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Contratos eletrônicos.

Contratos eletrônicos bancários

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01/02/2002 às 01:00
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Sumário: 1.Teoria – Hermenêutica e aplicação do direito, 2.Prática – Código Civil (formação do vínculo), 3.Notas sobre contratos bancários, 4.Notas sobre contratos em geral, 5.Criptografia, assinatura digital, etc.


1. TEORIA - HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO

Toda lei, por mais clara que seja, deve ser necessariamente interpretada. "A interpretação é a atividade mental que procura estabelecer o conteúdo e significado contido na lei. A ciência que disciplina e orienta a interpretação das leis é chamada de hermenêutica jurídica. O objeto da interpretação é a busca da vontade da lei, e não do legislador. Interpretar é determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito. Uma vez promulgada, a lei se desvincula do pensamento daqueles que a elaboraram. A lei é movida pelo mesmo dinamismo que transforma a realidade social, devendo ajustar-se às novas situações e concepções, sob pena de revelar-se obsoleta. Se a lei ficasse submissa à vontade do legislador a sua vida seria muito curta, diante dos constantes avanços sociais."[1]

Preferimos seguir os autores que entendem que há diferença entre hermenêutica e interpretação. Interpretação é a aplicação da hermenêutica. A hermenêutica descobre e fixa os princípios que regem a interpretação – Hermenêutica, como diz CARLOS MAXIMILIANO, é a teoria científica da arte de interpretar. A aplicação do direito consiste no enquadrar um caso concreto a uma norma jurídica adequada.

Não é possível que algumas séries de normas, embora bem-feitas, sintéticas, espelhem todas as faces da realidade. Por isso que os Romanos diziam: "neque leges, neque senatusconsulta ita scribi possunt, ut omnes casus qui quandoque inciderint comprehendantur" – traduzindo: "nem as leis nem os senatus-consultos podem ser escritos de tal maneira que em seu contexto fiquem compreendidos todos os casos em qualquer tempo ocorrentes". (Reuterskioeld) – citado por CARLOS MAXIMILIANO. É dizer: A lei não consegue prever todas as situações, por mais que ela possa aparentar tal pretensão.

Diz Carlos Maximiliano que "por mais hábeis que sejam os elaboradores de um Código, logo depois de promulgado surgem dificuldades e dúvidas sobre a aplicação de dispositivos bem redigidos. Uma centena de homens cultos e experimentados seria incapaz de abranger em sua visão lúcida a infinita variedade dos conflitos de interesses entre os homens. Não perdura o acordo estabelecido, entre o texto expresso e as realidades objetivas. Fixou-se o Direito Positivo; porém a vida continua, envolve, desdobra-se em atividades diversas, manifesta-se sob aspectos múltiplos: morais, sociais, econômicos. Nem por isso se deve censurar o legislador, nem reformar sempre a sua obra. A letra permanece: apenas o sentido se adapta às mudanças que a evolução opera na vida social."

Ante a impossibilidade de prever todos os casos particulares, o legislador deve pairar nas alturas, fixar princípios, estabelecer preceitos gerais, de largo alcance, embora precisos e claros. Como já sabemos desde os tempos de Faculdade, uma das características de maior importância das leis é justamente a sua generalidade.

"Hoje não mais se acredita na onipotência do legislador, não se interpreta o Direito como obra artificial do arbítrio de um homem, ou de um grupo reduzido, e, sim, elaboração espontânea da consciência jurídica nacional, fenômeno da psicologia coletiva, um dos produtos espirituais da comunidade. A lei reflete a consciência jurídica nacional."

Como dizia Wach, Thoel e inúmeros juristas – Pode a lei ser mais sábia do que o legislador, porquanto abrange hipóteses que este não previu. A lei pode perdurar e a vida continua; surgem novas idéias, aplicam-se os mesmos princípios a condições sociais diferentes.

