O juiz e o desembargador

23/07/2014 às 12:22
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A prestação dos serviços jurisdicionais só passsará por avanços, passível de credibilidade do cidadão, quando o Judiciário reparar o total descaso no qual os tribunais tem demonstrado para com a Justiça de primeiro grau.

A prestação dos serviços jurisdicionais só passsará por avanços, passível de credibilidade do cidadão, quando o Judiciário reparar o total descaso no qual os tribunais tem demonstrado para com a Justiça de primeiro grau. O Corregedor do CNJ foi muito feliz quando declarou que os “tribunais fazem licitação, compram veículos e móveis, colocam nas sedes dos seus palácios e mandam móveis antigos e carros velhos para a primeira instância, que fica como depósito do Judiciário”.

Após nomeados, os juizes deslocam-se para suas unidades sem saber o que lhes espera. Somente na posse percebem a falta total de infraestrutura no local de trabalho. Muitos até pedem exoneração, face ao desencanto com o ambiente de trabalho e o descuido no qual encontra a comarca. Poderá ter um fórum digno para a missão, mas estará sujeito ao descaso com a falta de servidores ou com a desmotivação na qual esbarra, porque tanto o Tribunal quanto o CNJ só lembram desse patrimônio humano, para exigir números de julgamentos, sem perceber que a função do magistrado não se encerra por aí, pois as audiências, as decisões, inclusive concedendo ou negando liminares, o atendimento às partes e aos advogados, os inúmeros ofícios do CNJ absorvem seu tempo.

Na condição de Corregedor das Comarcas do Interior, 2012/2013, denunciamos fatos que mereciam melhor atenção da Presidência e do CNJ: grande número de comarcas sob a responsabilidade de um juiz; anos sem gozar férias, além de situações semelhantes vividas pelos servidores: escreventes com mais de 20 anos no desempenho de cargo exclusivo de bacharel em direito, servidor com mais de 10 anos sem tirar férias ou total falta de acesso aos serviços médicos disponibilizados na capital, inexistentes em grande parte nas comarcas do interior e tantas outras irregularidades.

Além e acima desse cenário, o juiz deparará com um grande número de processos paralisados, porque a unidade judiciária passou muito tempo sem juiz, sem promotor, sem defensor e com insignificante número de servidores. E o pior é que esse quadro não é temporário, mas permanente; as comarcas do interior continuam defasadas em infraestrutura e material humano.

É conjuntura que uma administração, por mais competente que seja seu gestor, não conserta, porque o desmonte retrocede no tempo.   

Outras carências comuns, consubstanciam-se na diferença do gabinete de trabalho; às vezes são obrigados a trabalhar na própria sala de audiência ou em salas de casas velhas, aproveitadas para sediar os serviços judiciários.

Se se busca boa prestação jurisdicional, não resta outra opçao que não seja priorizar “os operários” das “filiais”. Afinal esses profissionais encarregam-se de receber, despachar, instruir, ouvir as partes, as testemunhas, realizar perícia, fazer diligências, vistorias, até o  julgamento final, que ocorre com a sentença, além de cuidar de toda a parte administrativa e disciplinar da unidade. Esse trabalho estafante ocorre em cada unidade, em cada processo. As condições dos fóruns forçam o juiz a levar para casa cupins, amontoados nos milhares de processos que transporta para seu lar, para desassossego da família.

Esse é o trabalho “braçal” no qual os magistrados se envolvem sem ter praticamente assessoria nenhuma. Alguns estados, recentemente, criaram 1(um), 2 (dois) assessores, mas não soluciona o drama, porque a segunda instância absorve os recursos que poderiam ser destinados ao primeiro grau. E aí vem o resultado para o menor: agregar, desativar ou fechar comarcas. Esses termos não são usados para corte de custos nos tribunais. 

Ademais, a justiça de segundo grau usa, com bastante frequência, das requisições dos melhores servidores da justiça de primeiro grau, inclusive de magistrados; o inverso não acontece, pois nunca um juiz requisita um servidor que presta serviço a um desembargador ou ministro.

Quase todos os investimentos dos tribunais destinam-se ao aprimoramento da justiça de segundo grau. Atualmente, vê-se, na Bahia e em muitos estados, o descalabro com a falta de servidores, de juizes, de promotores, de defensores públicos e de fóruns. Na Bahia, já se vão mais de 08 (oito) anos sem concurso e o número de servidores que se deslocaram das comarcas e varas para os gabinetes é muito grande.    

Se o Judiciário pensa em melhorar o atendimento ao jurisdicionado, em certos momentos, como se deu por ocasião da Copa, serve-se dos juizes e servidores; se quer oferecer ajuda aos passageiros, nos aeroportos, também vai buscar a justiça de primeiro grau; o mutirão para desafogar o grande número de feitos paralisados para sentença ou para liberação de presos que já cumpriram  penas depende da convocação de juizes, sem prejuizo de sua função original; as férias, a licença ou a ausência do juiz da comarca ou do próprio desembargador do gabinete é solucionada com a convocação de um juiz; as formações de comissões de toda natureza inovoca-se a presença de um juiz.

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Sobre o autor
Antonio Pessoa Cardoso

Ex-Corregedor das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça da Bahia. Advogado.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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