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Do auxílio reclusão

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CAPÍTULO IV - O BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-RECLUSÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO ATUAL

 

4.1. Conceito

No contexto legislativo atual o auxílio-reclusão pode ser conceituado como o benefício de prestação continuada substituto do rendimento do trabalhador ou aposentado, devido ao conjunto de dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão.

Partindo-se da análise deste conceito, extraem-se seus elementos de definição.

O primeiro ponto a ser enfocado é que o auxílio reclusão é um benefício de prestação continuada devido exclusivamente aos dependentes do segurado.

A finalidade do benefício é a proteção social à família e o móvel de sua existência. Conforme lembra Wagner Balera, citando Pierre Laroque: “não se pode conceber uma seguridade social do indivíduo que não seja uma seguridade social familiar”.17

Seu fundamento remoto está no art. 5º, XLV, da Constituição da República que preleciona que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.

Em um verdadeiro sistema de seguridade social não é admissível que uns arquem com as conseqüências dos atos ilícitos de outros.

Se foi a própria sociedade, através de seus representantes, que elegeu quais seriam as condutas humanas antijurídicas e definiu a pena pela prática de tal conduta, ofende ao Estado Democrático de Direito que essa pena ou mesmo seus efeitos recaiam sobre pessoas que em nada contribuíram para a conduta socialmente reprovável.

Portanto, para que se evite a situação de necessidade social, caracterizada pelo desamparo dos que dependiam economicamente daquele segurado recolhido à prisão, justifica-se a existência do benefício.

Apesar do nome “auxílio-reclusão”, o benefício não é devido apenas para aquelas situações nas quais se impôs pena de reclusão. Também é devido em caso de penas de detenção, prisão simples, imposição medida de segurança ou internação, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente.

A lei, também, não distingue entre prisão provisória e definitiva, penal ou administrativa.

Quanto ao regime de cumprimento da pena, considera-se para o deferimento do benefício aquela cumprida em regime:

a) fechado: aquele sujeito à execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; ou

b) semi-aberto: aquele sujeito à execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar.

Portanto, não se defere prestação a quem esteja em livramento condicional ou cumpra sua pena em regime aberto, assim entendido aquele cuja execução da pena seja em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

4.2. Beneficiários

Têm direito a essa prestação os dependentes de qualquer das espécies de segurados da Previdência Social. A prestação, tal qual a pensão por morte, é devida, em caráter de exclusividade, aos dependentes, pois não faria sentido conceder benefício previdenciário, em razão de cometimento de crimes, a quem se encontra preso, pois assim, se estaria premiando aquele que se comporta em desconformidade com as regras de conduta social.

Segundo estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social, nos termos do que vaticina o art. 16 da Lei 8.212/91:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;       

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.       

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada mantém união estável com o segurado, ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

Por força da análise deste artigo, têm-se quais são os beneficiários da prestação previdenciária de auxílio-reclusão.

A legislação estabeleceu três classes de dependentes, sobrepostas de forma hierárquica.

Os dependentes de uma mesma classe concorrem entre si em igualdade de condições e excluem do direito às prestações os das classes seguintes.

Na classe I, a legislação abarca o cônjuge, o companheiro e o filho menor de 21 anos, não emancipado ou inválido. São equiparados a filho o enteado e o menor tutelado.

Por cônjuge, deve ser entendida a união matrimonial de pessoas do sexo oposto, na forma da lei civil. A atual lei de benefícios não faz distinção quanto ao sexo, como acontecia no ordenamento até então vigente e que não havia sido recepcionado pela Constituição da República de 1988.

No regime anterior, o cônjuge varão somente tinha direito à prestação se fosse inválido. Na sistemática atual, marido e mulher podem ser dependentes um do outro, desde que sejam segurados da Previdência Social.

Companheiro, segundo a definição legal, é a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe que “para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.

