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Controle de constitucionalidade: jurídico-político ou político-jurídico?

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01/04/2002 às 00:00
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1.Visão panorâmica do controle de constitucionalidade no direito comparado

O controle de constitucionalidade, nos modernos Estados Democráticos de Direito, é a garantia inafastável da imperatividade e efetividade da Constituição, norma fundante de uma comunidade político-jurídica. Em sua ausência, o Texto Constitucional fica desprovido do caráter de norma jurídica suprema do ordenamento jurídico, à qual todos os Poderes e instituições devem curvar-se. E, nessas condições, fica reduzido a um mero complexo de regras cuja eficácia e disposição fica à mercê das instâncias constituídas, mormente o Poder Legislativo e Executivo.

Historicamente, como fartamente registra a literatura constitucional, detecta-se dois sistema de controle jurisdicional de constitucionalidade: o "europeu" e o "americano".

Na perspectiva de Ivo Dantas [1], a fim de possibilitar um controle tanto quanto possível técnico, os textos constitucionais têm criado diferentes modelos ou sistemas de controle jurisdicional, os quais, ora são exercidos pela judicatura ordinária, ora por um órgão jurisdicional especializado. A primeira modalidade – judicatura ordinária - corresponde o sistema americano; enquanto a segunda – órgão jurisdicional especializado - é denominada sistema europeu.

O sistema europeu, também chamado de "sistema austríaco", e que se consolidou após a 2ª Grande Guerra, realiza o controle concentrado abstrato de normas, a cargo, via de regra, de um Tribunal Constitucional.

Conforme Enrique Álvarez Conde [2], o sistema austríaco "sólo admite la via directa en el control de constitucionalidad de las leys, aunque a partir de la reforma de 1929 se introduce también la via indirecta". Segundo ainda o publicista espanhol [3], "este sistema va a ser el que influirá de modo más decisivo en los modelos alemán e italiano, que son los antecedentes más cercanos a nuestro atual Tribunal Constitucional."

Tal sistema somente tomou impulso depois da 2ª Guerra, quando foram instituídas a Corte Constitucional italiana (1948) e o Tribunal Constitucional alemão (1949), consagrando-se definitivamente nos anos 70/80, com o surgimento da justiça constitucional em Portugal (1976), na Espanha (1978), Polônia (1982) e Bélgica (1983).

Um peculiaridade deste sistema é que o órgão encarregado da jurisdição constitucional não se inclui no Judiciário, nem em qualquer dos Poderes clássicos, sendo independente em relação a todos os três. Compõe-se de pessoas que normalmente não pertencem aos quadros da Justiça, escolhidas com forte influência da representação e dos partidos políticos, que apreciam a norma impugnada in abstrato, sem referências a casos concretos, cujas peculiaridades poderiam comprometer a isenção das discussões.

Como observa Manoel Gonçalves Ferreira Filho [4], pode esta forma de controle, pelo menos na Alemanha, fugir do tudo ou nada que é o juízo de constitucionalidade/inconstitucionalidade, para adotar fórmulas mais flexíveis: impor uma interpretação "conforme a Constituição"; manter em vigor por cento tempo a norma inconstitucional, dando tempo para que o Parlamento a substitua por outra, essa constitucional; editar regras que supram a omissão do legislador etc. Tal "flexibilização" atinge muitas vezes os próprios efeitos a serem conferidos à decisão em matéria constitucional, admitindo-se, em alguns casos, somente efeitos "ex nunc" e não "ex tunc", graduando-se, politicamente, os efeitos da anulação do ato inconstitucional.

Nesta "atmosfera flexibilizadora" o ato inconstitucional não revela-se necessariamente nulo, em conformidade com a lição de Hans Kelsen [5]: "Dentro de uma ordem jurídica, não pode haver algo como a nulidade, que uma norma pertencente a uma ordem jurídica não pode ser nula mas apenas anulável. Mas esta anulabilidade prevista pela ordem jurídica, pode ter diferentes graus. Uma norma jurídica em regra somente é anulada com efeito para o futuro, de tal forma que os efeitos já produzidos que deixa para trás permanecem intocados. Mas também pode ser anulada com efeito retroativo, por forma tal que os efeitos jurídicos que ela deixou atrás de si sejam destruídos."

