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O e-mail como prova no Direito

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9.Do e-mail como prova no direito internacional

No direito internacional, a Lei modelo da UNCITRAL sobre comércio eletrônico (Resolução 51/162 da Assembléia Geral Das Nações Unidas – ONU – Nova York, de 16 de dezembro de 1996) tem servido de parâmetro para muitos países regulamentarem o comércio eletrônico. No que interessa à presente matéria, Ângela Brasil (in O documento físico e o documento eletrônico) anota:

"A UNCITRAL estabelece que para que o documento eletrônico tenha o mesmo valor probatório dos documentos escritos é preciso que eles tragam o mesmo grau de segurança contido nestes, sendo que para que isto aconteça é necessário o uso de recurso técnicos, que logo vemos que se trata do método cifrado.

"Diz a Comissão que para que o documento virtual tenham a mesma função e considerada como documento escrito, tal qual o documento convencional é preciso que ela fique disponível para consultas posteriores, sendo que o objetivo desta norma é a possibilidade de reprodução e leitura ulterior.

"Para o reconhecimento da assinatura no documento eletrônico a UNCITRAL prescreve que ela deve estar de modo a identificar a pessoa por algum método, e é obvio que esse método a que se refere é a Criptografia, pois é a única forma segura de garantir a autenticidade do assinante. Vários países já adotaram o modelo da UNCITRAL, como os Estados Unidos, a Alemanha, a França, a Argentina, Colômbia e outros que estão ultimando as suas legislações. O Brasil, ainda que seja um dos países que mais utiliza a Internet, ainda não tomou a iniciativa de legislar sobre o assunto.

"Reconhecemos que no documento eletrônico não há como distinguir o original da cópia e para contornar este óbice, a regra da Comissão afirma que um documento eletrônico será original quando houver a garantia de que ele chegou íntegro ao destinatário e aqui da mesma forma, temos o problema da segurança. Aliás esta é a chave para resolver a grande maioria das questões cibernéticas e o passo que está faltando para que as questões jurídicas, no seu passo, também sejam solucionadas."

Nos Estados Unidos, diversos Estados-federados vem promulgando leis para o reconhecimento jurídico das assinaturas eletrônicas. Conferindo, assim, validade jurídica às certificações eletrônicas no respectivo território. Entretanto o clima à nível nacional ainda é de indefinição, pois esses instrumentos normativos não indicam qual sistema irá prevalecer (não há uma uniformização nacional dos instrumentos normativos relativos ao comércio eletrônico ou se as entidades certificadoras serão privadas, públicas ou mistas).

Na Europa, há a Diretiva Européia 1999/93/CE, de 13 de dezembro de 1999, que trata, especificamente, das assinaturas eletrônicas e de seu reconhecimento legal e processual, inclusive como meio de prova. Tal documento admite a existência de instituições privadas autenticadoras habilitadas junto ao respectivo Estado-Membro da Comunidade Européia.

Conforme Gozalez, o Ante-Projeto de Lei Uniforme que vem sendo desenvolvido por grupo de trabalho para a Organização dos Estados Americanos baseia-se nos seguintes instrumentos normativos:

a) na Lei Modelo da UNCITRAL;

b) na Diretiva Européia 1999/93/CE e seus Anexos;

c) em alguns princípios constantes da Inter-American Convention on the Law Applicable to International Contracts, particularmente com referência à autonomia das partes.


10.Dos casos polêmicos

A fim de ilustrar o ponto a questão se encontra no Brasil, relata-se a seguir dois casos polêmicos, para os quais, ressalva-se, não se encontrou decisões judiciais em pesquisas realizadas pela internet:

a) Delfina Maria Figueira de Mello Nevares e Reginaldo de Castro; e

b) estudante anônima e ex-colega de colégio.

10.1Do caso Delfina Figueira de Mello Nevares versus Reginaldo de Castro

O caso entre esses dois advogados, que resultou em ação judicial no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ/DF), foi noticiado pela imprensa brasileira em duas matérias de Heitor Shimizu para a revista Época On-line, com os seguintes títulos: "Roupa suja na rede" e "O e-mail da discórdia - Tribunal proíbe internauta de enviar mensagens a ex-marido e exige que provedor faça a censura".

Na primeira reportagem, mais curta, o profissional relata:

"Delfina de Mello Nevares teria enviado um e-mail a diversas pessoas acusando o ex-marido de subornar autoridades. Ela não dá entrevistas nem se deixa fotografar.