Conforme adverte IONAS DEDA GONÇALVES, “uma leitura precipitada desse conjunto de dispositivos poderia levar à conclusão de que apenas as situações de união entre pessoas sem impedimento para o matrimônio sejam consideradas. Não se pode tomar essa assertiva como absoluta, pois assim estariam excluídas hipóteses, muito comuns, de pessoas que se separam de fato e constituem nova família, sem desfazimento formal do vínculo anterior. Nesse caso, a jurisprudência do extinto TFR, cristalizada no enunciado 159 de sua Súmula, firmou o entendimento de que cônjuge e companheira concorrem em condições de igualdade, se ambas preenchem os requisitos para a concessão de benefício previdenciário”.18

A jurisprudência tem ampliado significativamente o rol de dependentes do Regime Geral de Previdência Social.

Com efeito, por força da Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, que tramitou perante a 3ª Vara Previdenciária de Porto Alegre/RS, o INSS se viu compelido a conceder o benefício também ao companheiro ou companheira homossexual, em que pese a Constituição da República, em seu art. 226, fruto do constituinte originário, ter reconhecido apenas a união entre homem e mulher.

Não obstante isso, até mesmo atendendo a critérios de isonomia, o INSS integrou referida decisão no âmbito interno, sendo certo que é possível, a percepção do benefícios pelo companheiro ou companheira homossexual mediante requerimento administrativo.

Esse posicionamento é salutar, tendo em vista que a finalidade, tanto da norma constitucional, como da legislação previdenciária é a proteção à família, e o processo de mutação constitucional acabou por definir que o conceito de família deve ter uma interpretação muito mais abrangente do que a literalidade do texto constitucional.

Ainda se inserem como dependentes da classe I, os filhos.

Por força do comando do art. 227, §6º, da Carta Magna, atualmente não mais existem diferenças entre filhos, cabendo tratamento isonômico entre todas as espécies de filhos conceituadas pelo revogado Código Civil de 1916.

Para que possam ser considerados dependentes, os filhos devem ser menores de 21 anos, não importando a redução da maioridade civil imposta pela edição do novo Código Civil.

Existem ainda, algumas decisões judiciais garantindo o direito ao filho menor de 24 anos, desde que esteja matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau, de ser considerado como dependente. Nesse sentido:

TRF 2ª REGIÃO - AC 197037 - SEXTA TURMA - Data da decisão: 26/06/2002 - DJU DATA:21/03/2003 – REL. JUIZ ANDRE FONTES – M.V.

PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR DE IDADE. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CARÁTER ALIMENTAR.

I - Filho de segurado da previdência social faz jus à pensão por morte até os vinte e quatro anos de idade, desde que comprovado o seu ingresso em universidade à época em que completou a maioridade e a dependência econômica, a fim de assegurar a verdadeira finalidade alimentar do benefício, a qual engloba a garantia à educação.

II – Devido à natureza alimentar, não há argumento que justifique conferir à pensão por morte uma aplicação diversa da que é atribuída aos alimentos advindos da relação de parentesco, regulada pelo Direito Civil, sendo certo que nesta seara vigora o entendimento segundo o qual o alimentando faz jus a permanecer nesta condição até os 24 (vinte e quatro) anos de idade se estiver cursando faculdade.

III – É preciso considerar o caráter assecuratório do beneficio, para o qual o segurado contribuiu durante toda a sua vida com vistas a garantir, no caso de seu falecimento, o sustento e o pleno desenvolvimento profissional de seus descendentes que, se vivo fosse, manteria com o resultado de seu trabalho, por meio do salário ou da correspondente pensão.

IV – Recurso provido.

Essa discussão surgiu em razão de que a legislação do Imposto de Renda permite que sejam considerados como dependentes os filhos até 24 anos desde que esteja matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau (art. 77, § 2º, do Decreto nº 3.000/99) e a partir daí, alguns magistrados passaram a entender que o escopo protetivo da legislação previdenciária deveria alcançar também as pessoas nessa condição.

No nosso entender, não age com acerto essa corrente, uma vez que ainda que a discussão tenha sentido na legislação tributária, no campo previdenciário não é assim, uma vez que fere o princípio da tipicidade além de estender o benefício sem indicar a respectiva fonte de custeio, em afronta a regra da contrapartida. Nesse sentido:

TRF 1ª REGIÃO - AG 01000111175 - PRIMEIRA TURMA - Data da decisão: 10/06/2003 - DJ DATA: 23/06/2003 PAGINA: 111 – REL. DESEMBARGADOR FEDERAL EUSTAQUIO SILVEIRA – V.U.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PENSÃO TEMPORÁRIA. FILHA MAIOR DE 21 ANOS. RECEBIMENTO DA PENSÃO ATÉ A CONCLUSÃO DO CURSO SUPERIOR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REFORMA DA DECISÃO.

