CONCEITO
Com o nascimento do crime, surge para o Estado, o direito de punir o agressor da norma. Prescrição “é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória durante certo tempo”. (JESUS, 1995, p.20). Antigamente, não ocorria a prescrição em delitos considerados graves. Quando se trata desses crimes atrozes, cuja memória subsiste por muito tempo entre homens, se os mesmos forem provados, não deve haver nenhuma prescrição em favor do criminoso que se subtrai do castigo pela fuga. (NORONHA, 1977, v.1, p.411).
NATUREZA JURÍDICA
O entendimento predominante é que está no campo penal, por se tratar de norma extintiva de punibilidade, sendo mera consequência à extinção processual. Segundo Estefam, “a prescrição é instituto de direito material, de modo que as regras a ela inerentes regem-se pelo princípio constitucional”. (2012, p. 688). Ensina Jesus (1995, p.20-21), que “parte da doutrina entende que a prescrição é instituto de direito processual penal”, pois, “constitui obstáculo ao início ou prosseguimento da persecução criminal”, mas em posição contrária, “alguns doutrinadores com razão, a consideram de caráter penal, de direito material, extinguindo o poder-dever de punir do Estado”, existindo ainda uma posição intermediária, onde “há o entendimento de que possui caráter misto, constituindo instituto ao mesmo tempo de direito penal e de direito processual penal”. Diferencia-se da prescrição civil, pois nesta perde-se o direito de ação, enquanto que na penal o Estado perde o direito de punir o agente ou de executar a pena lhe imposta. “A prescrição civil nenhuma influência tem no processo criminal”. (BRASIL. STF – RHC - Rel. Rodrigues Alckmin – DJU 24.9.76, p. 8291).
ANÁLISE PRELIMINAR
A análise da prescrição punitiva deve ser preliminar, ou seja, antes da apreciação do mérito, por ser matéria de ordem pública, devendo ser decretada de ofício ou após pedido da parte. Como se explica que haverá análise preliminar da prescrição a alguém que quer ser absolvido? Existem acusados que almejam a absolvição. Nesse caso, a melhor opção é deixar para requerer a prescrição ao final somente após a decisão meritória, pois já está prescrito. Ocorrendo a perda do poder de punir do Estado, pela incidência da prescrição, o seu reconhecimento torna-se poder-dever da autoridade judiciária, por ser matéria de ordem pública, que suplanta até a expectativa de absolvição do réu. (BRASIL. TJPB – AC 92.002422-2-P – Rel. Júlio Aurélio Moreira Coutinho – RT 719/497).
FORMAS DE ANÁLISE QUANDO NÃO HÁ CONDENAÇÃO
Greco (2011) define a norma incriminadora como infração penal que proíbe ou impõe conduta possuindo preceito primário e secundário. O preceito primário descreve com clareza a infração penal e o secundário representa a cominação abstrata e individualizada da respectiva sanção, em mínimo e máximo (pena in abstrato). Inexistindo condenação, analisa-se a prescrição pela pena máxima constante no preceito secundário. A pena que está cominada entre um e quatro anos, averigua-se o período com base no máximo, ou seja, quatro anos. Esse número será confrontado na tabela do artigo 109 do Código Penal indiferente de se tratar de pena de reclusão, detenção ou prisão simples. O inciso IV do artigo 109 do Código Penal traz a redação de que o crime estará prescrito “em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro”. Existindo pena aplicada com recurso da acusação com possibilidade de alteração da pena para período maior, continua a ser analisada para os fins da prescrição a pena máxima cominada. A prescrição da pretensão punitiva pela pena máxima se chama abstrata ou propriamente dita.
CONDENAÇÃO SEM RISCO DE AGRAVAR A PENA
Existindo condenação sem risco de agravamento da pena, analisará a pena aplicada. Chama-se pena in concreto e pode ser analisada, dependendo da situação processual, a) a prescrição da pretensão punitiva retroativa; b) punitiva virtual; c) punitiva intercorrente e d) executória.
