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O art. 2º da Lei nº 10.259/2001 <I>x</I> o art. 61 da Lei nº 9.099/95.

E as infrações com rito especial ?

01/08/2002 às 00:00
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Sumário : I- Intróito, II- Dois conceitos de infração penal de menor potencial ofensivo?, III- Do suposto vício de inconstitucionalidade do artigo 20 da Lei nº 10.259/2001, IV- Dos crimes que possuem procedimento especial para processo e julgamento, V- Da Conclusão.


Ementa: Com o advento da novel Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001, que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, deve-se concluir que foi ampliado o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo, devendo o novo conceito ser estendido à esfera Estadual, sob pena de se violar o princípio constitucional da isonomia e o princípio da razoabilidade, excepcionados os delitos para os quais haja previsão de rito especial, face ao disposto no artigo 1º do referido diploma legal, que admitiu a aplicação da ressalva prevista no artigo 61 da Lei nº 9.099/95 à esfera Federal.


I- Intróito

Com o advento da Constituição da República de 1988, o artigo 98, de forma expressa, previu a criação dos Juizados Especiais Criminais, os quais são competentes para a conciliação o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial .

Em sendo assim, ficou a cargo do legislador infraconstitucional a conceituação de infração penal de menor potencial ofensivo, surgindo assim a Lei nº 9.099/95, cujo artigo 61 entendeu ser as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não ultrapasse um ano, desde que não tenha procedimento especial.

Pacificou-se o entendimento de que todas as contravenções penais, mesmo possuindo rito especial, seriam infrações penais de menor potencial ofensivo, como é o caso da contravenção denominada "jogo do bicho", em que pese o culto professor Damásio E. de Jesus insurgir-se contra este entendimento.

Após, o Código de Trânsito Brasileiro passou a admitir a aplicação de institutos previstos na Lei nº 9.099/95 à alguns crimes cometidos na condução de veículos automotores, como é o caso, por exemplo, da lesão corporal culposa (artigo 303 do CTB), que, por força do artigo 291, parágrafo único, do referido diploma legal, admite a conciliação civil, a renúncia ao direito de representação e a transação penal.

No entanto, no tocante às referidas infrações penais de trânsito, entendemos, pelo fato de o legislador admitir a aplicação de institutos denominados "despenalizadores", não podem as mesmas ser consideradas infrações penais de menor potencial ofensivo, até porque a competência é do Juízo Criminal Comum e não do Juizado Especial Criminal. O legislador, tão somente, de forma imprópria e por razões de política criminal, entendeu estender os referidos institutos àquelas.

Como se pode observar, falta ao legislador um mínimo de conhecimento jurídico e de visão sistemática, pois, ao mesmo tempo que agravou algumas penas de crimes cometidos na direção de veículos automotores, também mitigou o rigor ao admitir a aplicação de institutos previstos na Lei dos Juizados Especiais Criminais.

Recentemente, mais um ato normativo foi elaborado pelo legislador e sancionado pelo Poder Executivo, que foi a Lei nº 10.259/2001, em que passou a disciplinar os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, acabando por entrar em vigor no dia 13 de janeiro de 2002.

Este novo diploma legal, em seu artigo 2º páragrafo único, deu nova definição legal às infrações penais de menor potencial ofensivo, in litteris:

"Parágrafo único. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para efeitos desta lei, os crimes a que a lei comine pena máxima dois anos, ou multa" (grifos nossos).

Diante deste novo conceito, inúmeros trabalhos foram publicados, surgindo diversos entendimentos, vez que para uns há dois conceitos de infração penal de menor potencial, enquanto para outros o conceito é um só, devendo a Lei nº 10.259/2001 ser aplicada à esfera Estadual.

Há ainda que se registrar que a Chefia do "parquet" fluminense editou um ato conjunto com o Secretário de Segurança Pública e o Chefe de Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, entendendo pela existência de vícios de inconstitucionalidade, o que motivou inclusive uma representação junto ao Procurador-Geral da República.

No ato conjunto nº 001/2002, ficou resolvido que os crimes cujas penas cominadas fossem superiores a um ano e inferiores a dois anos, a autoridade policial continuaria lavrando auto de prisão em flagrante, se fosse o caso, e encaminhando ao Juízo Criminal comum, ou encaminhando o inquérito policial para as Promotorias de Investigação Penal (Centrais de Inquéritos).Portanto, tudo deveria ficar como era antes do advento da referida lei federal.

Ademais, vem se sustentando a inconstitucionalidade, no mínimo em parte, da Lei nº 10.259/2001, em especial do disposto no artigo 20, em que segundo a interpretação de alguns operadores do direito, quando dispõe "vedada a aplicação desta lei no juízo estadual", acaba por ofender o princípio constitucional da isonomia.


II- Dois conceitos de infração penal de menor potencial ofensivo?

A recente lei federal (10.259/2001) fez com que doutrina e alguns operadores do direito viessem a adotar vários entendimentos, alguns sustentando que se passou a admitir dois conceitos de infração penal de menor potencial ofensivo, ou seja, um para ao Juizado Especial Criminal Estadual, previsto no artigo 61 da Lei nº 9.099/95, e outro para a esfera

Federal, previsto na Lei nº 10259/2001. Já outros autores passaram a entender que o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo é um só, isto é, o previsto no artigo 2º da Lei nº 10.259/2001, que acabou revogando o conceito previsto no artigo 61 da Lei nº 9.099/95, inclusive, a ressalva quanto aos crimes que possuem procedimento especial.

Em suma, este último entendimento considera infração penal de menor potencial ofensivo as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não ultrapassa dois anos ou seja cominada pena de multa, independentemente de haver previsão de rito especial ou não.

Não podemos concordar com o entendimento daqueles que defendem que com o advento da Lei nº 10.259/2001, passou-se a ter dois conceitos de infração penal de menor potencial ofensivo, ou seja, um previsto no artigo 61 da Lei nº 9.099/95 para a esfera estadual e outro para a esfera federal, previsto no artigo 2º, parágrafo único, daquele diploma legal, pois a própria Constituição da República procurou distinguir no tocante aos Juizados Especiais Criminais, as Justiças Estadual e Federal, tendo cada uma suas próprias peculiaridades. Ademais, segundo este entendimento, o disposto no artigo 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001, de forma expressa preceitua que aquele conceito é aplicável apenas à esfera federal, pois utilizou-se da expressão "para os efeitos desta lei" (grifo nosso). E, por fim, argumentam ainda com o disposto no artigo 20 do referido diploma legal federal, o qual também de forma expressa, "vedou a aplicação desta lei no juízo estadual". Portanto, esse entendimento não admite que o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo tenha sido ampliado na esfera estadual.

Ora, segundo a maioria dos doutrinadores ( Fernando da Costa Tourinho Filho, Damásio E. de Jesus, Alberto Silva Franco, Luiz Flávio Gomes, dentre outros) não há dúvidas de que com o advento da Lei nº 10.259/2001, o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo foi ampliado, devendo o artigo 2º, parágrafo único, da referida lei ser aplicado à esfera estadual, face aos princípios constitucionais da proporcionalidade e da isonomia. Em sendo assim, citam como exemplo o fato de que se uma pessoa desacata um autoridade federal teria direito aos institutos da Lei nº 9.099/95, já se desacata uma autoridade policial estadual, em havendo dois conceitos distintos de infração penal de menor potencial ofensivo, não faria jus àqueles institutos, o que geraria um vício de inconstitucionalidade, violando o artigo 5º da CRFB/88.

Portanto, ao nosso sentir, não há dúvidas de que o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo foi ampliado, devendo tal conceito ser aplicado inclusive de forma retroativa, face ao disposto no artigo 5º, inciso XL, da CRFB/88, sendo certo que os processos em curso no Juízo Criminal, que apuram as novas infrações penais de menor potencial ofensivo, não podem prosseguir no referidos juízo, devendo ser encaminhados ao Juizado Especial Criminal, a fim de que sejam aplicados os institutos "despenalizadores" previstos na Lei nº 9.099/95, se for o caso. É certo que alguns Juízos Criminais estão aplicando os referidos institutos na própria vara criminal, porém tal procedimento afronta o disposto no artigo 98 da CRFB/88, face à competência absoluta do Juizado Especial Criminal

Cumpre-nos assinalar que há operadores do direito entendendo que o atual conceito de infração penal de menor potencial ofensivo abrange todas as contravenções penais, os crimes cujas penas privativas de liberdade não superam dois anos, bem como os crimes apenados com pena privativa de liberdade, independentemente do quantum , desde que seja cominada alternativamente a pena de multa, pois o artigo 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001, de forma expressa dispõe " ou multa".