1. Em caráter excepcional, poderá ser concedida a tutela antecipada, inaudita altera pars, se presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, bem como a prova inequívoca e a verossimilhança a alegação, em decisão devidamente fundamentada (Agravo Regimental no Agravo Regimental na Medida Cautelar 2000/0020613-0, Relator Min. Paulo Gallotti, Segunda Turma, DJ I de11/09/2000, pg. 231, RSTJ, Vol. 135, p. 198).

2. O provimento jurisdicional que está sujeito ao duplo grau de jurisdição é a sentença (art. 475 do CPC).

3. Dispondo a Lei nº 8.112/90 que a maioridade de filho, aos 21 (vinte e um) anos de idade, acarreta perda da qualidade de beneficiário (art. 222, IV), não encontra guarida no texto legal o pedido de continuidade do recebimento de pensão temporária após o atingimento da idade limite prevista na lei, ainda que seja o beneficiário estudante universitário.

4. Ausente a verossimilhança da alegação, há de ser indeferido o pedido de antecipação de tutela.

5. Agravo de instrumento provido.

Além disso, essa corrente jurisprudencial não se apercebeu que agindo dessa forma atenda contra o princípio da igualdade, pois o benefício não pode ser concedido a pessoas que estão na mesma situação jurídica: ser menor de 24 anos de idade.

O fator de discrímen utilizado, qual seja, estar matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau, não guarda qualquer razoabilidade, proporcionalidade ou coerência, com o direito a ser garantido, qual seja, a proteção familiar dos filhos do segurado recolhido ao cárcere.

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Também não são considerados dependentes os filhos emancipados.

A emancipação pode ser de três espécies (artigo 5.º, parágrafo único, do Código Civil): voluntária, judicial e legal.

a) Emancipação voluntária

Aquela decorrente da vontade dos pais. A idade mínima para a emancipação é 16 anos. Antes da vigência do atual sistema, a emancipação voluntária só poderia acontecer a partir dos 18 anos, porém hoje, por questão teleológica, a emancipação voluntária cai automaticamente para 16 anos.

A concessão da emancipação é feita pelos pais, ou de qualquer deles na falta do outro, como já era previsto pela própria Lei de Registros Públicos.

A emancipação só pode ocorrer por escritura pública, através de um ato unilateral dos pais reconhecendo que o filho tem maturidade necessária para reger sua vida e seus bens. O atual sistema é mais rígido que o anterior que autorizava a emancipação por escritura particular. O inciso I, do parágrafo único, do artigo 5.º foi expresso ao exigir o instrumento público. A escritura é irretratável e irrevogável para não gerar insegurança jurídica.

Hoje a jurisprudência é tranqüila no sentido de que os pais que emancipam os filhos por sua vontade não se eximem da responsabilidade por eles.

b) Emancipação judicial

É aquela decretada pelo juiz. O menor sob tutela só poderá ser emancipado por ordem judicial, tendo em vista que o tutor não pode emancipar o tutelado. O procedimento é regido pelos artigos 1103 e seguintes do Código de Processo Civil com participação do Ministério Público em todas as fases. A sentença que conceder a emancipação será devidamente registrada (artigo 89 da Lei 6.015/73).

c) Emancipação legal

Decorre de certos fatos previstos na lei (exemplos: casamento, estabelecimento do menor com economia própria, recebimento do diploma de curso superior etc.).

Qualquer que seja a idade, o casamento emancipa os menores. É um ato previsto em lei, que culmina na emancipação. No caso de casamento nulo, os efeitos da emancipação não serão válidos, voltando os menores à condição de incapazes. O casamento nulo putativo, para o cônjuge de boa-fé também produz uma emancipação válida.

Se inválidos os filhos, de qualquer idade, farão jus ao benefício. No entanto, a incapacidade deve ser verificada anteriormente ao filho completar 21 anos de idade.

