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Contratos administrativos: cláusulas de reajuste de preços e reajustes e índices oficiais

01/08/2002 às 00:00
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1. Introdução

Do Princípio da "Pacta Sunt Servanda"

Uma das teorias que dão fundamento aos contratos, em geral, inclusive aos administrativos, é a "teoria da imutabilidade das cláusulas contratuais", expressa pela máxima segundo a qual os pactos devem ser observados, ou pacta sunt servanda.

Esse princípio teve origem na Escola Clássica francesa e foi adotado pelo Art. 1.134 do Código de Napoleão. Por essa regra, os contratos fazem lei entre as partes e, por isso, devem ser cumpridos ou os pactos hão de ser observados, não obstante o advento de situações e resultados imprevisíveis, mesmo que levem à ruína um dos contratantes.

O princípio da pacta sunt servanda prevaleceu na teoria dos contratos durante muito tempo, até o início do século XX, quando o fim da Primeira Guerra Mundial trouxe novas situações que levaram os estudiosos a repensá-la.

Da Cláusula "Rebus Sic Stantibus"

Após a Primeira Guerra Mundial, em virtude dos estragos provocados pelo conflito, os fatos posteriores ao evento provocaram profundas mudanças nas relações jurídicas contratuais, tanto nas relações entre a Administração e os particulares como nas envolvendo apenas estes últimos.

Referida mudança se deu na medida em que muitas pessoas dos países envolvidos na guerra foram à ruína financeira, vendo-se completamente impossibilitadas de continuar a cumprir contratos de longo prazo que haviam pactuado antes da ocorrência do conflito, inclusive com a Administração, celebrados em uma situação totalmente diferente daquela desastrosa na qual se encontravam.

No entanto, como até então era prevalecente a teoria da "pacta sunt servanda", com a idéia de que "os contratos devem ser obrigatoriamente cumpridos", aqueles particulares se viam em situação deprimente, tendo em vista que deveriam, necessariamente, continuar a cumprir com obrigações financeiras que já não lhe eram mais possíveis.

Em decorrência daqueles novos fatos, os contratualistas da época, estudando como resolver tais situações, ressuscitaram a velha cláusula "rebus sic stantibus" do Direito Romano, com a nova denominação de teoria da imprevisão.

Segundo essa teoria, as obrigações contratuais devem ser compreendidas em função das circunstâncias que serviram de base para a respectiva avenca. É a situação de fato existente na época do acordo que deve prevalecer diante da superveniência de fatos imprevisíveis, modificadores do inicialmente ajustado pelas partes.

Assim, fatos imprevisíveis, anormais, fora da cogitação dos contratantes e que tornam o cumprimento do contrato de longo prazo ruinoso para uma das partes, quebram o equilíbrio contratual até então existente, criando uma situação que não pode ser suportada unicamente pelo contratante prejudicado e impõem, portanto, a imediata revisão do ajuste.


2. Mutabilidade X Imutabilidade dos Contratos Administrativos

Da Relativização da Idéia de Imutabilidade Contratual

Como se viu anteriormente, os fatos do pós-guerra levaram ao re-estudo do direito contratual, sobretudo no aspecto de sua imutabilidade, de seu cumprimento cego e irresistível pelas partes, o que se aplicou também aos contratos administrativos.

Tendo como ponto de partida a cláusula "rebus sic stantibus", tornou-se patente a idéia de que os contratos, em princípio, são imutáveis, porém essa imutabilidade só será mantida até o momento em que as partes permanecerem nas mesmas condições econômicas e financeiras em que estavam no momento em que se vincularam contratualmente a uma prestação.

Se, durante a vigência e cumprimento do contrato, fatos supervenientes vieram a alterar substancialmente a situação econômico-financeira de qualquer das partes, tornando-se para ela extremamente oneroso o cumprimento da obrigação, não é justo que se continue a exigir dela uma esforço sobre-humano, sob o argumento de que "os contratos devem ser obrigatoriamente cumpridos".

Ora, é plausível que as partes, quando da celebração do negócio jurídico contratual, cientes das condições econômico-financeiras que possuem, esperem poder cumprir devidamente as obrigações às quais estão se vinculando, já que aquelas condições assim permitem. Por outro lado, se soubessem que futuramente, ainda durante a vigência do contrato, este se tornaria um meio de leva-la à ruína, certamente a ele não teria se ligado juridicamente.

