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Alienação parental

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28/10/2014 às 09:16
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5  O FALSO ABUSO

É um absurdo o alienador implantar a falsa ideia no filho de que ele teria sido abusado sexualmente pelo seu outro genitor (alienante). Esta falsa acusação traz danos irreparáveis na criança, tão graves como as consequências de um abuso real, conforme explana Andréia Calçada[16] (2008):

 “Em função do imaginário infantil e do que os psicólogos chamam de verdade psíquica para a criança; as consequências de uma falsa acusação de abuso sexual deixam marcas tão cruéis e graves quanto à de um abuso real. As crianças ficam sujeitas a apresentar algum tipo de patologia grave, nas esferas afetiva, psicológica e sexual, pois vivenciam um conflito interno nessa relação triangular de pai, mãe e filho.”

As inúmeras jurisprudências sobre o assunto já demonstram que a Justiça está cada vez mais a par deste distúrbio que precisa ser tratado e reprimido, como exemplifica a decisão proferida pelo TJ do Rio Grande do Sul que negou provimento do agravo abaixo:

Nº 70015224140 – AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESA. MARIA BERENICE DIAS - Presidente Comarca de Porto Alegre.EMENTA: DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. ABUSOSEXUAL. SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL. Estando as visitas do genitor à filha sendo realizadas junto a serviço especializado, não há justificativa para que se proceda a destituição do poder familiar. A denúncia de abuso sexual levada a efeito pela genitora, não está evidenciada, havendo a possibilidade de se estar frente à hipótese da chamada síndrome da alienação parental. Negado provimento.


6  SEQUELAS

Quando o juramento feito diante do altar perde o sentido, e o amor entre o casal deixa de existir, pelo menos na forma marital, entra em cena um novo cenário, que envolve os mesmos atores, mas numa dramatização totalmente diversa: a certidão de casamento é substituída pela ata de  partilha de bens e de guarda dos filhos menores oriundo da união outrora celebrada.

A Síndrome de Alienação Parental produz diversas consequências nefastas, tanto em relação ao cônjuge alienado como para o próprio alienador, mas os efeitos mais dramáticos recaem sobre os filhos. 

A criança vai “ingerindo” tudo o que o alienador diz, e perderá a admiração e o respeito pelo genitor alienante, desenvolvendo temor e raiva do genitor. Com o tempo, a criança não conseguirá discernir realidade e fantasia e manipulação e acabará acreditando em tudo e, consciente ou inconscientemente, passará a colaborar com essa finalidade, situação altamente destrutiva para ela e, talvez, neste caso especifico de rejeição, ainda maior para o pai.

De acordo com IBDFAM[17] (Instituto Brasileiro de Direito de Família), as consequências de uma criança submetida à alienação parental são drásticas e corrompem todo o seu futuro, quando na condição de adulto. Dentre as mais frequentes características apontadas num estudo cientifico realizado a respeito, merecem destaque as que seguem de acordo com o referido Instituto:

a) Isolamento-retirada: A criança se isola do que a rodeia, e centra-se nela mesma, não fala com quase ninguém e se o faz, é de forma muito concisa, preferindo estar sozinha no seu quarto, em vez de brincar com outras crianças, mormente se filho único, perdendo o único outro referencial e passando a viver somente com o pai ou com a mãe, sentindo-se literalmente sozinha e abandonada, abandono e vazio a que nos referimos que não pode ser suprido por qualquer figura senão a dos próprios pais.

b) Baixo rendimento escolar: Por vezes associado a uma fobia à escola e à ansiedade da separação - a criança não quer ir à escola, não presta atenção nas aulas, mas também não incomoda os seus companheiros, não faz os deveres com atenção, apenas quer sair de casa, a apatia que mostra relativamente às tarefas que não são do seu agrado alarga-se a outras áreas, e isto é detectado a posteriori, não de imediato, mormente quando na fase das visitações.

c) Depressão, melancolia e angústia: Em diferentes graus, mas em 100% dos casos ocorre e infelizmente é recorrente.