RESTANTE DA PENA A CUMPRIR.
Terceira hipótese se justifica quando há evasão (fuga) do agente com a pena transitada em julgado. Não se analisa nesse caso a pena fixada, mas sim a pena restante a cumprir após a fuga. Alguém que cumpre pena total de seis anos, evadindo-se após o cumprimento de dois anos, será averiguada a prescrição com base no restante, ou seja, quatro anos.
DA EXISTÊNCIA DA PRESCRIÇÃO
As teorias abaixo explicam a razão de ser da prescrição.
FATOR ESQUECIMENTO
Valoram a existência do instituto pelo esquecimento da sociedade em relação ao delito, não existindo razões para apenar o agente se a própria sociedade se esqueceu da infração. Porto (1998, p, 14) assinala que “com o decorrer do tempo, o crime é esquecido pela sociedade, desaparecendo assim o alarme social. [...] não haverá mais interesse em punir”. Para Nucci (2012, p. 624) “a lembrança do crime apaga-se na mente da sociedade”. Citando Magalhães Noronha, Crivelaro assinalou que “o tempo, que tudo se apaga, não pode deixar de influir no terreno repressivo” de modo que “o decurso de dias e anos, sem punição do culpado, gera a convicção de sua desnecessidade, pela conduta reta que ele manteve durante esse tempo”. (2010, p.2). Para Crivelaro “o esquecimento do crime pela sociedade” é um dos fatores, “eis que, por mais grave que seja, o passar do tempo faz amenizar e, aos poucos, desaparecer sua lembrança do seio social”. (2010, p. 21).
TEORIA DA EXPIAÇÃO MORAL
Fundamenta que o agente já sofreu muito com a possibilidade de ser punido tornando desnecessária a punição ou execução da punição. Porto ensina que o culpado “expiou suficientemente a culpa com as angústias que sofreu e com os remorsos que o assaltaram”. (1998, p. 17).
TEORIA DA EMENDA DO DELINQUENTE
O tempo por si só traz a mudança do comportamento daquele que delinquiu e de certa forma há a melhora ou emenda do delinquente. “Presume-se iuris et de jure que o criminoso se corrigiu”. (PORTO, 1998, p. 18). Com frequência, profissionais advogados se deparam com situações em que o agente está há anos foragido, porém se comportando adequadamente nesse período, constituindo família, possuindo ocupação lícita, exercendo a religiosidade, eis que mudou vida, sem qualquer resquício malévolo do passado em seus comportamentos atuais.
DISPERSÃO DAS PROVAS
Forte argumento, trazendo a ideia de perda de provas pelo lapso temporal, aumentando a chance de ocorrência de erros cometidos nos julgamentos. Porto assevera que “com o passar do tempo, os meios de prova vão se tornando mais difíceis, quiçá impossíveis”. (1998, p. 16).
TEORIA PSICOLÓGICA
Pelo lapso temporal decorrido há a melhora por parte do agente no modo de ser e de pensar. Porto ensina que “com o tempo, muda a constituição psíquica do culpado”, e ele “será, portanto, ‘outro indivíduo’ que irá sofrer a pena”. (1998, p. 19).
INEFICIÊNCIA DA PENA APÓS LONGO PERÍODO
Para Estefam, “a ineficiência da aplicação da pena como resposta ao fato criminoso e como forma de punição após o decurso de longo período”, não se mostra útil. (2012, p. 689). A pena somente é eficaz se “os agentes do Estado responsáveis pela persecução penal atuarem de forma eficaz e dentro dos prazos estabelecidos na legislação”. (2012, p. 689).
REFERÊNCIAS
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STF – RHC - Rel. Rodrigues Alckmin – DJU 24.9.76, p. 8291
_____. TJPB – AC 92.002422-2-P – Rel Júlio Aurélio Moreira Coutinho – RT 719/497
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