Acareação - meio de prova

04/04/2014 às 00:19
Leia nesta página:

Conceito, possibilidades, pressupostos, resultado na prática e obrigação ou não de dizer a verdade. Na prática os resultados deixam a desejar, uma vez que na maioria absoluta das vezes, as pessoas que participam da acareação permanecem com suas versões.

CONCEITO

No dicionário Aurélio acarear significa colocar cara a cara.

Acareação é meio de prova que coloca frente a frente pessoas que prestaram depoimentos controvertidos, perguntando-as sobre as divergências.

Acarear (ou acoroar) é pôr em presença uma da outra, face a face, pessoas cujas declarações são divergentes. A acareação é, portanto o ato processual consistente na confrontação das declarações de dois ou mais acusados, testemunhas ou ofendidos, já ouvidos, e destinado a obter o convencimento do juiz sobre a verdade de algum fato em que as declarações dessas pessoas forem divergentes. (MIRABETE, 2006, p. 311).

Negando o Juiz a acareação, a decisão deve ser fundamentada.

ACAREAÇÃO ENTRE TESTEMUNHAS ATO INDEFERIDO PELO MAGISTRADO. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. [...] DECISÃO DISCRICIONÁRIA DO MAGISTRADO. I - o deferimento de provas submete-se ao prudente arbítrio do magistrado, cuja decisão, sempre fundamentada, há de levar em conta o conjunto probatório. II - é lícito ao juiz indeferir diligências que reputar impertinentes, desnecessárias ou protelatórias. III - indeferimento de pedido de acareação de testemunhas, no caso, devidamente fundamentado. IV - inocorrência de afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório ou às regras do sistema acusatório. (BRASIL. STF. RHC 90.399/RJ. Rel. Ricardo Lewandowski. T1. Julg. 27.03.2007).

POSSIBILIDADES

Pode ser realizada entre: a) testemunha x testemunha; b) testemunha x réu; c) testemunha x vítima; d) réu x vítima; e) réu x réu; e, f) vítimas x vítimas, ou seja, é possível a acareação entre todos que são ouvidos.

Será realizada sempre que existirem pontos controvertidos e qualquer das partes pode requerer a acareação além da possibilidade de ser determinada de ofício pelo Juiz.

Houve um depoimento anterior, mas com conteúdos colidentes, motivo pelo qual os acareados serão reperguntados, para que expliquem os pontos de divergências reduzindo a termo, todo ato de acareação.

A acareação não é providência obrigatória na instrução da causa, tratando-se de medida sujeita ao prudente arbítrio do juiz. (BRASIL. Ap. crim. n. 37.943 - Araçatuba - TACrimSP - 4ª Câmara - rel. Juiz Cunha Camargo - 4.11.71 - RT n. 436, p. 394).

Segundo Feitoza (2009), é possível a acareação por videoconferência utilizando-se das formas previstas ao interrogatório por videoconferência.

PRESSUPOSTOS

Para se realizar são necessários os seguintes pressupostos:

a) Presença de contradição sobre fatos ou circunstâncias relevantes entre depoimentos já prestados.

b) Que a divergência seja manifesta e irreconciliável, ou seja, os depoimentos são incongruentes.

c) Que não seja possível chegar à verdade pelas demais provas produzidas nos autos.

VIA PRECATÓRIA

É possível a realização da acareação de pessoas que não estão frente a frente.

Existindo acareados residentes em comarcas diversas deve-se realizar o ato via precatória, onde o Juiz deprecado fará as perguntas daqueles pontos controvertidos e as enviarão ao juízo deprecante, destacando os pontos controvertidos.

Quando ausente um dos acareados, pode-se proceder à "acareação indireta", que a rigor não constitui acareação, já que não haverá confrontação entre os acareados. Nessa modalidade, ao acareado presente será relatado o que houver de divergente entre seu relato e o do acareado ausente, consignando-se nos autos a sua explicação ou observação. Subsistindo a discordância, expedir-se-á precatória à autoridade do lugar em que resida o acareado ausente, se se situar este em local conhecido, a fim de que seja ouvido, pela mesma forma estabelecida para o que se fazia presente. Na precatória deverão ser transcritas as declarações de ambos os acareados, nos pontos em que divergirem, bem como a resposta do acareado presente (BONFIM, 2009, p. 362).