d) Fugas e rebeldia: Produzem-se para ir procurar o membro do casal não presente, por vezes para que se compadeça do seu estado de desamparo e regresse ao lar ou pensando que será mais feliz ao lado do outro progenitor.

e) Regressões: Comporta-se com uma idade mental inferior à sua, chama a atenção, perde limites, perde o ‘referencial’, e mesmo pode regredir como ‘defesa psicológica’ em que a criança trata de ‘retornar’ a uma época em que não existia o conflito atual, e que recorda como feliz.

f) Negação e conduta antissocial: ocorrem em simultâneo - por um lado a criança, (e mesmo as mães quando em processo de separação ou recém separadas, o que pode levar até mais de 5 anos para “superar em parte”) nega o que está a ocorrer (nega que os seus pais se tenham separado apesar da situação lhe ter sido explicada em diversas ocasiões e finge compreender e assimilar e mesmo negar e ignorar, mas internaliza), e, por outro lado sente consciente ou inconscientemente que os seus pais lhe causaram dano, o que lhe dá o direito de o fazer também, provocando uma conduta anti-social.

g) Culpa: Por mais de 75% das vezes, a criança se sente culpada, hoje ou amanhã, em regra mais tarde, pela situação, e pensa que esta ocorre por sua causa, pelo seu mau comportamento, pelo seu baixo rendimento escolar, algo cometido, e pode chegar mesmo a se autocastigar como forma de autodirigir a hostilidade que sente contra os seus pais, inconscientemente.


7  PROCESSO

Além da definição do ato de alienação parental, dos sujeitos envolvidos em sua prática e dos direitos fundamentais eventualmente violados, a Lei 12.318/10 trouxe regras sobre a instrumentalização processual do instituto.

O Art. 4° do supracitado diploma admite que o juiz declare indício de ato de alienação parental, o que poderá fazer de ofício ou mediante provocação, em ação autônoma ou incidentalmente.

A declaração de indício de ato de alienação parental gerará tramitação prioritária do feito, e após a audiência do Ministério Público o juiz determinará, com urgência, medidas provisórias necessárias à preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, materializando a efetiva reaproximação da pessoa em desenvolvimento com o pai ou a mãe em relação ao qual esteja se operando a síndrome de alienação.

O ato declaratório de indício de alienação parental opera-se, pois, em cognição sumária, devendo haver a demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora, para que se torne possível a designação de medidas urgentes de reaproximação da criança os adolescente com o pai ou mãe em relação ao qual esteja havendo a prática de embaraço ao exercício do poder familiar.

Dentre as medidas possíveis, destaca-se o parágrafo único do Art. 4° da Lei 12.318/10, que assegura à criança ou adolescente e à mãe ou pai alienado a garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.


8  LAUDO PSICOLÓGICO OU BIOPSICOSSOCIAL

Superada a situação de urgência, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial, conforme o que dispõe o art. 5° da lei em análise. O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra o genitor.

A perícia deverá ser realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitado, exigida, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

O laudo pericial deverá ser apresentado em até 90 dias, prazo esse que só pode ser prorrogado mediante autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.

Ademais, Roberta Palermo, diz que psicólogos, terapeutas, psiquiatras, advogados, conselhos tutelares e juízes – responsáveis pelas decisões finais nos processos que acabam nos fóruns de família – agora são capazes de conduzir o assunto com muito mais critério, conforme destacado abaixo:

“A divulgação do tema alertou famílias e, principalmente, especialistas que lidam com os casos de abuso emocional em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços afetivos com o outro cônjuge depois da separação”.

