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Evolução constitucional da remuneração dos agentes políticos municipais

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Sumário: 1.Introdução 2.Agentes políticos 3.Autonomia Municipal 4.Figuras remuneratórias atuais 4.1.Subsídios dos agentes políticos 4.2.Teto remuneratório 4.3 Direito adquirido à remuneração 4.4 Revisão Geral Anual 4.5 Fixação dos subsídios 4.6 Limites à fixação a) 5% da receita do Município b) Art. 29-A, CF/88 c) Subsídio dos Deputados Estaduais (para Vereadores) 5. Conclusão.


1.Introdução

O presente trabalho tem o propósito de estudar a remuneração dos agentes políticos municipais ao longo das constituições brasileiras, começando pela de 1824 e culminando na Constituição Cidadã de 1988, especialmente no que pertine às Emendas Constitucionais n.º 19 de 04 de Junho de 1998 em n. º 25 de 14 de Fevereiro de 2000.[1]

No decorrer da dissertação, procurar-se-á responder e esclarecer os pontos mais discrepantes na doutrina e jurisprudência, orientando o leitor acerca dos mais novos pontos introduzidos pelas emendas supracitadas.

Entrementes, antes de adentrar especificamente no tema, cumpre rever alguns conceitos necessários para a compreensão do tema ora debatido, bem como abordar, brevemente, outros aplicáveis ao estudo do direito constitucional, tais como a questão da interpretação e aplicabilidade das normas constitucionais e os princípios consagrados no artigo 37, caput[2], da nossa lex mater.

A conclusão do trabalho demonstra o resultado encontrado na singela pesquisa relativa à evolução constitucional da remuneração dos agentes políticos municipais, particularmente no tocante ao novo sistema remuneratório de tais agentes, estabelecido pelas Emendas Constitucionais 19/98 e 25/00, com a esperança de ter dado, a contento, os esclarecimentos necessários.


2.Agentes Políticos

Antes de embrenhar-se no cerne do tema escolhido, faz-se mister, para uma melhor percepção, conceituar a expressão "agente político".

Agentes políticos são "os titulares de cargos estruturais na organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder".[3]

O vínculo exercido entre estes agentes e o Estado, portanto, não é profissional, e sim, de natureza política, porquanto exercem um múnus público.

Nessa esteira, o saudoso Hely Lopes Meirelles nos ensina com propriedade que "agentes políticos são os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais".[4]

Ainda a respeito do assunto em tela, calha trazer à colação magistério de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, quando afirma: "a função política implica uma atividade de ordem superior referida à direção suprema e geral do Estado em seu conjunto e em sua unidade, dirigida a determinar os fins da ação do Estado, a assinalar as diretrizes para as outras funções, buscando a unidade de soberania estatal".[5]

Essas funções políticas estão abarcadas pelo Poder Legislativo e Executivo, como também pelo Poder Judiciário e Ministério Público. Nesta categoria encontram-se os Chefes de Executivo (Presidente da República, Governadores e Prefeitos) e seus auxiliares imediatos (Ministros e Secretários de Estado e de Município); os membros das Corporações Legislativas (Senadores, Deputados e Vereadores); os membros do Poder Judiciário (Magistrados em geral); os membros do Ministério Público (Procuradores da República e da Justiça, Promotores e Curadores Públicos); os membros dos Tribunais de Contas (Ministros e Conselheiros); os representantes diplomáticos e "demais autoridades que atuem com independência funcional no desempenho de atribuições governamentais, judiciais ou quase-judiciais, estranhas ao quadro do serviço público".[6]

Hely Lopes com a propriedade de sempre afirma:

"O art. 37, XI, da CF de 1988, com a redação da EC 19/98, consagra esse entendimento. De fato, essa norma, ao relacionar os agentes políticos remunerados mediante subsídio, menciona os ‘membros de qualquer dos poderes’, ‘os detentores de mandato eletivo’, e emprega, a seguir, a expressão ‘e dos demais agentes públicos’, deixando, assim, entrever que outros agentes também são considerados agentes públicos".[7]

À vista do presente trabalho limitar-se apenas aos agentes políticos municipais, discorrer-se-á somente sobre Vereadores, Prefeitos e Vice-Prefeitos.


3.Autonomia Municipal

A remuneração dos agentes políticos municipais está intimamente ligada à questão da autonomia municipal, porquanto sem esta, aquela não se concretiza.

