O contrato de leasing sobre veículo automotor, em regra, trata-se de típica relação de consumo, incidindo, assim, as normas relativas ao Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90), em consonância com o § 2° do artigo 3° do referidoCódigo, bem como da súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça[1], que assegura a aplicação do CDC às instituições bancárias (em verdadeiro diálogo das fontes), abrangidas também as empresas de leasing, mormente quando houver destinatário final qualificado pela vulnerabilidade, adotando-se a “teoria finalista aprofundada”[2].
Nesta senda, o contrato de leasing, sob o prisma do direito do consumidor, afigura-se como aquele em que a instituição financeira arrenda ao consumidor bem durável, por determinado tempo (prazo mínimo do contrato: 3 anos), facultando-se ao consumidor, ao final do prazo contratual, renovar a “locação”, não renovar, ou optar pela aquisição do bem arrendado, mediante o pagamento de valor residual previamente ajustado.
O leasing, quando do seu surgimento com o advento da lei 6.099/74, era utilizado em larga escala pelos consumidores para terem acesso a bens ligados à utilidade doméstica (tais como televisão, computador, geladeira etc.), haja vista que o crédito à época (ainda quando do nascedouro da referida lei) não era tão facilitado como se verifica nos dias atuais. Deste modo, diante da dificuldade de acesso ao crédito, o consumidor, pretendendo desfrutar de maneira mais rápida dos bens e da tecnologia disponível, viu-se compelido pelos ideais capitalistas a contratar leasing, pagando um aluguel para usufruir o bem de consumo desejado, podendo optar ao final pelo pagamento do Valor Residual Garantido (VRG) para se tornar proprietário do bem que até então era de propriedade do Arrendador.
Com o passar dos anos houve um aquecimento exacerbado no mercado de veículos automotores. Com isso, implementou-se o leasing para a aquisição de automóveis. As empresas de leasing ou instituições financeiras, levando em conta que os veículos têm uma desvalorização pela sua utilização (perecimento natural do bem) quando alugados por meio do referido contrato, adotaram a prática de diluir o VRG (valor residual garantido) nas parcelas do arrendamento do contrato. Assim, ao invés de o consumidor optar ao final do contrato de leasing se pretendia adquirir o automóvel, antecipou-se a opção de compra.
Neste panorama, portanto, quando diante de contratos de leasing envolvendo veículos automotores ao invés do pagamento do aludido VRG (valor residual garantido) ser realizado ao final, como em tese deveria ser, ele é diluído nas prestações do aluguel correspondente ao leasing, como se a opção de compra fosse feita no início do contrato[3].
Muitas vozes na doutrina e na jurisprudência entendiam que a cobrança antecipada do VRG descaracterizaria o contrato de leasing, transformando-o numa mera compra e venda a prestação.
O próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ) dispunha na súmula 263 que “a cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracterizaria o contrato de arrendamento mercantil, transformando-o em compra e venda a prestação”.
Tal súmula, posteriormente, foi cancelada, editando-se a súmula 293 do STJ, que assim dispõe: “a cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil”.
Como bem aponta André Luiz Santa Cruz:
“Tal decisão do STJ foi claramente influenciada pela relevância econômica que o contrato de leasing tem na economia nacional. Caso prevalecesse o entendimento anterior, haveria uma diminuição considerável dessas operações, o que poderia causar uma retração em setores do mercado em que a presença dessa modalidade contratual é significativa”[4].
É muito comum que o consumidor faça confusão entre contrato de leasing com o contrato de alienação fiduciária em garantia, sobretudo pelo fato de que muitas vezes o leasing ser utilizado como verdadeiro financiamento.
O consumidor final não sabe o significado dos tipos contratuais disponíveis e nem seus efeitos jurídicos, ele sabe unicamente escolher as parcelas que se encaixem no seu bolso. Há, assim, vulnerabilidade informacional do consumidor quando da “compra” do veículo pelo sistema leasing.
Não sabe o consumidor que optando pelo sistema leasing está realizando pagamento de alugueis, e que se deixar de realizar o pagamento, em regra não terá direito à devolução dos valores que desembolsou a título de locação, sujeitando-se a ação de reintegração de posse pelo proprietário do bem (arrendante). E também não sabe o consumidor que o sistema de alienação fiduciária em garantia possa lhe ser mais vantajoso em caso de inadimplemento, pois neste trata-se de compra e venda com reserva de domínio, ou seja, em eventual inadimplemento o bem será apreendido e posteriormente levado a leilão, e o valor da venda no leilão será abatido da dívida somada aos juros remuneratórios.
