Conclusão
Nota-se, assim, que os direitos fundamentais, quando divididos em gerações ou status, tendem a se distinguir em
(A) direitos que o Estado não deve violar (direitos de resistência, de primeira geração ou de status negativo),
(B) direitos que o Estado tem a obrigação de prover e o cidadão o direito de exigir (direitos de prestação, de segunda geração ou de status positivo) e
(C) os que aqui se colocam em apartado, como os direitos ditos de terceira geração, os políticos (status ativo), os direitos coletivos (Dimoulis e Martins, 2008:71-74) etc.
Constata-se, portanto, que há distinções essenciais entre os direitos fundamentais hodiernamente reconhecidos. Sob determinado aspecto, pode-se dizer que eles derivam de distintas formas da relação Estado-Indivíduo. Ademais, restou claro que cada categoria de direitos fundamentais tem por escopo assegurar diferentes aspectos da dignidade humana, ora a liberdade, ora a igualdade etc.
Unindo as breves lições ora trazidas ao conteúdo de possível contenda judicial acerca da efetivação dos direitos fundamentais, pode-se chegar a algumas conclusões, como abaixo exposto.
Primeiro, em se tratando de direitos de primeira geração, também chamados de liberdade ou de status negativo, a obrigação devida pelo Estado é um não-fazer, isto é, um dever de abstenção. Por isso, como regra, o pedido formulado em juízo e a eventual sentença de procedência devem ter um conteúdo mandamental negativo, determinando ao Estado que sobreste determinada ação, que se abstenha de algo.
Segundo, do mesmo modo como foi dito acima, uma demanda judicial que tenha por objeto a realização de um direito de segunda geração, prestacional ou de status positivo deve conter no pedido e em eventual sentença de procedência um comando igualmente mandamental, só que desta vez contendo uma obrigação de fazer. Neste caso, o ato ilícito é a inércia, a desídia, um não-fazer então tido como ilícito.
Os direitos ditos de terceira geração, vinculados à solidariedade, podem implicar obrigações de fazer ou de não-fazer, cabendo apurar em cada caso qual seria a conduta exigível do Estado ou do particular, motivo por que sua judicialização exige maiores desafios.
Em termos processuais, como as ações que discutem obrigações de fazer ou não-fazer permitem uma mitigação do princípio da congruência ou da correlação, o juiz dispõe de certa liberdade em relação ao que foi pedido, não se adstringindo às providências pleiteadas. Conta o julgador, portanto, com certa discricionariedade para determinar a ação ou abstenção que melhor resguarde o direito fundamental litigioso, sendo-lhe lícito inclusive emitir comando oposto ao pedido (uma ação quando pedida uma abstenção), desde que tal comando seja, fundamentadamente, o que melhor resguarde o direito, segundo critério de proporcionalidade. Exige-se, ainda, que o comando judicial não acabe por prejudicar os interesses do autor, isto é, não seja contrário aos seus interesses.
Por fim, uma boa decisão não deve desprezar as lições que permitem a classificação dos direitos fundamentais em gerações. Desta feita, todo e qualquer pedido ou provimento judicial acerca da questão deve sempre balizar-se pela realização dos valores que hitoricamente se buscou preservar com o estudo desses direitos, a saber, a liberdade, a igualdade e a solidariedade.
Esquivando-se ou não do pedido, mitigado ou não o princípio da congruência, a melhor decisão será aquela que contiver o comando judicial com maior capacidade de resguardar o direito fundamental pleiteado.
REFERÊNCIAS
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Notas
1 O termo evidenciação é utilizado por Pedro Lenza (2005:36) em lugar de nascimento ou surgimento, quando o autor trata dos direitos transindividuais. Aqui, utilizou-se de empréstimo o preciso vocábulo.
2 O exemplo é emprestado de Dimoulis e Martins (2008: 69).
3 Já aqui, o exemplo é nosso, com reforço no entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal (ADI 939, Relator Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/1993, DJ 18-03-1994 PP-05165 EMENT VOL-01737-02 PP-00160 RTJ VOL-00151-03 PP-00755), no sentido de que o princípio da anterioridade constitui garantia fundamental do cidadão-contribuinte em face do Estado.
4 Para distinção sobre as diferentes formas de atuação do Estado na atividade econômica, em sentido amplo ou estrito, cf. Grau, 2010: 101-108.