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A ilegal exigência do encargo legal previsto no art. 1º, do Decreto-Lei nº 1.025/69 na fase administrativa e a possibilidade de sua redução na execução fiscal

08/03/2013 às 13:58
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É indevida a exigência do encargo legal do Decreto Lei nº 1.025/69 na seara administrativa, mesmo que no percentual de 10% do valor da dívida.

Pretende-se neste artigo demonstrar a ilegalidade da cobrança do encargo previsto no artigo 1º, do Decreto-Lei n. 1.0125/69na via administrativa, bem como a possibilidade de sua redução nos casos em que haja sucumbência recíproca. Para tanto, analisaremos sua natureza jurídica e os dispositivos legais que regem a matéria.

Apesar de discordarmos integralmente da cobrança do encargo legal que aqui será tratado, pois entendemos que a União já dispõe de meios suficientes à recomposição dos valores dos tributos não pagos tempestivamente – juros e multas,não será este o objeto do presente trabalho. É que tal assunto, por sua importância, merece ser tratado em trabalho específico.

O dito encargo, como veremos, foi instituído pelo legislador, com o intuito de custear a execução fiscal proposta (e vencida) pela União. E dizemos vencida, pois, analisando a natureza do encargo legal aqui discutido e, em especial o fato de ele substituir, por expressa disposição legal, a condenação do devedor em honorários sucumbenciais, só se pode admitir sua cobrança na exclusiva hipótese em que saia a Fazenda Federal vencedora na executiva fiscal – nada obstante, consoante verificamos no dia-a-dia, a cobrança vem sendo feita pela União pelo só fato de o débito ser inscrito em dívida, o que conforme será demonstrado, não pode ser admitido.

Para avançarmos na análise do tema, imperiosa a transcrição do art. 1º, do Decreto-Lei 1.025/69,verbis:

“Art 1º É declarada extinta a participação de servidores públicos na cobrança da Dívida da União, a que se referem os artigos 21 da Lei nº 4.439, de 27 de outubro de 1964, e 1º, inciso II, da Lei nº 5.421, de 25 de abril de 1968, passando a taxa, no total de 20% (vinte por cento), paga pelo executado, a ser recolhida aos cofres públicos, como renda da União. (Vide Decreto-lei nº 1.407, de 1975) (Vide Decreto-lei nº 1.569, de 1977) (Vide Decreto-lei nº 1.645, de 1978) (Vide Decreto-lei nº 1.893, de 1981) (Vide Decreto-lei nº 2.163, de 1984) (Vide Decreto-lei nº 2.331, de 1987) (Vide Lei nº 7.450, de 1985)” (grifo nosso)

Pertinente ainda a leitura do artigo 3º, da Lei n. 7711/88, cujo teor é o seguinte:

“Art 3º Na cobrança executiva da Divida Ativa da União, a aplicação do encargo de que tratam o art. 21 da lei nº 4.439, de 27 de outubro de 1964, o art. 32 do Decreto-lei nº 147, de 3 de fevereiro de 1967, o art. 1º, inciso II, da Lei nº 5.421, de 25 de abril de 1968, o art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1.569, de 8 de agosto de 1977, substitui a condenação do devedor em honorários de advogado e o respectivo produto será, sob esse título, recolhido integralmente ao Tesouro Nacional.   “ (Vide Decreto-lei nº 1.893, de 1981)    (Vide Decreto-lei nº 2.331, de 1987)

Os comandos normativos ora citados são claros e nos permitem concluir que a cobrança do encargo sub examine é admitida apenas no curso da execução fiscal, pois há inequívocas referências a este meio processual próprio da cobrança de tributos, vide as expressões “paga pelo executado” e “na cobrança executiva da Dívida Ativa da União...”, não permitindo tais dispositivos interpretação diversa – maximeporque sabemos que não se pode interpretar extensivamente, dispositivo que o legislador quis dar contornos exatos, restando vedada, portanto, sua cobrança já na fase administrativa. Mais, a leitura do artigo 3º, da L. 7.711/88, ao dispor que o encargo em voga “substitui a condenação do devedor em honorários de advogado...”torna clarasua natureza jurídica, vez que ao impor que referido ônus substitui a condenação do devedor em honorários de advogados, limita a sua exigência às hipóteses em que a Fazenda Nacional saia vencedora da execução fiscal.

