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Diferenças nas verbas rescisórias em função da correção do FGTS.

Uma nova questão trabalhista

01/02/2002 às 01:00
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Uma nova questão vem sendo levada à Justiça do Trabalho, perante diversas Varas, na área de abrangência regional de mais de um Tribunal Regional do Trabalho, qual seja, o direito dos empregados, desde que demitidos sem justa causa e haverem recebido a multa rescisória calculada com os expurgos no FGTS, reclamarem o pagamento da diferença, à luz das mais recentes e uniformes decisões dos Tribunais Superiores, entenda-se, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, este, hoje presidido por um ex-Ministro do TST.

Uma consulta via internet aos portais desses TRT (por exemplo, os da 1ª. Região, da 3ª. Região e da 10ª. Região - Estado do Rio de Janeiro, Estado de Minas Gerais e Distrito Federal e Tocantins) demonstra cabalmente haver entendimentos díspares e conflitantes entre Juízes e Turmas, ao sentenciarem, no primeiro grau, e ao acordarem, na segunda instância. A tentativa de levar o tema à análise e decisão da Corte Trabalhista brasileira de mais alto nível tem esbarrado na decisão (corporativista?) dos TRT em negarem seguimento a Recursos de Revista.

A primeira vez em que manifestei minha opinião sobre o cabimento de reclamação trabalhista postulando a complementação da verba rescisória paga a menor, relativamente à multa de 40% calculada pelos empregadores que demitiam sem justa causa, foi em artigo que Jus Navigandi divulgou (www.jus.com.br / doutrina / trabalho) sob o título Os Expurgos no FGTS, texto elaborado em junho de 2000.

Escrevi, então:

Há um outro aspecto e reflexo dessa decisão, (.....): diz respeito às multas de 40% incidentes sobre os saldos existentes nas contas vinculadas dos empregados demitidos sem justa causa, e que se estende ao montante dos saques efetuados por ele durante a vigência de seu contrato de trabalho para o empregador que o demitiu sem justa para a aquisição da casa própria pelo SFH ou qualquer outra movimentação autorizada por lei.

Esses ex-empregadores devem ser chamados a pagar a diferença, ao ter de recalcular os 40% de multa, uma vez que o saldo na conta vinculada não será mais aquele baseado no qual ele calculou e pagou. Igualmente, o somatório dos saques durante a vigência do contrato terá que ser revisto, recalculado, considerando os índices que a Justiça entender ser aqueles corretos e que haviam sido manipulados e sobre o qual incidirão os famosos 40%. (.....) E os ex-empregadores, inevitavelmente, terão que fazê-lo, ainda que seja necessário ir à justiça para garantir seu recebimento.

A partir daí, elaborei outros artigos, igualmente divulgados via internet, de uma forma ou de outra, retomando a discussão e defendendo aquele meu ponto de vista.

- Em dezembro de 2000, após a decisão do STJ revendo sua posição quanto aos expurgos cabíveis (e que redundou na Súmula 252, publicada no DJ de 13 de agosto de 2001), elaborei outro texto, que Jus Navigandi também divulgou, FGTS: O empregador terá também de pagar a diferença?

- Em fevereiro de 2001, escrevi o texto Efeitos erga omnes de decisão do STF: uma decisão, sua abrangência e seus efeitos que, igualmente, mereceu divulgação, sendo encontrado em pelo menos dois portais (www.direitonaweb.adv.br e www.jus.com.br / doutrina / processo civil).

- Um mês mais tarde, escrevi mais um artigo, divulgado mais amplamente, posto que sob dois títulos diferentes (Expurgos do FGTS: uma parábola trabalhista e Outra vez, a mesma questão) e que pode ser lido em www.juristaonline.com.br, em Jus Navigandi (www.jus.com.br / doutrina / trabalho), em Jus Vigilantibus (www.apoena.adv.br), bem como no Jornal Trabalhista (o semanário JTb, da Editora Consulex) nº. 861 (30/4/2001), p. 17 – Ponto de Vista.

- Finalmente, outro artigo meu que aborda, en passant, a matéria (Quem deve e quem vai pagar os expurgos no FGTS) foi divulgado em vários portais jurídicos, no mínimo nos três citados por último e no www.escritorioonline.com.br, em que ponderei:

E os empregadores que demitiram sem justa causa? Também estão, por enquanto, enriquecidos ilicitamente ao calcularem as multas devidas utilizando os saldos e os índices considerados pela CEF (aqueles mesmos que o Judiciário vem dizendo, há quase dez anos, terem sido ilegalmente estabelecidos, ao arrepio da lei). E vão continuar beneficiados pela inércia e indolência dos empregados demitidos (e de seus Sindicatos) que deixaram prescrever o direito de reclamar, perante a Justiça do Trabalho, passados dois anos da extinção do vínculo laboral (CF/88, art. 7º., inciso XXIX, alínea b) e Enunciado 362 do TST, de novembro/99). A Súmula 181 do antigo Tribunal Federal de Recursos dispõe ser atribuição do empregador (e não do gestor ou do órgão fiscal, à época, respectivamente, BNH e IAPAS) cuidar da "individualização" das contas vinculadas de seus empregados. Quanto a esse "erro" (por culpa ou dolo?) a única via de escape é a prescrição do direito de postular, perdendo o empregado demitido sem justa causa, e que recebeu sua multa com expurgos, o prazo para ajuizar sua Reclamação Trabalhista.

Embora haja juízes que, simplesmente, consideram o pedido improcedente (esses, pelo menos, tomam uma posição), ora um Juiz ou Turma de Tribunal entende ser a Justiça do Trabalho incompetente para julgar a matéria, ora entende ser a questão acessória e, portanto, a decisão depender do êxito do reclamante na postulação (perante a Justiça Federal) na ação em desfavor da Caixa Econômica Federal. Outra decisão, que tem feito escola, particularmente no Fórum Trabalhista de Brasília e no âmbito da 10ª. Região, entende faltar interesse de agir ao postulante antes do trânsito em julgado daquela ação de cobrança contra a CEF. São essas três as principais fundamentações das decisões até agora tomadas, para extinguir, ou sobrestar, as Reclamações Trabalhistas, sem analisar o mérito do pedido, sem aplicar o direito ao caso concreto.

Pode-se, assim, depreender que se torna imperativo e urgente o pronunciamento do TST sobre a tormentosa matéria. Eis aí, talvez, um exemplo da "transcendência" a que alude o art. 896-A da CLT acrescido pela propalada Medida Provisória nº. 2.226. O que requer julgamento do mérito, em princípio.

Antes de discutir cada uma daquelas "saídas" encontradas pelos Juízes e Turmas (basicamente, uma forma de não analisar o mérito do pedido, como requerido, esperado e necessário), proponho-me a tecer, por achar oportuno, uma ou outra consideração a respeito dessa hábito.

Escrevi, sob o título Ser Juiz (www.jus.com.br / doutrina / direito processual civil / juiz):

(.....): por que eles foram ser juízes, se não querem julgar?

Extinguir o processo sem julgamento do mérito é (...) saída que alguns juízes encontram para se eximirem da responsabilidade de aplicar o Direito ao caso concreto. Por vezes, desconhecem, ou deixam de aplicar, a jurisprudência do próprio Tribunal que integram. Se são proibidos, por lei, de julgar ultra petita, alguns juízes não têm pejo de, até, dar uma "mãozinha" à Ré, trazendo aos autos, motu proprio, preliminar(es) que não havia, sequer, sido suscitada(s) na Contestação, quem sabe, por descabida(s), e, com base nesse seu julgamento "ultra contestatis" (existe essa figura?), "condenam", na prática, o Autor, que muitas vezes têm o direito assim negado ou postergado, a ser levado a recorrer (gastando mais com preparo, custas, honorários) e, sobretudo, a acreditar e confiar menos na Justiça.

Nosso Poder Judiciário vive crise permanente de assoberbamento, de sobrecarga de processos, inúmeros deles questionando uma mesmíssima coisa já decidida reiteradamente e que, portanto, inevitavelmente terá, no fim, o mesmo resultado, havendo decisões já sumuladas, jurisprudência mansa e pacífica, remansosa, inequívoca. Contribuem para esse estado de congestionamento, que leva à demora na decisão final, no trânsito em julgado e na coisa julgada, dois fatores:

a)................. ................; e

b) a postura dos magistrados (do Primeiro Grau, principalmente) que relutam em adotar as medidas processuais a seu alcance, no CPC (julgamento antecipado da lide, antecipação da tutela,.... ) e / ou recusam-se a aceitar como se fora erga omnes as decisões jurisprudenciais tomadas em casos anteriores por seus respectivos Tribunais, pelo STF, STJ e TST.

