Quinze de março de 1962, dia histórico para a defesa do consumidor. Nesta data, o Presidente Kennedy enviou ao congresso norte-americano a mensagem especial nº 93, dispondo sobre a proteção aos interesses dos consumidores. Este ato foi tão relevante no cenário da defesa do consumidor, que nesta mesma data, anualmente, comemora-se o dia mundial do consumidor.
Passados exatos 51 anos, a Presidenta Dilma fez também história ao lançar um conjunto de medidas para garantir a melhoria na qualidade de produtos e serviços e aperfeiçoar as relações de consumo. Dentre as medidas, está a criação do Plano Nacional de Consumo e Cidadania, a regulamentação do comércio eletrônico, a criação de regras mais transparentes nas tarifas bancárias, a proposta de nova regulamentação dos serviços de telecomunicações e, como medida mais contundente, o envio à Câmara dos Deputados do projeto de lei nº5193/13 dispondo sobre o fortalecimento dos Procons.
A importância dos Procons na solução dos conflitos de consumo é cada vez maior em nossa sociedade, que vive uma fase de consumo exacerbado. Portanto, muito acertada a decisão da Presidenta em fortalecer os Procons, dando-lhes mecanismos mais eficazes de solução dos litígios evitando-se a judicialização.
Embora aplaudida por muitos, as medidas propostas pelo Governo, visando o fortalecimento dos Procons, enfrentam resistência. Em audiência pública realizada no dia 08 de abril, no Senado Federal, para discussão do tema, o Gerente Geral Jurídico da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), criticou diversos pontos do Projeto de Lei, apontando, em suma, a precariedade de estrutura administrativa e de pessoal de diversos Procons, a ausência de regras para escolha das autoridades administrativas, a falta de uniformidade do processo administrativo, a ausência de critérios objetivos para cálculo das penas administrativas, a necessidade dos Procons em decidir conforme entendimento dos tribunais superiores e, por fim, ser essencial que as medidas corretivas a serem implementadas pelo projeto sigam uma regra geral de âmbito federal e sejam limitadas ao teto do Juizado Especial.
Certamente, críticas vindas do segmento (sistema financeiro) com maior número de reclamações registradas nos Procons em todo o Brasil eram esperadas, até mesmo porque, por muitos anos, o setor lutou no STF para que sequer as regras do Código de Defesa do Consumidor – CDC – não fossem aplicadas às instituições financeiras.
Em que pese ser verdadeira a afirmação de que diversos Procons funcionam com estruturas precárias, essa realidade não impede que sua atuação seja eficiente e legítima, e que estes órgãos tenham o reconhecimento da população como uma das instituições mais admiradas e confiáveis do país. Ressalte-se que, aos poucos, os municípios vêm reconhecendo a importância dos Procons como mecanismo essencial ao exercício da cidadania e à proteção da ordem econômica. Portanto, a notícia de fortalecimento destes órgãos, longe de merecer críticas, deve ser comemorada como mais uma medida de concretização dos direitos fundamentais dos brasileiros.
Parece-nos, ainda, infundada a crítica à ausência de procedimentos uniformes de processo administrativo nos Procons. O Decreto federal 2.181/97 dispõe claramente sobre as regras gerais de processo administrativo das relações de consumo, cabendo aos estados e municípios, contudo, regulamentarem as especificidades dos procedimentos em seus órgãos administrativos, de acordo com a sua estrutura organizacional. Esta liberdade não acontece apenas na esfera da defesa do consumidor, mas também na área tributária, ambiental e em outras áreas nas quais a competência de atuação caiba concorrentemente à União, Estados e Municípios.
Ademais, argumentou-se que os órgãos de defesa do consumidor não seguem decisões dos tribunais superiores. Estranho ouvir este argumento exatamente do representante das instituições financeiras, já as mesmas, sistematicamente, descumprem as leis, os regulamentos do Banco Central e até mesmo as próprias normas de autorregulamentação bancária. Como é curial, apenas as súmulas vinculantes do STF possuem caráter erga omnes , isto é, de observância obrigatória por órgãos do poder executivo. Assim, dentro da liberdade de atuação que lhes é inerente e considerando o devido respeito ao princípio da separação dos poderes, cada órgão administrativo, obedecidas a lei e a constituição, tem autonomia para decidir quais condutas tomar para melhor exercício das competências de fiscalização das normas de consumo.
Prosseguindo, parece precipitada a crítica de ausência de critérios procedimentais para a aplicação das medidas corretivas. Isto porque a regulamentação dos referidos critérios certamente será disposta em decreto regulamentar, após a devida aprovação do projeto de lei.
Cumpre esclarecer que o projeto de lei não inovou o ordenamento jurídico. A possibilidade de aplicação, no exercício do poder de polícia administrativa, de medidas administrativas já é realidade no Código de Trânsito e em leis ambientais. Tais medidas possuem um caráter complementar às penalidades e visam, de forma geral, impedir a continuidade de violação das normas de ordem pública, como são as de defesa do consumidor (art. 1º do CDC).
Por fim, merece aplausos a iniciativa de supressão da audiência de conciliação nos Juizados Especiais, quando tiver ocorrido previamente a tentativa de conciliação das partes em órgãos públicos de defesa do consumidor. Este novo procedimento certamente induzirá as empresas à maior solução das demandas de consumo junto aos Procons, evitando-se, assim, a judicialização das relações de consumo.
Diante de todo o exposto, em que pese as críticas advindas do sistema financeiro, o projeto de lei de fortalecimento dos Procons é medida de extrema relevância para a garantia de um crescimento econômico justo, pautado principalmente pelo respeito ao consumidor.