Pretende-se a partir do presente texto promover o estudo específico da hipótese de dispensa de licitação prevista no art. 24, inciso X, da Lei 8.666/93, que trata da possibilidade de compra ou locação de imóvel de particular pela administração pública de forma direta, sem prévio procedimento licitatório.
Entendemos que o assunto merece destaque devido à maneira desuniforme que o dispositivo vem sendo interpretado nos âmbitos da Corte de Contas da União, da doutrina e das diversas administrações dos entes públicos, o que evidencia uma falta de consenso na interpretação do real alcance da norma permissiva precitada, desaguando em indesejável situação de insegurança jurídica. Nesse cenário, reconhecida doutrina vem tratando o dispositivo como hipótese de inexigibilidade de licitação.
Do dever de licitar
O dever da administração de licitar decorre de norma constitucional específica. Com efeito, o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal é peremptório ao impor à administração dos órgãos de todos os entes federativos, o processo licitatório como caminho regular para a aquisição de bens, obras e serviços. Vejamos:
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (g.n)
Nesses termos, a Constituição criou verdadeira presunção de que a melhor contratação, entendida como o pagamento do menor preço pelo melhor produto existente no mercado, se concretiza por meio da licitação. Ademais, tal procedimento também é objetivamente apto a preservar a impessoalidade e isonomia das contratações.
Ocorre que o próprio legislador constituinte, atento para as implicações negativas que a aplicação absoluta do dever de licitar traria ao cotidiano de contratações da administração, através de norma de eficácia contida, previu a possibilidade de lei ordinária afastar a aplicação de tal comando. A partir da dicção do citado texto constitucional é inequívoco extrair que a regra está na licitação, sendo autorizada, de forma excepcional, o seu afastamento nas hipóteses expressamente previstas em lei. Nesses termos, ao legislador somente foi autorizado o afastamento do procedimento licitatório quando a competição mostrar-se ofensiva a princípios outros também tutelados pela ordem jurídica, tais como eficiência, economicidade, intervenção na economia ou questões de segurança nacional. Nesse sentido, eventual previsão legal que venha dispensar o procedimento licitatório sem que haja um correspondente valor jurídico a lhe dar substrato, será preceito eivado de inconstitucionalidade.
Da contratação direta
Regulamentando o dispositivo, a Lei 8.666/93, elencou três espécies de contratação direta: licitação dispensada, dispensável e inexigível. As duas primeiras modalidades estão previstas de forma taxativa (numerus clausus) respectivamente no art. 17 e art. 24. Já a inexigibilidade foi prevista de forma genérica no art. 25, caput. Há que se diga que a classificação ora apresentada é a predominante na doutrina e na jurisprudência do TCU[1].
Dentro da dispensa de licitação, as situações de licitação dispensável e dispensada se distinguem basicamente pelo sujeito ativo da “alienação” e em razão do momento de exercício da discricionariedade do gestor. Explica-se. Nas hipóteses de licitação dispensada o sujeito ativo da alienação é o ente público. É dizer, nesses casos o ente público tem interesse em ceder, doar, vender ou permutar seus bens. Por sua vez, o art. 24 elenca hipóteses em que a administração pretende contratar uma obra, bem ou serviço, ou seja, encontra-se no polo passivo.
Além dessa primeira diferença, temos que o exercício da discricionariedade do administrador se dá de forma diversa em um e em outro caso. Na licitação dispensável, apesar de não obrigado, o gestor pode obtemperar e entender que a contratação mediante licitação é a opção que melhor atende ao interesse público no caso concreto. Afinal, em todas as hipóteses previstas no art. 24 a competição é viável.
Já na licitação dispensada, em razão da necessária vinculação do objeto do contrato com o adquirente do bem, ao gestor não é dada a opção de licitar. Ex.: quando a administração decide por permutar um imóvel seu por outro de particular, o imóvel escolhido para ser recebido (art. 17, I, “c”) condiciona previamente o negociante, de forma que a licitação torna-se dispensada. Na verdade, nesse caso a discricionariedade do administrador não é afastada, ela simplesmente é exercida em momento anterior. Vale dizer, nos casos de alienação de imóveis ou móveis, cabe ao administrador, de forma fundamentada, justificar a opção de alienar o bem por meio de venda, através de licitação, ou, de forma direta, por dação em pagamento, doação, permuta etc.
