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Da desnecessidade do mandado de citação previsto no art. 880 da CLT e outras ponderações.

Releituras necessárias

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24/11/2014 às 11:22
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4. CONCLUSÕES

Diante de tudo o que foi dito, possível concluir que:

1) O procedimento executivo previsto no art. 880. da CLT perdura desde o texto original da Consolidação das Leis do Trabalho (1943) e possui inspiração nos artigos 918 e 889 do Código de Processo Civil revogado de 1939. Está-se, portanto, diante de um texto valorativa e comparativamente ultrapassado;

2) A “citação de execução” mencionada pelo artigo 880 da CLT não passa, em essência, de uma mera “intimação para cumprimento de título executivo”. Essa diferença conceitual é deveras relevante, pois, como se sabe, as legislações costumam prever disposições mais rígidas e solenes para o procedimento citatório, em oposição a um procedimento, via de regra, mais simplificado para a feitura de uma intimação;

3) O art. 880. da CLT não exige a pessoalidade do executado. A lei prevê, apenas, que o expediente seja encaminhado diretamente ao devedor. A diferença é substancial. Enquanto na pessoalidade a legislação “quer que a intimação chegue nas mãos do intimado”, no caso do expediente que deve ser direcionado diretamente à parte, basta a simples entrega (seja pelos Correios, seja pelo Oficial de Justiça) no endereço do intimado, independentemente de ser a própria parte intimada a recebê-lo;

4) Pelo exposto no item “3”, já se conclui que a intimação inaugural de execução prevista no art. 880. da CLT pode ser feita, também, via Correios, posto que este é meio notoriamente idôneo (utilizado para a notificação inicial trabalhista e, até mesmo, no processo civil, que exige a pessoalidade da citação) ;

5) A interpretação sistemática, teleológica e conforme a Constituição Federal do art. 880. da CLT faz emergir um sentido flexibilizante e atrai a conclusão de que a aplicação do mencionado texto legal deve ser tolerada seja via mandado, seja via postal, seja via intimação por meio do advogado do executado. O importante é preservar-lhe a essência (dar ciência ao devedor, por algum meio tolerado pelo Direito, para que pague ou garanta a execução no prazo de 48 horas) . Resultado do cotejo do texto com a legislação processual pátria contemporânea e da harmonização do texto legal: com os princípios constitucionais da Celeridade, Eficiência, Efetividade Jurisdicional, Proporcionalidade e Isonomia;

6) Mesmo que não se aplique a conclusão do item “5”, pode-se flexibilizar o meio eleito pelo legislador (mandado) por intermédio da aplicação do princípio da instrumentalidade das formas. Não sendo a forma de cumprimento essencial (Oficial de Justiça) , o art. 880. da CLT pode (e deve!) ser cumprido por outros meios mais efetivos, econômicos e simplificados (via postal ou via advogado) , haja vista que não serão causados manifestos prejuízos à parte devedora (salvo prova robusta em sentido contrário) ;

7) As conclusões contidas nos itens “5” e “6” sobre a flexibilidade dos meios de intimação para pagar, certamente se aplicam, mesmo que com alguns ajustes de raciocínio, à intimação para cumprimento das obrigações de fazer, não fazer e entregar;

8) O Judiciário e o intérprete possuem sim a importante missão de vivificar o direito. Se o legislador não o faz há mais de 70 anos, certo é que, diante da realidade, da processualística moderna e dos valores constitucionais, não se pode ficar inerte. Não se pode ficar escravizado, aguardando eternamente um legislador omisso. As normas velhas e desatualizadas vão naturalmente sofrendo releituras. A interpretação flexibilizadora do art. 880. da CLT, portanto, é medida viável e, diga-se mais, necessária;

9) A interpretação harmonizante dos artigos 832, §1, 835, 846 e 880 da CLT pode resultar em variadas conclusões:

