Esclarecimentos acerca da incidência ou não do diploma consumerista aos serviços públicos

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Qual a incidência do Código de Defesa do Consumidor no que toca os serviços públicos e seus destinatários? Seriam cidadãos consumidores?

RESUMO:

O trabalho em epígrafe surge com a necessidade de entender um pouco mais sobre a incidência do Código de Defesa do Consumidor no que toca os serviços públicos e seus destinatários, se este diploma regula ou não as relações estabelecidas entre estes, e se há a incidência, sobre quais serviços esta ocorrerá. Para o desenvolvimento deste trabalho foi utilizado o método dedutivo e a pesquisa bibliográfica. Ao final desse artigo concluiu-se que o CDC incide apenas sobre serviços públicos remunerados por meio de tarifa ou preço público, por haver nestes casos uma relação contratual volitiva na qual o usuário manifesta o elemento vontade.

PALAVRAS-CHAVE: DIREITO DO CONSUMIDOR, INCIDÊNCIA DO CDC, SERVIÇOS PÚBLICOS.

INTRODUÇÃO

Na atualidade, diante da falta de respeito com os cidadãos no que tange a má qualidade dos serviços públicos, a sua prestação ineficiente, entre tantos outros absurdos prementes na sociedade, os cidadãos estão desacreditados com o aparato de que dispõe o Estado para fornecer os serviços assegurados pela Constituição Federal e até mesmo pela legislação infraconstitucional, entre outros serviços que incumbem ao Poder Público direta ou indiretamente propiciar aos governados. Diante de tudo isso surge o questionamento se ante as relações entre prestadores de serviços públicos e os seus beneficiários há a proteção deste, enquanto vulnerável, pelo diploma consumerista e, se sim, sobre que serviços o diploma em comento incidiria e quando se verificaria essa tal incidência.

Com o fito de encontrar respostas para tais questionamentos é que surge a necessidade do desenvolvimento deste trabalho, objetivando que ao final reste respondido o que é serviço, dentro deste dando ênfase aos serviços públicos que são o principal alvo desse estudo, os tipos de serviços públicos e a incidência do CDC na relação Usuário X Prestador.

Para o desenvolvimento desse trabalho foi utilizado o método dedutivo, método este que parte das teorias e leis gerais e universais com o objetivo de explicar a ocorrência dos fenômenos particulares, como também a pesquisa bibliográfica, baseada na análise doutrinária, jurisprudencial e de algumas das legislações disponíveis acerca do assunto em tela.

  1. CONCEITO DE SERVIÇOS

Quanto aos serviços públicos sujeitos às regras de proteção ao consumidor trazidas pela Lei 8.078/90, essa não é uma questão pacificada, não existe uma unidade de entendimento por parte da doutrina, conforme explica Sergio Cavalieri:

                                     “uma corrente defende a aplicação do CDC somente aos serviços remunerados por taxa (preço público), estando dente os adeptos dessa corrente Cláudio Banolo e Paulo Valério Del Pai Moraes (Questões controvertidas no Código de Defesa do Consumidor, 4. Ed., Livraria do Advogado). Uma segunda corrente, menos ortodoxa, da qual são adeptos Cláudia Lima Marques e Adalberto Pasqualotto, entende que o CDC é aplicável indistintamente, a todos os serviços públicos, remunerados por tributo ou tarifa.” (2008, p. 68).

Faz-se mister iniciar com uma breve explicação sobre o que é serviço. O CDC traz em seu artigo 3º, parágrafo 2º o conceito legal de serviço, que “é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração (...)”. Os serviços podem tanto ser privados como também públicos, conforme se extrai do artigo 22 e artigo 3º, do diploma anteriormente citado, quando estes incluem no rol dos fornecedores a pessoa jurídica pública. Hely Lopes Meirelles, assim escreve:

                                       “A constituição insere, ainda, o conceito de serviço relevante, como o de saúde (art. 197). Atendendo a essa orientação, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) considera como direito básico a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral (art. 6º) e, em complemento, obriga o Poder Público ou os seus delegados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e contínuos, dispondo sobre os meios para o cumprimento daquelas obrigações e a reparação dos danos (art. 22 e parágrafo único).”

Para melhor entendimento sobre o que é serviço Rizzatto Nunes (2012, p. 144) escreve que “serviço é qualquer atividade fornecida ou, melhor dizendo, prestada no mercado de consumo.”

  1. SERVIÇOS PÚBLICOS

Depois de elucidado o entendimento sobre o que é serviço para os fins de incidência do CDC, necessário se faz verificar se os serviços públicos encaixam-se nesse conceito de serviços que traz a Lei 8.078/90.

