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Instrumentos processuais de garantia no direito dos Estados Unidos da América

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7.CONCLUSÃO

Diante do exposto, conclui-se pela inestimável importância advinda da análise sistemática dos institutos expostos para que os instrumentos processuais de garantia do direito pátrio possam realmente cumprir seu papel primaz, de efetividade perante o contingente populacional brasileiro, que se vê demasiadamente descrente quanto à eficácia na prestação jurisdicional.

Já em meados da década de cinqüenta, o ilustre Castro Nunes [11] afirmava a necessidade de remédios injuncionais, que peando a administração no interesse da conformidade de seus atos com a lei, não eram, ao contrário do que muita gente supunha, um produto da época liberal. Eram antes meios preventivos da lesão que, consumada, levava à reparação e é isto que se procurava evitar restaurando ou premunindo de pronto o direito violado ou ameaçado. Tanto assim que, as garantias das vidas jurídicas não são incompatíveis com o pragmatismo político na estruturação do Estado.

Ao se fazer a análise de cada instrumento processual de garantia, podem ser traçadas algumas conclusões alusivas ao seu pragmatismo.

Os writs no direito anglo-americano são vários e faz-se mister reconhecer que alguns já caíram em desuso. Os que subsistem têm finalidade específica e são, uns de eqüidade, como a injunction, outros de prerrogativa strito sensu, chamados também remédios extraordinários ou especiais.

Dizem-se de prerrogativas - state writ ou prerrogative writs - porque a expedição deles constituía prerrogativa da Coroa, nas origens britânicas da instituição. Daí a reserva de certo poder discricionário que se reconhece nas Cortes para concedê-los, poder maior no início, mas que perdura até hoje, particularmente na expedição do certiorari.

De tais writs só o habeas corpus é considerado ex debito justitiae e também, o de mais pronta expedição. Os de uso mais freqüente, além do habeas corpus, são: mandamus, certiorari, quo warrant, prohibition e injunction.

De maneira simplificada, conclui-se que mandamus tem por fim compelir a autoridade a agir ou praticar o ato recusado. Certiorari funciona como verdadeiro recurso de decisões proferidas pelos funcionários e conselhos de administração no desempenho de atribuições de caráter jurisdicional. Aplica-se também o certiorari para rever decisões criminais ou como recurso de apelação, mas usa-se mais como remédio contra a administração. Quo warrant e o writ adequado para assegurar o direito a um título, privilégio ou franquia. Injunction e prohibition, este remédio de prerrogativa, aquele de eqüidade, visam coibir a ação administrativa, servindo o segundo também como meio de regular a jurisdição das cortes.

O mandado de segurança do direito pátrio não é nenhum desses writs de per si. A todos resume: realiza a função do mandamus e da injunction, do certiorari e do quo warrant.

Cumpre-se ainda relatar que os writs of injunction, na atualidade, correspondem às cautelares do direito pátrio (preliminary injunctions) nos Estados Unidos e acabaram por abarcar a action of mandamus, que contém características que funcionam como o mandado de segurança.

Os writs of injunction guardam algumas peculiaridades, pois são medidas no curso do processo ou medidas provisionais, que tanto podem ser interpostas contra ato de autoridades locais, estaduais ou federais, do Poder Executivo, bem contra pessoas físicas ou jurídicas.

O mandado de injunção do direito pátrio tem seu nomem juris recolhido no sistema de Common Law onde, no entanto, diante de todo o exposto anteriormente, designa instituto completamente diverso do que identifica na Constituição de 1988. De comum, têm apenas a origem romana e o étimo latino injunctionem, a significar uma imposição de uma obrigação, uma ordem.

O problema que se apresenta no ordenamento jurídico brasileiro, e que se procura solver com institutos como o mandado de injunção é o de se evitar a inocuidade das normas constitucionais que consagram princípios e direitos fundamentais, que deixadas à própria sorte, sem mecanismos para coibir seu desrespeito, reduzidas a meras "normas programáticas", não seriam normas efetivas, atualizáveis no ordenamento jurídico.

O principal distanciamento entre a injunction e o remédio brasileiro configura-se no aspecto de que direitos constitucionais tuteláveis pela injunction norte-americana são auto-aplicáveis, constituindo seu maior exemplo a Décima-Quarta Emenda da Constituição Americana.

É inegável que no Brasil, sob o prisma da eficácia social, o instituto deixe muito a desejar; sendo importante admitir que é um instituto que ainda não logrou êxito, pois suas características teleológicas fogem ao modelo jurídico - sistemático ao qual foi inserido.