Assinala o Prof. José Alfredo de Oliveira Baracho: "A existência na Federação brasileira de três esferas de governo, que são a federal, a estadual e a municipal, gera a distribuição de encargos e serviços, nas três áreas de competência, mas gera, também, particularidades no que toca à definição institucional e constitucional dos entes destacados".[8]

Acerca da evolução da autonomia municipal, Isabela Barbosa Marinho Falcão[9] assevera:

"Como entidade político-administrativa, o Município surgiu na República Romana como uma solução de submissão pacífica das cidades vencidas às quais eram concedidos alguns privilégios (eleição de seus governantes e direção administrativa) em troca da obediência às leis romanas. Tais cidades eram chamadas municípios.

Através da expansão do domínio territorial romano, esta forma de administração descentralizada chegou à França, à Espanha e Portugal que, mais tarde a transferiria para suas colônias.

Àquela época, embora tenham surgido alguns municípios, a idéia centralizadora das capitanias hereditárias não foi propícia ao municipalismo, e os povoados existentes não tinham representação político-administrativa".[10]

Colhe-se da lição de Pinto Ferreira que o regime municipal, adotado no Brasil desde a colônia, remonta a 1549, à época do Governo-Geral, quando as Câmaras Municipais, com os seus Senados, administravam o município, arrecadavam os impostos e tinham influência política, cuidando, ainda, de administrar a justiça. Tão grande era o seu prestígio político porquanto representavam contra capitães-mores e governadores e até mesmo os afastavam de suas funções.[11]

A Constituição brasileira de 1824 referia-se, em seu art.167, ao "governo econômico e municipal das cidades e vilas", cuja organização se daria nos termos da Lei de 1º de outubro de 1828. As Câmaras não tinham autonomia financeira, pois não votavam seus impostos, e suas resoluções poderiam ser invalidadas e tornadas sem efeito pela Assembléia Legislativa Provincial.

A autonomia municipal foi assegurada, embora de forma sintética, pelo art. 68 da Constituição de 1891, sendo os preceitos desta complementados pelas Constituições estaduais e pelas Leis Orgânicas Municipais. Todavia, os Estados-membros da época outorgaram à Assembléia Legislativa a competência para elaborar a Lei Orgânica dos Municípios, excetuados os Estados de Goiás e Rio Grande do Sul, onde estes atribuíram a cada município a competência para a elaboração das suas próprias Leis Orgânicas.

O problema da organização municipal foi minuciosamente tratado pela Constituição de 1934, onde, nos diversos preceitos relativos à matéria, utilizou a experiência tradicional da República, elaborando um modelo que se aperfeiçoaria nas Constituições democráticas posteriores.

O municipalismo sofreu um retrocesso com o advento da Carta de 1937, a qual negou a autonomia municipal, ao estabelecer a nomeação dos chefes dos municípios ou prefeitos por meio do interventor ou do executivo estadual.

A Constituição brasileira de 1946 fortaleceu consideravelmente o regime municipal, tanto no aspecto político-administrativo, quanto no econômico-financeiro, erigindo o município à entidade estatal de terceiro grau, necessária ao nosso sistema federativo.

O golpe militar de 1964 tem como base os atos institucionais 01 e 02.

Com relação aos municípios, o AI 02/65, dispõe:

"Os vereadores não perceberão remuneração, seja a que título for".

A Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, manteve a autonomia dos municípios, revelada pelo poder de eleição do prefeito, do vice-prefeito e dos vereadores, por parte dos munícipes; pela competência do município para a auto-administração, especialmente quanto à organização dos serviços públicos locais. Não obstante mantivesse a eleição direta de Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores, limitava a remuneração destes últimos nos limites nela estabelecidos.[12]

A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, referindo-se à remuneração, e não mais a subsídio, deu à matéria relativa à remuneração dos vereadores tratamento diverso do previsto na Constituição de 1946.[13]

Já a Emenda Constitucional n.º 4/75 dá nova face a redação do §2º do artigo 15 da referida Constituição, estabelecendo:

"Art. 15. A remuneração dos Vereadores será fixada pelas respectivas Câmaras Municipais para a legislatura seguinte, nos limites e segundo critérios estabelecidos em lei complementar".

Com essa nova redação, a lex fundamentallis começa a dar importância aos princípios da impessoalidade e moralidade, vez que impede os vereadores de legislarem em causa própria.

