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Do auxílio reclusão

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CAPÍTULO V - A REGRA MATRIZ DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-RECLUSÃO

5.1. Antecedente

5.1.1. critério material

O critério material da hipótese de incidência normativa é a condição de privação de liberdade. O segurado deve estar preso.

Somado a isso, o critério material da norma geral e abstrata ao auxílio-reclusão, é integrado pelos seguintes elementos: a baixa renda do segurado e a não percepção de remuneração da empresa, aposentadoria ou auxílio-doença.

Cabe a ressalva de que o critério material acima descrito sofreu alguns temperamentos impostos pela Lei 10.666 de 8 de maio de 2003, que em seu art. 2º dispõe:

Art. 2º O exercício de atividade remunerada do segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de contribuinte individual ou facultativo não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão para seus dependentes.

§ 1º O segurado recluso não terá direito aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, ainda que, nessa condição, contribua como contribuinte individual ou facultativo, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, ao benefício mais vantajoso.

§ 2º Em caso de morte do segurado recluso que contribuir na forma do § 1º, o valor da pensão por morte devida a seus dependentes será obtido mediante a realização de cálculo, com base nos novos tempos de contribuição e salários-de-contribuição correspondentes, neles incluídas as contribuições recolhidas enquanto recluso, facultada a opção pelo valor do auxílio-reclusão.

A norma protetiva é ampla e abarca qualquer tipo de prisão ou pena privativa de liberdade, seja cautelar ou definitiva, inclusive a medida de internação decorrente de medida de segurança e da internação prevista no art. 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Cabe ressaltar, no entanto, que o benefício somente é devido ao segurado que estiver submetido aos regimes de cumprimento de pena fechado ou semi-aberto ou situações assemelhadas.

Não é devido o auxílio-reclusão ao dependente do segurado em quaisquer hipóteses de não cumprimento da pena, como o livramento condicional ou em caso de imposição do regime aberto de cumprimento da pena privativa de liberdade.

O benefício é devido enquanto durar a privação de liberdade do segurado.

Ocorre a suspensão do benefício nas seguintes hipóteses:

1.em caso de fuga;

b) recebimento de auxílio-doença no período de privação de liberdade;

c) deixar de apresentar trimestralmente atestado de prisão firmado por autoridade competente;

d) livramento condicional, cumprimento da pena em regime aberto, enquanto perdurarem tais situações.

Para FEIJÓ COIMBRA, a suspensão do benefício em razão da fuga, não se coaduna com o sistema protetivo da família. Com efeito, assevera o autor:

“Não vemos justiça na disposição legal, parecendo-nos, ao revés, que se conflitam as duas disposições. Se a prestação é, induvidosamente, estabelecida intuitu familiae, e se tem como elemento material da hipótese de incidência legal a ordem judicial de detenção ou de reclusão, o fato de ter-se evadido o segurado, de estar foragido, em nada altera os termos da questão, nem melhora a situação de seus dependentes, os titulares da prestação de que se cuida”.24

A finalidade da norma, no entanto, é evitar que a os dependentes passem a receber o benefício por prazo indeterminado.

Deve-se criticar esse posicionamento legal.

A justificativa da existência do benefício é justamente a proteção à família que fica desamparada em razão da retribuição estatal pela prática de ato antijurídico por parte do segurado, evitando-se que os efeitos da pena passem do condenado e atinja seus familiares ou pessoas de quem são dependentes.

De outro prisma, cabe a Estado zelar pela segurança do recluso e evitar que este fuja do estabelecimento prisional.

A suspensão do benefício, gera aos dependentes uma “punição” por atos ilícitos praticados por terceiros, o que não se coaduna com o sistema protetivo da seguridade social.

Com efeito, uma vez que o benefício de auxílio-reclusão é devido exclusivamente aos dependentes e por esse motivo, a esses cabe um direito subjetivo público frente ao Estado, não faz sentido a norma que sanciona esses dependentes pela fuga do segurado, que é um ato ilícito por parte do recluso.