"A ação do tempo é irresistível: não respeita a imobilidade aparente dos Códigos. Aplica-se a letra intata a figuras jurídicas diversas, resolve modernos conflitos de interesses que o legislador não poderia prever. Se de outra forma se agisse e se ativesse ao pensamento rígido, limitado, primordial, a uma vontade morta e, talvez, sem objeto hoje, porquanto visara a um caso concreto que não se repete mais na atualidade, então o Direito Positivo seria um obstáculo ao progresso, inútil, firme, duro, imóvel e atravancaria o caminho da civilização, ao invés de o cercar de garantias. Por isso é importante reconhecer que o intérprete melhora o texto sem lhe alterar a forma; a fim de adaptar aos fatos a regra antiga, ele a subordina às imprevistas necessidades presentes, embora chegue a postergar o pensamento do elaborador prestigioso; deduz corretamente e aplica inovadores conceitos que o legislador não quis, não poderia ter querido exprimir.

Os Romanos diziam mais: scire leges non hoc est, verba earum tenere, sed vim ac potestatem – saber as leis não é conhecer-lhes as palavras, porém a sua força e poder, isto é, o sentido e o alcance respectivos. Não há fórmula que abranja as inúmeras relações eternamente variáveis da vida; cabe ao hermeneuta precisamente adaptar o texto rígido aos fatos, que dia a dia surgem e se desenvolvem sob aspectos imprevistos.


2. PRÁTICA – CÓDIGO CIVIL (FORMAÇÃO DOS CONTRATOS)

2.1 PROPOSTA

Art. 1.080, Código Civil: A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.

Novo Cód. Civil – Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.

A proposta desde que séria e consciente, vincula o proponente (aquele que está fazendo a proposta – também chamado de policitante, ofertante). A proposta poderá ser provada por testemunhas, qualquer que seja o seu valor. A sua retirada sujeita o proponente ao pagamento de perdas e danos. A lei abre, entretanto, várias exceções a essa regra.[2]

(*) Diz o art. 1.081, CC:

Deixa de ser obrigatória a proposta: (isto é, NÃO É OBRIGATÓRIA A PROPOSTA):[3]

I - se, feita sem prazo a uma pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por meio de telefone.

Considera-se também presente a pessoa que contrata por meio de telefone; Aquele que conversa diretamente com o proponente/policitante é considerado "presente", mesmo através de outro meio mais moderno de comunicação a distância, ainda que os interlocutores estejam em cidades, estados ou países diferentes. Para nós, são exemplos de comunicação entre presentes, para esses efeitos, aquelas realizadas com a utilização da tecnologia existente nos softwares de comunicação instantânea, tais como o ICQ (AOL/Mirabilis), Microsoft Netmeeting e demais conferências eletrônicas online em geral. A comunicação realizada nesses ambientes é efetivamente instantânea e as partes estão naquele exato momento, assim como em uma ligação por telefone, conversando entre si. Não há intermediadores (no sentido clássico) e nem grandes lapsos temporais que possam descaracterizar a instantaneidade.[4] Por outro lado, não há como considerarmos o e-mail tradicional como comunicação entre presentes, justamente por existir quebra na instantaneidade, isto é, ao enviar um e-mail, não é possível garantir que o mesmo chegará ao destino naquele exato momento, além disso, seu iter é variado e passa por diversos intermediários (com maior possibilidade de retenção, redirecionamento e até mesmo extravio), tal como a já saudosa correspondência epistolar

II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente.

A proposta não é obrigatória ainda, se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta (do destinatário da proposta) ao conhecimento do proponente. Diz a doutrina que o prazo suficiente para a resposta (do destinatário) varia conforme as circunstâncias. Considera-se o necessário ou razoável para que chegue ao conhecimento do proponente e é chamado de "prazo moral" – em outras palavras, é o prazo durante o qual o proponente tem de esperar a resposta do destinatário sobre os termos da proposta que lhe foi dirigida (prazo de tolerância). Se as partes estiverem próximas, o prazo não deve ser longo, se distantes, haverá flexibilidade. Nas relações realizadas na Internet, para esse fim, entendemos que as partes estão próximas, apesar de eventualmente estarem localizadas à distâncias continentais.

III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro no prazo dado.

Da mesma forma, a proposta não é obrigatória ainda, se feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta (desta pessoa ausente – o destinatário) dentro do prazo dado. Fixado prazo para resposta, o proponente deve esperar o seu término, a partir de então, está desobrigado.

IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

Também não é obrigatória a proposta se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte (do destinatário) a RETRATAÇÃO do proponente. É possível ao policitante/proponente (o que fez a proposta) retratar-se, retirando a proposta formulada, desde que tal manifestação ocorra antes de seu recebimento pelo destinatário, ou simultaneamente a ele.

(*) Importante ressaltar, que a oferta no Código de Defesa do Consumidor – CDC – (Lei. 8078/90), apresenta distinções do disposto no Código Civil, vide os artigos 30 a 35 – da proposta nos contratos que tratam de relações de consumo. A oferta no CDC é mais ampla, já que na maioria das vezes é dirigida a pessoas indeterminadas. Efeitos também diferem: no Código Civil, a recusa indevida de dar cumprimento à proposta resolve-se em perdas e danos; No Código do Consumidor, dá ensejo à execução específica (arts. 35, inc. I e 84, § 1º), consistindo opção exclusiva do consumidor a resolução em perdas e danos. Além de poder preferir a execução específica (CDC, art. 35, I), o consumidor pode optar por, em seu lugar, "aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente" (II) ou, ainda, por "rescindir o contrato, com direito à restituição da quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e perdas e danos" (III). O art. 34, por sua vez, estabelece solidariedade entre o fornecedor e seus prepostos ou representantes autônomos".

2.2 ACEITAÇÃO

A aceitação é a concordância de uma parte com a proposta que lhe foi dirigida pela outra (a adesão integral[5] à proposta recebida). A aceitação está substancialmente ligada à formação do contrato, pois sem ela não se terá concluído o negócio jurídico contratual. Tal manifestação de vontade é imprescindível, portanto, para a conclusão do contrato e poderá ser expressa ou tácita.

Art. 1.083. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta.

2.2.1 ACEITAÇÃO TÁCITA

Art. 1.084. Se o negócio for daqueles, em que se não costuma a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa.[6]

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É possível verificar em torno da conjunção alternativa, duas hipóteses para a existência de aceitação tácita. O exemplo da primeira (casos em que não se costuma existir a aceitação expressa), nos é fornecido pelo Prof. Sílvio Rodrigues, citando precedente do E. TJSP (RT 232/227):

"Se o vendedor tinha por praxe não confirmar os pedidos que recebia, e se deu execução parcial à encomenda que lhe fora feita e não chegou a manifestar a sua recusa em fornecer aquela faltante, conforme preceitua o art. 1.084 do Código Civil, a conclusão que se impõe é a de que se estabeleceu o vínculo contratual entre as partes, aperfeiçoando-se, assim, o contrato de compra e venda".[7]

O exemplo da segunda hipótese (onde o proponente/ofertante dispensa a aceitação expressa) nos é fornecido pelo saudoso e eminente professor de direito civil, Washington de Barros Monteiro:

"certo viajante telegrafa a um hotel reservando acomodações, dizendo que chegará em tal dia, se não receber aviso em contrário: se o hoteleiro não expedir a tempo a negativa, o contrato estará concluído"[8].

(*) Salvo essas hipóteses, o proponente (o que fez a proposta) não poderá impor a falta de resposta como aceitação de sua proposta.

2.2.2 ACEITAÇÃO EXPRESSA

Em duas hipóteses a aceitação expressa deixará de gerar o aperfeiçoamento do contrato, desobrigando o proponente da sua força vinculante, a saber:

Art. 1.082. Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos.[9]

É dizer: se a aceitação for apropriada, porém chegar a seu destino fora do prazo, por circunstâncias imprevistas, o proponente (que recebeu a aceitação tardiamente) deverá, então, comunicar ao que aceitou a proposta, que não pretende mais levar adiante o negócio, sob pena de responder por perdas e danos.

Em outras palavras: se a aceitação, embora expedida a tempo, por motivos imprevistos chegar tarde ao conhecimento do proponente, este se encontrará desobrigado pelo atraso involuntário, de modo que o contrato não se aperfeiçoa, a menos que haja nova declaração de vontade – (a aceitação deixará de gerar o aperfeiçoamento do contrato, desobrigando o proponente da sua força vinculante).

Neste caso, portanto, impõe a lei ao proponente, o dever de comunicar imediatamente o ocorrido ao aceitante (emitente da aceitação que chegou atrasada), sob pena de responder por perdas e danos.

"Tal notificação se justifica na necessidade de advertir o aceitante de que o contrato não se ultimou, pois, sem receber esse aviso, ele poderá continuar a crer na eficácia da avença e poderá, por conseguinte, fazer despesas, assumir compromissos e realizar trabalhos necessários ao cumprimento de um ajuste que não chegou a existir. A inércia do proponente/policitante em comunicar o atraso no recebimento da aceitação revela sua culpa, de onde decorre a obrigação de reparar as perdas e danos".

(*) Como dissemos no início, em duas hipóteses a aceitação expressa deixará de gerar o aperfeiçoamento do contrato, desobrigando o proponente da sua força vinculante. A primeira acabamos de ver (art. 1.082, CC) Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos. A segunda hipótese é a ocorrência da retratação.

2.3 RETRATAÇÃO

Art. 1.085. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.[10]

O dispositivo em questão, trata da retratação. É possível, portanto, ao aceitante arrepender-se, desde que sua retratação chegue ao conhecimento do proponente antes da aceitação ou simultaneamente com ela. É a recusa oportuna do negócio aceito inicialmente, pois chegando tardiamente a seu destino, o aceitante (arrependido) continuará vinculado ao contrato. No caso,

"a declaração da vontade, que continha a acceitação, desfez-se, antes que o proponente pudesse tomar qualquer deliberação no sentido da conclusão do contracto". (Clóvis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 2a edição, volume IV, Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1924. – ipsis litteris. Também citado por Sílvio Rodrigues.

Como foi possível verificar, os contratos se aperfeiçoam no momento da aceitação. Entre presentes, consideram-se concluídos no mesmo instante em que o aceitante manifesta sua concordância com a proposta. As partes se encontrarão vinculadas no mesmo instante em que o oblato[11] aceitar a proposta, assim que ocorrer o acordo recíproco. Só, então, o contrato começará a produzir efeitos jurídicos, já que apenas terá existência de direito no momento que houver união coincidente das vontades dos contraentes. Na telemática, em especial nas relações envolvendo a retratação por e-mail convencional, será possível verificar tais elementos probatórios no iter percorrido pela mensagem, na medida em que os dados de emissão, recepção, data e horário, são armazenados em todo o trajeto, entretanto não há como negar futuras situações probatórias dramáticas, onde tais informações sejam deliberadamente alteradas.

No contrato realizado entre ausentes – inter absentes, no entanto, existe divergência doutrinária. Tratamos aqui do contrato realizado entre ausentes, por correspondência epistolar (missivas), etc. São exemplos: a carta, o telegrama, fax, radiograma e para nós, o e-mail convencional. A resposta nesses casos leva algum tempo para chegar ao conhecimento do proponente e passa por diversas fases.

A divergência reside nos critérios apresentados pela doutrina para fixar o momento inicial da obrigatoriedade do ato negocial.

Para a teoria da informação (sistema da cognição), o contrato só se aperfeiçoa no momento em que o proponente toma conhecimento da aceitação.

A teoria da declaração (sistema da agnição) por outro lado, determina que o contrato se aperfeiçoa pela declaração do aceitante. Todavia, surgem nessa teoria, três subdivisões:

  • Subteoria da Declaração (declaração propriamente dita), considerando que o contrato se aperfeiçoa desde o instante em que o aceitante escreve a carta, isto é, o momento da conclusão coincide com o da redação da correspondência epistolar. Apesar do consentimento haver sido externado, ele permanece restrito ao âmbito do aceitante (que pode destruí-la em vez de remetê-la), pois a carta, a despeito de encontrar-se escrita, não terá qualquer eficácia antes de expedida.

  • Subteoria da Expedição: entende que o momento do aperfeiçoamento do contrato é aquele em que a correspondência é expedida, pois neste instante ela sai do alcance do oblato (aceitante), que perde o comando sobre sua vontade, não mais podendo se arrepender.