A Constituição Federal de 1988 fortaleceu sobremaneira os municípios, modificando substancialmente sua posição na Federação Brasileira. Com efeito, por duas vezes o texto constitucional da República oferece os fundamentos da nova face reconhecida ao município, no art. 1º e no art 18.[14]

O Município, então considerado pelo Código Civil (art.14) pessoa jurídica de direito público interno, somente com o advento da Constituição Federal de 1988, tem reconhecida essa situação.

Desta feita, o Município tem, agora, a autonomia política (capacidade de auto-organização e de autogoverno), a autonomia normativa (capacidade de fazer leis próprias sobre matéria de sua competência), a autonomia administrativa (administração própria e organização dos serviços locais) e a autonomia financeira (capacidade de decretação de seus tributos e aplicação de suas rendas, que é uma característica da auto-administração).


4.Figuras remuneratórias atuais (Emendas Constitucionais 19/98 e 25/00)

4.1.Subsídio dos Agentes Políticos

É de bom alvitre destacar a alteração da nomenclatura introduzida pela reforma administrativa, através do vocábulo subsídio.[15]

O termo subsídio vem substituir, para determinadas categorias de agentes públicos, os termos remuneração ou vencimentos, "consubstanciando-se em importância salarial retributória de natureza alimentar paga pelo Estado em retribuição de serviços prestados".[16]

Segundo Georgenor de Souza Filho, "o subsídio pode ser definido como remuneração irredutível devida aos agentes políticos da Administração Pública, representada por parcela única, defeso acréscimo em espécie de qualquer natureza, fixada por lei específica, sujeito à revisão anual, limitado em qualquer caso, pelos valores percebidos pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal".[17]

A discussão acerca da remuneração dos agentes públicos sempre foi, em nossa literatura jurídica, um tema controvertido. A Lei 8.112/90, nos seus arts. 40 e 41, conceitua vencimento e remuneração, não obstante não seja de boa técnica legislativa fazê-lo.[18]

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Nesta esteira, afirma Christine Oliveira Peter da Silva[19]:

"O resgate da figura do subsídio, no âmbito da reforma administrativa impulsionada pela EC 19/98, teve por escopo corrigir distorções ocasionadas pela falta de precisão conceitual dos termos ‘vencimento’ e ‘remuneração’, de forma a tornar mais transparentes os salários de agentes públicos ocupantes de cargos de alta relevância para a Administração Pública. Resta evidente que o intuito da reforma, neste particular, foi evitar controvérsias e discussões que, muitas vezes, levavam a interpretações judiciais equivocadas sobre temas relacionados aos salários dos agentes públicos".[20]

Contudo, faz-se necessário tornar saliente a existência de outras parcelas que, por não serem de natureza remuneratória, isto é, por não fazerem parte da remuneração em si mesma considerada, podem ser pagas também aos agentes públicos recebedores de subsídios, v.g. décimo terceiro salário. Da mesma formam, não integram os subsídios as vantagens de caráter indenizatório, tais como as diárias, ajudas de custo, etc.

Faz-se necessário trazer à lume os ensinamentos de Ari Sundfeld acerca da matéria em tela:

"O fato de ter o seu trabalho remunerado por subsídio, que deve ser versado em parcela única, não impede o servidor de receber dos cofres públicos outras importâncias, sem caráter remuneratório do específico exercício de seu cargo. São exemplos: uma indenização por gastos de transporte, uma bolsa de estudos para completar a sua formação, um prêmio em concurso de monografias, um abono pela apresentação de idéia que gere economia de recursos públicos, uma gratificação pela participação em banca de concurso universitário, um adicional pelo comparecimento em sessão do ‘Conselho de Cidadãos’, uma verba de representação pela atuação em jugo esportivo, como integrante de time formado pelos servidores do órgão; bem assim um subsídio, um salário ou um vencimento pelo exercício, em regime de acumulação lícita, de outro cargo ou emprego; ou um provento de aposentadoria ou uma pensão".

4.2.Teto remuneratório

Um ponto altamente discrepante na doutrina e jurisprudência é o relacionado ao teto remuneratório. De acordo com a nova redação do art. 37, XI da CF/88[21], ninguém poderá receber mais, em espécie, do que recebem os Ministros do STF.

