Artigo Destaque dos editores

O direito ao lazer nas relações de trabalho

Exibindo página 2 de 3
27/12/2014 às 11:22
Leia nesta página:

8. A EFETIVAÇÃO DO LAZER NAS RELAÇÕES DE TRABALHO PARA A PRESERVAÇÃO DA SAÚDE    

Direitos Sociais são valores fundamentais abordados na Constituição Federal. Trata-se de liberdade positiva, imposta pelo Estado Social de Direito inerente a todos os homens, com o intuito de proporcionar melhores condições de vida aos indivíduos, aplicando-lhes a igualdade a fim de alcançar um desenvolvimento sustentável.

O artigo 1º inciso, IV – dá ênfase aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Como se vê, são imprescindíveis os valores sociais para o país, proporcionando-lhe o crescimento econômico.

Conforme salienta Alexandre de Morais a respeito dos direitos sociais:

“[...] são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e consagrados como fundamentos do Estado democrático, pelo artigo 1.º, IV da Constituição Federal” (2008, p.193).

Pode-se afirmar que os direitos sociais são normas de ordem pública, invioláveis pelas partes contratantes.            A Carta Magna trouxe com exclusividade no Capítulo II, artigos 6º ao 11 – o rol Dos Direitos e Garantias Fundamentais, no qual são subdivididos em cinco partes pela doutrina majoritária, nesta ordem: direitos individuais e coletivos; direitos sociais; nacionalidade; direitos políticos e partidos políticos.

Os direitos sociais exemplificados no artigo 7º ao 11 da Constituição Federal abordam os direitos sociais dos trabalhadores. O artigo 6º da Constituição Federal “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção, à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”.

O artigo 7º trata dos direitos relativos aos trabalhadores em suas relações individuais de trabalho, tanto dos trabalhadores urbanos quanto dos trabalhadores rurais e domésticos. O artigo 9º a 11 disciplina os direitos coletivos dos trabalhadores. Ressalta-se que os direitos sociais não se restringem apenas ao rol acima, mas se estende por toda a Constituição Federal.

A saúde como um direito humano do trabalhador é algo inseparável, permanente, em respeito à sua dignidade essencial e necessária para eficiente prestação de serviços ao empregador, contudo é um direito dotado de um teor fundamental, devendo ser observadas as condições mínimas necessárias para a sua satisfação, pois faz parte do quadro de necessidades primárias do ser humano.

Conforme OLIVEIRA e SILVA

“na interdependência entre os direitos à vida (com suas projeções exteriores - a integridade físico–funcional e moral), a saúde e ao meio ambiente do trabalho equilibrado, é que se identifica  o conteúdo mínimo do direito em questão, com base numa interpretação sistemática da constituição federal (artigos 1º, 5º, 6º , 7º, 200 e 225), na qual se encontra, portanto um fundamento máximo do referido direito”(OLIVEIRA e SILVA, 2008, p.1).

Salienta dizer que a saúde do trabalhador é um direito humano de natureza negativa e positiva, que proporciona tanto ao Estado quanto ao empregador não à abstenção de medidas que acarretam a doença física ou mental do trabalhador, mas também, uma ação positiva, isto é, a intervenção de normas preventivas de determinadas doenças.

Quanto às obrigações básicas do empregador para assegurar a saúde do trabalhador, deverá cumprir todas as disposições legais sobre o assunto, sejam elas Constitucionais, infraconstitucionais, infralegais, acordos coletivos ou no ordenamento internacional, dos quais a República Federativa do Brasil faça parte, por exemplo, as Convenções 148, 155, 161 e 187 da organização do trabalho.

Nessa última década, aumentaram de modo admirável na seara trabalhista, as doenças associadas ao trabalho, entre elas, o estresse.

A palavra estresse traz a seguinte definição: “Estado próximo à doença que um organismo ou uma de suas partes apresentam por terem sido submetidos a uma exigência de rendimento superior à normal”. (Dicionário SM, 2012, p.432)

Em parecer emitido pela presidente do Instituto de Psicologia e Controle do Stress, Marilda Lipp, a propagação dessa enfermidade tem crescido em virtude da globalização tecnológica.  A medicina confirma a existência de dois tipos de estresse qualificado como benéfico e maléfico. Há o que eleva a adrenalina e faz com que o trabalhador se sinta mais enérgico e consequentemente mais produtivo. Entretanto se conservar neste ritmo por período indeterminado torna-se prejudicial à saúde e o quadro se agrava. O trabalhador começa a ter queda em sua produtividade. Além desses sintomas evidentes, outros são acrescidos tais como: a taquicardia, a tensão muscular, a boca seca, o nó no estômago, as mãos frias e suadas e a perda da memória.

