DA NATRUREZA JURÍDICA DAS CONTRIBUIÇÕES
Segundo Celso Ribeiro Bastos, nos termos da Constituição Federal de 1988, cinco são as modalidades de tributos existentes no ordenamento jurídico: a) impostos ( CF, art. 145, I); b) taxas ( CF, art. 145, II); c) contribuições de melhoria ( CF, art. 145, III); d) empréstimos compulsórios (CF, art. 148); e e) contribuições sociais, também conhecidas como contribuições especiais ( CF, art. 149).( Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1995, p. 29)
A CF/88, caracteriza as contribuições como tributos. Também está no Texto maior, definido que tem a União, competência para instituir três únicas espécies de contribuições sociais. Logo, a sua matriz tem assento no art. 149, caput, que prescreve:
" Art. 149 – Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observando o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo."
Por sua vez, essas contribuições sociais estão capituladas da seguinte forma no art. 195 da CF/88:
"Art. 195 - A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
.......
§ 4° - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social
Por outro lado, prescreve o artigo 167, inciso IV, da CF:
" Artigo 167 - São vedados:
(..........)
IV - A vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesas, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os artigos 158 e I59, a destinação de recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino, como determinado pelo art. 212 e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, prevista no artigo 155, § 8°, bem assim o disposto no § 4° deste artigo ".
Daí, nos ensinamentos de Haroldo Gomes de Mattos, Dialética nº 73, pg. 24, se infere que compete à União instituir contribuições sociais (lato sensu), destinadas às finalidades elencadas na CF, Título VIII - Da Ordem Social (stricto sensu) que podem ser assim agrupadas:
a) para o financiamento da seguridade social: ao encargo do (I) empregador, (II) do trabalhador, (III) sobre a receita de concurso de prognósticos, e (IV) de outras fontes quaisquer (p. ex.: INSS, PIS/Pasep, Cofins, SAT, CSSL etc.), e
b) para o financiamento de outros direitos sociais: ao encargo de toda a sociedade, na área da saúde, previdência, assistência social (p. ex`: FGTS, salário-educação etc.).
E prossegue o festejado autor: " Requerem, portanto, tais contribuições finalidades constitucionais específicas, como "instrumento de atuação" da União na área social. A propósito, averba Misabel Abreu Machado Derzi ( Aliomar Balleeiro, "Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar", 7ª edição, atualizada pela autora) que essas contribuições são tributos finalísticos afetados:
"Assim, a destinação assume relevância não só tributária como constitucional e legitimadora do exercício da competência federal. O contribuinte pode se opor à cobrança de contribuição que não esteja afetada ao fins, constitucionalmente, admitidos." (grifos do original)
Logo, como as contribuições sociais são finalísticas, "estando necessariamente afetadas às despesas previstas na Constituição", como obtempera Misabel Derzi, caso instituída para custear despesa ou fundo não expressamente previsto na Norma Fundamental, a norma jurídica de incidência dessa exação (caso da LC 110/01) há de ser considerada írrita, nula, imprestável, por não encontrar abrigo constitucional, pois, lembramos com Hugo de Brito Machado que "a função das contribuições sociais, em face da vigente Constituição, decididamente não é a de suprir o Tesouro Nacional de recursos financeiros". ( Revista Dialética de Direito Tributário nº 73, p.15)
Já neste primeiro instante, dúvida não existe que a destinação das contribuições sociais instituídas pela LC n° 110/01 não financiam qualquer programa de caráter social, mas sim foram criadas para custear uma despesa do Estado.
DAS CONTRIBUIÇÕES INSTITUÍDAS PELA LEI COMPLEMENTAR Nº 110/01
O legislador aplicou às referidas contribuições a anterioridade nonagesimal a que estão sujeitas as contribuições destinadas a Seguridade Social ( art. 195, § 6º da CF/88). Todavia, as aludidas contribuições não podem ser caracterizadas como de Seguridade Social, uma vez que a finalidade por elas perseguidas não se encontra dentre aquelas previstas no capítulo da Ordem Social ( saúde, previdência e assistência social).
