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Pragmatismo jurídico para Benjamin N. Cardozo

19/11/2013 às 10:53
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Estudo sobre o Direito da Common Law, por meio do Pragmatismo Jurídico, utilizando-se o livro A Natureza do Processo e A Evolução do Direito de Benjamin Cardozo e artigos de Thamy Pogrebinschi sobre o assunto.

Sumário: 1. Introdução; 2. Aspectos Históricos, Culturais e Considerações Gerais; 3. Pragmatismo Jurídico em B. Cardozo analisado por Thamy Pogrebinschi; 4. Conclusão; 5. Referências Bibliográficas.


1. Introdução

A organização do sistema jurídico, especialmente no que se refere à decisão judicial, sempre foi retratada como controversa e passível de erros. Diante dos questionamentos a respeito da certeza do direito, mostra-se necessário que haja a reparação de danos na aplicação, na interpretação e na busca por fontes do direito. Precursor nessa discussão e responsável pelo desenvolvimento da Common Law americana no século XX, destaca-se o trabalho de Benjamin Nathan Cardozo. Jurista da Suprema Corte americana, aborda na obra A Evolução do Direito a necessidade de o direito passar por mudanças, segundo ele, imprescindíveis.

O direito de nossos dias depara dupla necessidade. A primeira é a de uma nova compilação (Restatement), que nos traga certeza e ordem, livrando-nos da confusão dos precedentes judiciários. Esta é a tarefa da ciência legal. A segunda é a de uma filosofia que exerça o papel de mediadora entre as exigências de estabilidade e de progresso em conflito, e forneça um princípio de evolução (CARDOZO, 1978, p.165).

Ao trabalhar a obra de Benjamin Cardozo, tem-se como fundamental considerar a sua contribuição ao direito da Common Law, por vias do Pragmatismo Jurídico. Thamy Pogrebinschi, pós doutora em Ciência Política, estuda as diversas obras de Cardozo abordando o Pragmatismo Jurídico em seus estudos. Trabalhar-se-á nesta análise com textos de Pogrebinschi, objetivando-se maior compreensão da Common Law e do Pragmatismo Jurídico.


2. Aspectos Históricos, Culturais e Considerações Gerais

Benjamin Cardozo foi um dos idealizadores do Realismo Jurídico, movimento responsável pelo aumento da produção judicial na Suprema Corte americana. Posteriormente o Realismo Jurídico foi denominado Pragmatismo Jurídico, na década de 1980. Em meados do século XX, no ano de 1932, Cardozo foi indicado para fazer parte da Suprema Corte norte-americana e permaneceu em exercício até sua morte, em 19381. Nos seus anos de atuação foram registradas as decisões mais marcantes da Corte. A sua escolha para o cargo foi celebrada pelos juristas e considerada como uma decisão correta e livre de quaisquer interesses políticos.

Em A Evolução do Direito (1978, p.166), Benjamin enfatiza que o direito tende a ser de todo mecânico. Essa inflexibilidade, ou seja, a incapacidade de fundir a interpretação mecânica à interpretação administrativa constitui-se, para o autor, no problema do direito de todos os tempos. Com o objetivo de esclarecer suas ideias, Cardozo (1978, p.167) traz para o contexto de sua obra a criação e o trabalho desenvolvido pelo Instituto Americano de Direito. Enumeraram-se, nas sessões do Instituto, possíveis causas da problemática jurídica, com a finalidade de combatê-las. Dentre elas, o autor identifica a pluralidade de decisões como sendo a mais importante.

Houve época em que a adesão ao precedente foi uma força proveitosa, a garantia, segundo parece, de estabilidade e certeza. [...] O acréscimo de seu número não trouxe acréscimo de respeito. Deve-se esperar que a produção de enorme quantidade de juízos contenha certa proporção de extravagâncias. Uma geração tão grande inclui defeituosos e desprotegidos (CARDOZO, 1978, p.167).

Baseando-se no direito norte-americano de Common Law, Benjamin (1978, p.168) tenta demonstrar que o cauteloso progresso e o recuo de alguns passos em certas ocasiões, próprios da Common Law, transformaram-se na fraqueza do sistema. Segundo o próprio autor (1978, p.168), trata-se da perda de vista do elemento universal, e da fixação em fatos limitados e menos importantes, característica inerente aos seres humanos. Propõe, portanto, Cardozo, que o aplicador do direito liberte-se dessa teia e que a veja como um todo, como uma unidade.

Nessa perspectiva, seria criada no Instituto de Direito Americano uma compilação científica e cuidadosa do direito em vigência, por meio da combinação de tratados (CARDOZO, 1978, p.170). Serviria, então, essa nova compilação, como um sumário de princípios tratados de forma clara. Além disso, consistiria “da amplificação, ilustração e exploração necessárias à aplicação e interpretação prática dos princípios” (CARDOZO, 1978, p.169). Apesar de postos em prática essas ideias, ainda assim não se conseguiu atingir uma uniformidade na Common Law 2.