I. Quanto à competência da Justiça do Trabalho para julgar esse tipo de feito, mais que competente, parece-me inconteste ser ela a única competente, ratione materiæ. A esse respeito, escrevi:

Essa dívida é, tipicamente, trabalhista. Portanto, não poderá ser cobrada da CEF, se não foi ela quem calculou, a menor, as verbas rescisórias, e se ela não mantivera vínculo empregatício, patronal, com os empregados prejudicados. No máximo, em outra esfera e discussão, pode ser imputada à Caixa a culpa por haver induzido ao erro esses empregadores, que enriqueceram ilicitamente, ou se locupletaram, com tal "erro", cumulado com seu próprio "erro", praticado com "respaldo" na orientação daquele gestor. (FGTS: O EMPREGADOR TERÁ TAMBÉM DE PAGAR A DIFERENÇA?)

Afinal, está sendo levado à consideração do Juízo Especializado se houvera culpa (ou dolo) de uma Reclamada ao efetuar os cálculos da indenização / multa de 40% decorrente da demissão sem justa causa de um empregado, convenientemente, desconsiderando os fatores de atualização monetária que deveria adotar (IPC / IBGE), consoante o mandamento legal e nossa melhor, antiga e consolidada jurisprudência.

Há que se considerar, por outro lado e ainda, o advento da Lei Complementar nº. 110, de 29 de junho de 2001, que entrou em vigor na data de sua publicação (DOU de 30/06/2001), que reconhece – e estende –, também pela via administrativa, o direito dos empregados à complementação das atualizações monetárias de suas contas vinculadas ao FGTS pelo IPC / IBGE de janeiro de 1989 e de abril de1990, desobrigando, salvo melhor entendimento em contrário, a Justiça do Trabalho de assumir a responsabilidade pelo cabimento daquele direito. Aquela LC o disse, a partir das decisões do STF e do STJ, em 2000.

Vincular, por exemplo, a concessão da complementação de uma verba rescisória à obtenção de outra complementação fundiária, e pela via judicial, é uma forma de impedir que os empregados demitidos sem justa causa e que receberam a multa de 40% diminuída, devido à prática dos mesmos expurgos, também por seus ex-empregadores, venham a receber a complementação reiteradamente reconhecida como devida, mormente em face do disposto na CF/88, art.. 7º., inciso XXIX, alínea b (prazo de dois anos após o término do vínculo laboral para ajuizar a Reclamação Trabalhista). A decretação da incompetência da Justiça Trabalhista tem o mesmo condão, ao exigir a tomada de medida judicial que, alfim, a reconheça, vencido o tempo de tramitação desta nova ação.

Registre-se, a bem da verdade, que, em sua maioria, os Juízes do primeiro grau reconhecem a competência da Justiça Laboral, enquanto, em sede de Recurso Ordinário, uma ou outra Turma vem extinguindo causas sem julgamento do mérito ao, de ofício, trazerem à luz essa incompetência, o que, obviamente, não fora aspecto abordado no recurso. Ao assim julgarem, olimpicamente, desprezam o princípio de tantum devolutum quantum appelantum, que constitui um dos pilares do processo.

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O Professor (e Juiz do Trabalho, em São Paulo) Sérgio Pinto MARTINS (Direito Processual do Trabalho, Ed. Atlas, 1998, 7ª. Edição, pág. 328 / 331) afirma:

(....) somente a matéria que foi veiculada no recurso poderá ser objeto de reexame pelo juízo "ad quem", devendo a apelação ser dirigida ao dispositivo da sentença, pois só faz coisa julgada o dispositivo da sentença. Os motivos, a verdade dos fatos e a apreciação da questão prejudicial não farão coisa julgada (art. 469 do CPC).

Assim, a matéria a ser examinada pelo tribunal é toda a matéria de fato e de direito impugnada. A impugnação não poderá exceder o dispositivo da sentença, nem poderá o tribunal ir além do exame da matéria veiculada, sob pena de julgamento "ultra petita", o que acarreta nulidade. O tribunal também não poderá reformar a sentença para pior ("reformatio in pejus"), julgando fora do pedido, salvo se a parte contrária também recorrer.

Da mesma forma, pedido de reforma de decisão feito em contra-razões não terá qualquer validade, pois deveria ter havido recurso próprio para tanto. As contra-razões nada devolvem. Suas alegações não são devolvidas à apreciação do tribunal, mas apenas argumentam ou rebatem os argumentos do recorrente.

Entretanto, costuma ser admitido na jurisprudência brasileira acatar alegações argüidas em contra-razões,.