Ousamos também discordar, vez que, desde a criação dos Juizados Especiais Criminais, o legislador procurou conceituar infração penal de menor potencial ofensivo levando em consideração a pena máxima privativa de liberdade, ou seja, o quantum da pena mais grave. Em sendo assim, levando-se em consideração que a sanção pecuniária é mais branda que a pena privativa de liberdade, pode-se concluir que deve prevalecer esta última pena, ou seja, o quantum máximo de dois anos, pois, do contrário, chegar-se-ia, com a devida vênia, ao absurdo de considerar como infração penal de menor potencial ofensivo o tipo penal previsto no artigo 7º da Lei nº 8.137/90, apesar de o legislador ter cominado a pena máxima privativa de liberdade de 05 (cinco anos). Não foi esta a ratio legis.


III- Do suposto vício de inconstitucionalidade do artigo 20 da Lei nº 10.259/2001

Alguns operadores do direito vêem entendendo pela existência de vício de inconstitucionalidade, pelo menos em parte, da Lei nº 10.259/2001, no mínimo do disposto artigo 20, pois, segundo eles, este dispositivo impede a aplicação da referida lei no âmbito do JECRIM estadual.

No entanto, conforme já assinalado, não vislumbramos qualquer afronta à CRFB pelo referido dispositivo legal, senão vejamos:

Em que pese o posicionamento em contrário, não há vício, pois na realidade, apesar de o legislador não possuir técnica-legislativa, assim como pouco conhecimento do sistema jurídico, na realidade a parte final do dispositivo em análise, que veda a incidência da lei no juízo estadual não pode ser interpretada isoladamente, ou seja, não se pode destacá-la da parte inicial do referido dispositivo legal.

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Ora, o referido dispositivo legal preceitua que "onde não houver Vara Federal", a causa poderá ser proposta no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no artigo 4º da Lei nº 9.099/95, "vedada a aplicação desta lei no juízo estadual". Em sendo assim, s.m.j., preconizamos que a preocupação deste dispositivo legal como um todo não foi de vedar a

aplicação da Lei nº 10.259/2001 ao âmbito estadual, per si, mas sim de impedir que o Juizado Especial Criminal Estadual de uma localidade onde não tenha Vara Federal passe a ser investido de jurisdição federal e venha a aplicar os institutos "despenalizadores" previstos na Lei nº 9.099/95.

Em suma, o legislador federal procurou forçar a instalação de Juizados Especiais Criminais Federais, não investindo o Juízo Estadual de jurisdição federal como ocorre por exemplo na hipótese prevista no artigo 27 da Lei nº6.368/76. É certo que o legislador, como se costuma dizer popularmente, "choveu no molhado", mas também é sabido que este mesmo legislador, conforme salientado, possui, repise-se, poucos conhecimentos sobre o sistema jurídico tanto que transformou a contravenção penal de porte de arma em crime (Lei nº 9437/97), a fim de coibir a posse e uso de armas de fogo, mas quatro anos depois transformou este crime em infração penal de menor potencial ofensivo, admitindo a aplicação de "cestas básicas" ao autor da infração.

Portanto, em matéria de legislação, em especial penal, tudo é possível, face à falta de visão sistemática.


IV- Dos crimes que possuem procedimento especial para processo e julgamento

Muitos operadores do direito estão defendendo que o artigo 61 da Lei nº 9.099/95 foi revogado pelo parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 10.259/2001, consequentemente a parte final daquele dispositivo legal, que ressalvava os crimes com rito especial, não seria mais aplicada . Desta forma, o crime de abuso de poder, crimes contra a honra, dentre outros, seriam infrações penais de menor potencial ofensivo, admitindo-se, em tese, a aplicação dos institutos "despenalizadores" da Lei nº 9.099/95.

Mais uma vez ousamos discordar.

Inicialmente, não se pode deixar de observar que o artigo 1º da Lei nº 10.259/2001 admite, de forma expressa, que se aplique aos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Federais a Lei nº 9.099/95, naquilo que não houver incompatibilidade. Em sendo assim, verificamos que a ressalva constante no artigo 61 deste último diploma legal quanto às infrações penais com rito especial deve continuar ser aplicada, pois não há qualquer incompatibilidade, sendo certo que, entendimento em contrário, acabaria violando os princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, previstos no artigo 2º da Lei nº 9.099/95, e outros princípios inclusive de ordem constitucional.