Uma das novidades introduzidas pela EC 19/98 foi a instituição de um teto de remuneração único para os três poderes e para todos os entes federados. Destarte, estabeleceu-se o limite máximo para a remuneração de qualquer agente público, qual seja, o subsídio recebido pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

No texto original, existiam três limites máximos de remuneração: na União, no Distrito Federal e nos Estados e um nos Municípios. No texto reformado, há um único teto constitucional nacional: o valor definido para subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. A redação do texto original permitiu, ainda, que se falasse em princípio da paridade ou equivalência dos tetos constitucionais, mecanismo iludente do princípio pela qual se exigia o aumento por lei específica, terminando esta exigência com a nova redação.

Transcreve-se aqui, por oportuna, a deliberação proferida pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião da sessão administrativa realizada em 24/06/98, in verbis:

"Não são auto-aplicáveis as normas do artigo 37, XI e 39, § 4º, da Constituição, na redação que lhes deram os artigos 3º e 5º, respectivamente, da Emenda Constitucional n.º 19, de 4 de junho de 1998, porque a fixação do subsídio mensal, em espécie, de Ministro do Supremo Tribunal Federal - que servirá de teto - nos artigos 48, XV, da Constituição, na redação do artigo 7º, da referida Emenda Constitucional n.º 19, depende de lei formal, de iniciativa conjunta dos Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal. Em decorrência disso o Tribunal não teve por auto-aplicável o artigo 29, da Emenda Constitucional n.º 19/98, por depender a aplicabilidade dessa norma, da prévia fixação, por lei, nos termos acima indicados".

Merece crítica, data máxima vênia, tal entendimento. Faz-se mister tecer algumas considerações acerca da aplicabilidade das normas constitucionais antes de fundamentarmos nossa posição. Assim, de acordo com o eminente jurista José Afonso da Silva, a eficácia jurídica das normas constitucionais é graduada em três níveis, a saber: dotam-se de eficácia plena aquelas normas aplicáveis imediata, direta e integralmente, independendo de legislação posterior para a sua inteira operatividade; as normas de eficácia contida são aquelas que, inobstante tenham aplicabilidade imediata, podem ter reduzido seu alcance pela atividade do legislador infraconstitucional; por derradeiro, tem-se como de eficácia limitada as normas dependentes da emissão de uma normatividade futura, sem a qual são insuscetíveis de serem concretamente aplicadas.[22]

Nesse viés, é de se descordar do Pretório Excelso do ponto de vista jurídico-constitucional, porquanto a decisão supra citada é meramente administrativa, vinculando apenas o órgão emitente. Dessarte, acredita-se que o art. 37, XI, da nossa Carta Política é de aplicação imediata, sendo de eficácia limitada, uma vez dependente, para sua aplicação plena, de emissão de uma norma futura, para dar-lhe total eficácia.

Relativamente ao assunto em tela, leciona Ivan Barbosa Rigolin:

"A deliberação administrativa e não judicante do STF, contestada praticamente por toda a doutrina e os estudiosos brasileiros, além de por todo o Poder Judiciário Federal - tendo ensejado um triste episódio de confrontação até mesmo do Conselho da Justiça Federal e o STF, é com todo efeito um dos mais lamentáveis de que se tem notícia na história do direito brasileiro. Quando o e. STF por maioria manifestou administrativamente entender que não se aplica desde já o artigo da emenda que manda que o novo teto remuneratório seja desde logo aplicado, já em 5 de junho de 1998, parece ter revogado a emenda constitucional, com apenas 21 dias de existência. Quando, em função daquilo, manifestou que entende que, ao invés do novo inciso XI, do art. 37 constitucional, deve ser aplicado o artigo, que a EC n.º 19 revogou expressamente, simplesmente emudeceu o leitor, que, estarrecido, simplesmente não acreditou no que lia - como este modesto escriba até o presente momento em sã consciência não acredita. A decisão, por administrativa que seja - e custa crer que judicialmente a mesma maioria de Ministros teria coragem suficiente para manter aquela deliberação -, pura e simplesmente não faz sentido em direito, já que contraria, um a um, todos os princípios, os cânones e as regras, abstratas ou concretas, de mera leitura - nem se fala em interpretação - de textos jurídicos. Não tem o menor pé nem cabeça, e o que todos no País desejam é que seja extirpada - algo como raspada com estilete - o mais breve possível da história do augusto sodalício, porque o submete a uma humilhação imerecida."