A partir dessas idéias, concluiu-se que o princípio da "pacta sunt servanda" só será supremo enquanto as condições econômico-financeiras, que permitiram às partes assumir determinadas obrigações contratuais, permanecerem idênticas as existentes quando da avenca. Pois, se fatos posteriores tornaram excessivamente onerosa a prestação por alguma das partes, ocasionando uma desproporção entre a sua obrigação prestada e o benefício por ela recebido, não é justo que se exija dela o cumprimento quieto e parcimonioso de tal negócio, uma vez que isto conflita com a idéia de direito e com a própria noção de justiça.

Daí porque se argumenta que, em casos assim, haverá uma relativização do princípio da "pacta sunt servanda", idéia que trouxe em sua esteira a noção dos institutos jurídicos da equação econômico-financeira, da revisão contratual e das cláusulas de reajuste de preços, aplicáveis aos contratos administrativos, como se verá a seguir.

Da Equação Econômico-financeira

Adentrando mais especificamente no contrato administrativo, temos que as mesmas idéias articuladas anteriormente a este devem se aplicar. Nesse sentido, deve haver uma permanente equivalência entre os encargos suportados pelo particular e a remuneração a ele paga pela Administração. Isto é, a remuneração paga pela Administração ao particular deve ser justa e reflexiva dos encargos suportados por ele.

Essa equivalência entre encargos do particular e a remuneração paga pela Administração foi denominada de "equação econômico-financeira", representada doutrinariamente pela fórmula E=R.

O conceito desta equação nos é dado pelo professor Diógenes Gasparini: "É a relação de igualdade entre os encargos do contratante particular e a correspondente remuneração a que faz jus, fixada no contrato administrativo para a justa compensação do pactuado". Essa relação é inatingível por ato do Poder Público, e como tal deve ser mantida durante toda a vigência do contrato.

Da Manutenção do Equilíbrio (E=R) e da Imutabilidade do Contrato Administrativo

A adoção pelos ordenamentos jurídicos da cláusula rebus sic stantibus não significa a anulação do princípio da pacta sunt servanda e a conseqüente possibilidade de alteração do ajuste gratuitamente.

Com efeito, o contrato é ainda considerado lei entre as partes, devendo estas cumprir obrigatoriamente o que livremente convencionaram. No entanto, o contrato só será considerado imutável e de observância obrigatória caso não se tenha verificado durante sua vigência qualquer quebra da Equação econômico-financeira, ou seja, se o equilíbrio existente à época da avença não tiver sofrido qualquer abalo.

Ora, estando o particular cumprindo seu encargo contratual, bem como a Administração honrado com a respectiva remuneração, e não havendo disparidade entre as respectivas obrigações (encargo-remuneração), conclui-se que as partes encontram-se nas mesmas condições de quando da celebração do pacto, não lhes assistindo, portanto, quaisquer justificações plausíveis para tentar se esquivar do cumprimento de suas cláusulas, por mero capricho ou motivo irrelevante, senão por eventos que tornassem o negócio demasiadamente oneroso para qualquer deles, ou nos casos de alteração unilateral do contrato pela Administração em virtude do princípio da supremacia do interesse público.

Da Quebra do Equilíbrio (E>R ou E<R) e Da Mutabilidade do Contrato Administrativo

O professor José dos Santos Carvalho Filho leciona que "quando pactuam, as partes implicitamente pretendem que seja mantido o equilíbrio econômico-financeiro do contrato".

Se, por algum fato ou motivo superveniente, as obrigações para uma das partes se tornam extremamente onerosas, verifica-se uma quebra do Equilíbrio econômico-financeiro, nascendo para a parte o direito de modificação de suas cláusulas, de forma a que o equilíbrio perdido seja restaurado, como conseqüência, aliás, daquela própria equação já mencionada.

Nesse sentido, socorre-nos mais uma vez José dos Santos Carvalho Filho: "... o efeito principal desse verdadeiro postulado contratual é o de propiciar às partes a oportunidade de restabelecer o equilíbrio toda vez que de alguma forma mais profunda ele for rompido, ou, quando impossível o restabelecimento, ensejar a própria rescisão do contrato".