Da mesma forma, tal finalidade não se submete às preceituadas no art. 149 da CF, não se enquadrando, portanto, como contribuição social geral, de intervenção no domínio econômico ou de interesse das categorias profissionais, que acarretam, inquestionavelmente, inconstitucionalidades. Nesse sentido os primeiros estudos doutrinários e as primeiras decisões do Poder Judiciário, prescrevendo que a indigitada cobrança "não encontra amparo em qualquer das hipóteses do artigo 149 da Constituição Federal, uma vez que incumbe ao Governo, e não aos empregadores, a administração do Fundo, não podendo repassar à sociedade os ônus pela má gestão dos recursos carreados às contas vinculadas ao FGTS.
A afirmação acima está legitimada na Constituição Federal de 1988, que especificou no artigo 149 a existência de três espécies de contribuições: as contribuições sociais, as de intervenção no domínio econômico e as de interesse das categorias profissionais e econômicas, observando-se o disposto nos artigos 146, III e 150, III, e sem prejuízo do previsto no § 6º do artigo 195, que são as contribuições da seguridade social.
De imediato, razão assisti à Juíza da 14ª Vara Federal de
São Paulo, Luciana de Souza Sanchez, que a cobrança "não encontra amparo
em qualquer das hipóteses do artigo 149 da Constituição Federal, uma vez que
incumbe ao Governo, e não aos empregadores, a administração do Fundo, não
podendo repassar à sociedade os ônus pela má gestão dos recursos carreados
às contas vinculadas ao FGTS". (Processo nº 2001.61.00024197-5 )
Mandado de Segurança - 14 Vara Federal- SP). No mesmo sentido o decidido pelo
Juiz Federal Drº Jediael Galvão Miranda, da 2ª Vara Civil e Criminal de São
José dos Campos (SP), Processo 2001.61.03.004285-1 – MS) ( fontes: Revista
Consultor Jurídico, Internet, www.jr.com.br. e Repertório IOB de
Jurisprudência nº 20/2001, Caderno 1, pág. 591).
As aludidas contribuições não se afinam com o art. 149, pelas razões assim resumidas: a) não se destinam a financiar a Seguridade Social, pois não têm o objetivo de assegurar direitos nas áreas da saúde, previdência e da assistência social ( art. 194, CF/88); b) não são de interesse de categoria profissional ou econômica, porque elas têm a características de organização de determinada categoria, fornecendo meios financeiros para a sua manutenção, como ocorre coma contribuição sindical; c) também não podem ser consideradas contribuições de intervenção no domínio econômico, porque estas devem ser instituídas para realização de princípios que fomentam a ordem econômica (art. 170, CF).
Ao optar pela criação de contribuições sociais, revelou-se flagrante ofensa ao art. 195 da Constituição Federal, que vincula esse tipo de contribuição ao financiamento da seguridade social, o que no caso não ocorre, uma vez que é mais do que evidente que as contribuições criadas pela lei visam financiar uma despesa do Estado. Seguridade Social, segundo Edvaldo Brito, está definida na própria Constituição ( art. 194) " como sendo um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade objetivando assegurar o exercício dos direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social ". (Contribuições Previdenciárias – Questões Atuais, Dialética, São Paulo, 1996, pg. 63).
Cumpre sublinhar que as figuras jurídicas criadas pela Lei Complementar 110/2001, não podem, sob qualquer título, serem caracterizadas como contribuições sociais, isto porque, como é mais do sabido, as contribuições sociais, ao contrário dos demais tributos, apresentam como nota característica e imprescindível, a destinação específica da receita ao custeio da atividade estatal que é pressuposto de sua criação, isto é, a vinculação da destinação da receita à seguridade social, o que, por óbvio, não ocorre in casu.
E, segundo Sacha Calmon Navarro Coelho, o disposto no art. 195, § 6º, abrange tão somente as contribuições sociais ( estrito sensu) voltadas à Seguridade Social ( previdência, assistência social e saúde). As contribuições sociais em sentido lato, como v.g a contribuição para o FGTS e o chamado salário-educação, assim como as contribuições interventivas e corporativas, submetem-se ao princípio da anterioridade anual......". ( Contribuições Previdenciárias – Questões Atuais, Dialética, São Paulo, 1996, pg. 176).