Através de Políticas Públicas desenvolvidas pelo governo federal, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), tem sido promovidos programas antiestresse como prevenção para os agentes da Segurança Pública e automaticamente estendidos aos demais servidores. Entretanto, nas empresas privadas há pouca adesão a essa campanha de responsabilidade social sobre a redução do estresse.

Segue sugestões valiosíssimas para amenizar o estresse maléfico no trabalho, tanto para os empregados quanto para os empregadores, segundo Lipp.

• Melhorar o relacionamento com colegas, chefes e subordinado;

• Controlar o estresse e a raiva; 

• Gerenciar bem o tempo de cada atividade;

• Realizar testes periódicos de estresse;

• Buscar horários flexíveis; 

• Campanhas de esclarecimento e repúdio ao assédio moral;

• Sala de relaxamento;

• Atividade física e alimentação adequada (convênios com academias e nutricionistas);

• Psicoterapia.

No dizer da especialista “Não se deve esperar o trabalhador adoecer para tratá-lo”. Portanto, a prevenção é um dos melhores remédios e com esta política há um retorno para o empregador, o empregado e automaticamente o Estado. [7]

Neste sentido ensina-nos Schiavi[8] que a defesa ao meio ambiente do trabalho é necessária para a dignidade da pessoa humana, no sentido de beneficiar sua qualidade de vida, bem como cuidar de sua segurança física e moral. A doutrina ainda nos ensina que o meio ambiente de trabalho apropriado e protegido é um direito fundamental do cidadão trabalhador (erga omnes), pois a proteção do trabalhador é imensurável ante a proteção dada ao meio ambiente de trabalho.

Existe no âmbito jurídico, desde 2004, a Política Nacional de saúde do Trabalhador, e as Normas Regulamentadoras com tendência a excluir as doenças e os acidentes relacionados ao trabalho, por meio da fiscalização.

O Ministério da Saúde com parceria dos ministérios do Trabalho e Emprego e da Previdência Social desenvolve uma política de ação integrada sobre a saúde e segurança do trabalho, conhecida pela sigla (PNSST), que especificam as diretrizes.

I - Ampliação das ações, visando a inclusão de todos os trabalhadores brasileiros no sistema de promoção e proteção da saúde;

II - Harmonização das normas e articulação das ações de promoção, proteção e reparação da saúde do trabalhador;

III - Precedência das ações de prevenção sobre as de reparação;

IV - Estruturação de rede integrada de informações em Saúde do Trabalhador;

V - Reestruturação da formação em Saúde do Trabalhador e em segurança no trabalho e incentivo à capacitação e à educação continuada dos trabalhadores responsáveis pela operacionalização da política;

VI - Promoção de agenda integrada de estudos e pesquisas em segurança e Saúde do Trabalhador.

Segundo o Dicionário Silveira Bueno a palavra Lazer significa descanso, ócio, passatempo. Sintetiza este conceito Alexandre Lunardi:

“A palavra lazer vem do termo latim licere, que significa ser lícito, ser permitido, ter valor, é também sinônimo de folga, passatempo”. Segundo o Dicionário Houaiss:

Acepções – Substantivo masculino – 1 tempo que sobra do horário de trabalho e/ou do cumprimento de obrigações, aproveitável para o exercício de atividades prazerosas; 2 – derivação: por metonímia – atividade que se pratica nesse tempo: 3 - derivação:por extensão de sentido – cessação de uma atividade; descanso, repouso.

Etimologia - tem sido ligado ao lat. licere¨ser lícito, ser permitido, ter valor” , através do arc. Lezer “ócio, passatempo”;ver lic-;f.hist sXIII lezer, 1619 lazer-

Sinônimos - “ver sinonímia de folga e passatempo”.

Conforme o ilustre professor LUNARDI

 “se de um lado, o lazer pode significar ociosidade, por outro, ele é um conceito construtivo, contraposto a esse conceito de inatividade. A ocupação do tempo livre com determinadas atividades gera uma força construtiva fundamental para o desenvolvimento da pessoa e da sociedade”. LUNARDI (2012 capa).

O lazer compreende aquilo que o indivíduo executa de espontânea vontade, sempre associado ao bem-estar próprio ou da família, seja divertimento, cultura, descanso, esportes ou até mesmo trabalhos voluntários. Visando proporcionar ao trabalhador a segurança, a saúde e o lazer no local de trabalho o Estado criou o Programa Segurança e Saúde no Trabalho com o objetivo de resguardar um bem indisponível, a vida.