Os nossos tribunais têm inibindo a prática de alienação parental, conforme o acórdão proferido pelo TJ do Rio de Janeiro, ilustrado abaixo:

“0060322-35.2010.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 1ª Ementa. DES. MARIA AUGUSTA VAZ - Julgamento: 29/03/2011 - PRIMEIRA CAMARA CIVEL ANTECIPAÇÃO DE TUTELA INDEFERIDA EM AÇÃO REVISÓRIA DE VISITAÇÃO PATERNA. ESTUDO SOCIAL QUE RECOMENDA A MANUTENÇÃO DA PRESENÇA DO PAI. SÚMULA 59 DO TJRJ. Ao contrário de ter ojeriza à companhia do pai, como afirma sua mãe, a agravante deseja sua presença mais ostensiva, dedicada e comprometida. Como posto pelo MP, aparenta tratar-se de hipótese de alienação parental, na qual o afastamento do pai, logo em sede de antecipação de tutela, pode acarretar mais danos do que benefícios. Além disso, a decisão atacada determinou a realização de estudo e acompanhamento psicológico do caso, reservando-se à eventual revisão do que foi determinado em sede antecipatória de tutela. Ocorre, ainda, que a decisão que concedeu liminarmente a tutela pleiteada não é teratológica, contrária à prova dos autos ou à lei, de modo que, nos termos do artigo 59 do TJRJ, merece prosperar. Recurso a que se nega provimento. Íntegra do Acórdão - Data de Julgamento: 29/03/2011.”

Não restam dúvidas de que o trabalho dos operadores da Justiça, tem colocado em prática o que dispõe a lei 12.318/2010, como verificado no julgado acima houve a realização da perícia, a qual é prevista na lei que rege o tema ora trabalhado.


9  SANÇÕES

Descoberta a presença da Síndrome da Alienação Parental, é indispensável à punição do genitor que age desta forma por ser sabedor da dificuldade de aferir a veracidade dos fatos e usa o filho com finalidade vingativa. Mesmo que sinta que há risco, por exemplo, de perda da guarda, caso reste evidenciada a falsidade da denúncia levada a efeito. Sem haver punição a posturas que comprometem o sadio desenvolvimento do filho e colocam em risco seu equilíbrio emocional, certamente continuará aumentando esta onda de atrocidades levadas a efeito de forma irresponsável.

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Quem pratica a alienação parental, esta sujeito a sanções encontradas na lei 12.318/2010, onde após a percepção do genitor alienado, este entra com uma ação na vara da família, e rapidamente faz com que o juiz tome medidas de urgência ou então cautelatória para proteger o menor.

A Lei nº 12.318[18] estabelece, em seu artigo 6º, sanções ao alienador, que poderão ser impostas de pronto pelo juiz, sem prejuízo da posterior responsabilização civil e criminal, tais como:

“Art. 6º  Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: 

I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; 

II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; 

III - estipular multa ao alienador;

IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; 

V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; 

VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; 

VII - declarar a suspensão da autoridade parental. 

Não há dúvidas que a alienação parental gera dano moral, tanto ao menor quanto ao genitor alienado, sendo ambos, titulares deste direito.

Assim, os incisos do art. 6º da Lei de Alienação Parental são numerus apertus, ou seja, trata-se de um rol exemplificativo de medidas, não esgotando, de forma alguma, outras que permitam o fim ou diminuição dos efeitos da Alienação Parental.

Além da lei que rege o assunto ora estudado, outros dispositivos regulamentam as sanções aplicadas no genitor que pratica a alienação em seu filho. O Código Civil[19], em seus artigos 1.637, caput e 1.638, IV, abaixo transcritos, elencam hipóteses em que pode haver a suspensão ou destituição do poder familiar:

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:(...)

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

Tais medidas devem ser aplicadas o mais rápido possível, quando da primeira percepção de hipótese de alienação parental por parte do juiz ou dos profissionais que acompanham o caso concreto, de forma a evitar que as consequências dos atos de genitor alienante se alastrem de forma irreparável.

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Sobre a autora
Rhayne Kerllen Pereira Vieira

Advogada inscrita na OAB-GO. Pós graduada em Direito Civil e Código de Processo Civil de 2015.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, Rhayne Kerllen Pereira. Alienação parental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4136, 28 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29822. Acesso em: 19 abr. 2024.

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