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Primeiras impressões sobre a responsabilidade civil das empresas desenvolvedoras e administradoras de aplicativos para chamar táxis

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27/09/2014 às 16:00
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3. RESPONSABILIDADE POR AGRESSÕES A PASSAGEIROS

Parece-nos forçado, contudo, admitir-se a responsabilização civil das empresas que gerenciam essa espécie de aplicativo por eventuais agressões a passageiros, como ocorrido no caso vertente.

Deve-se ponderar que a garantia de segurança não é intrínseca à atividade de empresas dessa natureza, não faz parte de sua organização, tratando-se de fortuito externo, e, portanto, de uma excludente de responsabilidade do fornecedor. Sinteticamente, o fortuito externo pode ser conceituado como o fato imprevisível e inevitável, que não guarda nenhuma relação com a atividade desenvolvida pela empresa. A esse respeito, confira-se o disposto no inciso II,do § 3º, do art. 14, doCDC:

Art. 14 (omissis)

(...)

§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

(...)

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Destarte, s. M. J., sendo o taxista um terceiro cujos ânimos estão fora da previsibilidade e evitabilidade por parte da empresa que opera o aplicativo, a esta nenhuma responsabilidade deve ser imputada pela agressão levada a efeito contra o passageiro.

Lado outro, dúvidas não há de que o passageiro poderá, com base no art. 14, § 1º, doCDC, responsabilizar objetivamente o taxista pela agressão. Veja-se:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

Quanto a esse ponto, importa salientar que, em relação à corrida de táxi, enquanto contrato de transporte que é, deve ser observada a cláusula de incolumidade, assim explicada por CAVALIERI FILHO:

“Sem dúvida, a característica mais importante do contrato de transporte é a cláusula de incolumidade que nele está implícita. A obrigação do transportador não é apenas de meio, e não só de resultado, mas também de segurança. Não se obriga ele a tomar as providências e cautelas necessárias para o bom sucesso do transporte; obriga-se pelo fim, isto é, garante o bom êxito. Tem o transportador o dever de zelar pela incolumidade do passageiro na extensão necessária a lhe evitar qualquer acontecimento funesto...” (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 328).

Ante a lição do preclaro autor, não restam dúvidas quanto à violação da cláusula de incolumidade por parte do motorista do táxi, aliás, de forma dolosa, registre-se.

Inobstante, adiantando-nos em relação a eventual questionamento acerca da responsabilização da empresa por fato do serviço (acidente de consumo), analisa-se.

O fato do serviço (sinônimo de acidente de consumo) ocorrerá sempre que o defeito, além de atingir a incolumidade econômica do consumidor, vier a atingir sua incolumidade física ou psíquica. Nesse caso, haverá danos à saúde física ou psicológica do consumidor. Portanto, diferentemente do vício, o fato do serviço deve desencadear um dano que extrapola a órbita do próprio serviço.

Veja-se que, no presente caso, o passageiro sofreu uma agressão física, foi golpeado e ferido pelo taxista. Portanto, dúvidas não há de que houve fato do serviço, ocasionado exatamente pelo prestador do serviço.

No entanto, esse fato do serviço, pelos argumentos já delineados quando da conclusão de ocorrência de fortuito externo em relação à empresa, conduz à sua não responsabilização por fato do serviço. Ou seja, somente o taxista responderá por fato do serviço.


4. CONCLUSÃO

Como visto, as relações travadas por meios eletrônicos são complexas, representando um grande desafio para os estudiosos do Direito, especialmente quando a análise envolve o vastíssimo campo de aplicação do instituto da responsabilidade civil.

Quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor às empresas desenvolvedoras/operadoras de aplicativos para chamar táxis, parece-nos que não há dúvidas nesse sentido, eis que, embora apresentem o serviço como sendo gratuito para passageiros e taxistas, é possível verificar que essas startups são indiretamente remuneradas, através de parcerias com outros estabelecimentos empresariais (bares, restaurantes, boates, casas de espetáculos etc.). Ademais, a existência de concorrência entre empresas dessa natureza é mais um indicativo de que trata-se de uma relação de consumo, já que todas elas buscam arregimentar clientela para promover o crescimento do negócio.

Porém, ficou claro que a incidência do CDC a essas relações deve se limitar aos casos envolvendo vício do serviço, conforme explanado, ficando de fora eventuais acidentes de consumo (fato do serviço), uma vez que a garantia de segurança (cláusula de incolumidade) não é inerente à atividade da empresa virtual. Sem embargo, em casos tais, nada impede que o passageiro, com fundamento nas normas consumeristas, acione judicialmente o taxista, porquanto este e o passageiro se enquadram perfeitamente no conceito jurídico de fornecedor e consumidor, respectivamente.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014. Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Brasília, 23 de abril de 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, 11 de setembro de 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10ª ed., São Paulo: Atlas, 2012.

GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: código comentado e jurisprudência. 7ª ed., Niterói: Impetus, 2011.

TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor: direito material e processual. 3ª ed. São Paulo: Método, 2014.

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Sobre o autor
Vitor Guglinski

Advogado. Professor de Direito do Consumidor do curso de pós-graduação em Direito da Universidade Cândido Mendes (RJ). Professor do curso de pós-graduação em Direito do Consumidor na Era Digital do Meu Curso (SP). Professor do Curso de pós-graduação em Direito do Consumidor da Escola Superior da Advocacia da OAB. Especialista em Direito do Consumidor. Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon). Ex-assessor jurídico do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Autor colaborador da obra Código de Defesa do Consumidor - Doutrina e Jurisprudência para Utilização Profissional (Juspodivn). Coautor da obra Temas Actuales de Derecho del Consumidor (Normas Jurídicas - Peru). Coautor da obra Dano Temporal: O Tempo como Valor Jurídico (Empório do Direito). Coautor da obra Direito do Consumidor Contemporâneo (D'Plácido). Coautor de obras voltadas à preparação para concursos públicos (Juspodivn). Colaborador de diversos periódicos jurídicos. Colunista da Rádio Justiça do Supremo Tribunal Federal. Palestrante. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4246450P6

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUGLINSKI, Vitor. Primeiras impressões sobre a responsabilidade civil das empresas desenvolvedoras e administradoras de aplicativos para chamar táxis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4105, 27 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31639. Acesso em: 2 nov. 2024.

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