3. Fatos Violadores do Equilíbrio Econômico-financeiro e Formas Permissivas de Reequilíbrio

Todas as vezes que a equação econômico-financeira for abalada, passando uma das partes a sofrer um ônus excessivo perante a outra, não desejado quando do pacto, o princípio da pacta sunt servanda é relativizado, tendo lugar a aplicação da cláusula "rebus sic stantibus", que ordena a necessidade de reequilibrá-la. Sendo variadas as espécies de fatos que podem ensejar o rompimento da equação econômico-financeira do contrato, variadas, também, são as formas permissivas do reequilíbrio.

a)revisão: a revisão tem lugar sempre que circunstância extraordinária e imprevisível, ou previsível de efeitos incalculáveis, comprometer o equilíbrio do contrato administrativo, para adequá-lo à realidade, mediante a recomposição dos interesses pactuados. Aplica-se aqui a teoria da imprevisão, buscando-se fora do contrato soluções que devolvam o equilíbrio entre as obrigações das partes;

b)reajuste: o reajuste tem lugar quando ocorram previsíveis elevações dos preços dos bens, serviços ou salários, face à instabilidade econômica. Não se aplica aqui a teoria da imprevisão, porque ditos fatos são previsíveis e que, por isso mesmo, devem estar expressos no contrato as formas de reajuste. Em outras palavras, o próprio contrato dará a solução para o reequilíbrio;

c)correção monetária: ocorre em virtude do processo inflacionário e da desvalorização da moeda. É aplicada como fator de atualização do valor da moeda, independentemente de estar prevista no contrato, que deverá, no entanto, expressar qual o fator de correção que será utilizado.


4. Cláusulas de Reajuste de Preços

Fundamentos

Em países caracterizados pela instabilidade constante da economia, como o Brasil, são comuns as periódicas elevações dos preços dos bens, serviços e salários. E, havendo contratos de longo prazo entre a Administração e os particulares em vigência, a cada elevações dos preços dos bens, serviços e salários, verifica-se um desequilíbrio econômico-financeiro, desnivelando a paridade que havia quando do ajuste e que se esperava que permanecesse até o termo do contrato.

Assim, para evitar que as constantes elevações dos preços dos bens, serviços e salários tornem impraticáveis os contratos de longo prazo entre a Administração e os particulares, tornou-se regra a instituição nesses contratos de cláusulas prevendo e regulando a majoração do valor inicialmente fixado nesses ajustes.

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Objetivos

Sendo certas, e, portanto, previsíveis, as elevações dos preços dos bens, serviços ou salários, os contratos administrativos devem conter cláusulas de reajuste, que prevejam que serão adotados certos critérios para, verificada alta nos preços que desnivele o equilíbrio entre as partes, seja restabelecido dito equilíbrio.

Portanto, o reajuste de preços busca preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato inicialmente estabelecido pelas partes. Celso Antônio Bandeira de Mello ministra que as cláusulas de reajuste de preço "... pretendem acautelar os riscos derivados das altas que, nos tempos atuais, assumem caráter de normalidade. Portanto, fica explícito no ajuste o propósito de garantir com previdência a equação econômico-financeira, à medida que se renega a imutabilidade de um valor fixo e se acolhe, como um dado interno à própria avenca, a atualização do preço".

Origem

Ministra Celso Antônio Bandeira de Mello que a previsão de cláusulas de reajuste de preço nasceu da vontade da Administração de evitar a aplicação da teoria da imprevisão quando fatos supervenientes ao contrato viessem a desequilibra-lo.

Ora, acreditava o administrador que se o próprio contrato administrativo já dissesse quais seriam as fórmulas que seriam utilizadas para se re-equilibrar a equação econômico-financeira abalada, desnecessária a invocação da referida teoria, evitando que os rumos do contrato fugissem do controle da Administração.

Entretanto, não se atentou para o fato de que não se pode prever o imprevisível, e que, como disse André Maurois, "o inesperado sempre acontece". Assim, é impensável que o administrador posa prever toda uma infinidade de situações ordinárias e extraordinárias que possam ocorrer durante a vigência do contrato administrativo, razão pela qual as cláusulas de reajuste de preços limitam-se a regular situações ordinárias, tidas como relativamente normais e esperadas, sendo, portanto, sempre previsíveis.

Previsão Legal

Os contratos administrativos são regulados pela Lei nº 8.666/93 – Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que, em seus artigos, estabelece normas quanto à observância obrigatória de certas regras, sendo impositivo também estejam expressas as cláusulas de reajuste de preços, tanto no corpo do instrumento contratual como no próprio ato convocatório do processo de licitação, senão vejamos:

"Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, o dia e a hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:

.... ..

XI – critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;"

"Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

......