4.3.Direito adquirido à remuneração

Outro ponto palpitante é a hipótese de tal remuneração ser superior ao teto estabelecido pela EC 19/98 à época do seu advento.

Há quem defenda, em relação a esta questão, que há de se interpretar a norma constitucional nova referente ao teto remuneratório de forma respeitante ao direito adquirido à remuneração atualmente percebida. Sustenta-se a interpretação conforme à Constituição sem redução de texto, de modo a reduzir o alcance valorativo do dispositivo que trata do teto de vencimentos (hoje subsídios), excluindo-lhe a interpretação concedente de retroatividade em relação às situações jurídicas já consolidadas antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 19/98.

Todavia, a doutrina constitucional pátria tradicionalmente rejeita a existência de direito adquirido em face de norma constitucional. O Supremo Tribunal tem jurisprudência firme no sentido de que não se pode falar em direito adquirido a regime jurídico, nem em direito adquirido contra a Constituição.

Ademais, o art. 17 do ADCT dispõe, in verbis:

"Art. 17 Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.

Art. 18. Ficam extintos os efeitos jurídicos de qualquer ato legislativo ou administrativo, lavrado a partir da instalação da Assembléia Nacional Constituinte, que tenha por objeto a concessão de estabilidade a servidor admitido sem concurso público, da administração direta ou indireta, inclusive das fundações instituídas e mantidas pelo poder público."

Portanto, resta pacífico a inexistência de direito adquirido a regime jurídico.

4.4.Revisão Geral Anual

O artigo 37, em seu inciso X, pretendendo dissipar a dúvida por vezes levantada sobre a possibilidade de fixação ou alteração do padrão remuneratório dos agentes políticos mediante ato administrativo, agora determina claramente que somente por lei específica isso pode ser feito, observada a iniciativa privativa em cada caso.

Sobre o assunto afirma Ricardo Teixeira do Valle Pereira :

"Por outro lado, deve ser frisado que a obrigatoriedade da revisão em princípio não significa garantia de manutenção do valor real dos estipêndios, ou de automática reposição da inflação verificada no período. Garante a Constituição revisão anual. Somente isso. Os índices, respeitada a iniciativa privativa em casa caso, serão os estabelecidos em lei, e aqui o critério político evidentemente preponderará".[23]

Cabe esclarecer que, independentemente da denominação, reajuste quer significar revisão ou recomposição de perdas salariais ao longo de determinado período, não se confundindo com o aumento real significante do verdadeiro acréscimo visando à correção de situações de injustiças ou de necessidade de revalorização profissional de determinadas carreiras em decorrência de alterações no mercado de trabalho.[24]

Os critérios de reajuste dos subsídios dos vereadores, prefeito, vice e secretários deverão ser expressamente consignados nos correspondentes atos fixatórios como forma de se evitar a violação do princípio da anterioridade consagrado pela EC nº 25.

4.5.Vedação de vinculação

A Constituição Federal, em seu artigo 37, inciso XIII, vedava a vinculação ou equiparação de vencimentos para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público. Entretanto, tinha regras aparentemente conflitantes. O artigo 39, no qual trata do regime jurídico único dos servidores públicos civis, em seu § 1º, assegura isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados entre os servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A situação agora está diferenciada, pois a redação do inciso XIII do artigo 37 ficou mais incisiva:

"É vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público".

Outrossim, o artigo 39 foi profundamente alterado. O Regime Jurídico Único dos Servidores foi extinto, e a regra do § 1º, que assegurava isonomia para cargos de atribuições iguais ou assemelhadas também foi eliminada. Os padrões remuneratórios serão doravante fixados por conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes (art. 39, caput e § 1º), sem qualquer garantia constitucional de tratamento igualitário aos cargos que se mostrem similares.

