CONCLUSÕES
Por tudo isso, as consequências de o arrolamento consignar um ato processual são fundas na ordem jurídica, não escapando aos preceitos que regem os atos humanos em geral. Sua decretação deve escudar-se em causas extrínsecas e intrínsecas, de iniludível normatividade, sob pena de afigurar-se inválida, destituída de eficácia jurídica, ainda quando tenha espargido, no plano da vida, efeitos deletérios à Justiça, à verdade processual, à boa-fé, ao sentimento do justo.
Como primeiro ato coativo do processo de execução, que permite separar o patrimônio do devedor de tantos bens quantos bastarem para a garantia do mister executório, o arrolamento deve concretizar-se à luz da forma cristalizada no Código Tributário, qual seja, após a constituição definitiva do crédito tributário, sob pena de ensejar danos inadmissíveis, e, por isso, sujeitos à indenizabilidade plena. Nesse particular, não há como flexibilizar o ordenamento jurídico e vergar a Constituição Federal, corroendo-lhe a forma e subvertendo o primado de seus preceitos. Aqui não há lugar para atenuações, porque a decretação do arrolamento é medida extrema, e não algo corriqueiro e banal, ao menos nos Estados de Direito, como o nosso (CF, art. 1°, caput).
O arrolamento configura-se como um ato constritivo que permite separar o patrimônio do devedor para a segurança da futura execução. Há uma clara privação dos bens do contribuinte, na medida em que, ao fazer constar da declaração negativa de débitos (CND) menção relativa ao débito fiscal e ao respectivo arrolamento de bens, estaria o fisco atribuindo ao contribuinte uma indevida roupagem de inadimplente, bem como inviabilizando qualquer tipo de operação comercial ou financeira desejada pelo contribuinte e que tenha por garantia os bens "indevidamente" arrolados pelo fisco, fato este que configura uma restrição ao direito de propriedade.
Ademais gera danos a moral da empresa ou do contribuinte. Isso porque o comprometimento do bom desempenho empresarial, a credibilidade junto às instituições financeiras, o nome limpo daqueles que vivem o cotidiano do trabalho honesto são valores supremos que não podem ficar à mercê de subversões legais e constitucionais. Some-se o fato da desvalorização comercial de um bem gravado pelo arrolamento.
Por fim, a lei que criou o arrolamento administrativo é inconstitucional.
Há inconstitucionalidade formal, por se tratar de matéria reservada às leis complementares (art.146, inciso III, alínea b, da Constituição Federal). Assim não poderia ser criado o arrolamento por lei ordinária.
A inconstitucionalidade material consubstancia na violação ao direito de propriedade, devido processo legal, contraditório, sigilo e honra.
Não obstante a inconstitucionalidade, a lei não estabelece explicitamente a oportunidade na qual deve ser feito o arrolamento. Sendo que este somente se afigura cabível quando concluído o procedimento de determinação do valor do crédito tributário. É que ao referir-se, como se refere, ao valor dos créditos tributários de sua responsabilidade, coloca como pressuposto do arrolamento a existência de créditos tributários. Portanto, não basta a existência de obrigações tributárias, que são ilíquidas e incertas.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
BULOS, Uadi Lammêgo. Procedural Constitution e penhoras contra legem. Disponível em www.saraivajur.com.br, acesso em 05 de junho de 2008.
CAMPOS, Dejalma de. Direito Processual Tributário, 5ª ed. pg. 74, Ed. Atlas
MACHADO, Hugo de Brito. O arrolamento de bens do contribuinte. Exações com exigibilidade suspensa. O dever de fazer o arrolamento. Invalidade jurídica do procedimento. In Cadernos de Direito Tributário, pag.21/35.
__________, Curso de Direito Tributário, 17ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2000, pp. 189-190.
GRECO, Marco Aurélio. O arrolamento fiscal e quebra de sigilo, in Processo Administrativo Fiscal, 3ª v. coord. Valdir de Oliveira Rocha. 1ª ed., São Paulo. Dialética. 1998, p.1 73.
Notas
[1] MACHADO, Hugo de Brito. O arrolamento de bens do contribuinte. Exações com exigibilidade suspensa. O dever de fazer o arrolamento. Invalidade jurídica do procedimento. In Cadernos de Direito Tributário, pag.21/35.
[2] XXII - é garantido o direito de propriedade;
[3] LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
[4] XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
[5] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[6] § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
[7] Curso de Direito Tributário, 17ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2000, pp. 189-190.
[8] O arrolamento de bens do contribuinte, in Processo Administrativo Fiscal, 3ª v. coord. Valdir de Oliveira Rocha. 1ª ed., São Paulo. Dialética. 1998, p. 71.
[9] O arrolamento fiscal e quebra de sigilo, in Processo Administrativo Fiscal, 3ª v. coord. Valdir de Oliveira Rocha. 1ª ed., São Paulo. Dialética. 1998, p.1 73.
[10] The procedural constitution, in: Festschrift für Ferdinand Hermens, Berlin, 1976.
[11] BULOS, Uadi Lammêgo. Procedural Constitution e penhoras contra legem. Disponível em www.saraivajur.com.br, acesso em 05 de junho de 2008.
[12] Nesse sentido: Liebman, Processo de Execução, ns. 55-66; Carnellutti, Lezioni di diritto processuale civile: processo di execuzione, v.2, p. 74 e s.; Redenti, Diritto processuale civile, v. 2, n. 214 e s.; Pugliatti, Esecuzione forzata e diritto sostanziale, n. 32 e s.; Pasquale Castoro, Il processo esecutivo nel suo aspetto pratico, p. 146 e s.; Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, t. X, p. 152 e s.; Gabriel de Rezende Filho, Curso de direito processual civil, v. 3, Capítulo XVII; Frederico Marques, Instituições de direito processual civil, v. 5, §§ 201-203.