Por outro lado, os dependentes são sancionados pelo Estado que se omitiu no dever de evitar que o preso se evadisse do estabelecimento prisional. E ainda, poderão ter o benefício cassado caso haja a perda da qualidade do segurado durante o período de fuga.

É uma situação injusta que praticamente impõe os efeitos da pena a pessoas distintas do condenado, em afronta ao art. 5º, da Carta Magna, que vaticina em seu inciso XLV, que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”.

Em caso de recaptura do foragido, o benefício é restabelecido, desde que o condenado ainda mantenha a qualidade de segurado.

5.1.2. critério espacial

O critério espacial reflete o âmbito de incidência da norma jurídica, sendo certo que para o auxílio-reclusão é o território brasileiro.

É possível a ocorrência de extraterritorialidade da norma, naquelas situações em que o segurado cumpra pena fora do país, ou esteja a serviço do Brasil no exterior, porém mantendo a qualidade de segurado perante a legislação previdenciária brasileira.

5.1.3. critério temporal

Pelo critério temporal se define o momento em que o benefício passa a ser devido.

Este momento ocorre, no benefício de auxílio-reclusão, no instante em que o segurado é recolhido à prisão, se o requerimento for feito até trinta dias deste evento. Ultrapassado esse prazo, o benefício será devido a partir da data de entrada do requerimento administrativo.

O benefício também somente é devido após a data do requerimento administrativo se o nascimento ou reconhecimento de filho ocorrer após a prisão ou ainda, em caso de matrimônio, se este também for realizado após a prisão do segurado.

Aos menores impúberes ou aos incapazes dependentes do segurado recluso, o benefício é devido desde a data do efetivo recolhimento à prisão do segurado, ainda que o requerimento administrativo tenha ocorrido após os trinta dias da reclusão, tendo em vista que não corre prescrição contra menores.

5.2. CONSEQUENTE

5.2.1. critério pessoal

Pelo critério pessoal são identificados os sujeitos ativo e passivo da relação jurídica do benefício de auxílio-reclusão.

O sujeito ativo é do benefício de auxílio-reclusão são, exclusivamente, os dependentes do segurado recluso.

O sujeito passivo é o Instituto Nacional do Seguro Social.

5.2.2. critério quantitativo

Pelo critério quantitativo é definido o valor da prestação previdenciária devida pelo sujeito passivo ao sujeito ativo.

A base de cálculo é o salário-de-benefício. Este é definido pela média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondente a 80% de todo o período contributivo para os segurados vinculados ao sistema previdenciário após a vigência da Lei nº 9.786/99 ou correspondente a 80% dos maiores salários de contribuição apurados a partir da competência julho/94 para os segurados vinculados anteriormente àquela lei.

A alíquota é de 100% do salário-de-benefício que o segurado recebia ou daquele que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data em que foi recolhido à prisão.

Para os dependentes do segurado especial, o valor do auxílio-reclusão será de um salário mínimo.

Conforme dito alhures, a Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, alterou o critério para concessão do benefício, restringindo-o apenas aos segurados de baixa renda e art. 13 da referida Emenda classificou como sendo de baixa renda o segurado que tenha salário de contribuição igual ou inferior a R$ 360,00 (valor sujeito à atualização segundo critérios do Ministério da Previdência Social).

A prisão ocorrida anteriormente à promulgação desta emenda não impunha tal limitação ao recebimento do benefício e portanto, o benefício é devido ainda que os dependentes tenham feito requerimento após 16 de dezembro de 1998.


CONCLUSÕES

O benefício de auxílio-reclusão, ao longo dos anos e acompanhando a evolução da sociedade, sofreu evoluções quanto ao seu alcance protetivo. No entanto, a Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, impôs drástica limitação, ao benefício, garantindo-o apenas aos dependentes do segurado de baixa renda.