Na hipótese de majoração dos subsídios dos Deputados Estaduais o Tribunal de Contas do Estado do Paraná tem o seguinte entendimento:

"A Constituição Federal proíbe a equiparação ou vinculação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de pessoal de serviço público, impedindo assim, a vinculação de índices de reajuste e a utilização de um cargo como paradigma para legitimar vinculações ocasionando revisões automáticas e aleatórias. O critério estipulado no art. 29. A, acrescentado pela EC nº 25, qual seja, o de adoção dos subsídios percebidos, em espécie, pelos deputados estaduais é apenas referência para a fixação dos subsídios dos edis, ou seja, não é possível vincular nem os subsídios e nem o critério de reajuste aos dos Deputados Estaduais."[25]

Com relação ao critério a ser adotado quando o reajuste for geral, porém com índices diferenciados, a mesma Corte de Contas nos dá a resposta:

"Pelo inciso X, do art. 37, da CRFB/88, somente podem ser estendidos aos agentes políticos os percentuais concedidos visando recomposição do poder aquisitivo da moeda, geral e irrestrita a todos os servidores. Quanto aos aumentos reais concedidos a todos os servidores ou a adequação dos valores percebidos por determinada categoria àqueles praticados no mercado ou, ainda, as majorações verificadas em razão da reestruturação de cargos e carreiras e as realizadas em razão de mandamento constitucional (FUNDEF) não devem ser repassadas em respeito ao princípio da irrevisibilidade."

4.6.Fixação dos subsídios

Sobre o processo legislativo de fixação dos subsídios dos agentes políticos municipais o art. 29, V, VI dispõe, in verbis:

"Art. 29. (...)

V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4°, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;

VI- subsídios de Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na Lei Orgânica (...)".

Deste modo, os subsídios dos Prefeitos e Vice-Prefeitos serão fixados por lei ordinária de iniciativa da Câmara Municipal e os subsídios dos Vereadores através de resolução de competência exclusiva do Poder Legislativo Mirim.

Do cotejo entre o texto anterior e a nova redação dada aos incisos V e IV do artigo 29, poder-se-ia afirmar, com relação ao Prefeito e Vice-Prefeito, o abandono do princípio da anterioridade, vez que o novo texto, ao menos expressamente, faz alusão ao referido princípio. Contudo, uma interpretação sistemática do texto constitucional distância essa mera interpretação literal. Traz-se como fundamento os princípios elencados no caput do artigo 37 da nossa Carta Magna. Ora, os princípios da impessoalidade e da moralidade impõem a fixação da remuneração dos Prefeitos, Vice-Prefeitos e secretários antes do início dos seus mandatos.

Assim já se manifestou a jurisprudência:

"CONSTITUCIONAL-REMUNERAÇÃO DE VEREADORES, PREFEITOS E VICE-PREFEITO - FIXAÇÃO - COMPETÊNCIA - CRITÉRIOS - AÇÃO POPULAR - FIXAÇÃO EM PERCENTUAL SUPERIOR A SETENTA E CINCO POR CENTO AO DA LEGISLATURA ANTERIOR - AFRONTA AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE – INOCORRÊNCIA.. Compete à Câmara Municipal, em cada legislatura, e antes da realização das respectivas eleições, fixar a remuneração do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Vereadores para a legislatura subseqüente."[26]

Ainda com referência ao assunto em tela, extrai-se do corpo do acórdão relativo à Argüição de Inconstitucionalidade na Apelação Civil n° 50.752, in verbis:

"Bem assinalou a sentença de Primeiro Grau que ‘uma vez estipulado a remuneração, esta será para toda a legislatura subseqüente, ou melhor enfatizado, para todo o período de mandato imediato’ (fls. 177)."

"É essa, sem dúvida, a correta exegese do inciso V do art. 29 da Constituição Federal, que estabelece dever a remuneração do Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores ser fixada ‘em cada legislatura, para as subseqüente’, não cabendo nesta conceder-se novos aumentos, ressalvados reajustes, isto é, mera atualização ante a corrosão inflacionária, o que não foi o caso, contudo, do aumento objeto da Lei n° 1.776/93" (grifei)."

Muito embora o texto constitucional não o inscreva expressamente, o entendimento segundo o qual a ‘anterioridade’ tem significado de ‘anterior às eleições’ foi fixado pelo STF, ao apreciar o Recurso Extraordinário n.º 62.594, interposto em sede de ação popular, de cujo acórdão foi relator o Ministro Djaci Falcão:

"(...) quando a lei fala em fixação de remuneração, em cada legislatura, para a subseqüente, necessariamente prevê que tal fixação se dê antes das eleições que renovem o corpo legislativo. Isso decorre, necessariamente, da ratio essendi do preceito".