Outro ponto relevante diz respeito à formalização do processo. Enquanto na licitação dispensada (art. 17, I e II) a formalidade de ratificação e publicação do ato de dispensa, prevista no art. 26 da Lei 8.666/93, não é exigida, nos casos do art. 24, III a XX, tal providência é condição de eficácia do ato.
Já no caso da licitação inexigível, o legislador reconheceu que o gestor público por vezes se depara com situações em que o objeto pretendido pela administração (bens ou serviços) é fornecido no mercado por apenas uma empresa. Ou, ainda, que o bem ou serviço necessitado pela administração pode se cercar de excessiva singularidade. Em ambos os casos, não há que se falar em licitação por ausência do pressuposto da competição.
O art. 25 estabelece que “é inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição”, em seguida, enuncia três hipóteses de inviabilidade de competição. A redação do dispositivo não deixa dúvida de que as situações previstas nos três incisos são meramente exemplificativas (numerus apertus), sendo possível a aplicação do instituto sempre que o gestor se depare com qualquer situação de inviabilidade de competição. De outro modo, a expressão “quando houver inviabilidade de competição”, por estar localizada no caput, tem completo caráter cogente e compulsório, de forma que é necessário reconhecer que mesmo nos casos previstos nos incisos do art. 25, havendo em tese competição, não há que se falar em contratação direta.
Nesse sentido, são as lições de Jorge Ulisses Jacoby[2]:
“O caput do art. 25 da Lei 8.666/93, estabelece que é inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial, quando ocorrer uma das três hipóteses retratadas nos incisos que anuncia. A expressão utilizada é salientada pela doutrina pátria para assegurar que se trata de elenco exemplificativo, firmando a assertiva de que os casos registrados não são únicos. Há, porém, outra consequência decorrente do uso de tal expressão, nem sempre alcançada pelos estudiosos do tema: ao impor taxativamente a inviabilidade, associando-a ao termo inexigibilidade, a lei estabeleceu característica essencial e inafastável do instituto da inexigibilidade. Assim, mesmo quando se caracterizar um dos casos tratados nos incisos, se for viável a competição, a licitação é exigível, porque não foi preenchido o requisito fundamental descrito no caput do art. 25.”
Como já mencionado no início, para o presente artigo nos interessa a hipótese de licitação dispensável prevista no art. 24, inciso X, da Lei 8.666, verbis:
Art. 24. É dispensável a licitação:
(...)
X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia.
Distinção entre as hipóteses do art. 24, inciso X e art. 25
Primeiramente, a partir dos parâmetros acima definidos acerca das modalidades de contratação direta, devemos analisar o disposto no art. 24, inciso X. Nesse caminhar, entendemos imprescindível distinguirmos quando a compra e a locação de imóvel pela administração se enquadram como licitação dispensável e quando é caso de inexigibilidade.
Respaldada doutrina pátria entende que a hipótese de dispensa prevista no art. 24, X, nada mais é que hipótese de inexigibilidade travestida de dispensa. A razão de ser desse pensamento está na interpretação literal da expressão: “cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha”. Assim, para prestigiados doutrinadores a aplicação do precitado dispositivo está atrelada necessariamente a existência de apenas um imóvel na localidade apto a atender as necessidades de instalação e localização da administração. É dizer, em havendo imóveis concorrentes, entendidos como aqueles que, guardadas suas peculiaridades, preenchem os requisitos objetivos exigidos pela Administração, não há que se falar na aplicação do dispositivo. De acordo com essa corrente o legislador teria ferido a boa técnica legislativa. Nesse sentido é a doutrina de Jorge Ulisses Jacoby[3]:
“Trata-se, em verdade, de hipóteses de inexigibilidade de licitação, visto que, uma vez existindo apenas um imóvel que satisfaça ao interesse da Administração, estará caracterizada a inviabilidade jurídica de competição. Nesse caso, se tão somente um imóvel é que atende às necessidades, não haverá licitação, tendo o legislador preferido colocar a hipótese entre os casos de dispensa, embora isto seja doutrinariamente condenável.”