  • Subteoria da Recepção: anuncia que além de escrita e expedida, a resposta tenha sido entregue ao destinatário. Tal subteoria do sistema da agnição (teoria da declaração), distingue-se da teoria da informação, pois nesta, exige-se além da entrega da correspondência, que o proponente a tenha aberto e tomado conhecimento de seu teor.

O Código Civil brasileiro acolheu o sistema da agnição (teoria da declaração) na subteoria da EXPEDIÇÃO, com mitigação. É o que se deduz da leitura do art. 1.086, CC e seus incisos, ao afirmar que "os contratos por correspondência epistolar, ou telegráfica, tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida". (No mesmo sentido o projeto do Novo Cód. Civil - Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida).

Art. 1.086. Os contratos por correspondência epistolar, ou telegráfica, tornam-se perfeitos desde que a ACEITAÇÃO É EXPEDIDA, exceto:[12]

I - no caso do artigo antecedente; (caso de retratação)

II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;

III - se ela não chegar no prazo convencionado.

Dizem ainda os incisos do referido artigo que a regra admite três importantes EXCEÇÕES: I. No caso de haver retratação do aceitante; II. Se o proponente se houver comprometido a esperar resposta; III. Se ela não chegar no prazo convencionado.

Será possível afirmar, deste modo, que o vínculo contratual (nos contratos entre ausentes) se torna obrigatório no momento DA EXPEDIÇÃO da aceitação, salvo as referidas exceções, quando então, se aplicará a subteoria da recepção. Pensando assim, é possível encontrar diversos julgados.

Traz a colação entretanto, Carlos Roberto Gonçalves (na obra referenciada e recomendada para uma breve revisão do Direito Civil atual): "ora, se sempre é permitida a retratação antes de a resposta chegar às mãos do proponente, e se, ainda, não se reputa concluído o contrato na hipótese de a resposta não chegar no prazo convencionado, na realidade o referido diploma filiou-se à teoria da recepção, e não à da expedição".

Em relação a esses interessantes argumentos, realmente é possível verificar que ocorrendo a retratação, antes ou ao mesmo tempo da chegada da resposta inicial, aquela (retratação) estará chegando ao destinatário – ou seja – estará sendo entregue – e com isso o contrato não será considerado perfeito desde a expedição da aceitação, contaminando assim a teoria da expedição existente no caput do artigo, pois o aceitante não perdeu o comando sobre sua vontade, já que é possível o arrependimento anterior ou simultâneo à chegada da resposta já expedida.

Ademais, o fato de a retratação chegar depois e não ser considerada válida, conforme se verifica no art. 1.085, CC, tem por fundamento justamente a chegada da aceitação inicial (recepção). Todos esses argumentos, sic et simpliciter, enfraquecem o caput (subteoria da expedição) e apontam uma quantidade maior de elementos caracterizadores da subteoria da recepção.

Pensando de forma contrária, o eminente Washington de Barros Monteiro, considera a teoria da expedição como a mais correta, e a que melhor se afeiçoa às necessidades da vida e à natureza das coisas. Diz que, com o nosso sistema legal, não basta escrever a resposta favorável, é preciso remetê-la (art. 1.086, CC). Os contratos por correspondência epistolar, ou telegráfica, tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida.

Lembra ainda que "em relação à possível contradição da teoria da expedição e o art. 1.085, não existe a acenada contradição, pois com a expedição da resposta, aperfeiçoa-se o contrato; a lei ressalva, porém, ao aceitante o direito de arrepender-se, desde que tenha este, possibilidade de fazer chegar ao proponente sua retratação antes da aceitação. Se ele não dispõe de meio algum nesse sentido, ou se o meio empregado falha, o contrato está concluído.

Outras duas exceções à teoria da expedição são as mencionadas nos números II e III; a primeira é mera criação da vontade das partes, que podem convencionar que aguarde o proponente a resposta do aceitante; o momento consumativo do contrato será então o da recepção e não o da expedição. A terceira exceção é justificável: se há prazo estipulado para a resposta, o contrato estará perfeito no momento da expedição; se o prazo é para a chegada da resposta, reger-se-á a hipótese pelo inciso II.