Os serviços públicos podem ser executados direta ou indiretamente pelo Estado ou por seus órgãos administrativos ou mesmo por entidades diversas da administração indireta, respectivamente. Conforme explica o renomado jurista Sergio Cavalieri Filho serviços públicos:

“são aqueles prestados pela administração ou por seus delegados, sob as normas e controles estatais, para satisfazerem necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado.” (2010, p. 235 e 236).

O mesmo jurista ainda os classifica de acordo com a existência ou não da vontade, ou da possibilidade de identificação do destinatário em UTI SINGULI E UTI UNIVERSI, a primeira refere-se aqueles serviços prestados quando não há a possibilidade de identificação dos destinatários, e seu financiamento se dá por meio dos impostos, como é o exemplo da segurança pública. Já o segundo é aquele destinado a usuários determináveis, como é o exemplo da energia elétrica. Os serviços UTI UNIVERSI caracterizam-se pela obrigatoriedade, por não haver opção por parte do contribuinte em pagar ou não pagar, e continuidade mesmo diante de um caso de inadimplência, em contraponto a estes estão os UTI SINGULI, que por ser a tarifa, meio pelo qual é financiado, facultativa, neste caso imperando a autonomia da vontade do beneficiário estabelece-se entre este e o Poder Público uma relação contratual.

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Do conceito de serviços públicos extrai-se a ideia de remuneração, e esta deve ser entendida como sendo todo e qualquer tipo, direta ou mesmo indiretamente de cobrança ou repasse.

Como visto anteriormente, a doutrina consumerista diverge acerca de quando ou quais serviços estão sujeitos às regras do código consumerista, uma corrente defendendo piamente que somente os serviços públicos remunerados sofreriam a incidência do diploma, já a outra corrente defende que o CDC deva ser aplicado a todos os serviços públicos. Durante algum tempo o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça esteve dividido acerca do tema. A 2ª turma do referido Tribunal em seu REsp 793422 (03/09/2006) decidiu o seguinte:

                                      “O CDC somente se aplica aos serviços públicos remunerados por meio de tarifa ou preço público, pois nos serviços remunerados por taxa o usuário não tem liberdade de escolha, travando-se entre ele e o poder público uma relação jurídica de natureza administrativo-tributária.”

EFICIÊNCIA NOS SERVIÇOS PÚBLICOS

O CDC em seu artigo 22 estatui que “Os órgãos públicos por si, ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.”, ou seja, as prestadoras de serviço público são compelidas a oferecer serviços adequados, de modo eficiente e seguro, eficiência esta advinda do principio da eficiência, expresso na Lei Maior e que nas palavras de Hely Lopes Meirelles

“é o mais moderno principio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.” (2008, p. 98).

Mesmo diante de uma norma expressa e esclarecedora, os prestadores de serviços públicos tentam na justiça derrubar o artigo 22 do CDC fundamentando seus pedidos dizendo não estarem submetidos aos regramentos da Lei 8.078/90, a exemplo do que foi citado na obra do doutrinador Rizzatto Nunes:

“... decisão da 3ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo no agravo de instrumento interposto pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – Sabesp. Nas razões do recurso feito, que envolve a discussão a respeito dos valores cobrados pelo fornecimento de água e esgoto (que o consumidor alega foram cobrados exorbitantemente), a empresa fornecedora fundamenta sua resignação “na não subordinação da relação jurídica subjacente àquela legislação especial (o CDC).” O Tribunal acertadamente rejeitou a resistência da Sabesp” (2012, p. 152).

Ainda sobre a eficiência no serviço público, o mesmo doutrinador leciona que:

“a eficiência é um plus necessário da adequação. O individuo recebe serviço público eficiente quando a necessidade para o qual ele foi criado é suprida” (2012, p. 154).

CONCLUSÃO ACERCA DOS SERVIÇOS SOBRE OS QUAIS INCIDE O CDC

Diante de tudo que foi exposto sobre a incidência do diploma consumerista, a corrente mais adequada é a que afirma serem regidos pelo CDC aqueles serviços remunerados por tarifa, pelo fato de que nestes encontra-se presente o direito de escolha do usuário e esse direito de escolha é um dos direitos fundamentais do consumidor, sendo necessário à sua caracterização como tal. Esse entendimento também é o que prevalece no Superior Tribunal de Justiça, o qual foi sintetizado no REsp 525.520 – AL.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DINIZ, Célia Regina; BARBOZA DA SILVA, Iolanda. Metodologia cientifica. Campina Grande; Natal: UEPB/URFN – EDUEP, 2008.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. 7ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2008.

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Sobre o autor
Bruna Antonia Nascimento Santana

Estudante do 7º semestre de Direito da Faculdade Paraíso do Ceará. Com Interesse na prestação de Concurso Público. Com afinidade maior na área trabalhista e penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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