9. LAZER ELEMENTO NECESSÁRIO À DIGNIDADE HUMANA

Observa-se que os primeiros indícios históricos sobre a necessidade do lazer ligado ao trabalho, encontram-se no livro, a Bíblia Sagrada. Em Gênesis, seu primeiro livro, no capítulo 2, “E havendo Deus acabado no dia sétimo a obra que fizera, descansou no sétimo dia de toda a sua obra, que tinha feito”. O Deus Criador mostrou com esse exemplo que o descanso é imprescindível a todos os seres humanos e que deve ser posto em prática para se ter uma vida digna.

Sabe-se que isto nem sempre foi possível. Ainda no livro sagrado, presenciamos relatos de como os Faraós forçavam os egípcios e os hebreus ao trabalho, ferindo o que reconhecemos hoje, como a dignidade da pessoa humana.

O lazer é um fenômeno tipicamente moderno, resultante das tensões entre capital e trabalho, que se materializa como um tempo e espaço de vivências lúdicas, lugar de organização da cultura, perpassado por relações de hegemonia. (MASCARENHAS, 2003)

O lazer é mais que um tempo livre, sendo um momento fundamental para o indivíduo vivenciar suas reais e profundas aspirações, gerando assim qualidade de vida em seus diversos aspectos, com maior motivação no trabalho, na realização de suas atividades e menos insatisfação dentre outras vantagens.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Segundo LUNARDI o lazer é desconectar da atividade laboral. É buscar o convívio familiar, participar de eventos na comunidade, esportes, teatros, cinemas, leituras, aprimorar em cursos extratrabalho, e o não ”fazer nada”, descansar. Assim o lazer possibilita a efetivação dos direitos fundamentais por meio do desenvolvimento, no sentido global, no convívio familiar e social, na igualdade, na cidadania, e no âmbito individual do desenvolvimento intelectual, psicológico, emocional entre outros.

Presencia-se, hoje, nos grandes pólos industriais o lazer associado à ginástica laboral, que teve sua origem na Polônia desde 1925, mas somente na década de 60 é que passou a ser reconhecida por outros países. Em nosso país foi introduzido com a proposta de exercícios fundamentados nas biomecânicas, em decorrência do elevado índice de acidentes no trabalho provocado por extensas jornadas de serviço e também do ocasionamento das dores musculares.

Pois bem, o programa de atividades físicas é compreendido no horário de trabalho com a finalidade de amenizar acidentes, bem como o de proporcionar a educação para a saúde no trabalho e automaticamente elevar a produtividade industrial. Segundo os especialistas, uma sessão de ginástica laboral, prepara os trabalhadores para a jornada de trabalho, visa ainda com essa técnica relaxá-los ao termino da jornada.

Em parceria com as empresas, o SESI - SENAI levam o programa Ginástica na Empresa aos locais de trabalho e ainda que de forma receosa tem alcançado grandes resultados e reconhece que:

As posturas habituais e o trabalho pesado levam ao encurtamento dos músculos e tendões, adaptando-se à amplitude de movimentos restritos podendo ocasionar, inclusive, inflexibilidade de caráter irreversível após longo período de tempo.

A limitação da flexibilidade nas formas de trabalho pesado nos leva progressivamente ao sedentarismo e pode ser responsável pela má postura, compressão dos nervos, torcicolos, lombalgia, cefaléia, disminorreia, e outros males. Por meio de um programa planejado de exercícios progressivos de resistência e flexibilidade e de atividade de consciência corporal, pode-se atuar de forma preventiva, objetivando evitar tais consequências indesejáveis, como LER (Lesão por Esforço Repetitivo) (SESI-SENAI, 2001, p.6).

Pode-se afirmar que a ginástica laboral realizada na empresa como forma de lazer, possibilita grandes benefícios para o trabalhador, vale destacar: o aumento da produtividade; diminui o absenteísmo (falta ao trabalho), atrasos ao trabalho, o número de acidentes, rotatividade de pessoal, reduz despesas médicas, as horas extras ocasionadas por atestados; promove maior integração empresa/empregado através do reconhecimento, alivia o estresse, melhora a postura, desperta o interesse pela prática de hábitos saudáveis, estimula o interesse pela prática de atividade física, diminui o risco de acidentes e alivia dores musculares (SENAI[9] / SESI[10]).

Na percepção dos legisladores ao citar na Constituição Federal de 1988 o lazer como direito dos trabalhadores, referiam-se ao descanso semanal, jornada de 44 horas semanais e 8 horas diárias, ou seja, o lazer fora do ambiente de trabalho.

Contrariando diagnósticos, essa visão foi obrigatoriamente mitigada. Ainda que timidamente, avanços estão ocorrendo, e o trabalhador e o empregador brasileiro estão conhecendo algo, até então, inédito em termos de lazer – a capacidade de associar ao trabalho intervalos destinados ao lazer pautado na humanização.

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REIS, Marta Moreira Costa. O direito ao lazer nas relações de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4196, 27 dez. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31874. Acesso em: 22 nov. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos