Ditadura ou respeito à imagem e à honra? Quando a Justiça manda retirar sites e blogs sobre candidatos às eleições

Leia nesta página:

O direito de saber da vida pregressa de candidatos é primordial para a democracia. Este artigo examina a importância da liberdade de expressão como manutenção da democracia

O direito à imagem é protegido constitucionalmente:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Ainda no artigo 5º, a própria Carta Política, de 1988, assegura a liberdade de expressão:

“IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

(...)

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

As ações ilegais e imorais (art. 37, da CF) dos agentes políticos vêm causando inúmeros prejuízos aos cidadãos [não agentes políticos]. As manifestações de junho de 2013 representaram o ápice do descontentamento da nação brasileira. Algumas mudanças ocorreram depois das manifestações de junho de 2013, outros ignóbeis atos administrativos continuam a verter a podridão de ímprobos agentes políticos.

Há colisões entre direitos:

  • O direito do agente político ou candidato às eleições - de não ser violabilidade em sua honra e em sua imagem (art. 5°, X); e
  • O direito de qualquer cidadão eleitor - de se manifestar, livremente, o seu pensamento (art. 5°, IV), assim como a sua atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de [prévia] censura ou licença (art. 5°, IX).

Os direitos humanos foram criados para impedir abusos do Estado, no caso, as ações do soberano. Antes da consagração dos direitos humanos [Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789)] os soberanos, assim como a sua corte, consumiam quase a totalidade dos recursos naturais, deixando o povo na miséria. Qualquer manifestação popular, contrária aos interesses do soberano, desencadeava prisões, mortes, perda da propriedade.

Não é à toa que a liberdade de expressão, depois da Declaração, passou a ser um dos direitos mais importantes, e por que não dizer “sagrado”, de qualquer cidadão diante de quaisquer arbitrariedades dos dirigentes [agentes públicos] do Estado.

Nas vigências das ditaduras no Brasil, a liberdade de expressão foi perseguida, reprimida, condenada. Quando algum ditador quer manter-se no poder, compreensível, apesar de repugnante, a sua conduta belicosa a qualquer cidadão contrário ao seu governo.

A liberdade de expressão encontra limite constitucional (art. 5°):

  • O não anonimato ( IV).

O anonimato permite acusações diversas, e até falsas. Quando há anonimato, algumas pessoas se sentem como deuses. Por isso, a Constituição proíbe o anonimato e, ao mesmo tempo, permite a identificação do acusador para, quando condenado, indenizar a vítima.

Em relação aos agentes políticos, mesmo depois que cumpriram as suas sentenças por improbidades administrativas, que venham a se candidatarem as eleições, é lícito que o Poder Judiciário venha a proibir quaisquer manifestações denegrindo a imagem e a honra do “ficha suja”? Eis a questão.

Em recente decisão liminar do desembargador Wagner Cinelli, do Tribunal Regional Eleitoral do estado do Rio de Janeiro, uma página social, intitulada de “Garotinho de Novo, não", foi proibida de ser mantida no ar. Para o desembargador, a página "prejudica a imagem" do candidato [1].

O candidato ao cargo de governador do Rio de Janeiro já fora condenado a dois anos e meio de prisão, por formação de quadrilha, sendo a punição a prestação de serviços e a suspensão de direitos políticos [2].

Seja ao referido candidato, ou qualquer outro candidato, é lícito [democrático] o Poder Judiciário impedir aos eleitores, os verdadeiros detentores de poderes soberanos (art. 1°, § 1°, da CF), informações verídicas sobre a vida pregressa dos candidatos que já foram sentenciados por condutas ímprobas? É também lícito [democrático] permitir que os eleitores entreguem suas vidas, por quatro anos, sem saberem das ações passadas dos candidatos? Essas são as perguntas que o mesmo povo soberano deverá fazer, pois suas vidas e as vidas de seus familiares estarão nas mãos do “ficha suja” – mesmo sendo “ex-ficha suja”.

Educação e informação para mudar a mentalidade dos eleitores

O “ficha suja” faz, mas tira o dinheiro do povo. Como?

Imagine você trabalhador, que acorda às 4 horas da madrugada para se arrumar e, depois, ir ao ponto de ônibus. Já no ponto de ônibus há uma fila enorme. Ao entrar no ônibus, que lhe levará ao seu destino (trabalho), você fica espremido como uma sardinha enlatada.

Depois de mais de 1h (uma hora), pelo menos, dentro da lata de sardinha chamada de ônibus, você salta e vai para o emprego. Trabalha 8h (oito horas), ou mais. No final do período laboral (trabalho) você pega outro ônibus, ou trem, para retornar para sua residência. Durante um mês você faz o mesmo trajeto. No final do mês, você recebe o desumano salário mínimo. Com o desconto do INSS, você recebe um mísero salário, que mal dá para sobreviver dignamente, como manda a Constituição:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(…)

III – a dignidade da pessoa humana.

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A própria Constituição assegura que:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.

Mas a realidade do poder aquisitivo, pelo vergonhoso salário mínimo, não atende as condições sociais (art. 7°, da CF/1988) dos trabalhadores.