III- o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios da atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;"


5. Interpretação dos Dispositivos Legais sobre as Cláusulas de Reajuste

Da Previsão Expressa no Edital e no Contrato

Os critérios de reajuste devem constar desde o Edital (Art. 40, XI), assim como do Modelo de Contrato que o acompanha, podendo o interessado, em caso de omissão, impugna-lo desde logo, sob pena de perder a oportunidade de faze-lo. Da mesma forma, os mesmos critérios de reajuste devem constar expressamente também no corpo do contrato definitivo (Art. 55, III). Em havendo omissão, a doutrina entende que não estando previstos os critérios de reajuste de forma expressa, o preço ajustado é fixo e irreajustável, presumindo-se que as partes renunciaram a essa faculdade pelo fato de haverem embutido no valor do contrato a inflação do período.

Da Adoção de Índices Oficiais de Reajuste

Índices oficiais são fatores nos quais os critérios de reajuste devem se basear para se realizar o ajustamento dos preços à nova situação fática. Consoante o Art. 40, XI, podem ser adotados como critérios de reajuste índices setoriais – como os índices de variação dos preços da contrução civil, por exemplo – ou mesmo índices específicos da FIPE, da FGV etc., exceto os proibidos para reajuste de contratos – TR, dólar etc.

Nesse sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello pontua que as cláusulas de reajuste devem se reportar a índices oficiais. E à Administração não é dado manipulá-los, ou por qualquer modo viciá-los em detrimento do contratante, como forma de angariar mais "recursos públicos", pois assim agindo estaria defendendo interesses públicos secundários (interesses da Administração enquanto pessoa jurídica) e não interesses públicos primários (interesse da Administração enquanto representante do interesse de cada indivíduo, que junto formam o interesse comum). O interesse secundário só pode ser almejado enquanto coincidente com o interesse primário.

Dos Critérios quanto à Periodicidade do Reajuste

Versando sobre contratos de longo prazo, buscou o legislador fazer com que a Administração estabelecesse prazos mínimos para que o contrato administrativo fosse revisto, no sentido de analisar se a equação econômico-financeira permanece equilibrada de tempos em tempos, pois caso contrário cumpre-lhe observar os critérios de reajuste estabelecidos no instrumento para devolver ao negócio a paridade entre os encargos do particular e a remuneração paga pela Administração (E=R).

Por tal motivo, o Art. 55, III, reza que são cláusulas necessários em todo contrato administrativo as que estabeleçam a data-base e periodicidade do reajustamento de preços.

Nesse momento, cumpre-nos abrir um parêntese para explicar a problemática envolvendo a Lei de Licitações e a Lei do Plano Real. Existe uma controvérsia quanto a essa periodicidade de reajustamento dos contratos administrativo e a Lei n 8.880/94, que criou o Plano Real.

Ora, por um lado, o legislador, no Art. 55, III, da Lei nº 8.666/93, deixou a cargo do Administrador o estabelecimento, no próprio contrato, dos critérios quanto à periodicidade de reajuste do mesmo, podendo, assim, ser de 02 anos, 01 ano, 06 meses etc. Por outro lado, a Lei do Plano Real dispôs que as cláusulas de reajustamento só são permitidas em contratos com vigência superior a 01 ano, e que só após esse lapso de 01 ano e que os mesmos podiam ser reajustados.

Diante disso, alguns passaram a entender que, sendo a Lei do Plano Real posterior à Lei de Licitações, aquela tinha aplicação aos contratos administrativos, só podendo estes, portanto, estabelecer critérios de reajuste para depois de 01 ano da avenca. Outros entendiam, porém, que este prazo deveria ser observado, mas tinha que ser contado da proposta.

Entretanto, ambas as posições estão equivocadas. A esmagadora maioria da doutrina entende que tal disposição da Lei do Plano Real não se aplica aos contratos administrativos, uma vez que o equilíbrio da equação econômico-financeira goza de proteção constitucional, mediante o disposto no Art. 37, XXI, da CF, que determina a manutenção das condições efetivas da proposta, senão vejamos:

"Art. 37. (...)

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências e qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações". (sublinhei)

O já festejado professor Diógenes Gasparini explica-nos o dispositivo constitucional: "Ora, manter as condições efetivas da proposta não é outra coisa senão a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, e se para isso forem necessários reajustamentos em tempos menores que o previsto pela Lei do Plano Real, que sejam feitos, sob pena de desatendimento da determinação constitucional."

Da Correção Monetária

A correção monetária é um fator utilizado, sobretudo em países assolados por processos inflacionários, para atualizar o real valor da moeda nacional.