Nesta linha, Cláudia Lima Marques muito bem ilustra a atual situação de déficit informacional dos consumidores nos contratos de leasing na citação abaixo:
“Cumpre observar que é o fornecedor que – para multiplicar suas vendas – escolhe o “método” do leasing de bens de consumo. Ao oferecer o método do leasing como mais um método ou meio de “aquisição” de bens de consumo massificado, tem o fornecedor uma “comodidade” e assume assim os riscos da complexidade e da falta de clareza deste contrato [...]. Relembre-se, também, que a publicidade deste método negocial muitas vezes já desinforma o consumidor em potencial, ao afirmar: “venda de automóvel X na modalidade leasing”. Outras vezes o fornecedor escolhe o leasing como única forma contratual possível para a compra de um veículo em uma determinada revendedora ou por determinado preço vantajosa. Quanto menor a informação, tanto mais dúbio o marketing, quanto menor a liberdade de escolha do consumidor, maiores são os riscos de inadimplemento e de violação dos paradigmas de boa-fé objetiva do CDC por parte dos fornecedores assim atuarem[5]”.
Neste cenário, o consumidor ao contratar a modalidade leasing imagina já estar realizando um financiamento para fins de compra e não uma locação de um bem ou uma compra e venda com reserva de domínio.
Assim, seria caso de a teoria da declaração ceder espaço à teoria da confiança (esta última prevista no artigo 113 do Código Civil), vale dizer, os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé, e não de acordo com o que foi declarado.
Não por outra razão o STJ, de maneira lúcida, no seu informativo 480, em atenção à teoria da confiança, que tem lastro na boa-fé objetiva e na função social do contrato, eliminou uma das naturezas do contrato de leasing (locação), permitindo que fosse reconhecida a teoria do adimplemento substancial, impossibilitando o arrendante de retomar a posse do bem[6].
Neste momento, levando-se em conta todas as considerações feitas até neste ponto, ingressa-se na abordagem da temática do presente artigo. Caso haja furto ou roubo do veículo objeto de leasing sem ter o arrendatário realizado seguro, deve haver o prosseguimento dos pagamentos por parte do consumidor até o final do plano? Como fica o saldo devedor do contrato de leasing?
É rotineiro que quando o consumidor não concorra para a perda do bem arrendado, como nos casos de roubos e furtos, sejam eles acionados pela arrendante a adimplir com o pagamento de todas as parcelas, vencidas e vincendas, comofariam se não houvesse sua "liquidação antecipada".
Entende Antônio Carlos Efing que:
“o consumidor arrendatário, até o pagamento do valor residual, não é proprietário do bem, tendosomentesua posse; o proprietário é o fornecedorarrendador. Todavia, diferentemente do queocorrepeloprincípio do res perit domino, emque a coisaperece para o dono, no leasing puro (financeiro), osriscos da conservação correm por conta do arrendatário possuidor, e não do arrendador proprietário, razão pela qual geralmente existe a obrigação do consumidor de manter segurado o bem arrendado, para que, eventualmente, ocorrendo qualquer sinistro, fique o proprietário resguardado de prejuízos dele advindos”[7].
Sob a ótica do consumidor é possível na prática apurar-se as seguintes situações que poderão ter tratamentos distintos. Vejamos:
1ª situação[8]: Se o arrendador trouxer no contratoque é obrigação do arrendatário a contratação do seguro total, não o obrigando à contratação do seguro fornecido pelo próprio arrendador, entendemos que não há que se falarem abusividade da cláusula, devendoser o arrendatário responsabilizado pelo pagamento do automóvel furtado ou roubado, levando-se emconta o preço do veículo quando da data do perecimento, e não o valor de quando da contratação, vale dizer, será devido o pagamento do preço do veículo de acordo com a tabela FIPE, haja vista a natural desvalorização do bem.
De outra banda, cumpre salientar que a partir do momento da ocorrência do sinistro não deve o arrendatário continuar o pagamento das parcelas vincendas, mas somente com as parcelas vencidas (período que usufruiu do bem), haja vista o nítido caráter de locação inerente ao leasing (contrato complexo), devendo-se lembrarque, de acordo com a súmula 297 do STJ, o simples fato de ter ocorrido antecipação do VRG não descaracteriza o contrato de leasing. Aliás, com o perecimento da coisa extinguiu-se relação ex locato, sendo indevida cobrança de alugueis se o arrendatário não mais possui a coisa para fins de fruição.