A partir do aprimoramento das instituições jurídicas pátrias, elevando os direitos constitucionais a uma plena satisfação social de auto-aplicabilidade, os instrumentos processuais de garantia cumprirão seu papel de norteadores do Estado Democrático de Direito, como o fazem, no direito norte-americano.

No pensamento norte-americano [12] existem problemas sociais e políticos os quais às vezes parecem resistir a uma solução (na seara política). Em tais situações... o Judiciário deve, com punho forte, aceitar sua responsabilidade em assistir quanto à solução, quando direitos constitucionais pesem na balança (tradução livre).


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NOTAS

1.SOARES, Guido Fernando Silva. Common Law: introdução ao direito dos E.U.A. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1999. p.32.

2.GOLDWIN, Robert A., SCHAMBRA, Willian A. A Constituição norte-americana. Rio de Janeiro : Forense, 1986. p.5-6.

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3.DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. 4.ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2001. tomo I, p.56.

4.MISHKIN, Paul J. Encyclopedia of the american constitution. New York : Macmillan Publisling Company, 1986. p.886.

5.NUNES, Castro. Do mandado de segurança e de outros meios de defesa contra atos do poder público. 5.ed. atual. Rio de Janeiro : Forense, 1956. p.42-43.

6.LEVY, Leonard W. Encyclopedia of the american constitution. New York : Macmillan Publishing Company, 1985. p.1198.

7.NUNES. Op. cit., p.68.

8.INJUNCTIONS: an overview. Cornell Law School. Cornell, 9 set. 2001. Disponível em <http://www.law. cornel.edu>. Acesso em 9 set. 2001. An injunction is a court order requiring an individual to do or omit doing a specific action. It is an extraordinary remedy that courts utilize in special cases where preservation of the status quo or taking some specific action is required in order to prevent possible injustice. Injunctive relief is a discretionary power of the court in which the court, upon deciding that the plaintiff’s rights are being violated, balances the irreparability of injuries and inadequacy of damages if an injunction were not granted against the damages that granting an injunction would cause. An individual who has been given adequate notice of an injunction but fails to follow the court’s orders may be punished for contempt of court. An injunction is an equity remedy and as such is available only in cases of in-personam jurisdiction (not in in-rem proceedings). Rule 65 of the Federal Rules of Civil Procedure explains what injunctions are and the rules regarding them. Basically, there are two types of injunctions: a preliminary injunction and a temporary restraining order (TRO). The purpose of both is to maintain the status quo - to insure a plaintiff that the defendant will not either make him or herself judgment - proof, or insolvent in some way, or to stop him or her from acting in the harmful, complained of way until further judicial proceedings are available. There is a balancing test that courts typically employ in determining whether to issue an injunction. The defendant’s 5th Amendment due process rights are weighed (heavily) against the possibility of the defendant becoming judgment - proof, and the immediacy of the harm allegedly done to the plaintiff (i. e., how badly does the plaintiff need the injunction). When it is possible, the defendant must always be put on notice of the injunction hearing, and the duration of the injunction is typically as temporary as possible. In many jurisdictions, plaintiffs demanding an injunction are required to post a bond.

9.BARBI, Celso Agrícola. Mandado de injunção. Revista dos Tribunais. São Paulo : Revista dos Tribunais, ano 77, n.637, p.7-8. nov. 1988.

10.KARST, Kenneth L. Encyclopedia of the american constitution. New York : Macmillan Publishing Company, 1986. p.224.

11.NUNES. Op. cit., p.32.

12.Encyclopedia of the american constitution. New York: Macmillan, 1986. p.886. There are social and political problems which at times seem to defy resolution (in the political arena). In such situations... the Judiciary must bear a hand accept its responsibility to assist in the solution where constitutional rights hang in the balance.

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Sobre a autora
Fernanda Kellner De Oliveira Palermo

Pós-graduada em Master of Laws (LL.M.) na The George Washington University Law School, em Washington, D.C., EUA,(2007/2008);Mestre em Direito Administrativo, com ênfase em Obrigações Públicas pela Universidade Estadual Paulista (UNESP); Bolsista da Organização dos Estados Americanos (OEA) para estudos acadêmicos de Pós-Graduação, advogada

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PALERMO, Fernanda Kellner Oliveira. Instrumentos processuais de garantia no direito dos Estados Unidos da América. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2733. Acesso em: 27 abr. 2024.

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Trabalho apresentado no Curso de Pós -Graduação em Direito na UNESP- França/ SP

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