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Comentários às alterações no crime de descaminho (Lei nº 13.008, de 26 junho de 2014)

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01/07/2014 às 15:45
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9. Preceito penal secundário

- A forma simples pena é de reclusão, de um a quatro anos.

- Nos crimes equiparados (§ 1o, incisos I, II, III e IV) a pena é a mesma.

- Na forma qualificada (se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial), a pena será de reclusão, de dois a oito anos.

9.1. Possibilidade de suspensão condicional do processo

Na forma simples e equiparada é possível a suspensão condicional do processo, eis que a pena mínima cominada é igual a 1 ano; portanto, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena.

Na forma qualificada (§ 3o), não é juridicamente possível a suspensão condicional do processo, eis que a pena mínima cominada é superior a 1 ano.

9.2. Possibilidade de transação penal

Não é possível a transação penal, visto tratar-se de modalidade em que a pena máxima é superior a 2 (dois) anos; entretanto, a Lei nº 11.313/2006 tornou possível a aplicação dos institutos do juizado especial criminal nos crimes de menor potencial ofensivo conexos ao rito comum, dispondo no parágrafo único do artigo 69 da Lei 9.099/95 que:

Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.

9.3. Análise da possibilidade de concessão da fiança extrajudicial e judicial

a) Fiança extrajudicial:

Na forma simples (caput) e na equiparada (§ 1o), não estando presente nenhuma das hipóteses previstas nos incisos I e IV do novo artigo 324 do Código de Processo Penal, é possível a autoridade policial arbitrar a fiança, pois o delito que tem pena máxima de prisão não superior a quatro anos.

- Na forma qualificada (§ 3o: se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial), há óbice na concessão na fiança pela autoridade policial, vez que a pena máxima é superior a 04 anos.

b) Fiança judicial:

Na forma simples (caput) e na equiparada (§ 1o), recusando-se ou retardando a autoridade policial a concessão da fiança, esta pode ser requerida, perante o juiz competente, que decidirá em quarenta e oito horas.

- Na forma qualificada (§ 3o), é possível a autoridade judicial conceder a fiança, exceto aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 do Código de Processo Penal.

9.4. Possibilidade de decretação da prisão preventiva

Na forma simples (caput) e na equiparada (§ 1o) o crime de descaminho é punido com pena máxima que não excede quatro anos; portanto, só será possível a decretação da prisão preventiva, presentes os requisitos infracitados:

a) tiver sido o indiciado ou acusado, condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no artigo 64, inciso I, do Código Penal.

b) presença dos requisitos previstos nos novos artigos 311 e 312 do Código de Processo Penal;

c) se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

d) se houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la.

A reforma processual penal ainda permite duas formas de prisão preventiva ao presente delito, quais sejam:

a) O quebramento injustificável da fiança importará na perda de metade do seu valor, cabendo ao juiz decidir sobre a imposição de outras medidas cautelares ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva.

b) No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas nas medidas cautelares, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva.

Na forma qualificada (§ 3o) o crime de descaminho é punido com pena máxima superior a quatro anos; portanto, atendidos os requisitos previstos nos novos artigos 311 e 312 do Código de Processo Penal, é possível a decretação da prisão preventiva.

9.4.1. Possibilidade de decretação da prisão temporária

Não é possível a prisão temporária no crime em estudo, pois o mesmo não foi elencado no artigo 1º, inciso III, da Lei nº 7.960/1989.

9.5. Análise da possibilidade de substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar

No delito em estudo, na forma do novo artigo 318 do Código de Processo Penal, poderá o juiz substituir a prisão preventiva, pela domiciliar, nas seguintes hipóteses:

I - pessoa maior de 80 (oitenta) anos;

II - extremamente debilitado por motivo de doença grave;

III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;

IV - gestante a partir do sétimo mês de gravidez ou sendo esta de alto risco.

Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste item.

A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.

9.6. Análise da possibilidade da decretação de medidas cautelares diversas da prisão

Quando não couber prisão preventiva, o juiz poderá decretar as medidas cautelares previstas no novo artigo 319 do Código de Processo Penal.

9.7. Possibilidade de concessão da liberdade provisória

Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no novo art. 319 e observados os critérios constantes do novo art. 282, todos do Código de Processo Penal.

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9.8. Do regime inicial de cumprimento de pena

No crime em comento, o regime inicial de cumprimento de pena, em regra, será inicialmente aberto ou semiaberto, dependendo da pena aplicada.