Por outro lado, para o sistema americano de controle difuso, a apreciação da constitucionalidade aparece situada na esfera normal e ordinária de atuação do Judiciário. Isso acontece, quando este Judiciário, ao julgar um litígio, precisa determinar qual a norma aplicável. Vislumbra-se a antinomia entre a norma legal e a norma constitucional como uma espécie de conflito de leis no espaço, prevalecendo a última, em razão do postulado da hierarquia das normas, que tem no comando constitucional a regra suprema.

Por esta razão tem-se admitido que o sistema americano consagra o controle de constitucionalidade nos moldes de um controle de supralegalidade.

Para Álvarez Conde [6],

"el sistema norteamericano de judicial review, que es un sistema de justicia constitucional difuso, ya que todos los tribunales son competentes en este sentido, aunque se sienten vinculados por el principio stare decisis. Al próprio tiempo, únicamente se admite la vía indirecta en nel control de constitucionalidad de las leys, no produciéndose tampoco la nulidad de la disposición afectada, sino únicamente su inaplicabilidad al caso concreto enjuiciado."

Na atualidade quase nenhum país adota modelos de controle que se identificam unicamente com um ou outro dos modelos apresentados.

Cada sistema político concreto apresenta suas próprias peculiaridades, que afetam tanto as funções como os procedimentos a serem adotados, produzindo-se uma espécie de simbiose entre os sistemas americano e europeu, ainda que com a preponderância dos elementos de um ou outro. Como veremos, o sistema misto desenvolvido no Brasil incorporou duas linhas de controle: a americana, inspirada em Marshall, e a européia, inspirada em Kelsen. Estas duas linhas de controle vinculam-se à eficácia de um ato judicial comumente chamado declaração de inconstitucionalidade.


2. Controle jurídico-político ou político-jurídico

Algumas questões de natureza política colocam-se como pano de fundo dos dois sistemas de controle referidos. Para Álvarez Conde [7], "la filosofía política subyacente a ambos sistemas es muy diferente". Enquanto o sistema americano apresenta um forte preocupação com a consagração do princípio federativo, tornando "difusa" a atividade de controle, o sistema europeu acentua a defesa e garantia da liberdade.

É sabido que em 1803 ainda existia nos Estados Unidos a escravidão negra, e que nos anos 20, na Europa, vicejou um grande debate entre Kelsen e Schimitt sobre as relações entre o político e o jurídico. Recorde-se que, para Schimitt, a existência de uma jurisdição constitucional de controle abstrato propicia uma politização da justiça em vez de judicializar a política, mister alcançado apenas pela difusão controle jurisdicional.

Inobstante tais ponderações, o sistema americano (controle difuso) parece acentuar o caráter de supralegalidade do controle de constitucionalidade, assumindo este, uma fisionomia de caráter mais técnico-jurídico. Aqui, o controle de constitucionalidade não se distingue do controle de legalidade de um ato qualquer em face da lei, exceto pelo fato de que o confronto se dá entre a lei e a norma constitucional. Disso também resulta que o ato normativo inconstitucional não pode produzir qualquer efeito válido, sendo insuscetível de qualquer convalidação. Neste caso, o reconhecimento judicial da inconstitucionalidade tem caráter declaratório, operando, necessariamente ex tunc e inter partes. Assim, a apreciação da constitucionalidade (adequação de uma lei à Constituição) apresenta-se como um ato normal de atuação do Poder Judiciário.

Inserindo-se neste debate, Manoel Gonçalves Ferreira Filho [8] afirma que o modelo de controle difuso escamoteia o aspecto político do controle de constitucionalidade, tratando-o como uma questão simplesmente jurídica, ou de mero procedimento jurisdicional. A tarefa do juiz seria apenas declarar a contrariedade entre a norma constitucional e a norma legal. Considera, em conseqüência, o juiz de carreira perfeitamente apto para exercer esta tarefa simples.