A contrario sensu, essa interpretação defende a necessária adoção do processo licitatório sempre que haja mais de um imóvel que preencha as condições objetivas elegidas pela administração como necessárias para o ideal funcionamento do órgão.
Deve-se aqui registrar que o Tribunal de Contas da União, nas poucas oportunidades em que analisou os requisitos de aplicação do art. 24, X, da Lei 8.666/93, embora não tenha atacado a fundo as nuances que envolvem a matéria, externou entendimento compatível com essa corrente de pensamento. Senão vejamos:
“10. O art. 24, inciso X, da Lei de Licitações estabelece ser dispensável a licitação para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da Administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia¿.11. Verifica-se, portanto, que a utilização desse dispositivo só é possível quando se identifica um imóvel específico cujas instalações e localização sinalizem que ele é o único que atende o interesse da administração. Nesse sentido se manifestam Marçal Justen Filho e Jessé Torres Pereira Júnior a respeito desse comando legal:“A ausência de licitação deriva da impossibilidade de o interesse sob a tutela estatal ser satisfeito através de outro imóvel, que não aquele selecionado... Antes de promover a contratação direta, a Administração deverá comprovar a impossibilidade de satisfação do interesse sob tutela estatal por outra via e apurar a inexistência de outro imóvel apto a atendê-lo...”(Marçal Justen Filho, Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11ª Edição, pag. 250).“Em princípio, a Administração compra ou loca mediante licitação.., tais e tantas podem ser as contingências do mercado, variáveis no tempo e no espaço, a viabilizarem a competição. Mas se a operação tiver por alvo imóvel que atenda a necessidades específicas cumuladas de instalação e localização do serviços, a área de competição pode estreitar-se de modo a ensejar a dispensa... Nestas circunstâncias, e somente nelas, a Administração comprará ou locará diretamente, inclusive para que não se frustre a finalidade a acudir” (Jessé Torres Pereira Júnior, Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, 5ª Edição, pag. 277).12. No caso em tela, essa hipótese não se verificou. Tanto é assim que o ICMBio publicou em Diário Oficial aviso de que estava procurando um imóvel, recebeu dez propostas, e a partir delas escolheu qual delas melhor lhe atenderia. Ou seja, não havia um determinado imóvel previamente identificado, que por suas características de instalações e localização fosse o único a atender as necessidades da administração. Havia, potencialmente, diversos imóveis que poderiam atender o instituto. Assim, deveria ter sido realizado um certame licitatório para realizar a locação (g.n.).(Acórdão nº 444/2008, Plenário, rel. Min. Ubiratan Aguiar)”
Entendemos, com todo o respeito, que esse não é o correto alcance da norma. Partindo de uma interprestação sistemática e topográfica da Lei 8.666/93, somada à ideia de que o legislador não faz previsões inúteis, ousamos discordar dessa posição. Como já abordado no texto, a contratação direta por inexigibilidade pressupõe a inviabilidade de competição. Ao contrário, todas as hipóteses de licitação dispensável pressupõem competição, que se deixa de realizar em razão da permissão legal dada aos gestores. Portanto, nas palavras de Marçal Justen Filho[4] temos que “a inexigibilidade é um conceito logicamente anterior ao da dispensa. Naquela, a licitação não é instaurada por inviabilidade de competição. Vale dizer, instaurar a licitação em caso de dispensa significaria deixar de obter uma proposta ou obter uma proposta inadequada. Na dispensa a competição é viável e, teoricamente, a licitação poderia ser promovida. Não o é porque, diante das circunstâncias, a Lei reputa que a licitação poderia conduzir à seleção de solução que não seria a melhor, tendo em vista circunstâncias peculiares.”. Equivale a dizer, se estamos diante de falta de competição, estamos diante de inexigibilidade e nunca de dispensa.
Assim, defendemos que sempre que a Administração esteja diante de um único imóvel na localidade apto a atender as suas necessidades de localização e instalação, deverá contratar diretamente com fundamento no art. 25, e não com supedâneo no art. 24, X, pois o primeiro instituto é logicamente anterior ao último.
Subsunção fático jurídica do art. 24, X
Nessa ordem de ideias, ao compreender-se a hipótese do no art. 24, X, simplesmente como hipótese de licitação inexigível estar-se-ia decretando a inutilidade do dispositivo, portanto, a sua morte jurídica. Pensamos diversamente.