Ainda referindo-se à visão limitada que a Common Law inevitavelmente produz nos aplicadores de direito, Cardozo (1978, p.172 e 173) atribui à moderna escola de direito o papel importante de expressão crítica e dissociada diretamente à decisão judicial. Dessa forma, o autor propõe aos juízes e demais juristas que considerem a visão crítica das revistas de direito das universidades e demonstra, a partir de casos reais, o “poder das universidades para orientar o curso do julgamento” (CARDOZO, 1978, p.173).

Benjamin Cardozo acreditava que com o passar do tempo, a partir da elaboração da compilação dos tratados, os tribunais, pouco a pouco, tenderiam à unidade. Porém, considerava que a harmonia entre as certezas reais – universais – e as certezas falsas – limitadas, não gerais – deveria ser alcançada por meio da evolução do direito. Ainda faz-se pertinente outra preocupação do autor. Essa diz respeito à rigidez e à intolerância no que se refere à aplicação da lei. Cardozo (1978, p. 176) propõe uma visão mais universal, que leve em conta não apenas o texto da lei, mas também as situações particulares de cada caso. Como tornar isso realidade, portanto? Para o autor “O direito, como o viajante, deve estar pronto para o amanhã. Deve ter um princípio de evolução” (CARDOZO, 1978, p. 176).


3. Pragmatismo Jurídico em B. Cardozo analisado por Thamy Pogrebinschi

Thamy Pogrebinschi (O que é Pragmatismo Jurídico?, p. 1) escreve, ao tratar do conceito de Pragmatismo Jurídico, sobre os pensadores dessa nova abordagem do direito, a forma de aplicar essa metodologia, bem como suas características mais importantes. Observa-se na seguinte passagem de Pogrebinschi, as principais características do Pragmatismo Jurídico:

São três as características fundamentais que definem o pragmatismo jurídico, quais sejam: contextualismo, consequencialismo e anti-fundacionalismo. O contextualismo implica que toda e qualquer proposição seja julgada a partir de sua conformidade com as necessidades humanas e sociais. O consequencialismo, por sua vez, requer que toda e qualquer proposição seja testada por meio da antecipação de suas consequências e resultados possíveis. E, por fim, o anti-fundacionalismo consiste na rejeição de quaisquer espécies de entidades metafísicas, conceitos abstratos, categorias apriorísticas, princípios perpétuos, instâncias últimas, entes transcendentais e dogmas, entre outros tipos de fundações possíveis ao pensamento (POGREBINSCHI, O que é o Pragmatismo Jurídico? p. 1).

Pogrebinschi (O que é o Pragmatismo Jurídico?, p. 1. e 2) considera que o pragmatismo deve ser concebido como um manual para os juízes, sobre como interpretar a teoria jurídica. Não seria tratado, portanto, o pragmatismo, como forma de interpretar a lei, pois os juízes assumem, nessa abordagem, a função de criadores das leis. “Os juízes pragmatistas fazem o direito, e não simplesmente o “encontram”. Eles são verdadeiros criadores do direito, e não meros reprodutores” (POGREBINSCHI, O que é o Pragmatismo Jurídico? p. 2). Desse modo, Thamy conclui que o juiz deve levar em consideração, também, as fontes não jurídicas, podendo assumir essa função até mesmo os costumes, a realidade social. Em O que é o Pragmatismo Jurídico? (POGREBINSCHI, p.2) afirma que “a melhor decisão, para o pragmatista, é aquela que melhor corresponder às necessidades humanas e sociais”. Um juiz pragmatista, portanto, para Thamy, é aquele cuja preocupação está voltada para a intervenção na realidade social. Percebe-se aí, em conotação ao pensamento da autora, que essa função do juiz acaba, por vezes, criando políticas públicas legítimas e justas, e um direito positivado, apenas, após ser posto efetivamente em prática pela decisão judicial.

Não faz sentido, assim, falar-se em um direito positivo preexistente à aplicação do juiz. O direito torna-se positivo ou positivado após ser aplicado pelo juiz, e não quando promulgado pelo legislador. Ou seja, antes de ser aplicada, a norma jurídica constitui apenas um dentre diversos recursos aos quais o juiz pode recorrer. Ela seria assim uma fonte autoritativa, mas não ainda uma norma válida – pois, para os pragmatistas, o que confere validade às normas é a sua aplicação (POGREBINSCHI, O que é o Pragmatismo Jurídico? p. 2. e 3).