Para o eminente constitucionalista pátrio [9], este modelo não confere qualquer flexibilidade de apreciação, colocando o julgador perante o dilema constitucional/inconstitucional, válido/inválido e inválido de modo absoluto, tendo isso, um efeito perverso, tal seja: o Tribunal deixa de reconhecer a inconstitucionalidade, dadas as conseqüências que daí decorreriam, conseqüências até injustas. Assim, não resta dúvida, arremata renomado teórico, que o sistema americano imprime ao controle um caráter mais jurídico do que político.

Por outro lado, tem-se admitido que o controle concentrado in abstrato tem assumido uma caráter mais político-jurídico, principalmente a partir da consagração das Cortes Constitucionais no pós-guerra. Álvarez Conde [10], analisando o caso espanhol, refere-se a uma crescente

"politización de la justicia constitucional, ya que la jurisdición constitucional entre dentro del dominio de lo político." Para o publicista espanhol [11], "se trata de un problema que siempre se há suscitado cuando se habla de la justicia constitucional."

Esta politicidade, ou "ativismo político" das Cortes Constitucionais no controle abstrato, principalmente quando direcionado às normas legais emanadas do Legislativo, tem sido objeto de críticas diversas dos mais variados matizes.

Hans Kelsen já advertia que os órgãos da justiça constitucional não poderiam ceder à tentação de se transformarem em autênticos "legisladores negativos", substituindo-se aos Parlamentos, com manifesto comprometimento dos postulados do Estado Democrático de Direito.

Tem-se observado que, no controle concentrado, o tribunal constitucional, tendo por objeto a lei em si, não profere decisões jurisdicionais como nas ações inter partes, em que cuida da aplicação da lei a um caso concreto sem negá-la para outros casos, mas toma decisões de caráter político e legislativo válidas para todos os casos. Legisla, assim, negativamente, porque nega a lei erga omnes, até para si mesmo, de sorte que a sentença de inconstitucionalidade é uma contra-norma com a qual a jurisdição constitucional revoga a norma inconstitucional.

No sentido de se evitar os extremos acima referidos, e de se buscar uma posição de compromisso entre o controle jurídico e o controle político, tem-se admitido que os Tribunais Constitucionais são, como os demais poderes públicos, poderes constituídos, não podendo nunca arrogar-se da representação do poder constituinte nem suplantar o núcleo de competência dos demais órgãos constitucionais, entre estes encontrando posição de destaque os parlamentos.

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Contrapondo-se a uma visão estritamente técnico-jurídica do controle de constitucionalidade concentrado, e buscando equilíbrio entre os aspectos jurídicos e políticos do controle de constitucionalidade, Álvarez Conde [12] assim se manifesta:

"lo que sucede es que la Constitución no es sólo un texto normativo, sino que en él se produce la expresión de todo un sistema de valores. Por eso, la justicia constitucional supone na defensa de todos e cada uno de esos valores. Todo ello, naturalmente, implica que la función de la justicia constitucional no puede – no debe – ser aséptica, sino que tiene que coadyuvar, junto com los demás poderes públicos, al desarrolo de los valores que sirven de fundamento a la Constitución. Desde esta configuración, plantear la disyuntiva judicialización de la política/politización de la justicia es, en gran medida, errónea, ya que todos los instrumentos y mecanismos de socialización política – y la justicia constitucional debe ser considerada uno de ellos – desarrollan una función política especialmente relevante en aquellos países que, como el nuestro, están tan necesitados de crear un auténtico sentimiento constitucional, indispensable para lograr el asentamiento del sistema democrático."


3. Sistema de controle de constitucionalidade no Brasil

Esta tensão entre elementos jurídicos e políticos do controle de constitucionalidade, tem estado presente nas discussões e debates sobre o assunto, em nível nacional, feitos na esfera judicial.

Para entendimento da natureza e configuração das discussões acontecidas, é bom que se faça um rápido levantamento histórico em torno da formação do controle de constitucionalidade no país.

É sabido que o controle de constitucionalidade combina elementos do controle difuso-concreto com outros do sistema concentrado-abstrato.