Observamos, em nosso cotidiano, que a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) inclui na cobrança administrativa dos débitos inscritos na dívida ativa da União, sem que sequer haja o ajuizamento da executiva fiscal, em campo que denomina “Encargo Legal”, a cobrança do acréscimo previsto no D.L. 1.025/69, no importe de 20% (vinte por cento) sobre o valor total do crédito tributário constituído, isto é, o percentual incide inclusive sobre as multas aplicadas, conforme redação do art. 3º, do Decreto-Lei n. 2.163/84 e art. 57, § 2º, da Lei n. 8.383/91.

Desse modo, quando o contribuinte se dirige à unidade de atendimento ou à Delegacia da RFB para pagar ou parcelar débitos seus que estejam inscritos na dívida ativa da União e sem que, repita-se, tenha sido ajuizada a execução fiscal, se vê obrigado a pagar valor que, a nosso sentir, não deve.

Os dispositivos legais de regência não comportam dúvidas no sentido de que, somente poderá ser exigido o acréscimo pela inscrição do crédito tributário nas hipóteses em que a União não somente ajuíze a execução fiscal, mas, sobretudo, dela saia vencedora.

Daí que o acréscimo do referido encargo ao valor devido pelo contribuinte, quando a cobrança é realizada na seara administrativa não pode ser tolerado, pois, sua natureza, como se vê das claras redações dos dispositivos legais supratranscritos, não se compatibiliza com a exigência fora da execução fiscal. Ademais, a incidência dos juros moratórios e da multa pelo atraso no pagamento do tributo declarado já compensam o Fisco e custeiam a cobrança extrajudicial do quantum inadimplido pelo contribuinte, de sorte que admití-lona seara administrativa, junto com os juros moratórios e a multa, equivaleria a permitir enriquecimento sem causa da União.

Ainda que se argumente que o encargo em apreço não serve apenas ao pagamento dos honorários advocatícios e que, em razão disso, sua cobrança na fase administrativa é legítima, não se pode perder de vistas que nele se incluem os honorários advocatícios e estes somente são devidos na fase executiva, não tendo lugar na seara administrativa. O fato é que no atual quadro legislativo, sua imposição é insustentável, sendo imperiosa a aproximação da moderna jurisprudência ao que já decidiu, cf. veremos, o Supremo Tribunal Federal, de modo que seja afastado o entendimento firmado na Súmula 168, do antigo Tribunal Federal de Recursos.

O STF, ao julgar a constitucionalidade de lei paulista semelhante que dispunha sobre a cobrança de encargo em razão da inscrição em dívida ativa, decidiu,verbis:

“ É inconstitucional o art. 1º da Lei n. 10.421, de 3.12.71, do Estado de São Paulo, que institui acréscimo pela inscrição do débito fiscal. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e provido”.

(RE n. 84.994/SP; Relator: Min. Xavier de Albuquerque; Órgão Julgador: Tribunal Pleno; Data do julgamento: 13/04/1977)

Valiosos os esclarecimentos extraídos do voto do Ministro Cunha Peixoto, litteris:

“...omissis...

3. O acréscimo funda-se no art. 1º da Lei Estadual n. 10.421/71, que estabelece:

‘O débito fiscal, quando inscrito para a cobrança executiva, será acrescido de 20%’.

Como se verifica, sua exigibilidade não decorre da constituição de um crédito tributário típico, isto é, de tributo e multa, mas de encargos tendentes a atender a despesas com o ajuizamento da dívida fiscal.

Trata-se, pois, de um acréscimo destinado à cobrança judicial, tanto que não advém da mora no pagamentodo tributo, mas é consequência de sua inscrição na dívida ativa.