Nesse sentido a doutrina de João Dácio Rolim:
" Para se caracterizar determinada exação como sendo contribuição social, mister se faz verificar a razão de sua instituição e respectiva destinação do produto de sua arrecadação. Se destinado ao financiamento exclusivo da seguridade social, trata-se de contribuição social, se tiver outro destino que não este, estar-se diante de outra espécie tributária, que não seja a contribuição social. Portanto, as contribuições sociais são tributos de afetação obrigatória à Seguridade." ( citado por Haroldo Gomes de Mattos, in Grandes Questões Atuais de Direito Tributário, Dialética, São Paulo, 1999, 3º V, pg. 39)
Adverte Marco Aurélio Greco que as contribuições só podem ser instituídas em função de determinadas finalidades constitucionais - e não a uma qualquer:
"Afirmar que a finalidade é o traço fundamental das contribuições também não significa que basta a existência de previsão de uma finalidade para que possam ser instituídas. Ao contrário, não podem ser criadas em função de qualquer finalidade. A criação de contribuições somente poderá ocorrer em relação a finalidades previstas constitucionalmente e relativamente às quais a própria constituição tenha autorizado a criação de contribuições (Contribuições, Dialética, São Paulo, 2000, p. 229).
Dentro dessa inafastável perspectiva, ao menos no que diz de perto com as contribuições especiais, revela-se destituída de plena eficácia jurídica a previsão contemplada pelo inciso II do art. 4° do CTN, no sentido de que a destinação legal do produto da arrecadação de um tributo não é um elemento apto à qualificação de sua natureza jurídica específica. Realmente, no caso das contribuições especiais o fator "destinação legal de suas receitas" não só é relevante, como é elemento nuclear que possibilita distingui-la dos impostos e das taxas, por exemplo.
Como afirma Misabel Derzi em nota à clássica obra de Aliomar Baleeiro:
" (...) Mas ressalvas devem ser feitas ao art. 4° do Código Tributário Nacional, no ponto em que considera irrelevante, de forma generalizada, a destinação do produto arrecadado para a definição da espécie tributária. É que a destinação, efetivamente, será irrelevante para distinção entre certas espécies (taxas e impostos, p. ex.), mas é importante no que tange à configuração das contribuições e dos empréstimos compulsórios.
A Constituição de 1988, pela primeira vez, cria tributos finalisticamente afetados, que são as contribuições e os empréstimos compulsórios, dando à destinação que lhes é própria relevância, não apenas do ponto de vista do Direito Financeiro ou Administrativo, mas, igualmente, do Direito Constitucional (Tributário).
Somente a União tem competência para criar contribuições ou empréstimos compulsórios, conforme estabelecem os artigos 148 e 149. Mas, enquanto o Texto Magno proíbe que o legislador vincule a arrecadação de impostos a órgão, fundo ou despesa (art. 167, IV), a afetação do produto a certas despesas ou serviços é requisito necessário para o exercício da competência federal, no que tange às contribuições e aos empréstimos compulsórios. (...)
( BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11° ed., rev. e compl., à luz da Constituição de 1988, por Misabel Abreu Machado Derzi, Rio de Janeiro: Forense, 2001, pp. 68-69).
Logo, in casu, sendo a destinação do produto da arrecadação o elemento capaz de demarcar a especificidade do tipo tributário, pode-se concluir que a Lei Complementar n° 110/0l deu azo a novas e autônomas contribuições sociais, cujo produto da arrecadação produz reflexos imediatos. Na pretensão de instituir uma nova contribuição, dando a ela a mesma destinação legal do produto da arrecadação de uma outra contribuição social preexistente, criou, ainda que pela via oblíqua, verdadeiro adicional.
A Lei Complementar n°110 determina que os recursos arrecadados devem ser transferidos à Caixa Econômica Federal e incorporados ao FGTS. Desta forma, caracterizam-se como um adicional do FGTS, porém com destinação específica - pagar a conta dos expurgos - e diferente da sua destinação constitucional. As contribuições foram ainda criadas para vigorar dentro de 90 dias.