Registre-se, desde já, que desde a primeira Carta Constitucional – a imperial, outorgada em 1824 até a presente, promulgada em 05 de outubro de 1988 - o capitulo do controle de constitucionalidade passou por diversas e significativas mudanças, até chegar à sua atual conformação, resultando numa combinação de elementos de controle difuso com outros de controle concentrado.

Num primeiro momento, o da Constituição de 1824, não tivemos qualquer controle de constitucionalidade. Como preleciona Gustavo Binenbojm [13], sob o influxo do ideário francês de rígida separação entre os poderes, a Carta Imperial não contemplou qualquer sistema de controle judicial da constitucionalidade das leis. Em seu art. 15, nºs 8º e 9º, a Carta Imperial outorgava ao Poder Legislativo a atribuição de fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, bem como, velar na guarda da Constituição. Nesse termos, parecia chancelar, neste momento histórico, não somente uma supremacia do Legislativo sobre os outros Poderes, fundada na idéia rousseauniana de lei como "expressão da vontade geral", mas, também, uma proeminência do Parlamento sobre a própria Constituição. A existência do Poder Moderador, conferido ao Monarca, longe de atenuar, antes agravava ainda mais, o despretígio institucional da Lei Maior. [14]

Em razão da forte influência do direito norte-americano no constitucionalismo republicano nacional, a Constituição de 1891 introduziu no país o controle judicial difuso de constitucionalidade. A raiz do chamado controle difuso data famoso julgamento do caso Marbury x Madison nos EUA (1803), quando a Suprema Corte deste país proclamou solenemente a superioridade hierárquica da Constituição sobre as demais lei e do conseqüente poder dos juízes e tribunais de não aplicar normas infraconstitucionais contrárias à Lei Maior.

Este controle difuso foi aperfeiçoado pela Constituição de 1934 ao prever a competência do Senado Federal para suspender, no todo ou em parte, a execução do ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, dando-se, assim, efeitos erga omnes a tais decisões.

Após a fase autoritária do Estado Novo, a Constituição de 1946 inovou o nosso sistema de controle de constitucionalidade, restaurando o controle difuso, então eclipsado no Getulismo, e introduziu-se no país a chamada representação interventiva, que permitia a arguição, pelo Procurador-Geral da República, da incompatibilidade de ato normativo estadual com os então denominados princípios constitucionais sensíveis. Tinha-se então o embrião do controle concentrado, posto que tal mecanismo possibilitava um certo controle abstrato de normas, desvinculado da instauração de uma lide concreta.

Contudo, o advento efetivo do controle concentrado de normas federais e estaduais no Brasil somente ocorreu com a Emenda Constitucional nº 16/65, em plena ditadura militar, a partir do embrião da representação interventiva, que modificou o art. 124, inciso III da Constituição de 1946.

A Constituição de 1967, quase que inteiramente modificada pela Emenda nº 01/69, manteve a combinação dos sistemas difuso-incidental e concentrado-abstrato em seu texto. Neste novo contexto, como observa Gilmar Ferreira Mendes [15], o controle abstrato de normar desempenhava uma função corretiva, na medida em que, mediante decisão direta e definitiva do Supremo Tribunal Federal, permitia superar a situação de insegurança jurídica e corrigir determinadas injustiças decorrentes da multiplicidade e da contrariedade dos julgados proferidos pelos diferentes juízes sobre a mesma matéria.

Com a promulgação da Constituição de 1988 assiste-se a consolidação de um complexo sistema de controle jurisdicional de constitucionalidade, com a continuidade da conjugação dos sistemas difuso e concentrado, como se pode reconhecer a seguir.

Primeiramente, ocorreu uma desmonopolização da legitimação para desencadeamento do controle abstrato, antes centrado na pessoa do Procurador-Geral da República. Como acentua Luís Roberto Barroso [16], "o florescente desenvolvimento da jurisdição constitucional no Brasil se deveu, substancialmente, à ampliação da legitimação ativa para propositura da ação direta de inconstitucionalidade".