9.9. Da progressão de regime

Na progressão de regime no crime em estudo, a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

Há ainda uma segunda condição para o deferimento da progressão de regime, pois o crime em estudo se encontra dentro do título XI do Código Penal, (dos crimes contra a Administração Pública), portanto, o condenado por crime contra a Administração Pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.


10. Sujeito ativo do delito de descaminho

Qualquer pessoa pode figurar como agente do delito. A eventual participação de funcionário público, transgredindo dever de ofício, importará o reconhecimento de delito autônomo, ou seja, o crime de facilitação de descaminho, previsto no art. 318.


11. Sujeito passivo do delito de descaminho

O sujeito passivo do delito é o Estado.


12. Do procedimento

O procedimento será o comum ordinário (arts. 395 usque 405 do CPP), uma vez que a pena máxima aplicada é igual a quatro anos na forma simples e equiparada e superior a quatro anos na forma qualificada.


13. Da competência

A competência para processar e julgar o crime de corrupção ativa é do Juízo singular na Justiça Federal.

13.1. Competência: local da apreensão dos bens versus o local da consumado

STJ: A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido da aplicação do Verbete Sumular nº 151 do Superior Tribunal de Justiça, fixando a competência para o processo e julgamento por crime de descaminho pelo lugar da apreensão dos bens, ainda que as investigações preliminares indiquem que o crime tenha se consumado em outro local. (Conflito de Competência nº 119247/SP (2011/0237473-4), 3ª Seção do STJ, Rel. Laurita Vaz. j. 25.04.2012, unânime, DJe 14.05.2012).

Súmula 151 do STJ: A competência para o processo e julgamento por crime de descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens.


14. Classificação doutrinária do tipo penal

O crime de descaminho:

- Não exige qualidade especial do agente ativo, portanto, é comum;

- Formal, não exige um resultado naturalístico, consistente na produção de efetivo dano para Administração.

- É de forma livre, pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente;

- Pode ser praticado por apenas uma pessoa, portanto, é unissubjetivo;

- Tanto pode ser unissubsistente (praticado num único ato) ou plurissubsistente (em geral, vários atos integram a conduta), dependendo do caso concreto;

- Comissivo (os verbos implicam ações), na forma “importar” e “exportar”, bem como comissivo ou omissivo (implicando abstenção) na modalidade “iludir o pagamento”, conforme o caso concreto. e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, art. 13, § 2º, do CP);

- Admite tentativa na forma plurissubsistente.

- Não admite tentativa na forma habitual. (Vide nos incisos I e II, a expressão “no exercício de atividade comercial ou industrial”).

- Transeunte (modalidade de crime que não deixa vestígios). 

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Sobre o autor
Francisco Dirceu Barros

Procurador Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral durante 18 anos, Mestre em Direito, Especialista em Direito Penal e Processo Penal, ex-Professor universitário, Professor da EJE (Escola Judiciária Eleitoral) no curso de pós-graduação em Direito Eleitoral, Professor de dois cursos de pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal, com vasta experiência em cursos preparatórios aos concursos do Ministério Público e Magistratura, lecionando as disciplinas de Direito Eleitoral, Direito Penal, Processo Penal, Legislação Especial e Direito Constitucional. Ex-comentarista da Rádio Justiça – STF, Colunista da Revista Prática Consulex, seção “Casos Práticos”. Colunista do Bloq AD (Atualidades do Direito). Membro do CNPG (Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público). Colaborador da Revista Jurídica Jus Navigandi. Colaborador da Revista Jurídica Jus Brasil. Colaborador da Revista Síntese de Penal e Processo Penal. Autor de diversos artigos em revistas especializadas. Escritor com 70 (setenta) livros lançados, entre eles: Direito Eleitoral, 14ª edição, Editora Método. Direito Penal - Parte Geral, prefácio: Fernando da Costa Tourinho Filho. Direito Penal – Parte Especial, prefácios de José Henrique Pierangeli, Rogério Greco e Júlio Fabbrini Mirabete. Direito Penal Interpretado pelo STF/STJ, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Recursos Eleitorais, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Direito Eleitoral Criminal, 1ª Edição, Tomos I e II. Editora Juruá, Manual do Júri-Teoria e Prática, 4ª Edição, Editora JH Mizuno. Manual de Prática Eleitoral, Editora JH Mizuno, Tratado Doutrinário de Direito Penal, Editora JH Mizuno. Participou da coordenação do livro “Acordo de Não Persecução Penal”, editora Juspodivm.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Francisco Dirceu. Comentários às alterações no crime de descaminho (Lei nº 13.008, de 26 junho de 2014). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4017, 1 jul. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29903. Acesso em: 24 abr. 2024.

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