Essa limitação é objeto de controvérsias tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Nosso posicionamento, no entanto, se coloca à parte da discussão ocorrida, tendo em vista que entendemos que é lícito à emenda constitucional definir novos critérios de seletividade e distributividade mas, no entanto, tais critérios devem se pautar pelos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, o que não ocorre com a limitação imposta pela emenda, uma vez que a utilização única e exclusivamente do critério da renda não se coaduna com tais princípios.

No ordenamento jurídico atual, o benefício comporta outras discussões importantes, tais como a aplicação do novo coeficiente de cálculo da renda mensal inicial, que a Lei 9.032/95 fixou em 100%, aos benefícios concedidos anteriormente à entrada em vigor desse diploma legal.

Buscou-se abordar também a questão da fuga do segurado recluso como causa de suspensão do benefício a seus beneficiários, situação a qual entendemos injusta, uma vez que pune os dependentes por ato ilícito praticado pelo preso e por ato omissivo do Estado que deixa de cumprir seu dever de manter preso aquele que agiu em desacordo com as regras sociais.

Quanto à regra de que a existência de dependentes de uma das classes exclui o direito dos dependentes da demais classe, enfatizamos que tal essa previsão no ordenamento jurídico não se coaduna com o sistema de proteção à família, que deve garantir o sustento de quem realmente necessite do benefício, evitando-se as presunções legais de dependência.

Na mesma linha, conclui-se que a presunção de dependência dos dependentes da primeira classe é relativa e não absoluta, como sustenta a maioria da doutrina, sendo lícito ao INSS fazer prova em contrário, desde que disponha de meios para tanto.

A questão da retirada do menor sob guarda do rol dos dependentes tem suscitado francos embates jurisprudenciais que, todavia, entendemos serem descabidos, tendo em vista que é possível à lei limitar o acesso aos benefícios previdenciários em atenção ao critério da seletividade.

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A análise da regra matriz do benefício nos traz sua exata dimensão e a conformação perante o ordenamento jurídico vigente, inclusive quanto algumas peculiaridades desta prestação previdenciária.


BIBLIOGRAFIA

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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional, 23ª ed., Malheiros, 2005.


Notas

1 José Afonso da SILVA, Curso de Direito Constitucional, p. 808.

2 Luís André MARTINS, Direito Previdenciário, p. 10.

3 Manoel Gonçalves Ferreira FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, p. 49.

4 Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, p. 29.

5 Celso Antonio Bandeira de MELLO, Elementos de Direito Administrativo, p. 230.

6 José Joaquim Gomes CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 1123.

7 Wagner BALERA, A Seguridade Social na Constituição de 1988, p. 45.

8 José Manuel Almansa PASTOR, Derecho de La Seguridad Social, p. 120.

9 Alonso Olea e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 37.

10 Ionas Deda GONÇALVES, Direito Previdenciário, p. 15.

11 Wagner BALERA, Noções Preliminares de Direito Previdenciário, p. 84.

12 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p.27.

13 Wagner BALERA, Introdução ao Direito Previdenciário, p. 51.

14 Wagner BALERA, A seguridade social na Constituição de 1988, p. 39.

15 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p. 33.

16 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p 86.

17 Wagner BALERA, Da proteção Social à família, p. 213.

18 Ionas Deda GONÇALVES. Direito Previdenciário, p. 62

19 Miguel Horvath JUNIOR, Direito Previdenciário, p. 115.

20 Ionas Deda GONÇALVES. Direito Previdenciário, p. 186.

21 Roberto de Ruggiero, Instituições de Direito Civil, vol. 1, p. 221.

22,Washington de Barros MONTEIRO, Curso de Direito Civil, vol. 1, pg. 32.

23 Lord DEVELIN, Judge and Lawmakers, p.1 e s.

24 Feijó COIMBRA, Direito Previdenciário Brasileiro, p. 133.

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Sobre o autor
Marcelo Cavaletti de Souza Cruz

Procurador Federal. Mestrando em Direito Previdenciário pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Marcelo Cavaletti Souza. Do auxílio reclusão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3962, 7 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28181. Acesso em: 15 nov. 2024.

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