Cuida-se de sucumbência estabelecida pelo Estado, e o que é mais grave, mesmo que a dívida não seja ajuizada, pois, neste caso, como estabelece o parágrafo 1º deste dispositivo, há redução do acréscimo para dez por cento do quantum do débito.

...

De outro lado, a inclusão deste acréscimo na certidão de dívida ativa viola o art. 201 do Código Tributário Nacional. Com efeito, um dos privilégios que tem o fisco é o de criar seus próprios títulos e instrumentos de crédito, por isto mesmo, como constitui uma exceção, deve ser interpretado restritivamente.” (grifos do original)

Vale referir que a Lei n. 7.711/88 em seu artigo 4º, passou a destinar o produto da arrecadação do indigitado acréscimo aqui analisado ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização–FUNDAF e tal fato passou a ser utilizado em decisões judiciais, a fim de i) sustentar que o encargo deve ser cobrado sempre à razão de 20% (vinte por cento) porque ele não representa apenas honorários advocatícios e ii) o nobre fim do produto de arrecadação justificaria a cobrança.

Ademais, no que diz à tentativa de defesa do acréscimo pela suposta nobreza da destinação da receita obtida com a sua arrecadação, devemos lembrar que este aspecto é irrelevante para qualificar juridicamente o tributo, forte no art. 4º, II, do CTN. A lição de Geraldo Ataliba é imune de dúvidas:

“É absurdo, despropositado, anticientífico, ilógico e primário recorrer a argumento ligado ao destino que o estado dá aos dinheiros arrecadados, para disso pretender extrair qualquer consequência válida em termos de determinação da natureza específica dos tributos. As espécies tributárias se reconhecem pela natureza da materialidade da h.i. Só.”[1]

Tudo isso, nos permite aferir que o atual estágio da jurisprudência sobre o tema não tem enfrentado a questão material da controvérsia, inclusive porque, no mesmo erro incorreu a Súmula 168 do Tribunal Federal de Recursos, cujo teor é o seguinte: “O encargo de 20%, do Decreto-Lei 1.025, de 1969, é sempre devido nas execuções fiscais da União e substitui, nos embargos, a condenação do devedor em honorários advocatícios”.

A jurisprudência recente, ao permitir a cobrança do acréscimo previsto no art. 1º, do DL n. 1.025/69 acaba por autorizar a absurda situação de vantagem exagerada à Fazenda Nacional, que além dos juros e das multas ainda conta com honorários sucumbenciais automáticos, com percentuais fixos, em total divergência com o tratamento oferecido aos contribuintes, que, muitas vezes quando vencedores de execução fiscal vêm os honorários sucumbenciais de seus advogados seremfixados em ínfimos 2%, 3% ou 4% do proveito econômico da causa.

Perceba-se que o valor arrecado pela União através do recolhimento do encargo em questão será destinado ao custeio das despesas para a realização da cobrança da dívida ativa, inclusive, para o pagamento dos honorários advocatícios devidos à Procuradoria da Fazenda Nacional nos casos em que o fisco saia vencedor do processo, de modo que admitir a cobrança de 20% (vinte por cento) tanto nesses casos, quanto naqueles em que a cobrança é feita apenas na seara administrativa foge do que se possa considerar como uma posição razoável, sendo clara a caracterização do enriquecimento sem causa da União.

Veja-se que o encargo legal ora discutido substitui a condenação do devedor em honorários advocatícios, ideia que reforça a impossibilidade de sua exigência quando a cobrança é realizada administrativamente, pois, só há condenação sucumbencial na esfera judicial.