Na forma do artigo 13 da LC 110/01, fica assegurada destinação integral ao FGTS de valor equivalente a arrecadação das contribuições, o que denota, sem a mínima dificuldade, que a aludida lei engendrou qualquer tipo jurídico, menos uma contribuição social, vez que é inexcedível que, para instituição válida de uma contribuição social, há que se ter à vinculação entre a destinação da receita e a seguridade social, sob pena de incontornável inconstitucionalidade.
Mas há mais. O FGTS foi constitucionalmente definido como um direito dos trabalhadores (art. 7°, III), e a multa de 40% visa proteger o trabalhador contra a despedida arbitrária ou sem justa causa (art. 7°, I, c/c art. 10, I, das ADCT). Assim, um adicional que fosse criado, só poderia ficar vinculado às contas individuais dos trabalhadores, e a eles ser destinado, sob pena de desvirtuar a sua função constitucional.
É firme a posição doutrinária no sentido de que todas as contribuições, inclusive as sociais, requerem destinação finalística, previstas ou referida na própria Constituição. Caso contrário, serão consideradas inconstitucionais. Assim, uma contribuição social que seja instituída, terá que ser cobrada, administrada e empregada pelo INSS nos fins da Constituição. Se for a União o sujeito ativo da obrigação, sem previsão de repasse imediato, já não se trata mais de contribuição, mas de imposto residual em bis in idem, na fórmula do art. 154, I, da CF. ( Sacha Calmon Navarro Coelho, Contribuições Previdenciária – Questões Atuais, Dialética, São Paulo, 1996, pg. 171).
Ainda que fosse possível admitir, absurdamente, considerando que não estivéssemos sob um Estado Democrático de Direito, que a imposição criada pela LC 100/01 poderia estar justificada por algum dos motivos que autorizam a criação do empréstimo compulsório ou do imposto de guerra, e que por esta razão estivéssemos frente a uma nova contribuição social especialíssima, criada em razão das circunstâncias especiais e extraordinárias do Pais, ainda assim seria impossível se atribuir o dever de suportar esta exação aos empregadores.
Caracterizado está que a instituição das referidas contribuições, cuja finalidade é cobrir um passivo da Caixa Econômica Federal, já fulmina, por si só, a validade das mesmas. Premente pois aperceber-se da inconstitucionalidade da LC nº 110/01, que ao prever em seu art. 14, a aplicação do prazo de anterioridade nonagesimal (art. 195, § 6º, CF), procurou rotular a referida contribuição como uma fonte adicional de financiamento da Seguridade Social ( art. 195, § 4º, CF). Restou, ainda caracterizado as demais inconstitucionalidades, sejam elas consideradas como contribuições de seguridade social, contribuições sociais gerais, de intervenção no domínio econômico ou de interessem da categorias profissionais. Implícito que as novas exações não podem ser consideradas contribuições sociais, pois não atendem os requisitos legais para tal, ficará, a seguir, demonstrado que também não se enquadram dentro das regras matrizes dos impostos.
Conforme já exposto, a finalidade a que se destinam as contribuições criadas pela LC 1l0/01 - financiamento do passivo da Caixa Econômica Federal decorrente de errônea correção monetária das contas de FGTS - não se subsume às finalidades previstas no texto constitucional, passiveis de serem custeadas mediante contribuições sociais.
Da mesma forma da constatação que se tratam, nesse caso, de contribuições sociais inconstitucionais, por desbordarem da finalidade que é elemento limitador da competência tributária no tocante às contribuições, estaríamos diante de impostos criado com base na competência residual da União (art. 154, I), que da mesma maneira, os tornaria inconstitucionais, pois, no tocante ao "imposto" instituído no art.1°, não teríamos uma manifestação de capacidade contributiva, indispensável criação desta espécie tributária, e, tocante ao "imposto" do art. 2° temos uma identidade de base de cálculo com imposto de renda, vedada pelo art. 154, I. Em ambos, o fato de serem vinculados a uma destinação específica, o que é expressamente vedado pelo art. 167, IV, da Constituição Federal.