Com a ocorrência do furto / roubo do veículo o VRG antecipado, deveráserdevolvido à arrendatária.o VRG, abatendo-se tal valor da indenização.
2ª situação: De outro lado, se o arrendador trouxer cláusula em seu contrato que é obrigação do arrendatário a contratação do seguro total fornecido pelo próprio arrendador (não lhe dando opções para contratação de outro seguro), entendemos que haverá nítida venda casada, sendo caso de nulidade da cláusula em razão da sua abusividade, de acordo com o artigo 39, inciso I do Código de Defesa do Consumidor, isentando o arrendatário de qualquer responsabilidade por eventual sinistro se este não tiver realizado / renovado o seguro.Neste caso, as parcelas vincendas não deverão ser pagas pelo arrendatário, e este ainda terá direito à devolução do VRG, por não ter sido exercido a compra do automóvel.
3ª situação: Seguindo-se brilhanteexemplo do pós-doutor e professor da PUCSP AdalbertoSimãoFilho[9], há publicidades em que se inclue seguro de veículo e licenciamento. Em tal hipótese é possível que o valor do seguro seja diluido no preço das parcelas do leasing até o final do contrato. Ocorre que, em razão da publicidade (no momento pré-contratual) que faz alusão que o seguro era grátis, sem mencionar o período de gratuidade, e o fato de o valor do seguro estar diluído em todas as parcelas poder-se-ia dizer que o consumidor foi levado a acreditar que o seguro iria perdurar durante todo o contrato de leasing. Sendo assim, eventual falha informacional na publicidade (informando tão somente que o seguro é gratis, não estabelecendo limite temporal), mesmo que no contrato assinado tenha clásula prevendo que o seguro seria pelo prazo de um ano tãosomente, a publicidade (mais abrangente) – por não estipular tempo – integraria o contrato (conforme estabelece o artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor[10]), devendo-se interpretar a cláusula mais favorável ao consumidor[11] (que era aquela prevista na publicidade).Desta forma, seria incumbência do arrendante renovar o seguro, e não o tendo feito arcaria com tal ônus em eventual furto ou roubo do bem, isentando o arrendatário de responsabilidade. As parcelas vincendas também neste caso não deverão ser pagas, haja vista que extinguiu-se a relação ex locato, devendo-se ainda o VRG antecipado ser devolvido, pois não se realizou a aquisição do bem.
Não obstante todaexplanação, háinteressante e recentíssimojulgado, datado de 15 de maio de 2013, do Juízo de Direito da SegundaVaraEmpresarial do Rio de Janeiro emsede de Ação Civil Pública (Processo: 0186728-64.2011.8.19.0001) decidiuqueem caso de roubo ou furto do bem arrendado,sem que o arrendatário tenha contribuído com culpa ou dolo, ainda que não tenha sido efetuado contrato de seguro, não pode ser cobrado do consumidor o prejuízo do arrendante pela perda da coisa. Veja-se trecho do julgado:
“Outrossim, nahipótese de rescisão antecipada do contrato, pordesistência, inadimplemento e outras, mesmodecorrendo o prazomínimo para oscontratos de leasing - 3 anos, osréus "tratam o contrato de arrendamento mercantilfinanceirocomo se de alienaçãofiduciária fosse", sendoque, nahipótese de rescisão a pedido dos consumidores, estessãoobrigados a arcar com o pagamento de todas as prestações vincendas, deduzindo-se apenas "eventual valor apuradonaoperação de venda do veículo a terceiros (leilão).
Assim, na hipótese da não celebração de contrato de seguro pelo arrendatário-consumidor, este deverá substituir o bem por outro equivalente, ou, ainda, ressarcir o arrendante do prejuízo equivalente ao valor do VRG.
Contudo, entendo que, tratando-se de contrato de arrendamento mercantil, o arrendante permanece dono da coisa arrendada até o final do contrato, somente sendo transferido o domínio se houver essa opção feita pelo consumidor. Desse modo, se a coias perece por ausência de dolo ou culpa do arrendatário, não pode ser este quem irá sofrer o prejuízo, de acordo com a regra res perit domino (arts. 233 a 236 do CCB). Portanto, em caso de roubo ou furto do bem arrendado,sem que o arrendatário tenha contribuído com culpa ou dolo, ainda que não tenha sido efetuado contrato de seguro, não pode ser cobrado do consumidor o prejuízo do arrendante pela perda da coisa.