II. Sobre haver uma ação principal e outra acessória, data venia, é entendimento que não resiste a uma análise isenta, ponderada e equilibrada, como deve ser a dos membros do Poder Judiciário. Se não, vejamos:

O conceito de ação acessória remete à Modificação das Competências, artigo 108 do CPC (Seção IV do Capítulo III do Título IV do Livro I: "A ação acessória será proposta perante o juiz competente para a ação principal."), para determinar a prorrogação da Competência de um juízo, e permitir que um único juiz, por prevenção, julgue as causas conexas ou as causas continentes, evitando conflitos ou decisões divergentes.

Como entender ser a Reclamação Trabalhista em comento um pedido acessório de outro, dito principal, em outra ação que tem Partes distintas, fórum de competência diferente e causa de pedir diversa? Inadmitida a prevenção, em comum, apenas, a circunstância de as Rés, em uma e outra causa, haverem cometido o mesmo erro (no mínimo, culposamente), ocasionando prejuízos (de valores desiguais) ao mesmo Autor e enriquecimento ilícito às Rés.

A Reclamação Trabalhista e a Ação de Cobrança perante a Justiça Federal, em desfavor da CEF, constituem, claramente:

- duas ações

absolutamente independentes uma da outra

- suscitadas pelo mesmo fato (os expurgos nos índices de reajuste utilizados)

- perante duas esferas judiciais

cujas competências (ratione materiæ e ratione personæ) não permitem prevenção (conexão ou continência) – ou acessoriedade

- em desfavor de duas Rés

(uma em cada qual) e

- com causas de pedir distintas.

O bastante para parecer absolutamente irrelevante, salvo melhor juízo, ser demonstrado, mormente ab initio, em uma das lides haver pronunciamento judicial, com índole de coisa julgada, deferindo o outro pleito, qualquer que seja a ordem dos julgamentos ou das decisões. E que o provimento de uma afete ou influa no provimento da outra.

Humberto THEODORO JÚNIOR (Curso de Direito Processual Civil, vol. I, Editora Forense, 22ª edição, 1997, p. 183/184) ensina:

a) ações acessórias: as que resultam da decisão de um outro processo ou que se prestam a colaborar na eficácia de outro processo, como as ações cautelares, e que se ligam ao juízo anterior, por regra de competência funcional. A competência, nesses casos, mesmo após o encerramento do primeiro feito, continua sendo do juiz da causa principal (....). São exemplos de causas acessórias: a liquidação da sentença; a restauração dos autos; a habilitação incidente; a ação de depósito, ou de prestação de contas, contra o depositário do bem penhorado; etc.;

(......)

Deve-se observar que a simples circunstância de sucessão entre duas causas, em torno de uma mesma relação jurídica, ou de relações derivadas da que primeiro se tornou litigiosa, não gera a acessoriedade, (.....). – grifos acrescentados.

A Reclamação Trabalhista me parece tão autônoma em relação àquela ajuizada perante a Justiça Federal, em desfavor da Gestora do FGTS, que seria admissível em juízo ainda que Ação de Cobrança contra a Caixa Econômica Federal não houvesse sido ajuizada (como permite e pretende a citada Lei Complementar nº. 110/2001) ou que só viesse a sê-lo depois, como se pode facilmente deduzir.

- Na Justiça do Trabalho somente é cabível este tipo de reclamação por parte de empregado demitido sem justa causa e ao qual parte das verbas rescisórias devidas deixou de ser corretamente paga. Perante a Justiça Federal, em desfavor da Caixa Econômica, pode postular qualquer trabalhador que tivesse saldo em conta vinculada nas datas em que os expurgos foram praticados.

- Esta Reclamação Trabalhista não diz respeito aos saldos existentes, causa petendi básica da ação que tramita perante a Justiça Federal, mas aos depósitos efetuados pelo empregador na conta vinculada de seu empregado, o que inclui os saques efetuados pelo empregado na vigência do contrato de trabalho.

No caso da cobrança em desfavor da Caixa Econômica, não seria mais objeto de correção um saque efetuado em janeiro de 1989, um dos meses em que foram perpetrados expurgos (pelos bancos depositários das contas vinculadas, ao seguirem orientação da Gestora do FGTS), de vez que a atualização monetária se fazia tendo por base de cálculo o menor dos saldos existentes (à época, no trimestre imediatamente anterior). Assim, se o Recorrente houvesse sacado tudo antes dos expurgos (isto é, se sua conta apresentasse saldo zero), não haveria saldo a corrigir nem correção a cobrar da Caixa Econômica, permanecendo, contudo, o direito à multa sobre os depósitos efetuados em seu favor e, conseqüentemente, o direito a esta Reclamação Trabalhista. Isso, em face do que dispõe o parágrafo 1º. do artigo 18 da Lei nº. 8.036/90.

Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, pagará este diretamente ao trabalhador importância igual a 40% (quarenta por cento) do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.

- A ação contra a Caixa poderá ser ajuizada até janeiro ou fevereiro de 2019 (prescrição trintenária), enquanto o direito à reclamatória, perante a Justiça do Trabalho e em desfavor de um ex-empregador, prescreve em dois anos contados da data de extinção do vínculo laboral. Há quem entenda ocorrer, não a prescrição, mas a decadência do direito, o que resulta, em termos práticos, no mesmo: não poder mais reclamar aquele seu direito trabalhista legítimo.

Casos há em que a complementação da multa de 40% que está sendo cobrada do ex-empregador, relativa àqueles expurgos, é maior que a complementação de responsabilidade da Caixa Econômica, vez que esta última incidirá, apenas, sobre o valor não sacado, e que permaneceu na conta vinculada. O valor da questão trabalhista, nesta hipótese (que um Juiz ou Turma entende acessória da outra), se mostra, pois, muito mais alto que o valor daquela tida por ele como principal. Seria, pois, no mínimo um paradoxo considerar que uma tal Reclamação Trabalhista, de maior valor, fosse acessória, e a principal fosse a de menor valor. "Uma coisa não pode ser acessória, se for maior do que a coisa tida por principal" (Institutas de Justiniano, séc. VI d.C., Livro 3, Título 21, Parágrafo 5º.)

III. Discutamos, por fim, o entendimento de faltar interesse de agir ao reclamante, se ele ainda não tem uma decisão, com trânsito em julgado, concedendo-lhe os expurgos na ação perante a Justiça Federal.

Em discussão, essencialmente, o que quer dizer, jurídica e processualmente, interesse de agir. As lições de nossos mais ilustres e respeitados doutrinadores conceituam e definem que se deve entender por interesse de agir, em suma, haver resposta positiva a duas indagações:

- houve necessidade de vir a juízo para conseguir o direito que se busca?

- haverá utilidade,ou adequação, do pedido, uma vez ele deferido?

A doutrina pátria assim interpreta o que seja interesse de agir, por seus mais ilustres e respeitados doutrinadores, dentre muitos outros, Nelson NERY JÚNIOR, Sérgio BERMUDES, Humberto THEODORO JÚNIOR, Alfredo BUZAID, ARRUDA ALVIM, Amauri MASCARO e Sérgio Pinto MARTINS.

O interesse processual se consubstancia na necessidade de o autor vir a juízo e na utilidade que o provimento jurisdicional poderá lhe proporcionar, apud Nelson NERY JÚNIOR (Código de Processo Civil Comentado, 2ª. Edição, Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 317.

Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático. Movendo a ação errada ou utilizando-se do procedimento incorreto, o provimento jurisdicional não lhe será útil, razão pela qual a inadequação procedimental acarreta a inexistência de interesse processual. (Idem, ibidem, p. 672).

(....) há um interesse outro, que move a ação. É o interesse em obter uma providência jurisdicional quanto àquele interesse, Por outras palavras, há o interesse de agir, de reclamar a atividade jurisdicional do Estado, para que este tutele o interesse primário, que de outra forma não seria protegido.

Diz-se, pois, que o interesse de agir é um interesse secundário, instrumental, solidário, de natureza processual, consistente no interesse ou necessidade de obter uma providência jurisdicional quanto ao interesse substancial contido na pretensão.

O que move a ação é o interesse na composição da lide (interesse de agir), não o interesse em lide (interesse substancial), no sábio ensinamento de Moacyr AMARAL SANTOS (Primeira Linhas de Direito Processual Civil, 1º. Volume, Editora Saraiva, 18ª. Edição, 1995, p. 166/167, item 128).

Necessidade e adequação, eis o binômio de cuja integração depende a formação do interesse processual, ou interesse de agir a que o Código alude, junto com as outras condições gerais da ação, no seu art. 267, VI, e também no art. 3°. (Sérgio BERMUDES, Introdução ao Processo Civil, 2ª. Edição, Editora Forense, 1996, p. 50).

Humberto THEODORO JÚNIOR (Curso de Direito Processual Civil - Vol. I, 22ª. Edição, Editora Forense, 1997, p. 55/57) leciona:

O interesse de agir, que é instrumental e secundário, surge da necessidade de obter através do processo a proteção ao interesse substancial. Entende--se, dessa maneira, que há interesse processual "se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais" (citando Alfredo BUZAID, Agravo de Petição, n°. 39, p. 88/89).