Com o salário em mãos, você terá que pagar as suas contas (luz, água etc.), comprar alimentos. E saiba que ao comprar alimentos, ou qualquer outra coisa, você paga impostos, que servem para melhorar a sua vida.

Perguntas:

  • Você compraria uma geladeira cujo preço é de R$ 1.000,00 (mil reais) sabendo que, em outro lugar, a mesma geladeira custa R$ 800,00 (oitocentos reais)?
  • Você permitiria que um pedreiro fizesse uma reforma na sua casa pelo preço de R$ 10.000,00 (dez mil reais) sabendo que outro pedreiro faria a mesma obra por R$ 5.000,00 (cinco mil reais)?

“Claro que não”!

E é assim que age o “ficha suja” ou corrupto político. Ele faz, mas toma em troca através do superfaturamento das obras públicas. 

É como se o “ficha suja”, todo mês, tirasse uma parcela de seu salário sem fazer nada, realmente, para você – melhorar em 100% (cem por cento) a sua vida. Como assim? Saiba que qualquer político ganha salário, que se chama subsídio – pagamento em parcela única –, e é você quem paga o salário de cada político. Como? Através do Estado.

O Estado é uma ideia – unicidades de pensamentos de várias pessoas para a existência do Brasil –, ele só tem existência através da atuação dos agentes públicos, como os policiais, os políticos, os médicos de hospitais públicos, assim como os professores de redes públicas. Todos são pagos pelo Estado – soma de povo, território e soberania.

E como o Estado obtém dinheiro para pagar os agentes públicos? Simples, com arrecadação de impostos. É através da arrecadação de impostos que o Estado paga os salários dos agentes públicos. No final, é você que – apesar de pegar ônibus lotado, molhar a sua roupa com o suor de seu trabalho, comer comida fria na marmita – paga os salários dos agentes públicos. Você, que suporta ônibus ou trem lotados e broncas do patrão, no final do mês “reparte” seu salário, através de impostos, para pagar o salário dos agentes públicos. Não deveria ser assim, mas diante dos ganhos dos agentes públicos comparado aos ganhos dos proletariados, estes trabalham para bancar as mordomias dos agentes públicos, principalmente os agentes políticos.

Agora imagine esta situação. Você tem seu salário em mãos, e alguém toma uma parte dele na marra. Como você se sentiria nessa afronta? Agora imagine que algum político se dizendo caridoso - cristão, evangélico, guru, umbandista, budista etc. -, providencia uma obra na sua rua. A obra custa, sem o ato corrupto do político, R$ 100.000,00 (cem mil reais), com o ato corrupto – obra superfaturada – o custo passa de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para R$ 100.100,00 (cem mil e cem reais).

“Mas só são R$ 100,00 reais que o político (corrupto ou “ficha suja”) pegou para ele. Isso não me fará falta, pois tenho a rua asfaltada”!

Assim você poderá dizer.

Ora, lembre-se que o político que abocanhou (improbidade administrativa) R$ 100,00 (cem reais) também obteve seu dinheiro através de seu salário. Como? Através do imposto que você paga ao comprar algo. Logo, o político “ficha suja” ganha duas vezes, e de forma desonesta.

E os R$ 100,00 (cem reais) que acha pouco irá faltar em algo importante, como educação, saneamento etc.

Do orçamento familiar ao orçamento público

Imagine-se ganhando seu salário, tudo deve ser anotado para você poder pagar suas contas, comprar medicamentos, alimentos. Deve também reservar parte de seu salário para alguma emergência. Se, por exemplo, sua casa tiver infiltração, você terá que mexer em sua reserva, pois infiltração está fora de sua administração - é algo inesperado.

Assim como você administra o seu dinheiro, o Estado também administra o dinheiro e riquezas do Brasil. É o Orçamento Público que serve para administrar as riquezas do país, e cada região (sudeste, nordeste etc.) tem seu orçamento público. Imprevistos [como enchente] não constam no orçamento. Enchente causa estragos. Por exemplo, o município terá que tirar dinheiro de algum setor (educação, segurança pública etc.) para reparar ruas, construir contenções de encostas etc. – dificilmente o agente político irá diminuir o próprio salário para ajudar na reconstrução da cidade.

Quando o “ficha suja” age - ou quando político age, mas depois a Justiça descobre que lesou a pátria, e o condena como “ficha suja” -, o orçamento público fica comprometido, o resultado é o que o Brasil vivencia: caos em todas as áreas (saúde, habitação, segurança pública etc.).

Somente através da educação e a livre manifestação de pensamento é que o eleitorado saberá, realmente, em quem votar.

Referência:

[1] – Justiça manda Facebook remover página contra Anthony Garotinho. Consultor Jurídico. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2014-ago-27/justica-manda-facebook-remover-pagina-garotinho>. Acesso em: 28 de ago. 2014.

[2] – Transparência Brasil - Excelência. Ocorrências na Justiça e Tribunais de Contas. Disponível em: < http://www.excelencias.org.br/@parl.php?id=71695 >. Acesso em: 28 de ago. 2014.

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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