Por outro lado, conforme recentemente decidido pelo E. STJ, no Recurso Especial Repetitivo nº 1.099.212, para os efeitos do art. 543-C do CPC, ficou pacificada a seguinte tese:
"Nas ações de reintegração de posse motivadas por inadimplemento de arrendamento mercantil financeiro, quando o produto da soma do VRG quitado com o valor da venda do bem for maior que o total pactuado como VRG na contratação, será direito do arrendatário receber a diferença, cabendo, porém, se estipulado no contrato, o prévio desconto de outras despesas ou encargoscontratuais".
Outrossim, está pacificado junto àquela E. Corte o entendimento de que, retomada a posse direta do bem pelo arrendante, através de ação de reintegração de posse, extinta está a possibilidade do arrendatário (consumidor) adquirir referido bem, quando deverá ser-lhe devolvido o valor residual pago antecipadamente, sob pena de enriquecimento ilícito da arrendante.
Desse modo, o E. STJ já fixou jurisprudência no sentido de, na hipótese de inadimplemento do contrato de arrendamento mercantil, com ou sem culpa do arrendatário, sendo o produto da soma do VRG pago antecipadamente com o valor da venda do bem, maior que o valor total contratado como VRG, ser devida a devolução ao arrendatário da diferença apurada, e, se também estipulado previamente, o prévio desconto de outras despesas ou encargos contratuais.
Outrossim, reconheceu igualmente que, após a retomada do bem em ação de reintegração de posse, o arrendatário não mais poderá exercer o direito de compra, devendo-lhe apenas ser devolvido o VRG, sob pena de enriquecimento ilícito.
Havendo manifesto abuso de direito, nos casos de inexistência de seguro contratado pelo arrendatário, exigindo deste substituir o bem por outro equivalente, ou, ainda, ressarcir o arrendante do prejuízo equivalente ao valor do VRG, quando o perecimento do bem não decorrer de culpa ou dolo do arrendatário, é devida a devolução em dobro dos valores pagos, na forma dodisposto no art. 92 do CDC”.
Quando do furto ou roubo do bem arrendado e não estava segurado, o consumidor pode valer-se de ação de resolução por onerosidade excessiva, pois o sinistro sofrido rompeu com a base a base objetiva do negócio. Deve-se pleitear em tal ação a resolução do contrato, a declaração de inexistência da dívida das parcelas vincendas e a devolução do VRG já pago.
De acordo com o informativo 488 do STJ Importante destacar que o prazo prescricional para se pleitear a restituição do VRG é de 10 (dez) anos[12].
Notas
[1]Súmula 297 do STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicávelàsinstituiçõesfinanceiras.
[2] GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor – CódigoComentado e jurisprudência. 9ª. Bahia: Editora Jus Podivm. 2013. p. 37: “[…] acerca do alcance da expressão “destinatáriofinal”constant do artigo 2° do CDC, consolidando a TeoriaFinalistacomoaquelaqueindica a melhordiretriz para a interpretação do conceito de consumidor, admitindo, certoabrandamentodessateoriaquando se verificarumavulnerabilidade no casoconcreto, nosmoldes do pensamento de Cláudia Lima Marques”.
[3]RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método. 2013. p. 581.
[4]Idem. p. 583
[5]MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor – o novo regime das relações contratuais. 6ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011. p. 576.
[6]LEASING. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. Trata-se de REsp oriundo de ação possessória ajuizada pela ora recorrente em desfavor do ora recorrido por inadimplemento de contrato de arrendamento mercantil (leasing). A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, entendeu, entre outras questões, que, diante do substancial adimplemento do contrato, ou seja, foram pagas 31 das 36 prestações, mostra-se desproporcional a pretendida reintegração de posse e contraria princípios basilares do direito civil, como a função social do contrato e a boa-fé objetiva. Consignou-se que a regra que permite tal reintegração em caso de mora do devedor e consequentemente, a resolução do contrato, no caso, deve sucumbir diante dos aludidos princípios. Observou-se que o meio da realização do crédito pelo qual optou a instituição financeira recorrente não se mostra consentâneo com a extensão do inadimplemento nem com o CC/2002. Ressaltou-se, ainda, que o recorrido pode, certamente, valer-se de meios menos gravosos e proporcionalmente mais adequados à persecução do crédito remanescente, por exemplo, a execução do título Precedentes citados: REsp 272.739-MG, DJ 2/4/2001, REsp 469.577-SC, DJ 5/5/2003, e REsp 914.087-RJ, DJ 29/10/2007. REsp 1.051.270-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/8/2011 (Informativo STJ 480).