Nesse sentido, percuciente o entendimento do E. TRF/1ª Região quanto à possibilidade de redução do encargo legal na hipótese da sucumbência recíproca, conforme se vê dos seguinte e recente aresto:

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“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MASSA FALIDA. SAT. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUTÔNOMOS, AVULSOS E ADMINISTRADORES. LEIS 7.787/89 E 8.212/91. EXCLUSÃO DOS VALORES DA EXECUÇÃO. NÃO-INCIDÊNCIA DE MULTA MORATÓRIA. SÚMULAS 192 E 565 DO STF. JUROS DE MORA. CONDICIONAMENTO À EXISTÊNCIA DE ATIVO SUFICIENTE. DL 1.025/69. DEVIDA A APLICAÇÃO NA CDA EM COBRANÇA. JUSTIÇA GRATUITA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DIFICULDADE FINANCEIRA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA CARACTERIZADA....omissis...

6. É incabível a alegação de que a embargante decaiu de parte mínima do pedido, eis que foi mantida na CDA em cobrança a exigibilidade do salário educação, dos juros de mora, do encargo legal do DL 1.025/69, bem como do indeferimento da justiça gratuita, razão pela qual permanece a sucumbência recíproca determinada pela sentença.

7. Entretanto a sucumbência recíproca no caso demanda a redução do encargo legal para metade.

8. Apelações da embargante e da Fazenda Nacional parcialmente providas.

(AC n. 2008.01.99.058607-9/MG; Relator: Des. Federal Leomar Barros Amorim de Souza; Órgão Julgador: 8ª Turma; e-DJF1, p. 504, de 02.12.2011) (grifo nosso)

Quanto à natureza do encargo, o C. STJ já se pronunciou, entendendo que o referido ônus ao contribuinte serve para o custeio das despesas judiciais da cobrança da dívida ativa, conforme se extrai do seguinte acórdão:

“TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. HONORARIOS. DECRETO LEI NUM. 1.025/69, ART. 1.

1 - NAS EXECUÇÕES FISCAISE SEMPRE DEVIDO O ENCARGO DE 20% (VINTE POR CENTO), CONFORME PREVISÃO DO DECRETO-LEI NUM. 1.025, DE 1969.

2 - A PARTIR DA LEI NUM. 7.711, DE 22/12/88, O REFERIDO ENCARGO DEIXOU DE TER A NATUREZA EXCLUSIVA DE HONORÁRIOS E PASSOU A SER CONSIDERADO, TAMBÉM, COMO ESPECIE DE REMUNERAÇÃO DAS DESPESAS COM OS ATOS JUDICIAIS PARA A PROPOSITURA DA EXECUÇÃO.”

3 - PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. RECURSO PROVIDO.

(REsp n. 154761/MG; Relator: Min. José Delgado; Órgão Julgador: Primeira Turma; Publicado em 16/03/1998) (grifo nosso)

Permissa venia, nada obstante o equívoco interpretativo do STJ no que diz à cobrança do encargo legal na seara judicial, o acórdão transcrito nos permite, por outro lado, ser taxativos ao reiterarmos nosso entendimento segundo o qual na esfera administrativa não se pode admitir sua exigência, pois, se não há ato judicial por parte da Fazenda, não tem lugar sua exigibilidade.

A situação decidida pelo STF e a aqui analisada são idênticas, sendo, portanto, aplicável à espécie o mesmo entendimento que o STF destinou à lei paulista.

Assim, conclui-se: a) pela impossibilidade de exigência do encargo legal do DL 1.025/69 na seara administrativa, mesmo que no percentual de 10% (dez por cento) do valor da dívida e b) pela ilegitimidade da inclusão do encargo legal no valor da dívida antes de sentença transitada em julgado que reconheça a procedência da execução fiscal. De outro modo, estar-se-ia a por a Fazenda Nacional em absurda vantagem, contrariando toda a lógica do próprio encargo aqui discutido.


Nota

[1] ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6ª ed. 13ª tiragem. Malheiros Editores. São Paulo: 2012.

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Sobre a autora
Catucha Moreira Gidi

Advogada. Pós graduada em direito público pelo JusPodivm. Juíza leiga do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GIDI, Catucha Moreira. A ilegal exigência do encargo legal previsto no art. 1º, do Decreto-Lei nº 1.025/69 na fase administrativa e a possibilidade de sua redução na execução fiscal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3537, 8 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23911. Acesso em: 2 nov. 2024.

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