O cotidiano administrativo demonstra que a escolha de um imóvel, seja para locação ou compra, é tarefa complexa devido a total falta de padronização desse tipo de objeto. Mesmo diante de exigências objetivas de necessidade que condicionem a escolha do imóvel, tais como localização em um bairro específico, num raio máximo de “x” km de distância de outro órgão, necessidade de sistema de refrigeração e estacionamento, é comum se deparar com a oferta de mais de um imóvel, todos preenchendo as exigências mínimas apresentadas pela Administração.
Para melhor ilustrar, vamos ao seguinte exemplo: um órgão da Administração Federal pretende alugar um imóvel para instalar um posto de atendimento ao público em uma cidade do interior de São Paulo. Divulga em um periódico de grande circulação (aviso de procura) que o imóvel deve possuir área mínima de 200 m² e máxima de 250 m², deve ter sistema de refrigeração e se localizar na parte central da cidade. Como resposta, dois imóveis refrigerados e localizados na área central são ofertados: o primeiro, uma casa antiga de 205 m², com diversos cômodos, com paredes emboloradas, alguns vazamentos e sem sistema de monitoramento de segurança, com aluguel de R$ 8.000,00; o segundo, um imóvel moderno de 230 m², layout físico predisposto à instalação do órgão, melhor localizado no que toca ao fluxo de pessoas, com estacionamento, com aluguel de R$ 10.000,00. A partir daí, questiona-se: deve a Administração necessariamente contratar o primeiro imóvel, que apesar de demandar mais manutenção e reforma possui o menor preço? Ou, possui o gestor, com fundamento no art. 24, X da Lei 8.666/93, certo grau de discricionariedade para, de forma impessoal e justificada, optar pelo imóvel que melhor atenda ao interesse do órgão, ainda que pague um aluguel mais oneroso?
Entendemos que a segunda resposta é que a melhor se coaduna com o Princípio da Eficiência e Economia da Administração Pública. No exemplo dado, apesar de objetivamente os dois imóveis atenderem às necessidades mínimas de instalação do órgão, o caso concreto demonstrou que, embora com aluguel mais caro, o segundo imóvel possui especificidades que certamente melhor atenderão ao interesse do órgão, tais como estrutura que demandem menores adaptações, melhor instalações (acessibilidade) para servidores e público, estacionamento privado, entre outros.
A presunção de que a licitação traz sempre a melhor contratação é relativa. Entendemos, ainda, que a hipótese do art. 24, X, tem justamente o escopo de dotar o gestor público de discricionariedade suficiente para, diante da oferta de diversos imóveis que, a primeira vista, são compatíveis com as necessidades da Administração, escolher e contratar aquele que, por razões justificadas, irá melhor garantir as necessidades do órgão e consequentemente do interesse público.
É certo que todas as hipóteses de contratação direta não prescindem da formalização de processo administrativo devidamente justificado. Na contratação com fundamento no art. 24, X, não é diferente, deve o gestor: inaugurar o processo administrativo, identificar/justificar a demanda do órgão por imóvel, definir as características do imóvel, realizar pesquisa de valor de mercado, buscar autorização orçamentária para a compra/locação, levar ao conhecimento do mercado o seu interesse em comprar/locar um imóvel, a partir das necessidades de localização e estrutura que foram definidas no processo, justificar a escolha final do imóvel e, por fim, cumprir a exigência prevista no art. 26 da Lei 8.666/93.
Não é demais lembrar que a Lei de Licitação condicionou a contratação direta com fulcro no art. 24, X à compatibilidade do preço do imóvel/locação ao valor do mercado. Portanto, temos como condição sine qua non para a contratação nesses moldes que o valor do imóvel escolhido ou de seu aluguel, de acordo com avaliação prévia, esteja compatível com o preço do m² adotado pelo mercado local.
A utilização do aviso de procura como instrumento de gestão eficaz
O aviso de procura tem demonstrado ser um eficaz instrumento de gestão tendente a dar maior publicidade e transparência ao processo de compra/locação de imóvel pelos entes públicos, não obstante a possibilidade de contratação direta. Consiste em procedimento de consulta ao mercado imobiliário onde a administração informa, através de edital publicado em periódicos de grande circulação, o seu interesse em comprar/locar imóvel localizado em determinada região e com certas exigências de infraestrutura.
