados ficam em situação de expectativa e instabilidade por desconhecerem se haverá ou não a nomeação. Logo, os mesmos fundamentos que levaram a jurisprudência firmar o posicionamento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados dentro das vagas ofertadas no edital, devem também ser adotados para os aprovados no cadastro de reserva, sob pena de inaplicabilidade deste novo posicionamento dos tribunais brasileiros, fato que macula o direito fundamental de acesso aos cargos públicos e desabona a Administração Pública, uma vez que gera farta desconfiança por parte dos administrados.


8 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo – 24. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

MAIA, Márcio Barbosa ; QUEIROZ Ronaldo Pinheiro de. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007.

MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo, 6. ed. - Niterói: Impetus, 2012.

MEDAUAR, Odete, Direito Administrativo Moderno – 15. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro – 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

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ROCHA, Francisco Lobello de Oliveira. Regime jurídico dos concursos públicos – São Paulo: Dialética, 2006.


Notas

[1] CRETELLA JÚNIOR, 2002, Apud MAIA, Márcio Barbosa ; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 3.

[2] MAIA, Márcio Barbosa ; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de, Op. cit., p. 4.

[3] Ibidem, p. 6.

[4] “Artigo XXI (...) 2 – Toda pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.”

[5] MOTTA, Fabrício. Concurso Público: direito à nomeação e a existência de “cadastro de reserva”. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº. 24, dezembro, janeiro, fevereiro, 2011. Disponível na Internet: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-24-DEZEMBRO-JANEIRO-FEVEREIRO-2011-FABRICIO-MOTTA.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2011, p. 2.

[6] ATALIBA, Geraldo, 1985 Apud DALLARI, Adilson Abreu. Princípio da Isonomia e Concursos Públicos. In: Fabrício Motta (org.), Concurso Público e Constituição. Belo Horizonte, Editora Fórum, 2007, p. 92/93.

[7] MS 21.322-1, Rel. Min. Paulo Brossard, por maioria, DJU 1 de 23.04.1993

[8] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 24. ed. – São Paulo: Atlas, 2011, p. 540.

[9] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. – Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2009, p. 595/596.

[10] CARVALHO FILHO, José dos Santos, op. cit., p. 597.

[11] MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo, 6. ed. - Niterói: Impetus, 2012, p. 634/635.

[12] A Portaria MP nº 450/2002, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, estabelece normais gerais sobre concursos públicos realizados no âmbito da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo da União.

[13] MAIA, Márcio Barbosa ; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de, Op. cit., p. 136.

[14] RE 598099, STF – Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento: 10.08.2011, DJe 30.09.2011.

[15] RE 598099, STF – Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento: 10.08.2011, DJe 30.09.2011.

[16] Fabrício Motta adota apenas as duas primeiras como indicadores da possibilidade do cadastro de reserva, mas admite a ultima também em momento diverso. (MOTTA, Fabrício. Concurso Público: direito à nomeação e a existência de “cadastro de reserva”. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº. 24, dezembro, janeiro, fevereiro, 2011. Disponível na Internet: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-24-DEZEMBRO-JANEIRO-FEVEREIRO-2011-FABRICIO-MOTTA.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2011)

[17] Idem, ibidem.

[18] Idem, ibidem.

[19] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. – Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2009, p. 606.


ABSTRACT: The public tender aims to select the candidates who will best perform the function of inherent public office or public employment. Given the highly competitive, there are more candidates than the number of vacancies, which gives rise to the creation of a register of booking. The legality of this type is subject to certain requirements, which if not followed the exhibition culminates in illegality.

KEY WORDS: Public tender; Master Reserve; Appointment; Legality.

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Sobre o autor
Antônio Rodrigues Miguel

Advogado integrante do escritório Tayrone de Melo Advogados, pós-graduado em Direito Administrativo e Constitucional pela Puc-GO, pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro, pós-graduado em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás. Membro da comissão de Direito Digital e Informática da OAB/GO e da Comissão Direito do Consumidor da OAB/GO, membro do IGDD – Instituto Goiano de Direito Digital.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MIGUEL, Antônio Rodrigues. A legalidade do cadastro de reserva nos concursos públicos e o direito à nomeação dos candidatos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3535, 6 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23891. Acesso em: 22 nov. 2024.

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