"Reginaldo de Castro, o ex-marido, nega as acusações e pediu à Justiça a censura dos e-mails enviados por Delfina" (Shimizu).

Na segunda, mais longa, Heitor Shimizu explica a origem do embate e o desenrolar da questão no Poder Judiciário: a) Delfina Nevares teria enviado mensagens de conteúdo calunioso, em março de 1997, à Reginaldo de Castro, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); b) o TJ/DF proibiu a dvogada de enviar e-mails e determinou a censura, pelo provedor Zaz Brasília, dos que forem enviados; c) Delfina Nevares, negou as acusações e "entrou com um mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por entender que a sentença do TJ agride seu direito ao sigilo de correspondências, garantido pela Constituição", sustentando, ainda, que: "o e-mail, legalmente, não pode ser considerado documento e, portanto, não pode ser usado como prova [grifo nosso]. ´Um e-mail é apenas um monte de bits digitais que pode ser facilmente interceptado e adulterado em seu curso´"; d) a Associação Brasileira dos Provedores de Internet (Abranet) manifestou-se no sentido de que "os provedores não devem censurar o conteúdo das mensagens de seus usuários", mas a decisão judicial deverá cumprida; e) o "provedor usado pela advogada, alega não ter condições técnicas de controlar o conteúdo dos e-mails de seus usuários. ´Nenhum provedor dispõe de formas eficazes de controle de dados e informações transmitidas por meio da rede´"

10.2Do caso Estudante versus Ex-colega do colégio Nossa Senhora Aparecida (SP)

O caso entre esses estudantes foi veiculado na internet (em página de reputada revista nacional – Isto É Dinheiro) com o título "E-mail como prova?" e o seguinte conteúdo:

"Um caso inédito pode ganhar jurisprudência em São Paulo. Depois de ser insultada em e-mails por um ex-colega, uma estudante do colégio Nossa Senhora Aparecida, no bairro de Moema, entrou na Justiça para acabar com a brincadeira de mal-gosto. De acordo com o processo, foram 56 ofensas em três mensagens, entre elas: inútil, espinhuda, "desprezada" e "sem calcinha". A ação pode vingar. As mensagens foram recebidas por outros colegas, o que pode atestar que os textos são originais. Além disso, algumas ofensas partiram de um provedor pago, o que pode confirmar a identidade do autor, que tem 17 anos. A advogada está pedindo R$ 30 mil a título de indenização. Quem pode pagar a conta é o pai do engraçadinho. E o rapaz pode arcar com serviços para a comunidade" (Isto É Dinheiro).

10.3Do caso Microsoft

À título ilustrativo, convém registrar a ocorrência do seguinte episódio em um país da América do Norte em que o e-mail figura como centro de uma questão judicial:

"Nos Estados Unidos, uma das principais armas dos promotores do caso Microsoft, acusada de promover práticas ilegais para prejudicar os concorrentes, são milhares de e-mails enviados e recebidos por funcionários, obtidos por ordem judicial. Vários deles têm como remetente Bill Gates, o mandachuva da Microsoft. Os advogados da empresa alegam que os e-mails não constituem prova legal. Os promotores não concordam. Lembram que mensagens eletrônicas têm importante papel legal há tempos, como no caso Irã-contras, em 1985, em que os e-mails encontrados no computador do coronel Oliver North foram fundamentais para provar que o governo americano vendeu armas ao Irã e usou o dinheiro para financiar guerrilheiros na Nicarágua" (Shimizu).


11.Conclusão

Fruto da evolução do homem, a internet tornou-se um fenômeno social, constituiu-se em uma nova modalidade de se estabelecer uma relação jurídica entre os seres humanos, trouxe o comércio eletrônico, que alcançou níveis significativos da economia mundial na última década (a tendência é de incremento constante das suas operações, inclusive nos países em desenvolvimento como o Brasil) e, com ele, o surgimento contratação eletrônica, que cresce em ritmo progressivo e notório no país. Em decorrência disso, a grande rede e as operações dela advindas necessitam de amparo jurídico para a solução de conflitos que já começam a ganhar proporções consideráveis em face do aumento dos choques de interesses que dela emergem.

O e-mail, o serviço de troca de mensagens digitais da internet, é apenas uma das suas diversas facetas. Por não ficar registrado em papel e não conter assinaturas e ser de fácil alteração (os freqüentes ataques dos hackers e crackers ainda é muito presente, o que demonstra que a criptografia não atingiu o ponto de segurança satisfatória), é controversa a sua utilização como prova no direito.