Além disso, paira discussão na jurisprudência sobre o direito ao benefício do menor sobre guarda.

Tal discussão surgiu em nossos Tribunais uma vez que antes da Medida Provisória nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei 9.528/97, que alterou a redação do § 2º do art. 16 da Lei 8.213/91, também o menor sob guarda, por determinação judicial, era previsto como equiparado a filho. Com a omissão dessa figura na nova redação do dispositivo legal, o INSS passou a entender que o menor sob guarda não mais podia ser enquadrado como dependente do segurado.

Nos termos do que vaticina o art. §2º do art. 16 supra mencionado, tais dependentes possuem posição privilegiada sobre os demais e são qualificados pela doutrina como preferenciais.

Sua dependência econômica é presumida, salvo quanto ao enteado e ao menor tutelado, que devem comprová-la.

Neste ponto, se estabeleceu séria controvérsia doutrinária a respeito da presunção de dependência econômica dos dependentes da classe I.

Para MIGUEL HORVATH JÚNIOR, “Só se poderia falar em presunção relativa se a prova da inocorrência de dependência econômica fosse causa de perda da qualidade de dependente, o que não ocorre no nosso sistema legislativo. A atual previsão legislativa que presume a dependência econômica na classe 1 sofre críticas. Melhor seria a lei exigir de todos os dependentes comprovação da dependência econômica, suprindo a presunção de dependência. Isso evitaria sérias distorções como, por exemplo, aquela em que o segurado falece deixando cônjuge em plena possibilidade de auto-sustento e pais que dependiam economicamente dele. Neste caso, conquanto o cônjuge sobrevivente não dependesse economicamente do segurado falecido é ele que tem direito à pensão por morte em detrimento dos pais do “de cujos”.19

No entanto, a questão pode ser analisada sobre outro prisma.

A lei, ao presumir a dependência, em nenhum momento estabeleceu que esta se dá de forma absoluta. Ao contrário, é lícito ao INSS, caso disponha de elementos para tanto, demonstrar a inexistência de dependência entre os dependentes da classe I e o segurado. Nesse sentido é a lição do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“Impossibilidade da viúva em gozo de aposentadoria por invalidez perceber cumulativamente pensão por morte, pois nesse caso não se verifica a dependência econômica em relação ao cônjuge falecido”.(REesp.194300/GO, 5ª T., Rel. Min.Félix Fischer, DJU 2.8.1999, p.00210).

A classe II e III, contempla, respectivamente os pais e os irmãos não emancipados, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido.

A dependência desses deve ser comprovada, sob pena do benefício ser indeferido.

Não é necessário que essa dependência seja absoluta, mas o auxílio financeiro prestado pelo segurado aos dependentes dessas classes, deve ser determinante para sua sobrevivência e deve ocorrer de forma habitual.

A prova da dependência econômica dos dependentes e de vínculo do companheiro, conforme o caso, é feita na forma do Regulamento da Previdência Social, que em seu art. 22, §3º, estabelece a necessidade de reunião de no mínimo três dos seguintes documentos:

I - certidão de nascimento de filho havido em comum;

II - certidão de casamento religioso;

III - declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;

IV - disposições testamentárias;

V - anotação constante na Carteira Profissional e/ou na Carteira de trabalho e Previdência Social, feita pelo órgão competente;

VI - declaração especial feita perante tabelião;

VII - prova de mesmo domicílio;

VIII - prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;

IX - procuração ou fiança reciprocamente outorgada;

X - conta bancária conjunta;

XI - registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;

XII - anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;

XIII - apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;

XIV - ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;

XV - escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;

XVI - declaração de não emancipação do dependente menor de vinte e um anos; ou

XVII - quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.

Por força do inciso XVII, percebe-se que a enumeração trazida pelo texto regulamentar é meramente exemplificativa.

Além disso, a jurisprudência vem considerando abusiva a imposição pelo regulamento de que o dependente deve apresentar três documentos, considerando essa exigência como uma prova tarifada sem qualquer previsibilidade legal, o que ofenderia o princípio da legalidade.