Não se pode confundir correção monetária com reajustamento de preços. Este implica revisão do valor inicial em face de alterações mercadológicas que repercutam sobre o contrato (custos de execução e remuneração). Aquela busca manter o valor do contrato, erodido pela inflação que corrói a moeda como meio de pagamento. São cláusulas cumuláveis porque diversos os seus respectivos objetos, razão pela qual não se cogita de bis in idem.

Os Arts. 40, XI, e 55, III, disciplinam que os fatores de atualização monetária devem estar previstos tanto no edital quanto no próprio contrato. Todavia, caso seja descumprida regra, sendo omissos tais instrumentos, é inaplicável a correção monetária? Teceremos algumas considerações a respeito a seguir.

O revogado Decreto-Lei nº 2.300/86 não contemplava a correção monetária nos contratos sujeito à sua disciplina. E, em razão disso, era usual que a Administração recusasse o pagamento de correção monetária não prevista no edital e no contrato, sob o argumento de que estaria ferindo o princípio da legalidade, segundo o qual à Administração só é dado agir consoante o que lhe autorizar a lei.

A Lei nº 8.666/93 alterou por completo o quadro, porquanto o Art. 5º, § 1º, o Art. 40, XIV, "c", e o Art. 55, III, tornaram obrigatória a correção monetária. Portanto, agora a correção monetária decorre de ordem legal, e, não, de deferimento administrativo. O fato de a correção monetária não haver sido prevista no ato convocatório não autoriza a Administração a descumprir a lei. Se aquele foi omisso, o foi apenas quanto ao critério de correção, e não quanto a aplicação desta.

Jessé Torres Pereira Júnior ressalta que "a escolha do critério de correção, omissos o edital e o contrato, deveria recair em índice geral, com variação diária, pois que diária seria a correção devida. A administração federal, uma vez extinta a Taxa Referencial Diária (TRD) pela Medida Provisória nº 319/93, adotou como parâmetro a UFIR.


5. Reajuste de Preços X Revisão do Contrato

Distinção

Tanto o reajuste quanto a revisão do contrato são remédios que procuram restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro quebrado por alguma contingência factual superveniente à avenca, que trouxe situação extremamente onerosa para uma delas. No entanto, inobstante fundamentarem-se na cláusula rebus sic stantibus, tratam-se revisão e reajuste de medidas diferentes no que tange aos contratos administrativos.

A Revisão é decorrência da teoria da imprevisão, tendo lugar quando a interferência causadora da quebra do equilíbrio econômico-financeiro consista em um fato imprevisível, ou previsível de conseqüências incalculáveis, anormal e extraordinário (geada no sertão nordestino, incêndios, enchentes etc.) Sendo imprevisível, é lógico que tal fato não está previsto no contrato, até mesmo porque não havia como as partes cogitar de seu acontecimento quando da avença.

O Reajuste, por sua vez, tem lugar em decorrência da instabilidade econômica e da conseqüente variação dos preços dos bens, serviços ou salários, onerando demasiadamente a parte que dependia da aquisição dos produtos majorados em seu valor. Como mencionada flutuação econômica é rotineira, ordinária, tida até mesma como normal, a mesma é por demais previsível quando da celebração de qualquer contrato, administrativo ou não. Assim, tendo em vista a previsibilidade da inflação e da elevação dos bens, serviços e salários, não se aplica, in casu, a teoria da imprevisão, uma vez que esta diz respeito a fatos imprevisíveis, e, portanto, não previstos no contrato.

O reajustamento, ao contrário, como disse o saudoso Hely Lopes Meyrelles, "é conduta contratual autorizada por lei para corrigir os efeitos ruinosos da inflação. Não é decorrência da imprevisão das partes; ao contrário, é previsão de uma realidade existente, diante da qual o legislador pátrio institucionalizou o reajustamento dos valores contratuais".

O fundamento legal da revisão contratual acha-se no Art. 65, II, "d", e § 6º da Lei 8.666/93; ao passo que o do reajustamento encontra-se no Art. 55, III, e Art. 65, § 8º, do mesmo do mesmo diploma legal.


Bibliografia:

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2000.

PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública. 5ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 5ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 1999.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 25ª edição. São Paulo: Malheiros, 2000.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 10ª edição. São Paulo: Malheiros, 1998.

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Sobre o autor
Kleber Martins de Araújo

advogado no Rio Grande do Norte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Kleber Martins. Contratos administrativos: cláusulas de reajuste de preços e reajustes e índices oficiais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3132. Acesso em: 22 nov. 2024.

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