Ora, se o legislador prevê rito especial para o processo e julgamento de determinados crimes é porque, na grande maioria dos casos, há alguma complexidade ou peculiaridade, o que exclui por completo a competência do JECRIM.

Vejamos alguns exemplos:

No caso do crime de calúnia, previsto no artigo 138 do Código Penal, em que alguém imputa à outrem falsamente fato definido como crime. E se o suposto ofensor desejar fazer a exceção da verdade? Como compatibilizar com o princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, previstos na própria Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais?

O mesmo se pode questionar no caso do crime de difamação, em que o ofendido é agente público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções (artigo 139, parágrafo único, do Código Penal).

Sequer se pode cogitar da aplicação do artigo 77, § 2º, da Lei nº 9.099/95, porque na realidade para que haja exceção da verdade pressupõe o oferecimento de ação penal, sendo certo que o referido dispositivo legal prevê que se houver complexidade antes do exercício do direito de ação penal, o MP poderá requerer ao Juízo o encaminhamento das peças aos Juízo comum. Ora, a aplicação deste dispositivo seria o malfadado "jeitinho brasileiro" para adequar uma situação complexa, mas não seria a nosso ver, de boa técnica, pois configuraria uma forma de não atender aos princípios informadores do JECRIM.

Um outro exemplo é o crime de abuso de poder, previsto na Lei nº 4.898/65, em que, no artigo 6º, § 3º, comina ao autor do delito as sanções penais de detenção de 10 (dez) dias a 06 (seis) meses, multa, perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo de até 03 (três anos).

Em sendo assim, analisando-se as penas previstas para o referido delito, pode-se concluir que não se trata propriamente de infração de menor potencial ofensivo, muito pelo contrário, até porque o sujeito ativo do delito pode até mesmo perder seu cargo público.

Qual seria a razão de o legislador prever a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por um espaço de tempo? A resposta parece ser lógica, é que o sujeito ativo, agente público, ao cometer o crime de abuso de poder viola princípios constitucionais, como o da legalidade e da moralidade administrativa (artigo 37 da CRFB/88). Portanto, o bem jurídico tutelado é bastante sério, o que afasta tal delito do conceito de infração penal de menor potencial ofensivo, face à magnitude da lesão, além do mais também tem rito especial.

Ora, à luz do princípio da ofensividade, aplicado por muitos, nullum crime sine injuria, se uma determinada infração viola bens jurídicos considerados pelo legislador constituinte como fundamentais, parece claro que não pode a mesma ser considerada de menor potencial ofensivo, pois violaria os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Não se pode olvidar que a ordem jurídica constitucional, no artigo 5º da CRFB/88, de forma expressa, REPELE :

a.. a tortura, o tratamento desumano ou degradante (inciso III);

b.. a violação da intimidade, da vida privada (inciso X);

c.. a violação do domicílio (inciso XI);

d.. a violação das correspondências e das comunicações telefônicas (inciso XII);

e.. a violação a qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (inciso XLI);

f.. a privação de liberdade sem o devido processo legal (inciso LIV);

g.. a prisão do cidadão, salvo em flagrante delito ou por ordem fundamentada de autoridade judicial (inciso LXI);

a.. a prisão ilegal (inciso LXV);

b.. a prisão quando a lei admitir liberdade provisória ou fiança (inciso LXVI);

Inclusive, assegura o direito à indenização ao cidadão que ficou preso além do tempo fixado na sentença (inciso LXXV).

Em sendo assim, suponhamos uma hipótese bastante comum em que um cidadão, suspeito de ter cometido um delito hediondo ou equiparado, tem a sua prisão temporária decretada por trinta dias, sendo prorrogada por mais trinta dias e, ao final, a Autoridade Policial prolonga ainda mais a privação da liberdade, cometendo o delito previsto no artigo 4º, alínea "i", da Lei nº 4.898/65.

Este agente público que violou os direitos e garantias fundamentais de um cidadão, bem como os princípios da moralidade e legalidade administrativa fará jus à transação penal? Será que a infração cometida por este agente público é de menor potencial ofensivo? E o bem jurídico ofendido, será que não é de grande importância inclusive constitucional? Será que a magnitude da lesão viabiliza, em tese, a transação penal? Será razoável e proporcional a aplicação dos institutos "despenalizadores" da Lei nº 9.099/95 a autores de tal delito?