Por outro lado, há entendimento de que a prova meramente testemunhal não basta para provar a relação de dependência, sendo necessário, ao menos, início de prova material.

Regra que a nosso ver, não se coaduna com o sistema protetivo da família, é aquela imposta pelo § 1º, do art. 16 da Lei 8.213/91, que dispõe que a existência de dependente de qualquer das classes exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

Se a finalidade protetiva é amparar aqueles familiares que dependiam economicamente do segurado, não se mostra razoável, que aqueles que se encontram na mesma situação de desamparo, sejam excluídos da proteção social por regra legal que se afasta de critérios de igualdade.

4.3. Os limites impostos pela emenda constitucional nº 20/98

A partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, para que seus dependentes façam jus ao benefício, o segurado deve ser classificado como de baixa renda, ou seja, não pode ser renda mensal superior a R$ 360,00 (esse valor sofre atualização periódica atendendo a critérios fixados pelo Ministério da Previdência Social), valor reajustado sempre na mesma data e proporção do reajustamento geral dos benefícios da Previdência Social.

Entendemos que o critério estabelecido pela EC/20, ao determinar que somente aos dependentes do segurado de baixa renda, utilizando-se como único fator a renda do segurado agiu de forma desproporcional.

Agindo assim, passou a tratar pessoas que se encontram em situação desigual de forma igualitária.

A renda não pode, para se definir a dependência econômica, ser utilizado como elemento isolado de definição de critérios de seletividade e distributividade. O grau de necessidade não é definido apenas por um único critério.

Devem ser utilizados outros critérios: número de dependentes, nível de renda do núcleo familiar, idade dos dependentes, capacidade física e para o trabalho de cada membro da família etc.

No entanto, a discussão na jurisprudência não se pautou exatamente por esses critérios.

A corrente que entende que os critérios de seletividade e distributividade impostos pela Emenda Constitucional nº 20/98 são inconstitucionais, se pautam pela argumentação de que o auxílio-reclusão tem por objetivo atender às necessidades dos dependentes que, em face da pena imposta ao segurado por ato criminoso, se vêem desamparados materialmente. Assim, pouco importa se o segurado percebia mais ou menos do que o valor estabelecido na regra transitória, pois o recolhimento do segurado empregado à prisão suprimiu toda a renda destina ao custeio da subsistência dos dependentes; tanto os dependentes do segurado que percebia salário-mínimo, como daquele que auferia vultuoso salário, ficam, pela eliminação da fonte de custeio de suas necessidades, ao desamparo. Nesse sentido: TRF 4ª Região, AG nº 2000.04.01.077754-4, rel. Juiz Carlos de Castro Lugon, 6ª T., DJU de 19/06/2001.

Por seu lado, a corrente que entende ser constitucional a Emenda, se pauta pela argumentação de que é juridicamente possível ao legislador constituinte estabelecer critérios de seletividade e distributividade, como forma de atender ao princípio da isonomia.

Argumentam ainda, que não há ofensa a cláusula pétrea, pois o constituinte originário permitia que se desse tratamento diferenciado para os dependentes do segurado de baixa renda, uma vez que o dispunha o art. 201, II, da redação original da Constituição, que os planos de previdência social deveriam promover “ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda”.

Quanto a essa corrente, colacionamos o seguinte julgado:

“CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. LIMITAÇÃO IMPOSTA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 20/98. POSSIBILIDADE.

1- A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NO ARTIGO 201, IV, AO INSTITUIR O AUXÍLIO-RECLUSÃO,PRESCREVE QUE ESTE SERÁ DESTINADO AOS SEGURADOS DE BAIXA RENDA, DEIXANDO À LEI DELIMITAR A FRONTEIRA DA REMUNERAÇÃO MÍNIMA CAPAZ DE CONFERIR DIREITO AO BENEFÍCIO.

2 - A EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 20/98, ART. 13, DECLARA QUE ENQUANTO NÃO HOUVER LEI REGULANDO O ASSUNTO, O AUXÍLIO-RECLUSÃO DEPENDERÁ DE OBSERVAÇÃO DE LIMITE DE RENDA BRUTA MENSAL NÃO SUPERIOR A R$ 360,00 (TREZENTOS E SESSENTA REAIS), VALOR ATUALIZADO PELOS MESMOS ÍNDICES APLICADOS AOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, ATUALMENTE CORRESPONDENTE A R$ 429,00 (QUATROCENTOS E VINTE E NOVE REAIS).

3- HIPÓTESE EM QUE NÃO RESTOU COMPROVADO O QUANTUM PERCEBIDO PELO SEGURADO.

4- AGRAVO IMPROVIDO. REGIMENTAL PREJUDICADO”. (Processo 200005000558918, Agravo de Instrumento 33407, 4ª T, Relator Desembargador Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria, Decisão UNÂNIME , DJ 25/02/2002, pág.1715 )

Não obstante isso, a jurisprudência ainda considera que o critério da renda a ser levado em conta é o dos dependentes e não do segurado, nos termos do art. 13 da Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998.

O argumento dessa corrente é no sentido de que a limitação imposta jamais poderia se dirigir à renda auferida pelo próprio segurado, já que este não é o beneficiário do auxílio-reclusão, mas seu dependente.

Entendem que a contingência atinge o segurado (risco reclusão), mas reflete diretamente para seus dependentes, que ficarão privados do sustento, enquanto que o segurado passará a ter sua subsistência garantida pelo Estado.

4.4. Requisitos para percepção e manutenção do benefício

A lei 8.213/91, em seu art. 80, determina que o auxílio-reclusão seja concedido nas mesmas condições da pensão por morte. Essas condições se referem aos beneficiários, à data de início e ao cálculo da prestação.

Os dependentes do segurado de baixa renda devem instruir o pedido de auxílio-reclusão acompanhado da certidão de recolhimento à prisão, emitida pela autoridade carcerária, que deve ser renovada a cada três meses a teor do art. 117, § 1º, do Decreto 3.048/1999.

A data de início é a do recolhimento à prisão, quando requerida a prestação em até 30 dias contados desse fato.

Após esse prazo, o benefício será devido a partir da data de entrada do requerimento administrativo, salvo se dentre os dependentes do segurado existirem menores impúberes ou incapazes, situação na qual o benefício é devido desde o recolhimento à prisão, tendo em vista que não corre prescrição contra pessoas nessas situações.

Para que seus dependentes tenham direito ao auxílio-reclusão, o segurado preso não pode estar recebendo remuneração da empresa, nem auxílio-doença ou aposentadoria. Se sofrer acidente ou doença durante a prisão, não poderá cumular auxílio-doença ou aposentadoria com auxílio-reclusão, mas poderá optar pelo benefício mais vantajoso, conforme alteração promovida pela Lei 10.666/03, in verbis:

Art. 2º O exercício de atividade remunerada do segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de contribuinte individual ou facultativo não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão para seus dependentes.

§ 1º O segurado recluso não terá direito aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, ainda que, nessa condição, contribua como contribuinte individual ou facultativo, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, ao benefício mais vantajoso.

O Código Penal, em seu art. 39, que cuida do trabalho do preso, estabeleceu, antes da vigência da Lei 10.666/03 que:

Art. 39 - O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social.

Portanto, se o preso exercesse trabalho dentro do presídio ou em colônia agrícola, teria direito aos benefícios da Previdência Social, inclusive sendo dever de seu empregador (União, Estados, Municípios e Distrito Federal, conforme a quem caiba a administração da unidade prisional), arcar com o recolhimento das contribuições previdenciárias.

Vale observar que o preso deve ter condição de segurado no momento da ocorrência do fato gerador da prestação, ou seja, no momento de seu recolhimento à prisão.

Na hipótese do segurado fugir da prisão, o benefício é suspenso, somente sendo reativado quando de sua recaptura, desde que nesse lapso de tempo não tenha perdido sua qualidade de segurado.

Caso exerça alguma atividade vinculada ao RGPS ou contribua para o sistema enquanto estiver foragido, manterá seu vínculo, interrompendo a contagem do prazo do período de graça.