O Código Comercial adotou igualmente a teoria da expedição. Dispõe o art. 127, que "os contratos tratados por correspondência epistolar reputam-se concluídos e obrigatórios desde que, o que recebe a proposição expede a carta de resposta, aceitando o contrato proposto sem condição nem reserva; até neste ponto é livre retratar a resposta; salvo se o que a fez se houver comprometido a esperar resposta, e a não dispor do objeto do contrato senão depois de rejeitada a sua proposição, ou até que decorra o prazo determinado". Aliás, importante ressaltar que com a aprovação do novo código civil, não teremos mais o antigo direito comercial. Estaremos diante do Direito Empresarial e da unificação da legislação comercial e civilista. Direito de Empresa – Livro II – Novo Cód. Civil – (arts. 966-1.195).

Para o professor Caio Mário da Silva Pereira, de todas, a melhor é a teoria da expedição, embora não seja perfeita. Evita, segundo ele, o "arbítrio dos contratantes e reduz ao mínimo a álea de ficar uma declaração de vontade, prenhe de efeitos, na incerteza de quando se produziu". De outro lado, afasta dúvidas de natureza probatória, pois que a expedição da resposta se reveste de ato material que a desprende do agente. Lembra ainda, que "nosso Código Comercial adotou-a francamente, e que o Código Civil aceitou-a, mas mitigada. Não a manteve em sua integridade, apesar da opinião em contrário de Clóvis Bevilaqua".

"Na verdade, recusando efeito à expedição, se tiver havido retratação oportuna, ou se a resposta não chegar ao conhecimento do proponente no prazo, desfigura a teoria da expedição, admitindo um pouco a da recepção e um pouco a da informação, o que é um mal, já que a imprecisão doutrinária na fixação do conceito perturba a boa aplicação dos princípios. Arnoldo Medeiros da Fonseca, com a sua vibrante argumentação, a par da tese de que é mais científica a teoria da informação (de quem pesarosamente divergimos), sustenta que o nosso Código Civil não adotou a teoria da expedição, antes aproximou-se da eclética de Windscheid. Estamos em que o Código Civil nem chegou a adotar como regra a da informação, e nem se inclinou para a de Windscheid. Não nos parece que uma regra com a conseqüência de induzir a integração das vontades possa variar em decorrência dos efeitos ulteriores do contrato, a saber se gerará este obrigações para uma só ou para ambas as partes[13].

Art. 1.087. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.[14]

No tocante ao lugar da celebração dos contratos, dispõe o art. 1.087, CC – "Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto." É dizer: considera-se celebrado o contrato no local onde a PROPOSTA foi realizada. Importante citar novamente os escritos de Gonçalves, que prescreve incisivo: "aparentemente, tal solução encontra-se em contradição com a expressa adoção da teoria da expedição, no dispositivo anterior. Entretanto, para quem, como nós, entende que o Código Civil acolheu, de fato, a da recepção, inexiste a apontada contradição".

Concordamos com o eminente desembargador, pois se adepto à subteoria da expedição (que considera aperfeiçoado, isto é, celebrado o contrato desde o momento em que a ACEITAÇÃO é expedida), o referido artigo deveria considerar celebrado o contrato no lugar em que foi aceito e não no local em que foi proposto.

Como o ref. artigo diz que considera-se celebrado o contrato no LUGAR onde a proposta foi realizada/no lugar em que foi proposto, se conclui pela necessidade da chegada de uma resposta (da aceitação) para o seu aperfeiçoamento. O contrato não poderá ser considerado celebrado no lugar onde a proposta foi realizada sem a chegada de uma aceitação. Relembrando: A aceitação está substancialmente ligada à formação do contrato, pois sem ela não se terá concluído o negócio jurídico contratual. Tal manifestação de vontade é imprescindível, portanto, para a conclusão do contrato e poderá ser expressa ou tácita. Observe-se por fim, que tal expediente (art. 1087 / reproduzido no art. 435 "novo cód.civil") também apresenta maior quantidade de elementos de acordo com a sub-teoria da recepção.[15]

"A determinação do lugar onde se tem por concluído o contrato é de enorme importância no direito internacional privado, pois dele dependerá não só a apuração do foro competente, mas também a determinação da lei a ser aplicada à relação contratual. Deveras, a Lei de Introdução ao Código Civil (art. 9º, § 2º) prescreve que a "obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente". Logo, se o ofertante residir no Brasil e o oblato na Dinamarca, o negócio reger-se-á pela lei brasileira. Se o proponente residir em Portugal e o solicitado no Brasil, sendo o contrato proposto naquele país, por meio de carta, ficará ele sob a égide da lei portuguesa, que disciplinará seus efeitos. Como se pode ver, a lei da residência do proponente regerá os contratos entre ausentes, sendo os contratantes residentes em países diversos"[16].

Há uma aparente contradição entre o art. 9º, § 2º, da Lei de Introdução e o art. 1.087 do Código Civil. Enquanto o art. 1.087, que é de direito interno, atendo-se ao problema de as partes terem residência no Brasil, reputa celebrado o contrato no lugar em que foi proposto, o art. 9º, § 2º, alude ao local em que residir o proponente, sendo aplicável quando os contratantes estiverem em países diferentes. Ora, o verbo "residir" significa "estabelecer morada" ou "achar-se em", "estar", e é nesta última acepção que está sendo empregado no art. 9º, § 2º, logo o lugar em que residir o proponente significa onde estiver o proponente. Os arts. 1.087 e 9º, § 2º, visam o local onde foi feita a proposta; logo um está a confirmar o outro[17].

O art. 9º, § 2º, alude à obrigação convencional contratada entre ausentes, que se regerá pela lei do país onde residir o proponente, pouco importando o momento e o local da celebração contratual. A lei a aplicar será a do lugar da residência do proponente, ou melhor, a do local onde foi feita a proposta, não adotando, portanto, a norma de direito internacional privado a lex domicilii do proponente. Afastou ela o critério domiciliar por entender que o elemento de conexão "residência" seria mais adequado à mobilidade negocial, uma vez que os negócios efetivam-se, não raro, fora do domicílio dos contratantes. A residência indicaria tão somente a lei do lugar da proposta. Os contratos inter praesentes dependerão, por sua vez, na seara internacional, da lei do lugar onde forem contraídos, não se considerando a nacionalidade, o domicílio ou a residência dos contratantes. Nos contratos por correspondência, em regra, as partes indicam o local da celebração do contrato, declarando qual das partes é o proponente, pois reputar-se-ão constituídos no lugar onde este residir e a lei desse local será a competente para qualificar e reger as obrigações contratuais avençadas. Há, portanto, uma presunção juris et de jure de se considerar os negócios inter absentes constituídos no lugar em que o proponente tiver sua residência, ainda que acidental, pouco importando a lex loci actum e a lei domiciliar ou nacional do proponente ou do aceitante[18].

No tema da TRANSMISSÃO ERRÔNEA DA VONTADE, de relevada importância para contratos eletrônicos, encontramos o art. 89, do Código Civil – "A transmissão errônea da vontade por instrumento, ou por interposta pessoa, pode argüir-se de nulidade, nos mesmos casos em que a declaração direta". O referido artigo encontra-se no âmbito dos defeitos dos negócios jurídicos – do erro ou ignorância. É a "transmissão defeituosa de vontade". Se o declarante não se encontra na presença do declaratário e se vale de um intermediário (interposta pessoa ou núncio) ou de um meio de comunicação (fax, telégrafo, e-mail, etc.) – e a transmissão da vontade, nesses casos, não se faz com fidelidade, estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido erroneamente (mensagem truncada), caracteriza-se o vício que propicia a anulação do negócio[19].

Em razão do que apresentamos, foi possível compreender perfeitamente que scire leges non hoc est, verba earum tenere, sed vim ac potestatem (saber as leis não é conhecer-lhes as palavras, porém a sua força e poder, isto é, o sentido e o alcance respectivos).

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Sobre o autor
Paulo Sá Elias

advogado em São Paulo (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ELIAS, Paulo Sá. Contratos eletrônicos.: Contratos eletrônicos bancários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. -516, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2674. Acesso em: 26 abr. 2024.

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