No ponto, não se deve olvidar que as exigências contidas no aviso de procura devem respeitar o disposto no art. 3º, §1º. I e art. 7º, §5º e § 9º da Lei 8.666/93, que proíbem a indicação de características excessivas, desnecessárias e exclusivas. Do contrário, o instrumento serviria para o indevido direcionamento da contratação.
A mencionada prática de gestão traz dupla vantagem à Administração: em primeiro, aumenta a transparência e o controle do processo de seleção do imóvel, na medida em que abre a possibilidade dos ofertantes e demais cidadãos questionarem administrativamente ou, mesmo, judicialmente a escolha final do imóvel; depois, contribui para a escolha do imóvel mais apto às necessidades do órgão, uma vez que aumenta o leque de possibilidades diante da oferta de mais imóveis, quando comparado com a busca realizada somente pela administração.
Há que se registrar que o aviso de procura não se confunde com edital de licitação, portanto, não contém os critérios objetivos de julgamento das propostas, nem tampouco inviabiliza a contratação de imóvel que tenha sido ofertado em momento posterior ao prazo final por ele estipulado. Nesse último caso, entendemos que a apresentação de sólidas justificativas pela Administração, demonstrando inequivocamente que o imóvel escolhido é o que melhor atende aos interesses da administração, é suficiente para amparar a escolha. Afinal, o escopo da norma contida no art. 24, X é, diante das características particularidades que envolvem a compra/locação de imóveis, dotar o gestor de discricionariedade suficiente para garantir a melhor contratação.
Trata-se, assim, de instrumento de controle e auxílio do gestor nas contratações diretas de imóveis realizadas com fundamento no art. 24, X. Nesse passo, a ideia de que o aviso de procura, em razão de gerar a oferta de diversos imóveis, inviabiliza a contratação direta por dispensa, a nós, parece totalmente equivocada.
Como dito aqui, defendemos que as compras/locações de imóveis por dispensa (art. 24, X) pressupõem mais de uma possibilidade de contratação, caso contrário, estando-se diante de única possibilidade de contratação, há que se falar em inexigibilidade. Nessa esteira, não há que se cogitar da utilização do aviso de procura nos casos em que o gestor previamente sabe existir na localidade apenas um imóvel apto a atender as necessidades do órgão, diante da sua total inutilidade.
Conclusão
Diante do aqui foi exposto, divergindo de parte da doutrina pátria e da jurisprudência do TCU, defendemos uma interpretação sistemática, que reconheça o inciso X como inserido no mesmo contexto fático jurídico de todas as demais hipóteses de licitação dispensável prevista no art. 24 da Lei 8.666/93, ou seja, pressupondo-se situações concretas de competitividade. É dizer, o inciso X do art. 24 garantiu ao gestor público optar pela contratação direta mesmo diante da oferta de mais de um imóvel aptos a atender as necessidades de instalação e localização da administração.
Nesse contexto, entendemos que o aviso de procura é um eficaz instrumento de gestão nos processos de compra e locação de imóveis pela Administração, contribuindo sobremaneira para uma maior transparência/controle dos atos dos gestores, bem como para a ampliação das ofertas de imóveis, o que necessariamente deságua em melhores contratações.
Notas
[1] 16. A inexigibilidade é espécie do gênero contratação direta, i.e., sem licitação. Na contratação direta insere-se, ainda, a licitação dispensável e a licitação dispensada. São 3 hipóteses, portanto, referentes à possibilidade de a Administração promover contratação sem se ater ao dever constitucional de licitar, insculpido no art. 37, inc. XXI, da atual Constituição Federal.(Acórdão 1.064/2005 Plenário)
[2] JACOBY, Jorge Ulisses. Contratação Direta Sem Licitação. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008.p. 532.
[3] JACOBY, Jorge Ulisses. Contratação Direta Sem Licitação. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008. 7ª edição, p. 399.
[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitação e Contratos. São Paulo: Dialética. 2009. 13ª edição, p. 345