Determina o artigo 230 do CPP que “esta diligência só se realizará quando não importe demora prejudicial ao processo e o juiz a entenda conveniente”.

NA PRÁTICA

Na prática os resultados deixam a desejar, uma vez que na maioria absoluta das vezes, as pessoas que participam da acareação permanecem com suas versões.

DIREITO DE NÃO PARTICIPAR

Como ninguém é obrigado fazer prova contra si mesmo, conforme princípio constitucional, o réu não é obrigado a participar da acareação e em caso de condução coercitiva poderá permanecer em silêncio.

Do mesmo modo que vítimas e testemunhas podem pedir ao Juiz para prestarem depoimento sem a presença do réu, não estarão obrigadas a participar de acareação com o réu.

Entre vítima e réu com certeza não se chega ao sucesso, eis que não possuem a obrigação de dizer a verdade. O réu por não ser obrigado a produzir prova contra si mesmo e a vítima ou ofendido que não presta compromisso por ser sujeito interessado na ação.

Conclusão é que nas acareações onde se figura o réu, os envolvidos não estarão obrigados a participar.

OBRIGAÇÃO DE DIZER A VERDADE

Nas acareações, quando estiver ausente o réu, os acareados terão o compromisso com a verdade e com a obrigação de dizê-la devendo ser advertidos pela Autoridade.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O crime de falso testemunho está no artigo 342 do CPB onde consta que “fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, [...] Pena - reclusão, de um a três anos, e multa”.

O momento propício para a realização da acareação é após os depoimentos.

“O momento oportuno para a acareação se dá depois da colheita de toda a prova oral”. (BRASIL. STF, AP. 470 Q.05/MG. Rel. Joaquim Barbosa. Julg. 08.04.2010).

Importante ressaltar que o ofendido não tem obrigação de dizer a verdade.

REFERÊNCIAS

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário acadêmico de direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999.

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. De acordo com as leis n. 10.741/2003. 8. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005.

_____ . _____ Curso de processo penal, São Paulo: Saraiva, 2008.

_____ . _____ Curso de processo penal, 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

FEITOZA, Denilson. Direito processual penal. Impetus, 2009.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 12. ed. Niterói: Impetus, 2010.

_____ . _____ . 13. ed. Niterói: Impetus, 2011.

MORAIS, Paulo Heber de e LOPES, João Batista. Da prova penal. Campinas – SP: Copola, 1994.

MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

MASSON, Cleber Rogério. Direito penal esquematizado: parte geral. 2. ed.  São Paulo: Método, 2009.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal. 22. ed.  São Paulo: Atlas, 2005.

____ . ____ Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 2000. v.1.

_____ . _____ .  26. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1977. v.1.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral. 6 ed. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal: 5 ed. ver. e atual. Ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, Rio de janeiro: Forense, 1996.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado. V. I e II. 13 ed. Ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2010.

_____  .  _____. 3º volume. São Paulo: Saraiva, 2010.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Santos Fiorini Netto

Advogado Criminalista, especialista em ciências penais e processo penal, professor de direito penal (Unifenas - Campo Belo - MG), escritor das obras "Prescrição penal simplificada", "Direito penal parte geral V. I" e "Direito penal parte geral V. II", "Manual de Provas - Processo Penal", "Homicídio culposo no trânsito", "Tráfico de drogas - Aspectos relevantes", "Noções Básicas de Criminologia" e "Tribunal do Júri, de suas origens ao veredicto". Atua na área criminal, defesa criminal em geral - Tóxicos - crimes fiscais - Tribunal do Júri (homicídio doloso), revisão criminal, homicídios no trânsito, etc.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos