Artigo Destaque dos editores

Ações afirmativas à luz da Constituição Federal de 1988

Exibindo página 2 de 2

Resumo:


  • O trabalho analisa as ações afirmativas com base na Constituição Federal de 1988, evidenciando o princípio da igualdade material e as previsões constitucionais que endossam uma atuação afirmativa do Estado para mitigar desigualdades.

  • As ações afirmativas são estudadas historicamente, desde sua origem global até a experiência dos Estados Unidos, e são definidas como políticas públicas e privadas que visam combater discriminações e corrigir desigualdades históricas.

  • A Constituição de 1988 é interpretada como um documento que autoriza e promove ações afirmativas em diversas áreas, sendo estas medidas temporárias e ajustáveis, destinadas a promover a efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como educação e emprego.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se pôde observar, o texto constitucional de 1988 consagrou o estado democrático social de direito, pregando uma atuação mais ativa do Estado no sentido de romper com situações desiguais existentes na sociedade.

Nesse diapasão, o ordenamento pátrio alberga o princípio da igualdade sob seus ângulos formal e material, existindo no texto constitucional artigo declarando serem todos iguais perante a lei, assim como outros determinando, em certas circunstâncias, o tratamento desigual e favorecido amparado pelo Estado.   

Considerando o conceito e objetivos das ações afirmativas, estas mostram-se totalmente coerentes com o texto da Constituição Federal de 1988, consistindo em claro instrumento para ver concretizada a igualdade material. Aliás, não são poucos os casos em que a Lei Maior, de forma explícita determina um tratamento favorecido, a exemplo do que determina para os portadores de deficiência física, para as micro e pequenas e empresas, para as mulheres e para a pequena propriedade rural, apenas para citar alguns exemplos.

Dessa forma, inexiste qualquer óbice para que determinada parcela da população possa ser tratada de forma mais benéfica em relação às demais, isto desde que exista elemento relevante a fundamentar essa situação, o fator de diferenciação utilizado não atente ao que se encontra previsto na lei e venha promover a plena igualdade de oportunidades e direitos entre os indivíduos. O Princípio da Igualdade, portanto, não é maculado com a promoção de ações positivas por parte do Estado, já que a nova perspectiva sob a qual esse princípio surge, pressupõe uma igualdade material e não meramente formal.

Nesse contexto, para que se promova a igualdade prevista na Constituição é necessário o tratamento distinto entre os diversos grupos sociais, de acordo com as peculiaridades de cada um. O tratamento idêntico para todos, sem a consideração das diferenças entre os mesmos, ao invés de prestigiar a igualdade, acaba se tornando um instrumento para perpetuação de situações históricas de desequilíbrio, constituindo na prática um engessamento social, o que está em total desacordo com o ordenamento.


7. REFERÊNCIAS

ARAÚJO, José Carlos Evangelista de. Ações afirmativas e Estado democrático social de direito. São Paulo: Ltr, 2009.

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.

_______. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Vade mecum acadêmico de direito. 10. ed. São Paulo: Rideel, 2010.

_______. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o estatuto nacional da microempresa e da empresa de pequeno porte. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LCP/lcp123.htm>. Acesso em: 05 maio 2010.

_______. Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Vade mecum acadêmico de direito. 10. ed. São Paulo: Rideel, 2010.

_______. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/L8213cons.htm>. Acesso em: 05 nov. 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Medida cautelar em arguição de descumprimento de preceito fundamental nº 186-2. Arguente: Partido político Democratas – DEM. Arguidos: Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade de Brasília – CEPE, Reitor da Universidade de Brasília e Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília – CESPE/UNB. Ministro Gilmar Mendes. 31 jul. 2009. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2691269>. Acesso em: 06 nov. 2011.

CAPELLIN, Paola. Ações afirmativas: Uma estratégia para corrigir as desigualdades entre homens e mulheres. In: Discriminação positiva – ações afirmativas – em busca da igualdade. 2. ed. São Paulo: CFEMEA/ELAS, 1996.

DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução de Luís Carlos Borges. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de informação legislativa, Brasília, v. 38, n. 151, p. 129-152, jul./set. 2001.

_______. Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade (O Direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA) Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

GRINOVER. Ada Pelegrini. O controle de Políticas Públicas pelo Poder Judiciário. Revista de Processo, Rio de Janeiro, v. 33, n. 164, p.9-28, out. 2008.

LEAL, Ângela Barros. Ações Afirmativas no Brasil - Breve análise sobre suas origens e constitucionalidade. Fortaleza: [s.n.], 2005.

LEAL, Luciana de Oliveira. O sistema de cotas raciais como ação afirmativa no direito brasileiro. Revista da escola de magistratura do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 31, p. 104-123, 2005.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

MARQUES, Eugênia Portela de Siqueira; MAIA, Suzanir Fernanda. Ações afirmativas e a política de cotas: uma análise do programa universidade para todos – PROUNI – a inserção de negros na universidade. Série estudos: Periódico do mestrado de educação da UCDB, p. 47-59, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Altas, 2002.

ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Ação Afirmativa – O conteúdo democrático do princípio da igualdade jurídica. Revista de informação legislativa, Brasília, v. 33, n. 131, p. 283 – 295, jul-set. 1996.

SANTOS, Antonio Carlos Costa. Cotas para negros na universidade (Uma análise da constitucionalidade em confronto com o princípio da igualdade recepcionado pela Constituição Federal de 1988). Revista de informação legislativa, Brasília, v. 48, n. 173, p. 11-25, jan./mar. 2007.


Notas

[1] “A adoção de políticas, programas e ações governamentais de ação afirmativa e seus mecanismos em benefício da população negra geraram uma polêmica no debate público que há tempos não se via. Essa polêmica tem sido constante na mídia, nos espaços acadêmicos, nos Legislativos e nos meios jurídicos. A discussão chegou ao seu ápice, quando essas políticas públicas para negros foram implantadas na educação superior.” (MARQUES; MAIA, 2006, p. 51)

[2] Estado Social é enfim Estado produtor de igualdade fática. Trata-se de um conceito que deve iluminar sempre toda a hermenêutica constitucional, em se tratando de estabelecer equivalência de direitos. Obriga o Estado, se for o caso, a prestações positivas; por meios, se necessário para concretizar comandos normativos de isonomia. (BONAVIDES, p. 343)

[3] Trata-se de argüição de descumprimento de preceito fundamental, proposta pelo partido político DEMOCRATAS (DEM), contra atos administrativos da Universidade de Brasília que instituíram o programa de cotas raciais para ingresso naquela universidade. (ADPF 186, p. 01)

[4] O caso Bakke é considerado um dos mais famosos julgados da Suprema Corte Americana. Nesse processo, Allan Bakke, candidato branco ao curso de medicina da Universidade da Califórnia em Davis, se insurgiu contra o programa de ação afirmativa desenvolvido à época por essa universidade. Allan Bakke alegou que, embora melhor preparado, foi rejeitado por essa instituição em virtude da reserva de vagas para negros, o que estaria impedindo o exercício dos seus direitos constitucionais. A Corte americana considerou ilegal o sistema de cotas, deferindo ao autor a sua inscrição, fazendo apenas uma ressalva de que a raça pode ser usada como critério na seleção de estudantes para o ensino superior.

[5] Constituição Federal de 1988. “Art. 5º, XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora, para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento; [...] Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; [...] Art. 37 – [...] VIII – a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão; [...] Art. 146, III, d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados [...]; Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País; [...] Art. 227, §1º, II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.”

[6] Art. 5º, §2º da Lei 8.112/90: “Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscreverem em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso”.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
José Carlos Machado de Brito Filho

Especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera Uniderp (2012). Graduado em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR (2010.1). Advogado - OAB/CE 23.653. Procurador do Município de Maracanaú-CE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRITO FILHO, José Carlos Machado. Ações afirmativas à luz da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3915, 21 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27001. Acesso em: 22 dez. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos