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Zonas saturadas de poluição do ar X direito ao meio ambiente equilibrado

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5. Das Zonas Saturadas

A existência dessas zonas tem como base elementar a despreocupação da população como um todo, no tocante à preservação do meio ambiente – principalmente os governantes, que deveriam tomar atitudes severas que coibissem a poluição, porém,  nada faziam em seus mandatos, apenas deixando para que os políticos posteriores tomassem providências.

Eles não se importavam com as possíveis conseqüências que decorreriam de certos atos: desmatamentos, lixos jogados em lugares inapropriados,  fábricas que não respeitavam as normas impostas (exemplo: não utilizavam - e nem utilizam - filtros para amenizar a poluição), carros soltando fumaça.

Porém, os efeitos destes atos foram se acumulando ao longo das décadas, até que deles resultaram situações calamitosas. E, entre estes efeitos, as zonas saturadas de poluição do ar.

5.1 Conceito

Primeiramente, cumpre acentuar que a doutrina não se ateve muito à  conceituação de zonas saturadas e, por este motivo, torna-se necessário recorrermos à legislação pertinente para que seja possível entender o que são estas zonas.

O artigo 23 da Lei 997/76 do Estado de São Paulo disciplina: “Considera-se saturada em termos de poluição do ar, uma região ou sub-região quando qualquer valor máximo dos padrões de qualidade do ar nelas estiver ultrapassados”.

Registre-se que a existência dessas zonas se deve a um rápido e brusco desenvolvimento econômico que nunca se preocupou com os efeitos que acarretaria futuramente, uma vez que tinha em vista tão somente um progresso econômico tecnológico e, tal progresso, trouxe consigo danos ambientais irreparáveis.

Assim, nas regiões saturadas há efetivo dano ao meio ambiente e à vida da população como um todo, uma vez que o padrão de qualidade do ar admitido por lei foi ultrapassado.

No tocante ao Estado de São Paulo, a Lei 997/76 é a que cuida do grau de saturação da qualidade do ar. Ela não faz exigência de a zona ser industrial para haver tal classificação (saturada ou não), mas acaba por controlar a qualidade do ar através da divisão do Estado em regiões ou sub-regiões.

O artigo 20 do Decreto n° 8.468/76, que aprovou o regulamento  da Lei n° 997/76, divide o Estado em 11 regiões denominadas RCQA – Regiões de Controle de Qualidade do Ar. Vejamos:

1. Região da grande São Paulo – RCQA 1

2. Região do Litoral – RCQA 2

3. Região do Vale do Paraíba – RCQA 3

4. Região de Sorocaba – RCQA 4

5. Região de Campinas – RCQA 5

6. Região de Ribeirão Preto – RCQA 6

7. Região de Bauru – RCQA 7

8. Região de São José do Rio Preto – RCQA 8

9. Região de Araçatuba – RCQA9

10. Região de Presidente Prudente – RCQA 10

11. Região de Marília – RCQA 11

Essas regiões podem, ainda, ser subdivididas agrupando Municípios, visando à realização de programas que tenham como objetivo a diminuição da poluição do ar.

As regiões ou sub-regiões que são tidas como saturadas (aquelas onde os níveis de poluentes ultrapassam o padrão de qualidade do ar previsto por lei) ocasionam danos efetivos ao meio ambiente e riscos as pessoas que nela  habitam. Geralmente, estas regiões estão vinculadas à presença de atividades industriais e, também, à grande circulação de veículos.

5.2 Obrigatoriedade do Poder Público de intervir nas zonas saturadas

O art. 225 da Constituição Federal deixa claro que é dever do Poder Público defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.

Implicitamente, neste artigo, a Carta Magna propõe que a defesa  esteja sempre voltada à prevenção de danos ambientais, uma vez que leva em consideração que os danos são, de modo geral, irreversíveis.

Neste sentido, o papel do Poder Público, no tocante às zonas saturadas de poluição do ar, seria o de impedir uma maior saturação da qualidade do ar, principalmente nas zonas industriais e nas grandes cidades, que têm mais facilidades de poluir, visto que o número de entes poluidores é maior e estes são mais intensos.