9.1) Por um caminho, pode-se perfeitamente dividir o cumprimento do título executivo judicial em duas etapas. A primeira, de cumprimento espontâneo do executado, que se dará dentro do prazo, sob as condições e - se for o caso - penas estipuladas no acordo (CLT, art. 846. c/c 835) ou pelo magistrado na própria sentença (CLT, art. 832, §1º, c/c art. 835) . A segunda etapa seria a do cumprimento forçado, em que se daria, no caso das obrigações de pagar, o último prazo de 48 horas, em prestígio ao art. 880. da CLT, antes do início dos procedimentos de constrição e expropriação patrimonial. Seria perfeitamente possível, portanto, cominar multa pecuniária, ao menos no caso de descumprimento espontâneo do comando sentencial. Nota-se, no caso, ter sido encontrada uma interpretação plenamente viável, harmonizada e garantidora da máxima efetividade da decisão judicial e das normas celetistas. Porém, percebe-se, em essência, que a solução ficaria melhor se simplesmente fosse superado o último prazo de 48 horas previsto no art. 880. da CLT, que realmente parece estar “sobrando”. Será possível superar essa “sobra”?;

9.2) No caso da conciliação, tal problema é “facilmente” superável. Constata-se com muito mais evidência, até mesmo por ser um ato que necessita da participação conjunta das partes e do magistrado, que a legislação celetista atribuiu um alcance bastante amplo no estabelecimento das condições do acordo firmado (art. 846. da CLT) . Se é lícito, inclusive, estabelecer condição no sentido de que a parte que não cumprir o acordo ficará obrigada a satisfazer integralmente o valor pedido na inicial (normalmente muito superior ao montante acordado) , por óbvio plenamente possível estipular que, em caso de descumprimento, haverá multa e a execução será imediata, sem novo prazo ou nova intimação/citação. Quem descumpre um acordo já está mais do que ciente de sua conduta, não sendo justificável ou necessária mais nenhuma providência com o fito de conceder mais uma última chance para pagar (muito menos uma intimação via Oficial de Justiça, conforme preceitua a literalidade do art. 880. da CLT) ;

9.3) No caso da sentença, pode-se perfeitamente compreender que, sendo estabelecido com precisão pelo magistrado o marco em que se iniciará o prazo arbitrado para cumprimento da sentença, restaria desnecessário seguir o procedimento previsto no art. 880. da CLT. Este dispositivo, em último análise, serviria apenas como um procedimento subsidiário, necessário para a estipulação do termo inicial para o cumprimento da sentença, ou, por generalização, do acordo inadimplido;

9.4) Além do exposto, mas seguindo a mesma trilha, observa-se que uma leitura mais atenta do art. 880, caput, pode trazer – partindo da premissa de máxima eficácia dos artigos 832, §1º, 835 e 846 da CLT - novas interpretações à matéria:

9.4.1) A lei estabelece que - não sendo estipulado na sentença termo inicial para o prazo de cumprimento - o devedor deverá ser “citado” (intimado) para cumprir a decisão no prazo, pelo modo e sob as cominações que forem estipuladas pelo juiz com fulcro no art. 832, §1º, CLT;

9.4.2) A lei estabelece que - não sendo estipulado termo inicial no próprio acordo - a parte devedora deverá, em caso de inadimplemento, ser intimada para cumprir o acordo, dentro do prazo, modo e sob as cominações que forem estipuladas nos moldes do art. 846. da CLT;

9.4.3) Não tendo sido estipulado prazo, modo, condição ou cominação, a execução das obrigações de pagar se processará segundo as disposições legais subsidiárias estipuladas pela parte final do caput do art. 880. da CLT (pagar ou garantir a execução no prazo de 48 horas, sob pena de penhora) ;

9.4.4) Se o juiz não estipular prazo, modo e cominações para o cumprimento das obrigações de fazer, não fazer ou entregar, tais modalidades executórias seguirão a legislação processual comum, haja vista inexistir disposição específica da CLT regulando os temas.