4.7.Limites à fixação

A nossa Carta Magna traz como limites fixadores do subsídio dos agentes políticos os seguintes:

a)Limite de 5% da receita do Município

As receitas municipais que compõem a base de cálculo para o cômputo do limite de 5% (cinco por cento) destinado à fixação dos subsídios dos vereadores, compreendem o total da receita arrecadada diminuídos os convênios, auxílios, subvenções e instrumentos congêneres, operações de crédito e produto da alienação de bens.

Buscando-se conformação da legislação complementar (LRF nº 101) com os dispositivos constitucionais reguladores da mesma matéria, há que prevalecer as disposições da Constituição Federal constantes do artigo 29, VII, para considerar como receita municipal o consignado nos termos do citado inc. VII, do art. 29.

Esta é exclusivamente destinada a submeter o total da remuneração dos edis ao limitador de 5%, sendo composta de todas as receitas tributárias (transferidas e próprias), receitas de capital e corrente, excluídas as verbas provenientes de auxílios, convênios e instrumentos congêneres, as advindas de operações de crédito, de alienações de bens e o superávit do FUNDEF.

b)Art. 29-A, CF/88

São computados para fins de cálculo das despesas com o Legislativo, além dos subsídios dos vereadores, remuneração de seus servidores, encargos previdenciários, despesas com custeio de seus serviços internos e materiais de consumo e as despesas de capital (investimentos).

Tal assertiva encontra respaldo na Lei Federal nº 4.320/64, ao classificar as despesas nas seguintes categorias econômicas:

DESPESAS CORRENTES

Despesas de Custeio: Pessoal Civil, Pessoal Militar, Material de Consumo, Serviços de Terceiros e Encargos Diversos.

Transferências correntes: Subvenções Sociais, Subvenções Econômicas, inativos, Pensionistas, Salário Família e Abono familiar, Juros da Dívida Pública, Contribuição da Previdência Social, Diversas Transferências Correntes.

DESPESAS DE CAPITAL

Investimentos Obras Públicas, Serviços em Regime de Programação Especial, Equipamentos e Instalações, Material Permanente, Participação em Constituição ou Aumento de Capital de Empresas ou Entidades Industriais ou Agrícolas.

Inversões Financeiras Aquisição de Imóveis, Participação em Constituição ou Aumento de Capital de Empresas ou Entidades Industriais ou Agrícolas, Aquisição de Títulos Representativos de Capital de Empresas em Funcionamento, Constituição de Fundos Rotativos, Concessão de Empréstimos, Diversas Inversões Financeiras.

Transferências de capital Auxílios para Equipamentos e Instalações, Amortização da Dívida Pública, Auxílio para Obras Públicas, Auxílios para inversões Financeiras, Outras Contribuições.

O mencionado diploma legal impõe ainda, a discriminação dos investimentos na Lei Orçamentária segundo o projeto de obras e de outras aplicações.

As receitas integrantes da base de cálculo para os fins do artigo 29 são[27] o somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art.153 e nos arts.158 e 159, conforme disciplinado no art. 29, A, da EC 25 (base de cálculo coincidente com a receita efetivamente realizada no exercício anterior). Infere-se do texto constitucional que são os impostos (IPTU, ITBI, ISS, art.156, I, II, III), taxas, contribuições de melhoria de competência municipal acrescidos da quota parte das transferências tributárias constitucionais, tais como, o Imposto de Renda na Fonte (IR), quota-parte do Imposto de Renda, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), Imposto Territorial Rural (ITR), Impostos sobre Produtos Industrializados para Exportação (IPIEx) e por fim, a tributação sobre o ouro na forma do inc. V, do citado art, 153, limitados:

-8% para Municípios com população de até 100.000 habitantes;

-7% para Municípios com população entre 100.001 e 300.000 habitantes;

-6% para Municípios com população entre 300.001 e 500.000 habitantes;

-5% para Municípios com população acima de 500.000 habitantes;

c)Subsídios dos Deputados Estaduais (para Vereadores)

O subsídio dos Vereadores terá que observar o limite do subsídio recebido pelos Deputados Estaduais, observados os parâmetros diferenciados segundo a população de cada Município.

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Sobre o autor
Raphael Peixoto de Paula Marques

acadêmico de Direito da Unipê, em João Pessoa (PB)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARQUES, Raphael Peixoto Paula. Evolução constitucional da remuneração dos agentes políticos municipais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2390. Acesso em: 15 nov. 2024.

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