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Na obra de Cardozo (1978, p.180) a questão do pragmatismo é abordada de maneira tal como entende o autor, por aplicação correta dos princípios jurídicos. Considera importante que o jurista e o juiz compreendam de forma correta o processo judicial, para que possam chegar a uma decisão justa. Para isso, tem-se como fundamental, no seu livro, que a análise do processo judicial dever-se-á basear na “análise da gênese e evolução do direito, e esta, num estudo das funções e dos fins” (CARDOZO, 1978 p. 180). O autor considera, então, uma ferramenta eficaz para a evolução do direito, a filosofia. A contribuição de Benjamin Cardozo para o Pragmatismo Jurídico do século XX é entendida como a busca incessante por um novo método de interpretação do direito, que priorize sempre a proporção entre a lei – texto escrito – e a vontade do juiz – baseada nos costumes, na vida da sociedade. Tal método deveria, também, ao tratar das críticas feitas ao direito, “combater o monstro da incerteza e destruí-lo” (CARDOZO, 1978 p. 168). Lorena de Melo Freitas, por sua vez, evidencia aspectos que retratam as ideias de Cardozo em A Evolução do Direito e sua complementar relação com a obra anterior de Benjamin Cardozo, A Natureza do Processo.

A temática agora era como o juiz deveria decidir, mas se dá uma perfeita continuação, na verdade, do livro anterior, pois é observando o direito como fenômeno social e vislumbrando o direito não como um saber isolado, mas percebendo sua pluralidade além da expressão normativa e ainda a ajuda das outras ciências. Com tal postura reforça-se o que dissera no Método filosófico (primeira conferência), que a Common Law é hipótese de trabalho e não verdades finais (FREITAS, 2007 p. 18).


4. Conclusão

A abordagem e a interpretação do Pragmatismo Jurídico, mesmo contando com inúmeros estudos, ainda constituem uma tarefa árdua ao profissional do direito. No que se refere à organização do sistema jurídico, a Common Law americana mostra-se mais adaptada e, portanto, mais suscetível ao uso do Pragmatismo Jurídico que a organização da Civil Law, como por exemplo, no sistema jurídico do Brasil.

Além das divergências na organização jurídica de cada território, vale também ressaltar a dificuldade apresentada por Benjamin Cardozo, da ocorrência da evolução do direito. O autor aponta como causador principal desse empecilho na transformação da estrutura jurídica, a multiplicidade de decisões. Propõe, portanto, que uma nova compilação do direito vigente viria, com o tempo, entrar em uso, trazendo finalmente a unidade aos tribunais. O autor defendeu que essa compilação, posta em prática pelo Instituto de Direito Americano, conseguiria resolver os problemas do direito e conduziria todos os tribunais a um só caminho.

Entretanto, Benjamin não previu que o direito poderia crescer muito mais que o esperado em um pequeno espaço de tempo. O resultado desse equívoco foi que, apesar de ter sido um trabalho árduo e com um alto nível, não se conseguiu impor uniformidade à Common Law. Houve outras tentativas anteriores e depois dessa, todas sem êxito para uniformizar a estrutura jurídica americana.

O autor ainda propõe que seja dada maior liberdade para os juízes durante a decisão judicial. Porém, considera essencial a compilação do direito em vigor, para que se tenham decisões semelhantes, quando necessário for. De fato, é imprescindível que haja justiça igualitária nas decisões judiciais, e que, para isso, o juiz utilize-se das relações sociais e do costume. Afinal, a decisão judicial não pode ser tratada friamente, apenas com base em leis e em códigos. Cada caso exige uma atenção especial, baseada no contexto em que se insere. Essa diferenciação caso a caso, a liberdade ao juiz de intervir com base nos costumes e a busca por uma compilação do direito da Common Law americana no século XX foram o diferencial de Benjamin Cardozo, o que fez com que ganhasse destaque na Suprema Corte americana e o que o tornou um dos grandes nomes do Pragmatismo Jurídico.


5. Referências Bibliográficas

CARDOZO, Benjamin N. A Natureza do Processo e A Evolução do Direito. 3. ed. Porto Alegre: AGE, 1978. v. 8, 253 p.

The Biography Channel website (2013). Benjamin Cardozo. Disponível em: https://www.biography.com/people/benjamin-cardozo-40728. Acesso em: 20 mar. 2013.

POGREBINSCHI, Thamy. O que é o Pragmatismo Jurídico? Disponível em: https://cedes.iesp.uerj.br/pdf/paginateoria/pragmatismo.pdf. Acesso em: 23 mar. 2013.

FREITAS, Lorena de Melo. Um Diálogo entre Pragmatismo e Direito: Contribuições do Pragmatismo para Discussão da Ideologia na Magistratura. Revista Eletrônica de Filosofia, Vol. 4, número 1, jan-jun, 2007, p. 10-19.


Notas

1 Dados históricos sobre a vida do autor foram retirados de The Biography Channel website (2013). Benjamin Cardozo. Disponível em: https://www.biography.com/people/benjamin-cardozo-40728. Acesso em: 20 mar. 2013.

2 O Instituto de Direito Americano atuou de 1932 a 1943, concluiu seus trabalhos, mas não conseguiu uniformizar a Common Law, assim como uma tentativa em 1892 e outra em 1953, que também não lograram êxito.

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Sobre o autor
Luzardo Neto

Acadêmico de Direito vinculado a Universidade Federal do Piauí – UFPI.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NETO, Luzardo. Pragmatismo jurídico para Benjamin N. Cardozo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3793, 19 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25893. Acesso em: 2 nov. 2024.

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