Como toda inovação, esse serviço de mensagens carece da normatização adequada. Entretanto, ao contrário do que muitos imaginam, a Internet não é um mundo sem leis, já existem algumas regras que a controlam. Incipientes, porém. Urge, pois, a necessidade de uma legislação mais adequada para regular esse instrumento tão útil e prescindível que é o e-mail às modernas sociedades, de forma tal que possa ser utilizado sem prejuízo dos princípios da estabilidade e da ordem social e jurídica. Não só ele, todas as novas tecnologias, sobretudo a internet e todos os seus produtos, não podem mais passar ao largo do direito. É imperioso que o legislador consagre especial atenção às novas formas contratuais que pretendem regê-los, pois as questões judiciais que já se afiguram estão a forçar isso.

Em relação à questão da prova processual, o direito tem que, Igualmente, aprimorar-se. Entretanto, até que isso ocorra, os juizes deverão utilizar-se dos princípios gerais de direito e dos costumes internacionais que paulatinamente se vão fixando para reger as controvérsias oriundas dos contratos internacionais, em conformidade com o que estabelece o art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Alguns avanços já foram realizados, como as conquistas da controvertida Medida Provisória nº 2.200/2001, que criou os mecanismos básicos para a implantação da certificação digital no Brasil. Tal lei, criou uma reserva de mercado que, mantida, impedirá a competitividade e inviabilizará a participação de empresas privadas no setor. A participação do governo é importante, mas com limitação de escopo semelhante às das recém criadas agências reguladoras. Acredita-se, não se deve repetir a experiência da estatização.

Um ponto de partida para qualquer nação que pretenda editar legislação que vise regular as atividades da internet, é o direito comparado. Sem pretender copiar as leis alienígenas, muito podem ser úteis como subsídios. Igualmente importante é a uniformidade com os modelos já consagrados no exterior, como o da UNCITRAL.

Resultado das implicações jurídicas desse novo fenômeno social, que é a internet e seus produtos, sobretudo o e-mail, não se pode excusar de emitir uma opinião sobre o uso do e-mail como prova no direito. Acredita-se que ele pode e deve ser utilizado como instrumento probante, à luz da legislação existente. Entretanto recorrendo-se sempre à perícia que o ateste.

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Glossário

Protocolo é um conjunto de regras pelo qual os computadores se "entendem". Por meio dele, v.g., estabelecem o modo de transmissão e recepção dos dados que trocam entre si.

Provedor de Acesso à Internet "é organização que provê acesso à Internet. Pequenos provedores (ISPs) fornecem o serviço via modem e ISND, ao passo que os grandes provedores também oferecem conexão através de linhas privativas (T1, T1 fracionado, etc.) Os usuários são normalmente obrigados a pagar uma taxa mensal, mas outras podem ser as formas de pagamento. Mediante o pagamento de uma taxa, pode-se criar um site e mantê-lo no servidor do provedor, o que permite que mesmo uma pequena organização possa estar presente na rede com o seu próprio nome de domínio" (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

Servidor "é um computador em uma rede compartilhado por vários usuários. O termo pode se referir a ambos hardware e software ou apenas ao software que realiza o serviço. Por exemplo, Servidor da Rede pode se referir ao software do servidor da rede em um computador que também roda outros aplicativos, ou pode referir-se a um sistema de computador dedicado apenas a rodar o aplicativo do servidor da rede. Deve haver alguns servidores dedicados à rede em um grande site. Harvard Technical Glossary" (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

Roteador (do inglês Router) "é um dispositivo que envia pacotes de informação de uma área local da rede (LAN) ou área longínqua da rede (WAN) para outra. Baseado em tabelas de rotas e protocolos de rotas, os routers lêem o endereço eletrônico de cada mensagem transmitida e decidem como enviá-la de acordo com a melhor rota disponível (tráfego, custo, velocidade, qualidade das linhas, etc.). Harvard Technical Glossary (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

SMTP (do inglês Simple Mail Transfer Protocol) é o protocolo de entrega de e-mails mais antigo e é baseado na arquitetura de rede em que todas as máquinas estão ligadas o tempo todo.


Referências bibliográficas

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Sobre o autor
Esdras Avelino Leitão Júnior

acadêmico de Direito no Instituto Camilo Filho, em Teresina (PI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEITÃO JÚNIOR, Esdras Avelino. O e-mail como prova no Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3025. Acesso em: 18 nov. 2024.

Mais informações

Trabalho apresentado à disciplina Informática Aplicada ao Direito, no curso de bacharelado em Direito do Instituto Camillo Filho.

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