Desta maneira, surge a seguinte pergunta: como é possível evitar o surgimento de áreas saturadas e/ou de áreas que tenham o ar com a qualidade prejudicada? Há várias maneiras de se conseguir chegar a uma qualidade estável e ideal, ou seja, primeiramente é necessária a conscientização das pessoas, e depois, a fiscalização e o controle rigoroso das emissões de poluentes, sendo que é preciso que cada Estado tenha o seu órgão fiscalizador. Por exemplo, no caso do Estado de São Paulo, o órgão responsável é a CETESB (Companhia de  Tecnologia de Saneamento Ambiental), que tem como objetivo fundamental impedir que novas fontes poluidoras se instalem em áreas que já sejam saturadas ou que estejam próximas da saturação.

Mas, vale ressaltar que, sem a conscientização humana, que é o que levaria ao resgate da idéia de desenvolvimento sustentável para se chegar a uma sadia qualidade de vida, torna-se difícil a atuação rigorosa dos órgãos fiscalizadores. Por mais que eles se esforcem a coibir os entes poluidores, não tendo tais entes a devida consciência, não se chegará ao desenvolvimento sustentável, o que se tanto almeja.

Não devemos esquecer, porém, que já existem áreas saturadas, devido ao pensamento equivocado de governantes passados que queriam o “desenvolvimento a qualquer custo”. Então, qual deve ser a atuação do Poder Público nestas áreas? É exatamente nelas que ele deve agir rigorosa e intensamente, com um único objetivo: reduzir os níveis de poluentes aos níveis admitidos de qualidade do ar.

Neste sentido, a função dos órgãos fiscalizadores deve ser a de obrigar e impor aos órgãos emissores de poluentes que reduzam tal poluição, através de instalação de equipamentos de tecnologia avançada, alteração de processos produtivos. ou qualquer outro meio que seja eficiente para que a área saturada deixe esta condição e possa ser enquadrada dentro dos padrões admitidos pela lei.

Enfim, as condições existentes nas zonas saturadas de poluição do ar vão totalmente contra as condições que a Constituição Federal assegura a toda coletividade: no lugar de sadia qualidade de vida e equilíbrio ecológico, meio ambiente degradado e pessoas prejudicadas (doenças respiratórias, doenças  de pele, e até mesmo anomalias, como é o caso da cidade de Cubatão - SP). É justamente por isso que há necessidade do Poder Público intervir em tais zonas.

5.3 O licenciamento necessário para atuar

O licenciamento ambiental é a primeira fiscalização, com intuito de verificação preventiva da utilização dos recursos naturais. Exige a Lei n. 6.938/81, em seu artigo 10, apenas a degradação, ou seja, alteração adversa do meio ambiente para que o licenciamento seja obrigatório.

Por este motivo, se verificada que determinada zona é ou está saturada de poluição, imediatamente o licenciamento é negado. E, assim, a atividade não poderá ser exercida naquele local.

Esta verificação existe em dois momentos: antes do início da atividade e após o início de seu desenvolvimento.

De acordo com MEIRELLES (1998:166), licença é conceituada como “o ato administrativo vinculado e definitivo pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividades ou a realização de fatos.”

O licenciamento ambiental é complexo, pois em suas etapas intervêm vários agentes. O artigo 225, § 1º, IV, da Constituição de 1988, dá incumbência ao Poder Público de exigir a licença, nas hipóteses de instalação de obras ou atividades de grande potencial de degradação ambiental. Conforme já aludido, sendo a zona considerada saturada, impossível a sua instalação.

São utilizados atos administrativos para proteger e assegurar o patrimônio público, que no caso, se trata do meio ambiente.

Há diferença entre autorização e licença. Autorização é um ato discricionário e precário, que a autoridade faculta ao administrado. A autorização da atividade e serviço ou a utilização dos bens, de início é proibida, cabendo à administração conceder ou não em favor do particular. Diferente da licença que, como foi conceituado anteriormente, é um ato vinculado.

Assim, por exemplo, a atividade de licenciamento de construções e outros, feitos através da expedição de alvarás de licença de construção, constitui ato vinculado, razão pela qual, preenchidas todas as exigências contidas em lei, ao agente público competente não é permitido nenhum juízo de discricionariedade quanto à conveniência ou oportunidade de outorga da referida licença.

Por outro lado, outros tantos atos podem ser discricionários. Tal é o caso das autorizações, atos típicos da polícia administrativa, que costumam ser expedidas no uso de competência discricionária.

Sobre os tipos de licença podemos dizer que o processo de licenciamento possui um rito ordinário e também procedimento especial.