Ora, como aplicar uma pena restritiva de direitos ou o pagamento das denominadas "cestas básicas" a um agente público que atentou com o segundo maior direito do cidadão que é a liberdade , sendo o primeiro o direito à vida.

Parece cristalino que as hipóteses delituosas previstas na lei nº 4.898/65 estão correlacionadas com os direitos e garantias individuais previstas no artigo 5º da CRFB/88. Portanto, conclui-se que não pode ser considerada infração de menor potencial ofensivo, até porque seria teratológico o legislador erigir determinados direitos à categoria de direitos e garantias fundamentais, mas caso violados as conseqüências jurídicas seriam mínimas ou inexistentes.

No âmbito da legislação falimentar, tem-se o crime previsto no artigo 190 do Decreto-lei nº 7.661/45, em que trata como crime a aquisição de bens da massa falida por determinadas pessoas, como o magistrado, o membro do Ministério Público dentre outros, tendo como pena máxima abstratamente cominada de dois anos de detenção.

Ora, como compatibilizar o rito do processo dos crimes falimentares com a simplicidade, o informalismo, a oralidade e a celeridade dos Juizados Especiais Criminais?

Não há inclusive quem entenda que o inquérito judicial é contraditório (artigo 106 do Decreto - lei nº 7.661/45, como José Frederico Marques e Fernando da Costa Tourinho Filho)? Como será possível apenas lavrar um termo circunstanciado?

Se for preconizado o entendimento de que o artigo 61 da Lei nº 9.099/95 foi totalmente revogado, consequentemente o crime que tenha rito especial, dependendo da pena (não superior a dois anos), seria considerado infração penal de menor potencial ofensivo. Desta forma, chegaríamos ao absurdo de excluir as contravenções penais dos Juizados Especiais, senão vejamos :

Ora, é certo e sabido que infração penal configura gênero, tendo como espécies o crime/delito e as contravenções penais, sendo certo que o artigo 61 da Lei nº 9.099/95, de forma técnica, colocou como infrações penais de menor potencial ofensivo as contravenções penais e os crimes cujas penas máximas não superam um ano, já o artigo 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001, não foi tão técnico, pois considera como infrações penais de menor potencial ofensivo "os crimes" (grifei), silenciando quanto às contravenções penais. Então, estas estariam fora do conceito?

Não há dúvidas de que o artigo 109 da CRFB/88 exclui da competência da Justiça Federal as contravenções penais, razão talvez pela qual a Lei nº 10.259/2001 excluiu do conceito o "crime-anão". Mas se o artigo 61 da Lei nº 9.099/95 foi revogado e se for possível "ressuscitar" a parte que prevê as contravenções penais, da mesma forma poderá ser "ressuscitada" a ressalva ("excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial").

De se verificar que este entendimento foi acolhido em novembro de 2001, no 10º encontro do Fórum permanente de Coordenadores de Juizados Especiais, realizado em Porto Velho - Rondônia, que teve a participação também do Exmo. Sr. Presidente do E. STJ, Ministro Costa Leite, tendo, na ocasião, sido editado o enunciado nº 46, in litteris :

"A lei nº 10.259/2001 ampliou a competência dos Juizados Especiais Criminais dos Estados e Distrito federal para o julgamento de crimes com pena máxima cominada até dois anos, excetuados aqueles sujeitos a procedimento especial." (grifei).


V- Conclusão

Conclui-se que não há qualquer vício de inconstitucionalidade na Lei nº 10.259/2001, sendo certo que o novo conceito de infração penal de menor potencial ofensivo deve levar em conta todas as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não ultrapassa dois anos, ressalvado aqueles que possuem rito especial.

Outrossim, rogamos a Deus que o legislador tenha mais cautela nos projetos de leis, buscando orientações jurídicas dos operadores de direito, a fim de que sejam evitadas reformas pontuais e teratológicas, como ocorreu com a lei dos delitos hediondos, lei de combate à tortura, lei dos juizados especiais criminais Estadual e Federal e a novel lei de entorpecentes, dentre tantas outras.

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Sobre o autor
Cláudio Calo Sousa

promotor de Justiça no Rio de Janeiro (RJ), professor de Direito Empresarial e de Direito Comercial

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Cláudio Calo. O art. 2º da Lei nº 10.259/2001 <I>x</I> o art. 61 da Lei nº 9.099/95.: E as infrações com rito especial ?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3042. Acesso em: 19 dez. 2024.

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