Havendo morte do segurado durante o recebimento do auxílio-reclusão por seus dependentes, a prestação é convertida em pensão por morte. Caso tenha havido contribuição do segurado recluso, em razão da atividade remunerada desenvolvida durante a prisão, os salários-de-contribuição correspondente são considerados no cálculo da pensão por morte, resguardada sempre a opção pela simples conversão do auxílio-reclusão, se seu valor for mais favorável, conforme dispõe o art. 2º, §2º da Lei 10.666/2003, in verbis:

§ 2º Em caso de morte do segurado recluso que contribuir na forma do § 1º, o valor da pensão por morte devida a seus dependentes será obtido mediante a realização de cálculo, com base nos novos tempos de contribuição e salários-de-contribuição correspondentes, neles incluídas as contribuições recolhidas enquanto recluso, facultada a opção pelo valor do auxílio-reclusão.

Vale lembrar a advertência de IONAS DEDA GONÇALVES: “É importante prestar atenção na seguinte situação, que pode gerar confusão: se o detido, quando foi recolhido à prisão, mantinha sua qualidade de segurado, mas seus dependentes não tinham direito ao auxílio-reclusão (porque não era segurado de baixa renda), conserva seus direitos perante a Previdência, pois encontra-se no período de graça, até 12 meses após o livramento. Se falece, adoece ou se invalida durante a prisão, ele ou seus dependentes têm direito às respectivas prestações previdenciárias, desde que cumpridos os demais requisitos exigidos, pois ainda mantinha sua qualidade de segurado”.20

4.5. Do valor do benefício

O valor equivale ao de aposentadoria por invalidez, a que o segurado teria direito no momento do recolhimento à prisão.

A jurisprudência, após o advento da Lei 9.032/1995, que elevou o coeficiente de cálculo do valor do benefício de pensão por morte e auxílio-reclusão, passou a entender que os benefícios concedidos anteriormente à sua vigência, deveriam ser reajustados, de acordo com a nova legislação, em razão do princípio da aplicação imediata da nova lei.

Por seu lado, a corrente que entende que não se pode fazer a aplicação imediata da lei a fatos ocorridos anteriormente à sua vigência, argumenta que a questão cinge-se a saber se uma Lei posterior ao ato da concessão do benefício pode alterar o percentual dessa concessão, com efeitos nas prestações mensais a serem pagas após a sua publicação, sem ofender o princípio constitucional da irretroatividade das leis, consubstanciado no art. 5°, XXXVI, da Carta Magna.

A solução jurídica da questão que fundamenta a demanda resolve-se, simplesmente, ao se encontrar o evento que deve ser considerado para que se subsuma o caso a uma ou outra lei de regência.

A questão passa, assim, pelo regime jurídico que rege a aplicação das leis no tempo.

O princípio que rege a aplicação da lei no tempo estabelece que, em regra, a lei possui eficácia imediata, regendo as relações jurídicas a que se referem desde o momento em que recebem execução até àquele em que cessa a sua virtude normativa.

Pautado no brocardo latino tempus regit actum, mencionado princípio estabelece que, em tese, a lei não pode alcançar fatos ocorridos em período anterior ao início de sua vigência, nem aplicada àqueles ocorridos após a sua revogação.

No entanto, poderão existir situações em que uma mesma relação jurídica possa, aparentemente, ser regulada por diplomas legais diversos, dando azo a um conflito aparente de normas.

Como bem doutrina Roberto de Ruggiero21, para que se verifique o conflito de leis no tempo, é preciso que a vida de uma relação jurídica se prolongue tanto que apanhe dois momentos diversos, dois momentos em que sucessivamente vigorem normas de conteúdos substancialmente diversos.

A fim de dirimir tais conflitos aparentes, primeiramente, baseado no sentimento universal e com inspiração em fontes romanas (“leges et constitutiones futuris certum est dare formam negotiis, non ad facta praeterita revocari”), formulou-se o princípio da irretroatividade da lei, segundo o qual a lei sempre dispõe para as relações futuras e não tem efeitos retroativos.

No entanto, na prática, mencionado princípio não se mostrou suficiente para a resolução dos conflitos concretos.

Dessa forma, desenvolvendo a teoria da irretroatividade da lei, Lassalle formulou o princípio do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada.