Estabelecida a zona na qual a empresa pretende se instalar (não sendo ela zona saturada) e, deferido o pedido de licenciamento, a licença é emitida por fase, como dispõe o artigo 19, do Decreto n. 99.274/91, a saber:

O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças:

I - Licença Prévia-LP, na fase preliminar do planejamento da atividade, contendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, observados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo;

II - Licença de Instalação-LI, autorizando o início da implantação, de acordo com as especificações constantes do Projeto Executivo aprovado; e

III - Licença de Operação-LO, autorizando, após as verificações necessárias, o início da atividade licenciada e o funcionamento de seus equipamentos de controle de poluição, de acordo com o previsto nas Licenças Prévia e de Instalação.

Assim, diante da clareza da lei, o processo de licenciamento ambiental é dirigido em três etapas, havendo necessidade da obtenção de três licenças, cada uma em uma fase de implantação do empreendimento. A fase anterior sempre condicionando a posterior. Por exemplo, se for negada a licença prévia (LP) para implantação do empreendimento em um determinado local, essa negativa encerra o processo, não sendo possível a expedição da licença de instalação (LI) e da licença de operação (LO).

A licença de operação (LO) tem o papel de verificar se, na verdade, o projeto executado está de acordo com as anteriores autorizações.

Enfim, uma vez verificada a saturação de determinada zona, proibida fica a instalação de novos empreendimentos saturadores naquele local. E, para os empreendedores lá instalados são estabelecidas medidas que diminuam a poluição até que se chegue ao grau permitido, como por exemplo, a utilização de filtros nas chaminés das fábricas.

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6. Considerações Finais

Ao elaborarmos este trabalho, buscamos esclarecer alguns conceitos básicos sobre as questões ambientais, para posteriormente mostrarmos a importância da obediência aos limites de poluição do ar admitidos nas zonas saturadas de poluição do ar.

É importante ressaltar que não houve, nem poderia haver, preocupação em abordar o assunto em todas as suas hipóteses, mesmo porque a doutrina ainda não se voltou especificamente ao estudo das zonas saturadas.

Quanto à poluição do ar, ficou demonstrado que ela pode ser controlada, dada a variedade de opções que existem para tal, como por exemplo, o uso de filtro pelas indústrias e também, porque há todo um processo de licenciamento para que seja permitida a instalação de agentes poluidores em determinados locais. Medidas como estas visam tão somente à preservação do meio ambiente, coibindo os entes a não causarem danos a ele. Mas, o fator mais importante para que não se originem tais zonas é, exatamente, a conscientização dos indivíduos, pois só assim, será possível a existência de um meio ambiente equilibrado e sadio.

Desta maneira, pretende-se levar ao leitor à reflexão e à formação de uma opinião pela qual poderá, então, participar de discussões acerca do assunto.

No tocante aos aspectos jurídicos, ressalta-se que estão surgindo, a cada dia, novos aplicativos objetivando a defesa do meio ambiente.

Não é difícil perceber quais são as conseqüências da falta de preservação das áreas aqui discutidas e a importância de defendê-las.

Resta-nos concluir que, teoricamente, há leis suficientes para a preservação do meio ambiente - o problema se concentra, na maioria das vezes, na falta de fiscalização e conscientização.

Por isso, o que pode ser sugerido é a realização de mais formas de  fiscalização e  maiores possibilidades para fazê-las. Isso, sem esquecer de todo um trabalho educacional que deve ser elaborado com os cidadãos, para que eles se conscientizem da necessidade de preservar o meio ambiente.

Enfim, o presente trabalho objetiva servir como alerta ao problema dos danos causados ao meio ambiente, principalmente no tocante a poluição causada na atmosfera.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 12 ed. Rio de Janeiro:  Lúmen Júris, 2010.

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 4.ed. Brasília:  Universidade de Brasília, 1994.

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CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Proteção do Ambiente e Direito de Propriedade: Crítica de Jurisprudência Ambiental. Coimbra: Editora Coimbra, 1995.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 5.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1997.

CETESB. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. São Paulo: 2002. Disponível em www.cetesb.sp.gov.br. Ultimo acesso em 12/06/2011.

FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2000.

MILARE, Edis. Direto do Ambiente: doutrina, prática, jurisprudência e glossário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

_________. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2008.

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Sobre a autora
Ana Carolina Daldegan Serraglia

Procuradora do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERRAGLIA, Ana Carolina Daldegan. Zonas saturadas de poluição do ar X direito ao meio ambiente equilibrado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4077, 30 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31325. Acesso em: 23 abr. 2024.

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