Admitindo-se que as duas novas contribuições encontrem amparo como contribuições sociais gerais ( parafiscais) cobradas com fundamento no art. 149 da CF/88, cujos recursos serão revertidos em benefícios dos empregados, teríamos que: a) observar o inciso I do art. 150 da Lei Maior, que explicita a necessidade de lei para a exigência da contribuição; b) observar o disposto no inciso III do mesmo artigo, que dispõe sobre a impossibilidade de cobrança de contribuições com fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado (princípio da irretroatividade da lei tributária) e no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou ( princípio da anterioridade). Desta feita, se a LC nº 110/01, superasse todos os requisitos supra citados, o que é certamente improvável, somente poderia entrar em vigor em 2002.
A finalidade perseguida pela referida norma é, exclusivamente, cobrir passivo da Caixa Econômica Federal e assim, também estaria em desacordo com o que preceitua o artigo 167, IV, da Constituição Federal, que veda a vinculação da receita de impostos a órgão, fundo ou despesa. De sua leitura se depreende que repugna o texto constitucional vincular o produto da arrecadação dos impostos a um determinado fundo, como o que foi instituído pela LC nº 110/2001.
Mesmo se revestindo natureza jurídica de impostos, essas novas contribuições jamais poderiam ser vinculadas a um fundo, no caso ao FGTS, como prescreve o art. 167, inciso IV, da CF.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou de forma definitiva, quando do julgamento da lei estadual paulista que majorava alíquota do ICMS, de 17% para 18%, destinando-se o tributo arrecadado para fins de cobrir financiamentos de casas populares ( RE n° 183.906-6 e RE nº 230.210-7):
"Imposto - Vinculação a Órgão, Fundo ou Despesa.
A teor do disposto no inciso IV, do artigo 167 da Constituição Federal, é vedado vincular receita de impostos a órgão, fundo ou despesa. A regra apanha a situação concreta em que a lei local implicou majoração do ICMS, destinando-se percentual acrescido a um certo propósito- aumento do capital da caixa econômica, para financiamento de programa habitacional....... ( RE nº 183.906-6, Rel. Min. Marco Aurélio, RDDT nº 34, p. 215).
IMPOSTO. VINCULAÇÃO A ÓRGÃO, FUNDO OU DESPESA. A teor do disposto no inciso IV do artigo 167 da Constituição Federal, é vedado vincular receita de impostos a órgão, fundo ou despesa. A regra apanha situação concreta em que a lei local implicou a um certo propósito – aumento de capital de caixa econômica, para financiamento de programa habitacional. Inconstitucionalidade dos artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9º da Lei nº 6.556, de 30 de novembro de 1989, do Estado de São Paulo. (STF – 2ª Turma – unanimidade de votos, julgam. de 26.10.98, RE nº 230.210-7 – São Paulo, Relator Min; Marco Aurélio)
Essa insistência em desobedecer às normas constitucionais (artigo 167, IV, da CF/88), fulminou com a proclamação da inconstitucionalidade dos artigos 3º a 9º da Lei 6.556, de 30.11.89, do Estado de São Paulo, que aumentaram de 17% para 18% a alíquota do ICMS, com destinação específica da majoração. Do Recurso Extraordinário n° 183.906-6-Plenário - Relator Min. Marco Aurélio - DJU - 1 - de, 29 de setembro de 1997, pág. 48.068, colhe-se trecho do voto do Exmo. Ministro Relator:
"É incontroverso que na mesma lei em que majorada a porcentagem do tributo de dezessete para dezoito por cento dispôs-se que a diferença seria destinada à Caixa Econômica do Estado de São Paulo, visando a construção de moradias populares. A ginástica intelectual feita para justificar a destinação não resiste à analise da questão à luz do categórico preceito constitucional que veda a vinculação. Pouco importa que na lei majoradora tenha-se aludido à execução orçamentária, adentrando-se sítio que não era próprio, o que surge real valia é que o acréscimo de um por cento, na mesma lei que o previu, acabou por ser destinado a um certo órgão, visando a fazer frente à despesa, com a construção de habitações populares. "
E, ainda, analisando esse ponto constante da lei paulista, ( diga-se de passagem que tem o mesmo objetivo da LC 110/0), o Exmo. Min, Relator coloca:
"............. ...... Dificuldades de Caixa não podem ser potencializadas a pontode olvidarem-se os parâmetros constitucionais. Na Organicidade do Direito está a segurança do cidadão pelo que não se pode perder de visão que meio justifica o fim, mas não este aquele ".
