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A (in)utilidade probatória da confissão extrajudicial

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Conclusões

O processo penal de um estado de direito é ao mesmo tempo pressuposto necessário à eventual aplicação da pena e limitador do arbítrio. Nesse diapasão, conforme já afirmou o BGH alemão a busca pela verdade não pode ocorrer a qualquer custo,[21] de modo que a produção de provas tem de ocorrer com certos limites.

O acusado não pode mais ser encarado como mero objeto do processo e sim um sujeito ativo do mesmo que, diretamente ou com o auxílio do defensor, tem a prerrogativa de influir na conformação da decisão judicial.

Nesse cenário, para que a confissão do acusado seja utilizada com o adequado respeito aos seus direitos fundamentais, é necessário que se respeite a mais ampla liberdade do acusado de prestá-las ou não, sem que a sua negativa seja interpretada em seu desfavor, bem como tenha sido precedida da devida instrução acerca dos fatos apurados e dos seus direitos, além da imprescindível orientação de defensor.

Outrossim, é mister ainda que apenas as declarações prestadas oralmente perante o órgão julgador em audiência sejam valoradas, bem como se evite que os juízes tenham contato com as declarações anteriores para evitar que tais declarações não valoráveis influenciem a sua percepção da prova produzida em audiência.

Em que pese entendermos que a forma de aproveitamento das declarações do acusado acima exposta represente o modelo ótimo de proteção às garantias do acusado, seria exagerado afirmar que em nenhuma hipótese a confissão extrajudicial pode ser utilizada como prova em seu desfavor.

Consideramos que,desde que respeitada a autodeterminação do acusado e que o mesmo tenha sido devidamente informado de seus direitos, bem como esteja acompanhado e seja orientado por defensor, que é verdadeira conditio sine qua non da efetividade das demais garantias[22], é possível admitir-se a sua utilização sem que tal fato represente uma restrição irrazoável às garantias do acusado.


Bibliografia

ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra Editora, 2006.

CARDOSO, Helena Schiessi. Inquérito policial no anteprojeto do Código de Processo Penal: será possível abrir mão do defensor no interrogatório policial? In COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de (org). O novo processo penal à luz da constituição: análise crítica do projeto de lei nº 156/2009, do Senado Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. pp. 59-68.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Sistema Acusatório: cada parte no seu lugar constitucionalmente demarcado. In COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de (org). O novo processo penal à luz da constituição: análise crítica do projeto de lei nº 156/2009, do Senado Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 1-17.

DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. Coimbra: Coimbra Editora, 1974 (2004 reimpressão).

________Criminologia: o homem delinquente e a sociedade criminógena. 2ª reimpressão. Coimbra: Coimbra Editora, 1997.

FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

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FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2° ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional. V. I. 3º ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

MALAN, Diogo. Defesa técnica e seus consectários lógicos na Carta Política de 1988. In PRADO, Geraldo; MALAN, Diogo (org). Processo Penal e democracia: estudos em homenagem aos 20 anos da Constituição da República de 1988. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. pp. 143-186.

PALMA, Maria Fernanda; MENDES, Paulo de Sousa; CAIRES, João Gouveia de; VIANA, João Matos; RAMOS, Vânia Costa. Parecer do IDPCC sobre as propostas de lei n° 77/XXIII/1° (gov) e n° 266/XII/1° (PCP), 2012. disponível em www.idpcc.pt

QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir prova contra si mesmo: o princípio “nemo tenetur se detegere” e suas decorrências no processo penal. São Paulo, Saraiva, 2012.

SILVA, Germano Marques da. Curso de Processo Penal. V. I. 6ª ed. Lisboa, Babel, 2010.


Notas

[1] Não se olvida que tais direitos possuem existência autônoma, mas, in casu, serão analisados como correlatos à prerrogativa contra a auto-incriminação.