Essa necessidade é o "que nos leva a procurar uma solução judicial, sob pena de, se não fizermos, vermo-nos na contingência de não podermos ter satisfeita uma pretensão (o direito de que nos afirmamos titulares), recorrendo ao ensinamento de ARRUDA ALVIM, em Código de Processo Civil Comentado, v. I, p. 318.

Para rematar:

O interesse processual, a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial.

Em obras de doutrinadores mais diretamente ligados ao Direito Processual do Trabalho, encontramos:

Interesse de agir. É o interesse da parte de recorrer ao Judiciário para a obtenção do reconhecimento de um direito ameaçado ou violado. Exemplo: o empregado não pode pretender a indenização em dobro, em decorrência de ser estável, se não foi dispensado. Falta interesse de agir, diz Sérgio PINTO MARTINS, Juiz da 33ª. Vara Trabalhista de São Paulo (Direito Processual do Trabalho, 7ª. Edição, Editora Atlas, 1998, p. 197).

Interesse de obter o bem mediante a intervenção jurisdicional, único meio que evitaria os prejuízos que o autor sofreria se não movimentasse o órgão estatal, interesse que pode ser patrimonial ou moral, proclama Amauri Mascaro NASCIMENTO, em Curso de Direito Processual do Trabalho, 19ª. Edição, Editora Saraiva, 1999, p. 269.

A necessidade do reclamante, nestes casos, se caracteriza porque torna-se indispensável e inevitável buscar a intervenção do Estado-Juiz, para que seu Direito possa ser reconhecido e a tutela pretendida alcançada. Se assim não proceder, ante a negativa do ex-empregador em admitir pagar-lhe mais do que já pagara (mesmo que, no Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho, houvesse sido feita ressalva a respeito), o reclamante verá, quem sabe, esgotar-se o prazo prescricional a que alude o inciso XXIX do art. 7°. da CF/88, lembrando o prejuízo, nas palavras de Alfredo BUZAID e Amauri MASCARO, e a contingência, nas de ARRUDA ALVIM anteriormente citados.A adequação e utilidade da medida judicial buscada estão presentes, igualmente, de vez que é a Reclamação Trabalhista a única medida cabível a seu alcance.

Há que se considerar, ademais, que a demora na obtenção da coisa julgada perante a Justiça Federal – tendo que superar todos os recursos, notoriamente procrastinatórios da CEF (Ré naquele processo) –, fatalmente, faria com que o reclamante visse seu direito de reclamar na esfera trabalhista prejudicado.

A ameaça, ou iminência, da perda do direito de postular, se não o fizer dentro de dois após a extinção do vínculo laboral, a meu ver, bastaria, pois, para configurar, sobeja e suficientemente, o interesse de agir do reclamante.

Tentando entender o que poderia levar um Juiz a extinguir uma Reclamação Trabalhista em que seja pleiteada a complementação de uma verba rescisória paga a menor, fundamentando sua decisão na falta de interesse de agir do reclamante, pode-se inferir que S. Exa., talvez, quisesse dizer que havia uma ação prejudicial (e não acessória) em curso. Não querendo ele fazer uso dos poderes que lhe confere o art. 470 do CPC, enquanto a prejudicial não fosse julgada, caberia, no entanto, suspender o trâmite da Reclamação Trabalhista, no máximo, por uma ano, prazo que pode não ser suficiente para a outra chegar ao julgamento final, leia-se, trânsito em julgado.

Algumas sentenças chegam a antecipar que, obtido o direito na outra esfera – a Federal, em desfavor da CEF –, o direito trabalhista seria reconhecido. De se estranhar que, mesmo nesses casos, obtida aquela decisão irrecorrível e trazida a competente certidão que o ateste aos autos, nem assim, o processo tem sido devolvido (dando provimento ao Recurso Ordinário, sendo tal o requerido) para que o juiz a quo analise o mérito e prolate nova sentença, sem supressão de instância.

Aos diabos com o princípio da economia processual! O hipossuficiente que volte a postular, arcando com o ônus de seu primeiro insucesso, é o que se pode concluir.

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Sobre o autor
João Celso Neto

advogado em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CELSO NETO, João. Diferenças nas verbas rescisórias em função da correção do FGTS.: Uma nova questão trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2636. Acesso em: 29 mar. 2024.

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