[7]EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2012. p. 211.
[8]ARRENDAMENTO MERCANTIL. LEASING.SEGURO PARA COBERTURA DE RISCOS DO BEM ARRENDADO. OBRIGAÇÃO CONTRATUAL DO ARRENDATÁRIO. FURTO DO VEÍCULO. RESCISÃO DO CONTRATO.PRESTAÇÕES DEVIDAS ATÉ A OCORRÊNCIA DO SINISTRO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não há abusividade ou nulidade da cláusula contratual que obriga o arrendatário a providenciar o seguro do bem objeto do arrendamento. Ele responde pelas prestações durante o tempo em que desfrutou da posse direta do bem, pois a natureza delas corresponde a simples aluguel pelo desfrute que teve. E, seguindo o mesmo modo de pensar, não pode responder por prestações subsequentes ao roubo do veiculo. Contudo, descumprindo o arrendatário a cláusula que o obrigava a contratar cobertura de riscos do veiculo arrendado, ocorrido o sinistro do bem, a arrendadora tem o direito de cobrar pela via ordinária a indenização que entender pertinente. VALOR RESIDUAL GARANTIDO COBRADO ANTECIPADAMENTE. RESCISÃO DO CONTRATO. DIREITO DA PARTE ARRENDATÁRIA A DEVOLUÇÃO. RECURSO IMPROVIDO. O VRG cobrado antecipadamente permanece em depósito da parte arrendadora, cabendo-lhe efetuar a respectiva restituição ao arrendatário, caso não efetivada a compra e venda (TJ-SP - Apelação APL 992060655533 SP (TJ-SP)Data de publicação: 07/12/2010).
[9]Aula proferida no curso de pós-graduação da PUCSP no dia 10 de agosto de 2013.
[10]Art. 30 da lei 8.078/90: Toda informaçãooupublicidade, suficientementeprecisa, veiculadaporqualquer forma oumeio de comunicação com relação a produtos e serviçosoferecidosouapresentados, obriga o fornecedorque a fizerveicularoudela se utilizar e integra o contratoquevier a sercelebrado.
[11] Art. 47 da lei 8.078/90: As cláusulascontratuaisserãointerpretadas de maneiramaisfavorávelaoconsumidor.
[12]ARRENDAMENTO MERCANTIL. RESTITUIÇÃO DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO. PRAZO PRESCRICIONAL GERAL. Trata-se de recurso especial no qual se discute a definição do prazo prescricional para a propositura de ação visando à restituição do valor residual garantido (VRG) em contrato de arrendamento mercantil: se o prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, IV, do CC/2002 ou se aquele geral decenal do art. 205 do mesmo diploma legal. A Min. Relatora fez ponderações sobre a natureza do VRG, que deve ser entendido como o adiantamento da quantia que seria devida ao final do contrato, na hipótese de o arrendatário pretender adquirir o bem. Isto é, além do arrendamento já pago durante a vigência do contrato, o arrendatário deveria pagar mais essa importância previamente ajustada se pretendesse ficar com a propriedade do bem arrendado, capitalizando-se de modo a tornar menos onerosa a opção de adquirir o bem no termo final do contrato. Caso o arrendatário não pretenda ficar com o bem, desfeito o arrendamento mercantil, e não importa a causa, nada justificaria a manutenção com a arrendadora do valor residual garantido e pago por antecipação, devendo ser devolvidos os valores recebidos pelo arrendador a título de VRG. Ressaltou, ainda, que, não se tratando de pedido fundado no princípio que veda o enriquecimento sem causa, mas de restituição de quantias em razão do desfazimento do arrendamento mercantil, cuja natureza contratual já basta para conferir caráter pessoal às obrigações dele decorrentes, o prazo prescricional para esta ação é o geral (de dez anos, previsto no art. 205 do CC/2002 ou vintenário, conforme regra prevista no art. 177 do CC/1916 para as ações pessoais). Considerando as datas dos fatos discutidos nos autos, a Min. Relatora entendeu correta a utilização pelo Tribunal de origem da regra de transição do art. 2.028 do CC/2002 para afastar a prescrição, já que não se havia encerrado o prazo estipulado no art. 205 do CC/2002. REsp 1.174.760-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 1º/12/2011.