Conclusões
Como já foi dito, a ideia do poder normativo da Justiça do Trabalho possui inconteste influência fascista, corporativista, que, com o pretexto de proteger as classes sociais, impedia a ação coletiva, o conflito real entre capital e trabalho. A própria Justiça do Trabalho vinha servindo como uma alternativa ora à proibição da greve ora à sua própria insuficiência.
O paternalismo estatal, ainda que com um discurso protetor, pode acabar por desestimular as formas extrajudiciais de composição dos conflitos de trabalho, pois convém tanto ao Estado corporativo como a um sindicato enfraquecido buscar a solução para as controvérsias oriundas da relação de trabalho no seio do próprio Estado.
Sabendo que o direito do trabalho foi fruto de lutas de classes, de grandes sacrifícios e resistência, chega a ser paradoxal que justamente na relação laboral é que se aceita a interferência normativa do Poder Judiciário nas relações privadas. Um Poder Judiciário que, mesmo com boas e justas intenções de seus membros, não seria o órgão mais preparado para conhecer efetivamente dos meandros do conflito coletivo e da realidade enfrentada por cada categoria envolvida.
É verdade que não poderia o Estado distanciar-se por completo das relações de trabalho, ao menos no que se refere ao Brasil, como pretende os defensores de um movimento flexibilizador, muitas vezes inclinado à precarização do trabalho e ao abandono do trabalhador. O total absenteísmo estatal não é a solução para a crise de desemprego e subemprego. Mecanismos tais funcionam muito bem no início, como remédios que somente alcançam os sintomas. O desemprego tem se mostrado um problema significativamente estrutural, de modo que medidas rápidas e paliativas somente escondem a necessidade de uma ação complexa.
Tal constatação, que o Estado não se deve afastar-se por completo, pode estar presente no próprio efeito da negociação coletiva, que não é instrumento apenas de avanço protetivo dos trabalhadores, tendo em vista a possibilidade constitucional e legal de ela ser instrumento também de redução de direitos, com o objetivo verídico ou não de diminuir custos e possibilitar a transposição dos períodos de crise que ameaçam a continuidade da atividade empresarial e os postos de trabalho.
Assim, pode-se dizer que a nova redação do § 2º do artigo 114 da Constituição Federal que condicionou o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica ao comum acordo dos entes coletivos envolvidos não encerra nenhuma inconstitucionalidade. A inafastabilidade da jurisdição não alcança o poder normativo da Justiça do Trabalho, poder este que foge à função típica do Poder Judiciário e relativiza sobremaneira a separação dos poderes.
Do exposto, ressalte-se que é perfeitamente possível que se exija comum acordo para a instauração do dissídio coletivo, mas de se ressaltar igualmente que o rigor deve ser abrandado pela aceitação de que o acordo possa ser tácito, manifestado durante o curso do dissídio coletivo, em razão da não-oposição expressa da parte adversária.
O intuito inequívoco da reforma constitucional foi o de extinguir o Poder Normativo da Justiça do Trabalho, alçando tal órgão jurisdicional a mais uma espécie de arbitragem, a judicial, à semelhança do que já ocorre no seio privado.
Recusando-se as partes a chegar a um desfecho promissor ao cabo da negociação coletiva, e não se optando por instaurar o dissídio, não restará outra saída que não seja a greve. Para isto, os sindicatos necessitam ser fortes, sob pena de tornar uma boa intenção (fortalecimento da negociação coletiva, dos sindicatos e supressão do corporativismo) em mera demagogia incutida pelo poder econômico e aceita ingenuamente pelo proletariado.
Referências
BARROSO, Fábio Túlio. Neocorporativismo e concertação social. Análise político-jurídica das atuais relações coletivas de trabalho no Brasil. Recife: Editora Universitária UFPE, 2010.
LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Liberdade sindical: percursos e desafios na história constitucional brasileira. São Paulo: LTr, 2011.
MELO, Raimundo Simão de. Processo Coletivo do Trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 2011.
MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3 ed. São Paulo: LTr, 2011.
Jurisprudência: http://www.jusbrasil.com
Jurisprudência: http://www.tst.jus.br/
Notas
[1] Este intervencionismo estatal acabou por dar origem tanto ao direito do trabalho como à Justiça laboral, criações essas que, sob o manto do princípio protetor, difundiram o estereótipo de certa parcialidade direcionada aos interesses simplesmente dos trabalhadores. O Estado, valendo-se da elaboração de leis reguladoras das relações de trabalho, acabou reduzindo significativamente as formas autônomas de solução dos conflitos.
[2] MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3 ed. São Paulo: LTr, 2011, p. 165.
[3] Em sentido contrário, Melo, Greve, para quem é cabível suprimento judicial da vontade do réu/suscitado. MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3 ed. São Paulo: LTr, 2011, p. 168.
[4] Notícias do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/3900147>. Acesso em 29.05.2013.
[5] Disponível em: http://tst.jusbrasil.com/jurisprudencia/1373719/recurso-ordinario-em-dissidio-coletivo-rodc-219007420065120000-21900-7420065120000. Acesso em: 30.05.2013.
[6] Disponível em: http://tst.jusbrasil.com/jurisprudencia/1471104/dissidio-coletivo-dc-1659416952006500-1659416-9520065000000>. Acesso em 30.05.2013.