Novos atores são admitidos nos termos do art. 103 do Texto Constitucional. E, assim, poder propor a ação de inconstitucionalidade: I – o Presidente da República; II – a mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a mesa de Assembléia Legislativa; V – o Governador de Estado; VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Outra inovação da Constituição Federal foi a instituição de mecanismos de controle contra as chamadas "omissões legislativas". Para as omissões "concretas" institui-se o Mandado de Injunção (art. 5º, LXXI). Para o controle abstrato, por seu turno, a Carta de 88 previu, na esteira do constitucionalismo português e espanhol, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (art. 103, § 2º), nos seguintes termos:

"Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias."

Em face do exposto pode-se afirmar que, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o controle de constitucionalidade no Brasil foi objeto de significativo aperfeiçoamento, com a introdução de medidas e institutos destinadas a prover uma maior defesa do Texto Constitucional.

Como acentua Ivo Dantas [17], a criação de novos institutos (ex: Inconstitucionalidade por Omissão), as novas atribuições que foram conferidas pela Constituição ao Supremo Tribunal Federal como decorrência das novéis ações e a amplitude da Legitimação Ativa para a proposição da ADIN, explicam a freqüência com que, a partir de 1988, tem sido proposto, junto àquele pretório, grande número de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, isto sem falarmos nas possibilidades de que, por via de Controle Incidental, principalmente no tocante aos Direitos e Garantias Individuais e Sociais, inúmeras questões sejam submetidas à apreciação dos Tribunais e do Supremo Tribunal Federal, através de Recurso Extraordinário.

Com a edição da Emenda Constitucional nº 03, de 17 de março de 1993, acresceu-se ao sistema brasileiro de controle de constitucionalidade a Ação Declaratória de Constitucionalidade, alterando-se o art. 102, inciso I, alínea a do Texto Constitucional.

Desde então, "as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo"(CF, art. 102, inciso III, § 2º). Procedeu-se, ademais, quanto a esta ação, à redução da legitimação ativa, nos seguintes termos: "A ação declaratória de constitucionalidade poderá ser proposta pelo Presidente da República, pela Mesa do Senado Federal, pela Mesa da Câmara dos Deputados ou pelo Procurador-Geral da República" (CF, art. 103, § 4º). Também pela via desta Emenda instituiu-se no art. 102, § 1º da Carta Magna um novo instituto, denominado de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Tal instituto foi posteriormente regulamentado pela Lei nº 9.882/99.

Como observa o constitucionalista Ivo Dantas [18], a introdução da Ação Declaratória de Constitucionalidade no ordenamento jurídico nacional provocou, de imediato, reações as mais variadas, algumas defendendo sua criação e oportunidade, enquanto outras indicavam-se vício de inconstitucionalidade.

Entres as inconstitucionalidade apontadas, maior parte referente à polêmica eficácia vinculante introduzida por este novel instrumento, e tão bem destacados por Ana Maria Scartezzini [19] destaquem-se a ofensa ao princípio do contraditório e da dupla instância (CF, art. 5º, LVI), a ofensa ao direito de acesso ao Judiciário (CF, art. 5º, XXXV) e o comprometimento do controle incidental ou difuso de constitucionalidade.

A par deste complexo sistema de controle da Constituição pela via jurisdicional, tem-se observado um agudo desenvolvimento do sentimento constitucional no país, segundo expressão cunhada por Pablo Luca Verdu. Neste sentido, observa Luís Roberto Barroso [20] que "trata-se ainda de um sentimento tímido, mas real e sincero, de maior respeito e até um certo carinho pela Lei Maior, a despeito da volubilidade de seu texto". E arremata: "Superamos a crônica indiferença que, historicamente, se manteve em relação à Constituição. E para os que sabem, é a indiferença, não o ódio, o contrário do amor."

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Sobre o autor
Robertônio Santos Pessoa

professor de Direito Administrativo da UFPI, membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, mestre em Direito pela USP, doutorando em Direito Administrativo pela UFPE, especialista em Direito Comparado pela Faculté des Affaires Internacionales du Havre (França)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PESSOA, Robertônio Santos. Controle de constitucionalidade: jurídico-político ou político-jurídico?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 56, 1 abr. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2882. Acesso em: 28 mar. 2024.

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