9.5) Diante desse raciocínio, conclui-se que, a despeito da factibilidade da conclusão alçada no item “9.1”, a melhor interpretação leva a crer que o art. 880. teria emprego subsidiário aos artigos 832, §1, 835 e 846 da CLT, aplicando-se somente no caso de inexistir termo inicial fixado ou de não terem sido, no caso das obrigações de pagar, estipulados prazos, modos, cominações e condições no título executivo judicial;

9.6) Por fim, mister anunciar que a harmonização do art. 880. da CLT com os artigos 832, §1, 835 e 846 da CLT, garante, sem dúvidas, a possibilidade de cominação de multa em caso de descumprimento da obrigação de pagar (e abre também um mar de possibilidades, diga-se de passagem), seja por uma via (divisão do cumprimento em duas fases, uma espontânea e outra forçada) , seja por outra (entender o art. 880. como disposição subsidiária - que parece ser a via mais precisa e razoável).

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REFERÊNCIAS

BRUXEL, Charles da Costa. Novos Tempos: A Era Digital, a Efetividade, a Celeridade Processual e Justiça do Trabalho. 2013. 100. f. Monografia (Especialização) – Central de Cursos de Extensão e Pós-Graduação Lato Sensu, Universidade Gama Filho, Fortaleza, 2013.

CHAVES, Luciano Athayde. As reformas processuais e o processo do trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Porto Alegre, RS, v. 73, n. 1, p. 140-156, jan./mar. 2007. Disponível em: <https://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/2282/010_chaves.pdf?sequence=3>. Acesso em: 28 jul. 2014.

JORNADA NACIONAL SOBRE EXECUÇÃO NA JUSTIÇA DO TRABALHO, 2010, Cuiabá. Anais Eletrônicos... Cuiabá: 2010. Disponível em <https://www.jornadanacional.com.br/tesesaprovadasind.asp>. Acesso em: 25 jul. 2014.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2012.

LIMA, Francisco G. M. Releitura Revigorada do Art. 832, §1º, da CLT. 2009. Artigo publicado no Jornal Carta Forense (versão eletrônica) . Disponível em <https://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/releitura-revigorada-do-art-832-%C2%A7-1%C2%BA-da-clt/4217>. Acesso em: 25 jul. 2014.

LIMA, Fernando AntônioNegreiros. Teoria Geral do Processo Judicial. São Paulo: Atlas, 2013.

MICHAELIS Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. 2010-2012. Versão eletrônica. Disponível em: <https://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Acesso em: 26 jul. 2013.

MOLINA, André Araújo. Teoria dos Princípios Trabalhistas. São Paulo: Atlas, 2013.


Notas

1 Por sinal, na minha humilde opinião, soa bastante contraditório o entendimento vazado na Súmula 410 do Superior Tribunal de Justiça: “A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”. Se há a possibilidade de, mediante intimação via advogado, impor multa de 10% ao devedor, por certo deveria haver a mesma possibilidade no caso de estipulação de astreintes. Mesmo que se reconheça eventual distinção teórica entre a natureza das astreintes e a da multa do art. 475-J, o fato é que, se, em um caso, tolera-se a imposição de ônus direto à parte (multa de 10%) , mediante intimação via patrono, no outro caso isso deveria ser igualmente tolerado.

2 Pausa para um breve comentário. Poucos notam que, a despeito da consagrada execução de ofício, o art. 880. da CLT atecnicamente supõe a necessidade (ou ao menos entende como sendo a situação normal) de ser requerida a execução para a deflagração do processo executivo: “Requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir...”. Mais uma sucinta demonstração de que uma legislação arcaica não pode ser seguida tão à risca.

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Sobre o autor
Charles da Costa Bruxel

Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Direito na área de concentração de Constituição, Sociedade e Pensamento Jurídico pela Universidade Federal do Ceará (2021). Especialista em Direito Processual Civil pela Damásio Educacional (2018). Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Gama Filho (2013). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2016). Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Ceará (2011). Analista Judiciário - Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE), exercendo atualmente a função de Assistente em Gabinete de Desembargador. Explora pesquisas principalmente o Direito Processual do Trabalho, Direito do Trabalho, Direito Processual Civil e Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRUXEL, Charles Costa. Da desnecessidade do mandado de citação previsto no art. 880 da CLT e outras ponderações.: Releituras necessárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4163, 24 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30549. Acesso em: 5 dez. 2025.

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