Com o surgimento da Lei 9.714/98, o legislador modificou o sistema das penas alternativas, aumentando o seu número, bem como elevando o limite da pena privativa de liberdade aplicada passível de substituição.
Com a nova redação, passou o artigo 43, do Código Penal, a dispor o seguinte:
Art. 43. As penas restritivas de direitos são:
I – prestação pecuniária;
II – perda de bens e valores;
III – (Vetado);
IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V – interdição temporária de direitos;
VI – limitação de fim de semana.
Essas penas servem como substitutas, a teor do artigo 44, I, do Código Penal, quando aplicada pena privativa de liberdade não superior a 04 anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo, além de preenchidos os elementos subjetivos dos incisos II e III, do mesmo artigo.
A mudança preconizada nas penas restritivas de direitos veio em um momento de crise do sistema prisional e teve, por objetivo, oportunizar que determinados infratores eventuais não parassem atrás das grades, misturando-se com delinqüentes contumazes e de difícil ressocialização [1].
Porém, como o direito não é estanque, modificando-se conforme a necessidade social e o entendimento do judiciário, vimos em alguns julgados que a pretensão que fez surgir e depois expandir as penas alternativas está sendo ignorada, fazendo-se valer, antes da vontade da lei, a interpretação de alguns juízes e/ou desembargadores.
Digo que a intenção da Lei 9.714/98 está, espero que em raríssimas exceções, sendo desvirtuada, porque a pena restritiva de direito acaba, em alguns casos, sendo mais gravosa que a privativa de liberdade substituída, situação que exige do Juiz um cuidado especial.
Um exemplo de pena alternativa que pode se tornar mais grave que a privativa de liberdade é a limitação de fim de semana (art. 44, VI), senão vejamos um caso hipotético: um cidadão condenado a uma pena final de 02 anos, a ser cumprida em regime aberto, por infração ao artigo 328, parágrafo único, do Código Penal [2], tem sua pena, eis que satisfeitas todas condições subjetivas exigidas, substituída por uma restritiva de direito (limitação de fim de semana [3]) e por uma multa, conforme artigo 44, § 2º, do Código Penal.
Esse cidadão, supomos que detentor de uma conduta relevante socialmente, réu primário e com bons antecedentes, irá permanecer aos sábados e domingos, por 05 horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, pelo prazo de 02 anos, haja vista que a pena restritiva de direito terá a mesma duração que a privativa de liberdade [4].
Olhando, agora, sob um outro enfoque, esse sujeito, caso não tivesse a pena substituída, cumpriria a condenação de 02 anos em regime aberto, tendo, após decorrido 1/3 da pena (08 meses) direito ao livramento condicional, quando, então, teria por obrigação apenas comparecer em juízo no prazo fixado.
Vê-se, portanto, que a vantagem desse cidadão em não ter sua pena substituída pela limitação de fim de semana é enorme. Primeiro porque não temos, salvo raras exceções, locais apropriados para executar a limitação de fim de semana, ficando o condenado, muitas vezes, no pátio do presídio ou delegacia de polícia, literalmente preso. É um paradoxo, mas a limitação de fim de semana acaba sendo, antes de uma pena alternativa, uma privação temporária e parcelada da liberdade do condenado. Segundo, porque na limitação de fim de semana o sujeito deverá cumpri-la rigorosamente pelo prazo de dois anos, todo o fim de semana (sábado e domingo), durante 05 horas diárias.
De outro lado, caso não houvesse a substituição, o agente cumpriria sua pena em regime aberto, podendo beneficiar-se com o livramento condicional, após cumprido 1/3 da pena. Além do que, cediço que no livramento condicional a condições impostas ao condenado são mais "leves", haja vista, e este é apenas um exemplo, não terá contato com a população carcerária, apenas comparecendo em juízo (Cartório da Vara) mensalmente para a assinatura de livro de presença, além de outras condições.
Em razão dessas desproporcionalidades que vez em quando se depara nas lides forenses, máxime no Direito Penal onde está em jogo a liberdade do ser humano, é que o Advogado sente-se na obrigação de fazer uma verdadeira engenharia jurídica para beneficiar seu cliente.
Assim, no caso hipotético acima vislumbrado, deve o Advogado orientar seu cliente a descumprir a pena restritiva de direito – limitação de fim de semana – para que a mesma seja revogada, já que não tem o condenado como recusar a substituição, continuando, assim, a cumpri-la em regime aberto pelo prazo de 08 meses, quando será beneficiado com livramento condicional.
Portanto, deve o juiz, ao fazer a substituição, ter a sensibilidade e a visão de que a restritiva de direito não será mais prejudicial que a privativa de liberdade. Se isso ocorrer, como infelizmente vem ocorrendo, deve o Advogado, antes de aceitar passivamente, mobilizar-se e encontrar uma saída mais benéfica ao seu cliente.
Notas
1. Sem entrar na questão de que muitos infratores sequer foram socializados, que dirá ressocializados.
2. Art. 328. Usurpar o exercício de função pública: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa; Parágrafo único: se do fato o agente aufere vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dosi) a 5 (cinco) anos, e multa.
3. A escolha de qual pena alternativa a ser aplicada fica a critério do juiz, desde que preenchidos os requisitos legais.
4. Artigo 55, do Código Penal.