[2] Em que pese não ser objeto do presente artigo, necessário registrar que a posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos não é pacífica. Além de intensa polêmica no âmbito doutrinário, o STF ainda oscila em sua posição, havendo julgados que os consideram como norma supralegal (RE 466.343) e como norma constitucional (HC 87.585-8). Contudo, é inconteste que suas normas aplicam-se ao Direito Brasileiro.

[3] Existe polêmica doutrinária e jurisprudencial acerca da possibilidade de investigações preliminares poderem ser realizadas por outros órgãos, nomeadamente o Ministério Público, entretanto o esmiuçar desta questão foge aos objetivos do presente texto.

[4] Mesmo após o interrogatório, as partes podem requerer diligências para esclarecer fatos ou circunstâncias originados da instrução (art. 402 do CPP).

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[5] Note-se que lei não utiliza a expressão prova para os elementos colhidos na fase policial, reservando tal nomenclatura para os produzidos em juízo, sob o crivo do contraditório.

[6] Nesse sentido FERNANDES, Antonio Scarance. Tipicidade e sucedâneos de prova. In FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de; MORAES, Maurício Zanoide de. Provas no Processo Penal: estudo comparado. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 35; LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional. V. I. 3º ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 285-289.

[7] Nesse sentido STJ HC 146.603 e, implicitamente, STF HC 91.654.

[8] Nesse sentido STF HC 84.517 e HC 85.457.

[9] No mesmo sentido CARDOSO, Helena Schiessi. O inquérito policial no anteprojeto do Código de Processo Penal: será possível abrir mão do defensor no interrogatório policial? In COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de (org). O novo processo penal à luz da constituição: análise crítica do projeto de lei nº 156/2009, do Senado Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 65-67.

[10] QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir prova contra si mesmo: o princípio “nemo tenetur se detegere” e suas decorrências no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2012. p.150. sugere que poderia haver comprovação de leitura mediante entrega de rol escrito.

[11] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2° ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 520-521.

[12] SILVA, Germano Marques da. Curso de Processo Penal. V. I.  6ª ed. Lisboa: Babel, 2010. p. 73.

[13] COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Sistema Acusatório: cada parte no seu lugar constitucionalmente demarcado. In COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de (org). O novo processo penal à luz da constituição: análise crítica do projeto de lei nº 156/2009, do Senado Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 1-17.

[14] SILVA, Germano Marques da. cit V. I.  6ª ed. Lisboa: Babel, 2010. p. 74.

[15] BINDER, Alberto. Introducción al derecho procesal penal. apud MALAN, Diogo. Defesa técnica e seus consectários lógicos na Carta Política de 1988. In PRADO, Geraldo; MALAN, Diogo (org). Processo Penal e democracia: estudos em homenagem aos 20 anos da Constituição da República de 1988. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 155.

[16] DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa. Criminologia: o homem delinquente e a sociedade criminógena. 2ª reimpressão. Coimbra: Coimbra Editora, 1997, p. 377.

[17] DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. Coimbra: Coimbra Editora, 1974 (2004 reimpressão). p. 232.

[18] SILVA, Germano Marques da. cit V. I.  6ª ed. Lisboa: Babel, 2010. p. 104-105.

[19] SILVA, Germano Marques da. cit V. I.  6ª ed. Lisboa: Babel, 2010. p. 92.

[20] FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 253.

[21] Apud ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra Editora, 2006.  p.117.

[22] PALMA, Maria Fernanda et al. Parecer do IDPCC sobre as propostas de lei n° 77/XXIII/1° (gov) e n° 266/XII/1° (PCP), 2012. disponível em www.idpcc.pt  p. 6-7.

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Sobre o autor
Geraldo Vilar Correia Lima Filho

Defensor Público Federal. Professor Universitário. Chefe Substituto da Defensoria Pública da União em Pernambuco. Mestrando em Direito pela UFPE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA FILHO, Geraldo Vilar Correia. A (in)utilidade probatória da confissão extrajudicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3660, 9 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24858. Acesso em: 21 nov. 2024.

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