Se contribuição social não se afigura, mostram, também, que o que a lei criou imposto não é, ou o sendo, afigura-se plenamente inconstitucional, tendo em vista o que impõe a observância dos princípios e diretrizes de todo o Sistema Constitucional Tributário aplicável à matéria, como o princípio da anterioridade - só poderia valer a partir de 2002 -, da irretroatividade da lei - art. 150, III, CF/88 ( expurgos inflacionários do anos de 1988, 1989 e 1990) e a destinação específica ( art. 167, IV); com a mesma base de outros impostos ( art. 154, I), que no caso de um imposto, é impossível.
Por outro lado, ainda que se admita que não há destinação específica ao FGTS, o que não se cogita pela clareza da mencionada lei, estaríamos, então, diante de um imposto, que é uma espécie de tributo que independe de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. No entanto, mesmo que se as "contribuições sociais" criadas pela LC 110/01 possam ser definidas juridicamente como impostos, também não subsistem frente a postulados constitucionais inafastáveis, como o princípio constitucional da anterioridade, esculpido no artigo 150, III, "b", que veda a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou e outros já fartamente aduzidos nesta exordial.
Ocorre que, tendo em vista a decantada rigidez e inflexibilidade de nosso sistema tributário – o que veda a instituição de tributos não previstos no texto constitucional, para coactar justamente investidas fiscais desse jaez, fruto da voracidade fiscal e irreflexão de nossos governantes – afirma-se desde já que a exação instituída pela LC nº 110/01, imposto também não se afigura. É pacífico que o legislador pátrio só pode criar impostos, taxas e contribuições obedecendo à norma padrão de incidência já previamente prevista na Constituição Federal.
Como já restou demonstrado, as contribuições instituídas pela LC 110/01, destinadas à complementação da correção monetária do FGTS, não podem ser qualificadas como contribuições de Seguridade Social, em razão da disposição constitucional para a espécie. Sendo assim, é vedado qualquer outro tipo de contribuição sobre a folha de pagamento, a não ser aquelas previstas na CF/88. As contribuições sociais estão capituladas da seguinte forma no art. 195 da CF/88:
"Art. 195 -.............
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoas física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
(..........)
Nenhuma razão existe para classificar a formação dos fundos indenizatórios das perdas do FGTS sofridas durante os períodos compreendidos entre 01.12.88 a 28.02.89 e durante o mês de abril de 1990, como contribuições destinadas à Seguridade Social, vez que o produto de sua arrecadação não ingressarão no cofre publico único a que alude o inciso III do § 5º do art. 165 da CF/88, indissociavelmente aplicável à saúde, à previdência e à assistência social.
Além da disposição constitucional que por si só veda qualquer tentativa de interpretação em contrário, também não é permitido a incidência de mais de uma contribuição sobre a mesma base de cálculo, motivo pela qual, a incidência da contribuição social instituída pelo artigo 2º da LC nº 100/01 é, induvidosamente, INCONSTITUCIONAL.
Aliás, entendimento diverso não teve o Juiz Federal da 2ª Vara Civil e Criminal de São José dos Campos – SP, Processo nº 2001.61.03.004285-1, nestes termos:
" Ainda que possuísse natureza tributária de imposto, estaria a contribuição definida no art. 2º da Lei Complementar nº 110/01 estaria, prima facie, irremediavelmente viciada pela inconstitucionalidade, pois tem a mesma base de cálculo de contribuição que incide sobre a folha de salários.
Assim, as contribuições sociais mencionadas não se revestem dos atributos constitucionais pertinentes à espécie tributária"
Em derradeiro, a conclusão de Fernando Dantas Casillo Gonçalves, in Contribuições para o FGTS da Lei Complementar nº 110/2001, Repertório IOB de Jurisprudência, nº 20/2001, Caderno 1, pág. 597:
" Portanto, salvo melhor juízo, entendemos que a Lei Complementar nº 110/2001 é inconstitucional por não observar diversas determinações constitucionais, dentre estas, os Princípios da Razoabilidade, da Proporcionalidade e da Moralidade Administrativa."