Tal princípio foi posteriormente abraçado e complementado por Gabba, estabelecendo que a proibição geral da retroatividade da lei se deve limitar ao direito adquirido e aos seus derivados: o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Em sua obra Teoria da Irretroatividade das Leis, Gabba observa que o grande problema de retroatividade das leis está em que se não firam os direitos que se constituíram graças ao império da lei antiga e em sua plena conformidade.

Propõe assim, que o critério da retroatividade ou irretroatividade da lei não seja encontrado na própria natureza da norma jurídica, como pretendia Savigny, mas sim na situação jurídica que se constituiu à sombra da lei anterior, elaborando a noção de direito adquirido.

Entre nós, na atualidade, preceitua o artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal:

“Art. 5°. (...) XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.”

Assim, a norma constitucional não impede a aplicação retroativa da lei, sendo esta, em tese, admitida, desde que não prejudique o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Tem-se, assim, que, instaurada a relação jurídica, deve a mesma reger-se pela lei à época vigente, segundo o princípio tempus regit actum, sendo inoperante, para esta relação que já se concretizou, todas as alterações legislativas posteriores relacionadas ao cálculo da prestação inicial, sejam elas menos ou mais benéficas para o sujeito ativo, a menos que, evidentemente, a lei posterior contenha previsão de aplicação a situações fáticas pretéritas, circunstância inocorrente na hipótese.

A corrente doutrinária e jurisprudencial, defende ainda que não se pode invocar, nessa situação, o princípio da aplicação imediata da lei.

De fato, como bem destaca Washington de Barros Monteiro22, entre a retroatividade e irretroatividade da lei, existe situação intermediária, a da aplicabilidade imediata da lei nova, porém, limitada às situações que embora nascidas sob a vigência da lei antiga, ainda não se aperfeiçoaram; não se consumaram.

Além disso, defendem que o magistrado não pode atuar como legislador positivo.

Sua atuação deve limitar-se ao afastamento de normas legais incompatíveis com o ordenamento superior, de sede constitucional, ou seja, como legislador negativo. Pois bem: caso afastada uma norma por inconstitucionalidade, esta norma não teria gerado efeitos. Dentre esses efeitos que se afastam, está a revogação do ordenamento anterior, que seja consigo incompatível ou que tenha sido expressamente revogado. Ou seja: declarada a inconstitucionalidade da norma, retorna-se ao regramento anterior, posto que o próprio efeito de revogação deste ordenamento anterior se desfaz.

Ora, está dentro do espaço de conformidade do legislador a ampliação ou não dos direitos garantidos pela norma constitucional, é certo que não poderá restringi-los, mas a sua ampliação é discricionariedade do legislador, não cabendo ao Juiz, sob pena de invasão da atribuição legislativa e desrespeito ao princípio democrático a inclusão de novos direitos.

Pondera LORD DEVELIN que: “A partir do momento em que o juiz se transforma em legislador, mina a idéia fundamental da separação dos poderes, trazendo a ameaça talvez mortal à legitimação democrática da função jurisdicional, e definitivamente conduzindo, mais cedo ou mais tarde ao estado totalitário”.23

Por fim, defendem que a majoração do coeficiente dos benefícios concedidos anteriormente à lei 9.032/95, pela aplicação imediata desta, ofende o princípio da necessidade de prévia fonte de custeio.

Conclui essa corrente que não existe lacuna ou omissão da lei a ser suprida por analogia, sendo o silêncio da norma intencional, indicando claramente que não há a possibilidade de majoração do percentual dos benefícios concedidos sob a égide da lei pretérita.

4.6. Da extinção do benefício

A prestação do benefício de auxílio-reclusão extingue-se:

a) individualmente, nas mesmas condições da pensão por morte;

b) quando extinguir-se a cota-parte do último dependente com direito ao benefício, por eventos de idade, morte, ou cessação da invalidez;

c) com o livramento do segurado;

d) com sua fuga por prazo superior ao do período de graça;

e) com a morte do segurado;

f) com a opção por aposentadoria adquirida no período de prisão.

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Sobre o autor
Marcelo Cavaletti de Souza Cruz

Procurador Federal. Mestrando em Direito Previdenciário pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Marcelo Cavaletti Souza. Do auxílio reclusão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3962, 7 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28181. Acesso em: 15 nov. 2024.

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